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segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

CONTO: ROBBIE - (FRAGMENTO) - ISAAC ASIMOV - COM GABARITO

 Conto: Robbie – Fragmento

            Isaac Asimov

        — Noventa e oito, noventa e nove, cem.

        Gloria tirou o bracinho rechonchudo da frente dos olhos e ficou de pé por um instante, franzindo o nariz e piscando sob a luz do Sol. Então, tentando observar todas as direções ao mesmo tempo, ela se afastou com alguns passos cautelosos da árvore na qual estava encostada.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjOvt1AbtK3sdgqcZb1HC4Nxp9x6Ld9mcRUANAYFR92jS6rassB-i3iMXvu_RIFdyMhHQpjwuEi_rlNLi_6yt4wbXLM51npRLarMUVJMu69cQs0uDyQmn47K9CT4GClD7uxjoV5LgJJHmG3OmXFixqDokCpUGgEbxVFI6X3LDPTQxkwNDcfn6uSR8eKKy8/s320/ROBO.jpg


        Ela levantou a cabeça para investigar as possibilidades de um amontoado de arbustos à direita, depois afastouse para obter um ângulo melhor a fim de ver seus vãos escuros. O silêncio era profundo, exceto pelo incessante zumbido de insetos e o ocasional gorjeio de um pássaro robusto, desafiando o sol do meio dia.

        — Aposto que ele foi para dentro de casa – disse Glória, fazendo beicinho –, e eu disse a ele um milhão de vezes que isso é justo.

        Apertando os pequenos lábios e fazendo uma carranca que lhe franzia a testa, ela seguiu de maneira resoluta para a construção de dois andares que ficava logo após a entrada da garagem para os carros.

        Ela ouviu, tarde demais, o farfalhar atrás de si, seguido pelo ploc-ploc característico e ritmado dos pés metálicos de Robbie. Ela se virou para ver seu companheiro triunfante sair do esconderijo e correr para a árvore a toda velocidade.

        Gloria gritou, aflita.

        — Espera, Robbie! Isso não foi justo, Robbie! Prometeu que não iria correr até eu encontrar você. – Seus pezinhos não conseguiriam fazer grandes progressos contra as passadas gigantescas de Robbie. Então, a pouco mais de três metros do alvo, as passadas de Robbie diminuíram de repente a um mero passo de tartaruga; com a última arrancada em velocidade, ela passou correndo por ele, ofegante, para tocar no tronco da árvore primeiro.

        [...]

        A sra. Weston esperou pacientemente por dois minutos, depois impacientemente por mais dois, e por fim quebrou o silêncio.

        -- George!

        -- Hum?

        -- George, estou falando com você! Quer fazer o favor de baixar esse jornal e olhar pra mim? 

        Farfalhando, o jornal caiu ao chão e Weston virou-se para a mulher com ar aborrecido.

        -- O que foi, querida?

        -- Você sabe o que é, George. É Gloria e aquela máquina terrível.

        -- Que máquina horrível?

        -- Não finja que não sabe do que eu estou falando. É aquele robô que Glória chama de Robbie. Ele não a deixa nem por um segundo.

        -- Bem, e por que ele deveria? Ele não deve deixá-la. E ele com certeza não é uma máquina horrível. É o melhor robô que dinheiro pode comprar e tenho certeza absoluta de que me custou a renda de seis meses. Mas ele valeu a pena, é muito mais esperto que metade do pessoal do meu escritório.

        Ele fez um movimento para pegar o jornal de volta, mas sua mulher foi mais rápida e o pegou com violência.

        -- Ouça o que eu digo, George. Não vou confiar a minha filha uma máquina, e não me importa quão esperta ela seja. Ela não tem alma e ninguém sabe o que pode estar pensando. Crianças simplesmente não foram feitas para serem protegidas por um coisa de metal.

        Weston franziu as sobrancelhas.

        -- Quando você decidiu isso? Ele está com Glória há anos e eu não vi você se preocupar até agora.

        -- Era diferente no começo. Era novidade, diminuiu a quantidade de trabalho que eu tinha e... e estava na moda. Mas agora não sei. Os vizinhos...

        -- Bom, o que os vizinhos têm a ver com isso? [...]

        A sra. Weston encontrou o marido à porta duas noites depois.

        -- Você precisa ouvir isso, George. Há um mau pressentimento na vizinhança.

        -- Sobre o quê? – perguntou Weston. Ele entrou no lavatório e sufocou qualquer resposta possível com o esguicho da água.

        A sra. Westoon esperou.

        -- Sobre Robbie – respondeu ela.

        Weston saiu do lavatório com a toalha na mão, o rosto vermelho e bravo.

        -- Do que você está falando?

        -- Ah, é algo que está ganhando cada vez mais força. Tentei fechar os olhos à questão, mas não vou mais fazer isso. A maioria dos moradores considera Robbie perigoso. As crianças estão proibidas de chegar perto da nossa casa à noite. [...]

        Dez vezes ao longo da semana seguinte ele gritou “Robbie fica, e esta é a minha última palavra”, e o grito era cada vez mais fraco e acompanhado por um gemido mais alto e mais agonizante. Chegou por fim o dia em que Weston se aproximou da filha de modo culposo e sugeriu que fossem a um “lindo” show visivox na cidade.

        Glória bateu palmas, alegre:

        -- Robbie pode ir?

        -- Não, querida – disse ele, e recuou diante do som da própria voz –, não vão permitir um robô no visivox; mas você pode contar tudo a ele quando voltar. – ele tropeçou sobre as últimas palavras e desviou o olhar.

        Glória voltou da cidade transbordando de entusiasmo, pois o visivox tinha sido de fato um espetáculo lindo. Ela esperou o pai colocar o carro a jato na garagem em desnível.

        -- Espere só até eu contar a Robbie, papai. Ele teria adorado o show. Principalmente quando Francis Fram, que estava se afastando tããão quietinho, acabou encostando em um dos Homens-Leopardo e teve que correr. Glória riu de novo. – Papai, existem de verdade Homens-Leopardo na Lua?

        -- É provável que não – disse Weston, distraído. – É só um faz-de-conta divertido. – Ele não demoraria muito mais tempo com o carro. Iria ter de encarar a situação.

        Glória correu pelo gramado. – Robbie! Robbie!

        Então ela parou de repente ao avistar um lindo collie que olhava para ela com sérios olhos castanhos enquanto abanava o rabo contra uma coluna da varanda.

        -- Ah, que cachorro lindo!

        Glória subiu os degraus, aproximou-se com cautela e o acariciou.

        -- É para mim, papai?

        A mãe tinha se juntado a eles.

        -- É sim, Glória. Não é lindo, macio e peludo? Ele é muito dócil e gosta de garotinhas.

        -- É claro. Ele sabe fazer inúmeros truques. Você gostaria de ver alguns deles?

        -- Agora mesmo. Quero que Robbie veja também. – Robbie! [...]

        -- Mamãe, Robbie não está no quarto. Onde ele está?

        Não houve resposta; George Weston tossiu e demonstrou, de repente, um interesse excessivo em uma nuvem que vagava a esmo.

        -- Onde está Robbie, mamãe? – perguntou Glória com voz trêmula, a ponto de chorar.

        A sra. Weston se sentou e puxou a filha delicadamente para perto de si.

        -- Não fique triste, Glória. Acho que Robbie foi embora.

        -- Foi embora? Para onde? Para onde ele foi embora, mamãe?

        -- Ninguém sabe, querida. Ele simplesmente foi embora. Procuramos, e procuramos, e procuramos por ele, mas não conseguimos encontra-lo.

        -- Quer dizer que ele nunca mais vai voltar? – Seus olhos estavam arregalados de terror.

        -- Pode ser que o encontremos logo. Continuaremos procurando por ele. E enquanto isso pode brincar com o seu novo cachorrinho lindo. Olhe para ele! O nome dele é Relâmpago e ele pode...

        Mas os olhos de Glória estavam marejados.

        -- Eu não quero esse cachorro nojento; quero Robbie. Quero que encontre Robbie pra mim.

        Seus sentimentos tornaram-se profundos demais para serem expressos por palavras e, balbuciando, ela soltou um gemido agudo. [...]

        -- Por que você está chorando, Glória? Robbie era só uma máquina, só uma máquina velha e asquerosa. Ele sequer estava vivo!

        -- Ele nem não era uma máquina! – gritou Glória de maneira furiosa e antigramatical. – Era uma pessoa como eu e você e era meu amigo.

       [...].

ASIMOV, Isaac (1920-1992). Eu, robô. Tradução: Aline Storto Pereira. São Paulo: Aleph, 2014. p. 20-33.

Fonte: Maxi: Séries Finais. Caderno 1. Língua Portuguesa – 7º ano. 1.ed. São Paulo: Somos Sistemas de Ensino, 2021. Ensino Fundamental 2. p. 72-75.

Entendendo o conto:

01 – Qual a relação entre Glória e Robbie?

      A relação entre Glória e Robbie é profunda e baseada em amizade. Robbie, um robô, é o melhor amigo de Glória, sendo uma figura presente e companheira em sua vida.

02 – Qual a reação dos pais de Glória em relação a Robbie?

      Inicialmente, os pais de Glória aprovam a presença de Robbie, mas com o tempo começam a se preocupar com a influência do robô na filha e com a opinião dos vizinhos.

03 – Por que os vizinhos se opõem à presença de Robbie?

      Os vizinhos se opõem à presença de Robbie por medo e preconceito. Eles veem o robô como uma ameaça e temem que ele possa causar algum mal.

04 – Qual o papel do medo na história?

      O medo é um elemento central na história, pois é ele que leva os pais de Glória a se separarem de Robbie. O medo do desconhecido, do diferente e da tecnologia gera uma reação de rejeição e exclusão.

05 – Qual a lição que a história nos ensina sobre a amizade?

      A história nos ensina que a amizade pode transcender as diferenças e que a lealdade e o companheirismo são valores importantes em qualquer relacionamento. A amizade entre Glória e Robbie mostra que a amizade pode existir entre humanos e máquinas.

06 – Como a história aborda o tema da tecnologia?

      A história aborda o tema da tecnologia de forma ambígua. Por um lado, Robbie é apresentado como um companheiro leal e inteligente, capaz de proporcionar alegria e conforto para Glória. Por outro lado, a história mostra como a tecnologia pode gerar medo e preconceito, e como ela pode ser utilizada para manipular as pessoas.

07 – Qual o papel da família na história?

      A família desempenha um papel fundamental na história, pois é através das relações familiares que os conflitos e as emoções são expressos. A decisão dos pais de Glória de se separar de Robbie gera um grande sofrimento para a menina e questiona os valores familiares.

08 – Como a história retrata a infância?

      A história retrata a infância de forma realista, mostrando as alegrias, os medos e as angústias de uma criança. A amizade entre Glória e Robbie é um reflexo da imaginação e da pureza da infância.

09 – Qual a importância da figura do robô na narrativa?

      O robô Robbie é uma figura central na narrativa, pois é através dele que são explorados temas como amizade, lealdade, medo e preconceito. Robbie representa a inocência e a pureza, em contraste com a complexidade e as contradições do mundo adulto.

10 – Qual a mensagem principal da história?

      A mensagem principal da história é que a amizade é um valor universal que transcende as diferenças e que o medo e o preconceito podem levar à perda de coisas importantes. A história também nos convida a refletir sobre a nossa relação com a tecnologia e a importância de valorizar os laços humanos.

 

sábado, 24 de setembro de 2022

CONTO: O MELHOR AMIGO DE UM GAROTO - ISAAC ASIMOV - COM GABARITO

 Conto: O Melhor Amigo de um Garoto

             Isaac Asimov      

        – Onde está Jimmy, querida? – perguntou o Sr. Anderson.

        – Lá fora, na cratera – disse a Sra. Anderson. – Ele está bem. Está junto com Robobo… Sabe se já chegou?

        – Chegou. Está na estação de foguetes, fazendo os testes. Na realidade, eu mesmo mal posso esperar para vê-lo. Não vi nenhum de verdade desde que deixei a Terra, quinze anos atrás. Os que passaram nos filmes não contam.

        – Jimmy nunca viu nenhum – disse a Sra. Anderson.

        – Porque ele nasceu na Lua e não pode ir à Terra. E é por isso que estou trazendo um para cá. Acho que é o primeiro a aparecer na Lua.

        – Custou bastante caro – disse a Sra. Anderson com um ligeiro suspiro.

        – Manter Robobo também não é barato – disse o Sr. Anderson.

        Jimmy estava lá fora, na cratera, como sua mãe tinha dito. Pelos padrões da Terra, ele era espigado, um tanto alto para os seus dez anos de idade. Seus braços e pernas eram compridos e ágeis. Parecia mais gordo e troncudo, vestido com o traje espacial, mas podia lidar com a gravidade lunar como nenhum ser humano, nascido na Terra, seria capaz. O pai não podia acompanhar-lhe os passos quando ele esticava as pernas e entrava no salto de Canguru.

        A face exterior da cratera inclinava-se para o sul, e a Terra, que surgia baixa no céu meridional (onde sempre surgia, quando vista da Cidade Lunar) estava quase cheia, de modo que todo o declive da cratera ficava brilhantemente iluminado.

        O declive era suave e mesmo o peso do traje espacial não impedia que Jimmy disparasse em cima dele num salto flutuante que fazia a gravidade parecer não existente.

        – Venha, Robobo – ele gritou.

        Robobo, que podia ouvi-lo pelo rádio, guinchou e pulou atrás.

        Jimmy, embora fosse ágil, não podia correr mais depressa que Robobo, que não precisava de um traje espacial e tinha quatro pernas e tendões de aço. Robobo navegava sobre a cabeça de Jimmy, dando saltos imensos e aterrando quase sob os pés do garoto.

        – Não precisa se exibir, Robobo – disse Jimmy – e não saia de vista.

        Robobo guinchou outra vez o guincho especial que significava “Sim”.

        – Eu não confio em você, seu enrolador – gritou Jimmy, subindo num último salto, que o conduziu sobre a curva da beira superior da parede da cratera, e o largou do outro lado, num declive interno.

        A Terra mergulhou abaixo do topo da parede da cratera e, de imediato, ficou escuro como breu em volta de Jimmy. Uma escuridão amistosa e quente, que dissipava a diferença entre solo e céu, exceto pelo brilho das estrelas.

        Na verdade, Jimmy não devia brincar no lado escuro da parede da cratera. Os adultos diziam que era perigoso, mas isso acontecia porque nunca estiveram ali. O chão era macio e ondulado, e Jimmy conhecia a localização exata de cada uma das poucas rochas.

        Além disso, como podia ser perigoso correr no escuro se Robobo estava bem ali a seu lado, pulando em volta, guinchando e cintilando? Mesmo sem cintilar, Robobo podia dizer onde estava, e onde Jimmy estava, pelo radar. Jimmy não podia se machucar enquanto Robobo estivesse por perto, detendo-o quando ele se aproximava demais de uma rocha, ou pulando sobre ele para mostrar o quanto o amava, ou circulando em volta e guinchando baixo e assustado quando Jimmy se escondia atrás de uma rocha, embora nessas ocasiões Robobo soubesse todo o tempo, e suficientemente bem, onde ele estava. Certa vez, Jimmy se esticou imóvel no chão e fingiu estar ferido. Robobo acionou o rádio alarme e o pessoal da Cidade Lunar chegou ali às pressas. O pai de Jimmy disse-lhe poucas e boas sobre aquele pequeno embuste, e Jimmy nunca mais o repetiu.

        Quando estava se lembrando disso, Jimmy ouviu a voz do pai no seu rádio individual de ondas longas.

        – Jimmy, volte. Tenho uma coisa para lhe contar.

        Jimmy tirou o traje espacial e se lavou. Você sempre precisa se lavar quando vem de fora. Mesmo Robobo tinha de ser borrifado, mas ele gostava disso. Ficava de gatinhas, o pequeno corpo, com menos de meio metro de comprimento, tremia e exibia uma minúscula cintilação. A cabecinha, sem boca, possuía dois grandes olhos vidrados e uma protuberância onde ficava o cérebro. Ele guinchou até ouvir a voz do Sr. Anderson:

        – Quieto, Robobo!

        O Sr. Anderson sorria.

        – Temos uma coisa para você, Jimmy. Ainda está na estação de foguetes, mas estará conosco amanhã, depois de todos os testes terminarem. Achei que tinha de lhe contar isso agora.

        – É da Terra, papai?

        – Um cachorro da Terra, filho. Um cachorro de verdade. Um cãozinho “terrier” escocês. O primeiro cachorro na Lua. Não precisará mais de Robobo. Não podemos ficar com os dois, você sabe. Ele ficará com algum outro menino ou menina.

        O Sr. Anderson pareceu esperar que Jimmy dissesse alguma coisa.

        – Você sabe o que é um cachorro, Jimmy. É a coisa real. Robobo não passa de uma imitação mecânica, um robô boboca. Ê isso que seu nome significa.

        Jimmy fez cara feia.

        – Robobo não é uma imitação, papai. É o meu cachorro.

        – Não um cachorro verdadeiro, Jimmy. Robobo é apenas aço, fiação e um simples cérebro positrônico. Não é um ser vivo.

        – Ele faz tudo que eu quero que ele faça, papai. Ele me compreende. Sem dúvida, é um ser vivo.

        – Não, filho. Robobo é só uma máquina. É apenas programado para se comportar do modo como se comporta. Um cachorro está vivo. Você não vai mais querer Robobo depois de ter o cachorro.

        – O cachorro precisará de um traje espacial, não é?

        – Sim, naturalmente. Mas será um dinheiro bem empregado e o cão se acostumará. E não precisará usá-lo na Cidade. Você vai ver a diferença quando ele estiver aqui.

        Jimmy olhou para Robobo, que estava guinchando outra vez, um guincho lento, muito baixo, parecendo amedrontado. Jimmy estendeu os braços e Robobo deu um salto para eles.

        – Qual será a diferença entre Robobo e o cachorro? – Jimmy perguntou.

        – É difícil explicar – disse o Sr. Anderson – mas será fácil de perceber. O cachorro realmente gostará de você. Robobo está apenas ajustado para agir como se gostasse de você.

        – Mas, papai, não sabemos o que há dentro de um cachorro ou quais são as suas sensações. Talvez seja também apenas um modo de agir.

        O Sr. Anderson franziu a testa.

        – Jimmy, você saberá a diferença quando experimentar o amor de uma coisa viva.

        Jimmy segurou Robobo com força. Também estava franzindo a testa e o olhar desesperado em seu rosto significava que não estava disposto a mudar de ideia.

        – Mas qual é a diferença no modo como eles agem? E quanto ao modo como eu sinto? Eu gosto de Robobo e isso é o que importa.

        E o pequeno robô-boboca, que nunca fora abraçado com tanta força em toda a sua vida, guinchou rápidos e altos guinchos… guinchos felizes.

Asimov, Isaac. O melhor amigo de um garoto. In: Os melhores contos de Isaac Asimov. São Paulo: Editora LeBooks, 2018. (Coleção Os Melhores Contos).

Fonte: Estações e Linguagens – Rotas da Ciência e Tecnologia – Ensino Médio – Editora Ática – 1ª edição, São Paulo, 2020. p. 93-7.

Entendendo o conto:

01 – Você tem animal de estimação? Qual? Ele vive dentro de casa? Como se chama?

      Resposta pessoal do aluno.

02 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Guinchou: produziu um som agudo.

·        Positrônico: que é formado artificialmente por uma partícula chamada pósitron, nome dado ao elétron positivo.

03 – Em relação a aspectos da construção do conto, responda no caderno.

a)   Qual é o enredo da história?

A história trata da relação de Jimmy com seu cachorro-robô e do momento em que sua família decide dar um cachorro de verdade para ele. Quando avisam que o cão chegou à Lua e que Jimmy terá de se desfazer do cachorro-robô, o menino não gosta da ideia, sugerindo que prefere continuar com o robô de estimação.

b)   Quais são as personagens da trama?

As personagens são o Sr. Anderson; a Sra. Anderson; Jimmy, o filho do casal; e Robobo, o cachorro-robô de estimação de Jimmy.

c)   Os nomes que as personagens recebem contribuem para a caracterização delas no conto? Explique.

Sim. Sr. e Sra. Anderson são nomes que caracterizam um típico casal estadunidense; Jimmy, que é diminutivo de Jim, caracteriza uma criança; e o nome Robobo caracteriza o robô que imita um cachorro, que “não passa de uma imitação mecânica, um robô boboca”.

d)   Quando e onde se passa a história?

A história se passa na Lua, quinze anos depois de o Sr. Anderson ter chegado lá. Outra marca temporal que pode ser mencionada é o fato de que Jimmy tem dez anos de idade.

e)   O narrador é uma das personagens? Ele sabe o que as personagens pensam e sentem? Cite trechos do conto para comprovar qual é o foco narrativo do conto.

O narrador não é uma personagem, mas é onisciente, ou seja, sabe o que as personagens pensam e sentem. Isso pode ser observado no trecho: “Quando estava se lembrando disso, Jimmy ouviu a voz do pai no seu rádio individual de ondas longas”. O narrador sabe de que Jimmy estava se lembrando, o que significa que sabe o que ele estava pensando.

f)    O texto se inicia com o diálogo entre o Sr. e a Sra. Anderson, o que cria certo suspense no conto. Que estratégia é usada pelo narrador para construir esse efeito de sentido?

O conto tem início com um diálogo entre o Sr. e Sra. Anderson, em que eles usam frases com sujeito elíptico “[...] Sabe se já chegou?”; “— Chegou. Está na estação de foguetes, fazendo os testes”; “— Custou bastante caro [...]”. Além disso, fazem referências ao assunto por meio de pronomes sem antecedentes expressos anteriormente, usam artigo não acompanhado do substantivo que determina, e usam o pronome indefinido nenhum em função adjetiva sem apresentar o substantivo a que se refere. Por meio dessas estratégias, o narrador cria uma atmosfera de suspense e prende a atenção do leitor até o clímax da história, quando o Sr. Anderson conta para Jimmy que chegou um cachorro da Terra para ele. O objetivo é explorar a identificação de elementos linguísticos que contribuem para a criação do suspense no diálogo entre o Sr. e Sra. Anderson em torno do cachorro que veio da Terra.

04 – Você já tinha lido algum outro conto do escritor Isaac Asimov? A leitura desse texto fez com que você se interessasse por conhecer mais obras dele? Por quê? Comente com os colegas.

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Esta atividade é uma oportunidade para que os estudantes compartilhem gostos e interesses, identificando eventuais afinidades, respeitando e valorizando diferentes pontos de vista.

05 – Leia novamente estes trechos do conto e responda às questões no caderno.

Trecho I – Você sabe o que é um cachorro, Jimmy. É a coisa real. Robobo não passa de uma imitação mecânica, um robô boboca. É isso que seu nome significa.

Trecho II – Os adultos diziam que era perigoso, mas isso acontecia porque nunca estiveram ali.

Trecho III – Além disso, como podia ser perigoso correr no escuro se Robobo estava bem ali a seu lado, pulando em volta, guinchando e cintilando?

a)   O trecho I caracteriza o uso do discurso direto. De quem é a fala nesse trecho? Que efeito pode gerar esse uso do discurso direto?

O discurso direto acontece quando o narrador reproduz fielmente a fala da personagem. A fala é do Sr. Anderson.

b)   Nos trechos II e III, observa-se o uso do discurso indireto livre, trazendo o ponto de vista de uma personagem. De qual personagem é esse ponto de vista? Que efeito o uso do discurso indireto constrói nesse trecho?

Nos dois trechos, em que se usa o discurso indireto livre, personagem e narrador se confundem, não ficando claro de quem é o posicionamento. Os pontos de vista são de Jimmy. Ainda que o narrador não seja Jimmy, o uso do discurso indireto livre sinaliza o ponto de vista de Jimmy como sendo o ponto de vista narrativo. Essa é uma maneira de o narrador levar o leitor a pensar que o ponto de vista de Jimmy corresponde à verdade.

06 – Que acontecimento muda os rumos da história? O desequilíbrio instaurado nesse momento é solucionado ao final?

      A história muda de rumo quando o Sr. Anderson fala para o filho que ele vai ganhar um cachorro da Terra e que terá de doar Robobo a outra criança. Jimmy não fica feliz com o fato de ter de trocar Robobo por um cachorro terráqueo. O conto não deixa clara a solução do desequilíbrio. Quando Jimmy declara que gosta de Robobo e isso é o que importa, demonstra que não mudou de opinião.

07 – Quais são as características dessa história que a definem como um conto de ficção científica?

      A história transcorre em uma época em que os seres humanos não vivem mais na Terra, mas na Lua, e lá existe uma estação de foguetes; os animais de estimação são robôs que guincham em vez de latir; a presença de um cachorro vindo da Terra causa estranhamento.

08 – Releia este trecho do conto e discuta a questão com os colegas.

        “– Qual será a diferença entre Robobo e o cachorro? – Jimmy perguntou.

        – É difícil explicar – disse o Sr. Anderson – mas será fácil de perceber. O cachorro realmente gostará de você. Robobo está apenas ajustado para agir como se gostasse de você.

        – Mas, papai, não sabemos o que há dentro de um cachorro ou quais são as suas sensações. Talvez seja também apenas um modo de agir.”

·        Qual é o contraste que existe entre o pensamento do pai e o do menino sobre os “modos de agir” do Robobo e do cachorro terráqueo?

      Para o pai, o modo de agir de Robobo é apenas resultado de treinamento e programação: o robô não expressa sentimentos reais. Já os cães terráqueos, que são seres vivos e não máquinas, expressariam sentimentos verdadeiros. Para Jimmy, não haveria como garantir que os cães terráqueos agem movidos por sentimentos verdadeiros, já que não se sabe o que se passa dentro de um cachorro.

09 – Você acha que a situação apresentada no conto pode se tornar realidade um dia? Compartilhe com os colegas a sua opinião.

      Resposta pessoal do aluno.

 

 

 

quinta-feira, 14 de abril de 2022

CONTO: OS CARROS AUTOMÁTICOS - ISAAC ASIMOV - COM GABARITO

 CONTO: Os carros automáticos

           Isaac Asimov

        Sentamos no banco embaixo do velho carvalho. Dali dava para avistar toda a extensão do pequeno lago e a rodovia particular que tínhamos do lado oposto. Era um dia quente, os carros estavam do lado de fora, distraindo-se – uns trinta deles, pelo menos. Mesmo a distância eu podia ver que Jeremiah estava entregue à sua brincadeira de costume, acompanhando em marcha lenta um dos modelos mais sérios, mais antigos, e de repente arrancando em plena potência, cantando pneus e o ultrapassando com estridência em questão de segundos. Há duas semanas ele tinha assustado o velho Angus, fazendo-o perder a direção e sair do asfalto; aí tive que desligar seu motor por dois dias.

        Pelo que vejo agora, não adiantou muito; parece que não há nada a fazer. Jeremiah é um desses modelos esportivos, eles são assim mesmo, dão o maior trabalho.

        -- Muito bem, Sr. Gellhorn – falei. – Quais são as informações que deseja?

        Mas o cara estava distraído, olhando em redor.

        -- Que lugar fantástico, Sr. Folkers.

        -- Pode me chamar de Jake. Todo mundo chama.

        -- Ok, Jake. Quantos carros você tem aqui?

        -- Cinquenta e um. Todo ano chegam mais um ou dois. Houve um ano em que vieram cinco. Até agora não perdemos nenhum. Estão todos funcionando perfeitamente. Temos até mesmo um Mat-O-Mot de 2015 em perfeito funcionamento. Um dos primeiros automáticos. Foi o primeiro carro que trouxemos para cá.

        O velho Matthew. Agora ele costumava ficar na garagem a maior parte do dia, afinal de contas ele era o avô de todos os carros positrônicos. Da época em que os carros automáticos eram utilizados apenas por veteranos de guerra, paraplégicos e chefe de Estado. Mas naquela época Samson Harridge era meu patrão, ele era rico o bastante para ter um carro automático. Eu era seu chofer.

        Pensar naquilo fez com que me sentisse velho. Sou do tempo em que não existia um único automóvel no mundo capaz de encontrar sozinho o caminho de casa. Já dirigi umas coisas enormes e desajeitadas cujo motorista não podia tirar as mãos do volante por um só momento. Monstrengos desse tipo matavam dezenas de milhares de pessoas todo ano.

        Os automáticos resolveram esse problema. Um cérebro positrônico pode reagir muito mais rápido do que um cérebro humano, claro, e as pessoas não tinham que manter as mãos nos controles o tempo inteiro. Sentavam ao volante, digitavam as instruções sobre o trajeto e o carro fazia o resto sozinho.

        Hoje em dia todo mundo já está acostumado, mas eu me lembro de quando surgiram as primeiras leis retirando das autoestradas os carros velhos e só autorizando viagens em carros automáticos. Deus do céu, que balbúrdia. Disseram que isso era fascismo, que era comunismo, mas o fato é que as estradas ficaram muito mais tranquilas e as mortes por acidentes pararam como por encanto; um número muito maior de pessoas passou a viajar com muito mais segurança.

        Claro que os automáticos eram de dez a cem vezes mais caros do que os carros manuais, e não havia muita gente que pudesse pagar esse preço. A indústria começou a derivar para a produção de ônibus automáticos. A qualquer momento você podia chamar uma empresa e em poucos minutos ter um desses ônibus à sua porta, indo na direção que você queria. Você tinha que viajar ao lado de outras pessoas que iam para o mesmo lado, mas qual era o problema?

        Samson Harridge, no entanto, tinha um automóvel particular, e eu fui contra ele desde o instante em que o vi. Naquele tempo, eu não via o tal carro como “Matthew”, não podia imaginar que ele se tornaria no futuro o decano de nossa Fazenda. A única coisa que eu sabia era que aquele carro ia me jogar no desemprego, por isto o odiei.

        Falei:

        -- Bem, acho que não vai mais precisar de mim, Sr. Harridge.

        -- Ora, Jake, que bobagem está me dizendo? – foi a resposta dele. – Você não está pensando que vou deixar essa geringonça tomar conta de mim, não é mesmo? Você é quem vai ficar ao volante.

        Eu falei:

        -- Mas esse carro funciona sozinho, Sr. Harridge. Ele capta e analisa a imagem da estrada, evita os obstáculos, sejam eles carros ou pedestres, e arquiva os trajetos na memória.

        -- Sim, é o que dizem. Mesmo assim, prefiro que você esteja sentado ao volante, no caso de alguma coisa não correr bem.

        É engraçado como a gente pode chegar a se afeiçoar a um carro. De um dia para o outro eu já o tinha batizado de Matthew e passava a maior parte do tempo dando polimento nele, checando o motor. Um cérebro positrônico funciona melhor quando está em contato permanente com o seu “corpo”, ou seja, o chassi, de modo que ajuda bastante se a gente mantiver o tanque cheio para que o motor possa ficar ligado dia e noite. Depois de algum tempo acostumei-me tanto àquilo que bastava ouvir o som do motor para saber como Matthew estava se sentindo.

        O Sr. Harridge também gostava muito de Matthew, ao seu modo. Ele não tinha ninguém mais para gostar. Tinha ficado sem três esposas, através da viuvez ou do divórcio; e acabou vivendo mais tempo do que cinco filhos e três netos. Desse modo, quando morreu não foi surpresa para ninguém que ele fizesse converter suas propriedades numa Fazenda para Automóveis Aposentados, onde eu era o curador e Matthew o primeiro membro de uma família que viria a se tornar ilustre.

        Minha vida passou a ser apenas isso. Nunca me casei. Você não pode ser casado e ao mesmo tempo se dedicar a carros automáticos de uma maneira adequada.

Sonhos de Robô. São Paulo, Record, 1991. p. 151-153.

Fonte: Português – Linguagem & Participação, 6ª Série – MESQUITA, Roberto Melo/Martos, Cloder Rivas – Ed. Saraiva, 1ª edição – 1998, p. 231-4.

Entendendo o texto:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Carvalho: tipo de árvore.

·        Extensão: tamanho.

·        Estridência: barulho em tom alto.

·        Positrônico: referente ao pósitron antipartícula do elétron (parte do átomo).

·        Paraplégicos: pessoas com problemas de locomoção, com paralisia de certos membros.

·        Balbúrdia: confusão.

·        Fascismo: sistema político muito autoritário.

·        Comunista: pensamento político que proíbe a propriedade particular dos meios de produção.

·        Decano: o mais velho.

·        Geringonça: máquina estranha, engenhoca.

·        Converter: transformar.

·        Curador: aquele que cuida de uma instituição cultural.

·        Adequada:  certa, correta.

02 – Onde acontecem os fatos apresentados no texto?

      Os fatos acontecem em um museu de automóveis automáticos.

03 – Quando acontecem esses fatos?

      Esses fatos acontecem num futuro distante, em algum ponto do século XXI.

04 – Quem são Jeremiah e Matthew?

      São carros automáticos: Jeremiah é um carro esportivo, brincalhão e “sem juízo”; Matthew é o mais velho dos carros automáticos, o primeiro que foi trazido pelo milionário.

05 – Quem é o narrador? O que sabemos dele?

      O narrador é Jake Folkers, motorista do falecido milionário Samson Harridge. Jake é solteiro e cuida do museu dos carros automáticos.

06 – Como são os carros automáticos? Que habilidades eles têm?

      Os carros automáticos dirigem a si mesmos. Chegam a ter vida própria: captam e analisam a imagem da estrada, evitam obstáculos e arquivam os trajetos na memória.

07 – Qual é a grande vantagem dos automóveis automáticos sobre os atuais?

      A vantagem é a segurança. Os automóveis automáticos praticamente não sofrem acidentes, evitando automaticamente carros e pedestres.

08 – Como se sentia o senhor Harridge quanto aos carros automáticos?

      Devia gostar muito deles porque destinou sua fortuna para um museu de carros automáticos.

09 – E Jake Folkers, como se sentia com relação aos carros automáticos?

      Igualmente, devia gostar deles, pois nem se casou para dedicar-se ao museu de carros automáticos “de maneira adequada”.

10 – O texto se passa no século XXI. As personagens se comportam de modo diferente dos seres humanos?

      A pergunta é especulativa. As personagens se comportam como os seres humanos atuais. A diferença reside no comportamento das máquinas.

11 – Você gostaria de possuir um carro automático? Por quê?

      Resposta pessoal do aluno.