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quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

DIÁRIO FICCIONAL: O QUE LELÊ VAI SER QUANDO CRESCER? JOSÉ ROBERTO TORERO - COM GABARITO

 Diário ficcional: O QUE LELÊ VAI SER QUANDO CRESCER?

                         José Roberto Torero

        Ontem foi o maior chato.

        É que eu tive que ir numa festa de adulto porque a minha mãe não tinha com quem me deixar. E festa de adulto é o maior chato.


        É chato porque não tem outras crianças para brincar, porque a tevê fica desligada, porque não tem vídeo game e porque não tem cachorro-quente nem sorvete, só uns pãezinhos pequeninhos com umas gosmas em cima.

        Mas o

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhDgGbUr-ptTMlG3rjZg3lFo5bEOlp4-Lm3aGlFS31Wl0boZwxtf8aFAmTF5IKkp1yH1eFXk-QW3eOmGq9u00SCZubd3YtXcDy4gnQqFqp2CB8Wiwkgc2zkiiwbG9NKCkdx0pzjYu6NDZqp81qVvdyF7AwosJx8TZIozbmAAU8xPJqEPFHs7WZTYlaDCog/s320/FESTA.jpg

pior é que em festa de adulto eles falam com a gente como se a gente fosse meio abobado.

        Tipo assim, quando eu perguntei onde era o banheiro, a dona da casa respondeu:

        -- “O banheiro é ali. Você já vai sozinho?”.

        Depois, um cara com cara de velho, mas cabelo bem preto me perguntou:

        -- “Quantos anos você tem? Seis ou sete?”

        E uma mulher com unha comprida falou:

        -- “Sabe que você está a cara da sua mãe?”

        Deu vontade de responder: “A cara da minha mãe?! Então eu vou fazer plástica porque eu sou menino e ela é mulher!”.

        Para o homem de cabelo preto eu ia dizer: “Eu tenho quase nove, mas um dia vou ter cento e vinte que nem você!”.

        E para a dona da casa eu ia falar: “Não, não sei ir ao banheiro sozinho. Eu uso fralda!”

        Pô, adulto não sabe conversar direito!

        Mas o pior mesmo é que todo mundo quer saber o que você vai ser quando crescer.

        Parece que é só o que eles sabem falar: “O que você vai ser quando crescer?”, “O que você vai ser quando crescer?”, “O que você vai blá-blá-blá…”

        Teve um casal que chegou perto de mim e aí ela falou assim:

        -- “O que você vai ser quando crescer, Leocádio? Acho que você vai ser médico. Aposto que você vai ficar superbem de branco.”

        E aí o marido dela disse:

        -- “Que nada! Ele vai ser é jogador de futebol.”

        -- Médico!

        -- Jogador de futebol!

        -- Médico!

        -- Jogador de futebol!

        -- Médico!

        -- Jogador de futebol!

        E aí eles começaram a brigar e eu saí dali porque eu sei que não vou ser nenhuma dessas coisas porque eu sou grosso no futebol e, quando eu uso roupa branca, eu sempre fico o maior sujo.

        Bom, eu ainda não sei o que eu quero ser quando crescer, mas eu já pensei em um monte de coisas:

·        eu podia ser palhaço porque é legal fazer os outros darem risada;

·        podia ser astronauta porque fazer viagens espaciais é bacana;

·        podia ser escritor que nem o meu tio porque ele trabalha em casa e sempre dá uma paradinha para jogar Playstation;

·        e podia ser motorista de táxi porque eles passeiam o dia todo e ainda ganham dinheiro para isso (sem falar que eles devem ser o maior inteligente porque sempre sabem a solução para tudo).

        Depois eu fiquei pensando que, quando os adultos perguntam o que você vai ser quando crescer, eles querem saber é “em que você vai trabalhar quando crescer.” Mas isso é esquisito porque a gente não é um trabalho.

        Os adultos não querem saber se eu vou querer morar numa praia ou num morro, se eu vou querer ter um monte de filho ou nenhum, se eu vou ser engraçado ou sério, se eu vou querer ler muitos livros ou ver muita tevê, se eu vou ser alegre ou triste, se eu vou ser alto ou baixinho. Eles só querem saber no que eu vou trabalhar.

        Então eles tinham que perguntar: “No que você vai trabalhar?”, e não “O que você vai ser?”.

        Da próxima vez que um adulto me perguntar o que que eu quero ser quando crescer, eu não vou responder uma profissão porque eu não quero ser um trabalho, eu quero ser outras coisas também.

        Quando eu crescer eu quero ser sabido (que nem motorista de táxi), quero saber fazer piada (que nem palhaço), viajar muito que nem astronauta (pode ser aqui na Terra mesmo), e jogar Playstation que nem o meu tio (que nem ele, não, melhor, porque ele é meio ruim).

        E também quero ser altão, alegre, morar na praia, ler livro e ver tevê ao mesmo tempo.

        Ah, e eu quero ser legal. Mesmo que eu não seja palhaço, astronauta, escritor ou motorista de táxi.

JOSÉ ROBERTO TORERO. As primeiras histórias de Lelê. São Paulo: Panda Books, 2007. P.12-14. (Adaptado).

Fonte: Coleção Desafio Língua Portuguesa – 5° ano – Anos Iniciais do Ensino Fundamental – Roberta Vaiano – 1ª edição – São Paulo, 2021 – Moderna – p. MP108-MP113.

Entendendo o diário ficcional:

01 – Leia, em voz alta, o texto de José Roberto Torero. Depois, releia em voz alta o trecho a seguir desse mesmo texto.

        “É chato porque não tem outras crianças para brincar, porque a tevê fica desligada, porque não tem vídeo game e porque não tem cachorro-quente nem sorvete, só uns pãezinhos pequeninhos com umas gosmas em cima.”

a)   A palavra porque, nesse trecho, reforça os motivos pelos quais a personagem acha a festa chata. Reescreva esse trecho usando a palavra porque uma única vez.

É chato porque não tem outras crianças para brincar, a tevê fica desligada, não tem vídeo game e não tem cachorro-quente nem sorvete, só uns pãezinhos pequeninhos com umas gosmas em cima.

b)   Leia, em voz alta, as palavras retiradas do trecho:

Porque – brincar – fica – cachorro-quente – pequeninos.

·        O que você observa ao pronunciar as letras c ou qu nessas palavras?

          Resposta pessoal do aluno.

c)   Agora complete outras palavras com c ou qu.

·        Quadro.

·        Mosquito.

·        Quatro.

·        Casaco.

·        Queijo.

·        Xerocar.

·        Turístico.

·        Aquático.

02 – Leia três vezes as palavras do quadro abaixo o mais rapidamente que puder.

Crescer – amadurecer – florescer – fortalecer – nascer – engrandecer – decrescer – enfraquecer – falecer – perecer – esmorecer – esmaecer.

a)   Algumas dessas palavras do quadro podem ser o antônimo uma da outra. Identifique-as e escreva-as. Em seguida, leia cada palavra e seu(s) antônimo(s) duas vezes.

Crescer: decrescer; fortalecer: enfraquecer/esmorecer; nascer: falecer/perecer.

b)   Copie no caderno as palavras do quadro, separando-as em duas colunas: palavras escritas com c e palavras escritas com sc (todas com som de s). Depois, complete as colunas com outras palavras escritas da mesma forma.

Palavras com c: amadurecer, enfraquecer, falecer, perecer, esmorecer, engrandecer, esmaecer.

Palavras com sc: crescer, decrescer, florescer, nascer.

Outras palavras: resposta pessoal do aluno.

03 – A história contada por Lelê parece ser um desabafo.

a)   Por que Lelê está desabafando?

Ele está indignado pois teve de ir a uma festa de adultos.

b)   Qual o adjetivo ele utiliza para caracterizar o tipo de festa em que estava?

Chato.

c)   No terceiro e no quarto parágrafo, Lelê enumera cinco razões que justificam seu desabafo. Qual dessas razões tem maior grau de importância para ele? Justifique com uma expressão do texto.

Os adultos falam com as crianças como se elas fossem meio abobadas. O narrador usou a expressão “o pior é” ao apresentar essa razão.

04 – Você concorda com todos os argumentos usados pelo narrador para justificar sua indignação? Acrescentaria outros? Comente.

      Resposta pessoal do aluno.

05 – Leia estas frases e compare-as.

        “Mas o pior mesmo é que todo mundo quer saber o que você vai ser quando crescer”.

        “Mas o pior é que todo mundo quer saber o que você vai ser quando crescer.

·        A palavra mesmo provoca diferença de sentido entre os trechos? Por quê?

Sim. Ela modifica o sentido da expressão “o pior é que”, acrescentando ao fato um grau de importância mais elevado.

06 – Releia:

        “O que você vai ser quando crescer, Leocádio? Acho que você vai ser médico. Aposto que você vai ficar superbem de branco.”

a)   Por que a mulher achava que Lelê seria médico?

Porque, segundo ela, ele ficaria bem vestindo roupa branca.

b)   Na sua opinião, essa justificativa foi satisfatória? Explique.

Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Não, uma vez que a boa aparência do garoto usando roupa branca não significa que ele será um bom profissional.

07 – Para Lelê, a pergunta “O que você vai ser quando crescer?” deveria ser outra.

a)   Qual seria a pergunta mais adequada na opinião do menino?

“Em que você vai trabalhar quando crescer?”.

b)   Por que ele propôs essa substituição?

Porque, na opinião dele, quando os adultos fazem essa pergunta, estão interessados apenas em saber em que a criança vai trabalhar quando crescer

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

DIÁRIO: QUARTO DE DESPEJO: DIÁRIO DE UMA FAVELADA - (FRAGMENTO) - CAROLINA MARIA DE JESUS - COM GABARITO

 Diário: Quarto de despejo: diário de uma favelada(Fragmento)

           Carolina Maria de Jesus

        13 DE MAIO Hoje amanheceu chovendo. E um dia simpático para mim. E o dia da Abolição. Dia que comemoramos a libertação dos escravos.

        ...Nas prisões os negros eram os bodes expiatórios. Mas os brancos agora são mais cultos. E não nos trata com despreso. Que Deus ilumine os brancos para que os pretos sejam feliz.

        Continua chovendo. E eu tenho só feijão e sal. A chuva está forte. Mesmo assim, mandei os meninos para a escola. Estou escrevendo até passar a chuva, para eu ir lá no senhor Manuel vender os ferros. Com o dinheiro dos ferros vou comprar arroz e linguiça. A chuva passou um pouco. Vou sair.

        ...Eu tenho tanto dó dos meus filhos. Quando eles vê as coisas de comer eles brada:

        — Viva a mamãe!

        A manifestação agrada-me. Mas eu já perdi o habito de sorrir. Dez minutos depois eles querem mais comida. Eu mandei o João pedir um pouquinho de gordura a Dona Ida. Ela não tinha. Mandei-lhe um bilhete assim:

        — "Dona Ida peço-te se pode me arranjar um pouco de gordura, para eu fazer uma sopa para os meninos. Hoje choveu e eu não pude ir catar papel. Agradeço. Carolina."

        ... Choveu, esfriou. E o inverno que chega. E no inverno a gente come mais. A Vera começou pedir comida. E eu não tinha. Era a reprise do espetáculo. Eu estava com dois cruzeiros. Pretendia comprar um pouco de farinha para fazer um virado. Fui pedir um pouco de banha a Dona Alice. Ela deu-me a banha e arroz. Era 9 horas da noite quando comemos.

        E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava contra a escravatura atual — a fome!

        15 DE MAIO Tem noite que eles improvisam uma batucada e não deixa ninguém dormir. Os visinhos de alvenaria já tentaram com abaixo assinado retirar os favelados. Mas não conseguiram. Os visinhos das casas de tijolos diz:

        — Os políticos protegem os favelados.

        Quem nos protege é o povo e os Vicentinos. Os políticos só aparecem aqui nas épocas eleitoraes. O senhor Cantidio Sampaio quando era vereador em 1953 passava os domingos aqui na favela. Ele era tão agradavel. Tomava nosso café, bebia nas nossas xícaras. Ele nos dirigia as suas frases de viludo. Brincava com nossas crianças. Deixou boas impressões por aqui e quando candidatou-se a deputado venceu. Mas na Camara dos Deputados não criou um progeto para beneficiar o favelado. Não nos visitou mais.

        ...Eu classifico São Paulo assim: O Palacio, é a sala de visita. A Prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o quintal onde jogam os lixos.

            JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: diário de uma favelada. São Paulo: Ática, 2007. p. 27-28.

Fonte: Práticas de Língua Portuguesa – Ensino Médio – Volume Único – Faraco – Moura – Maruxo – 1ª ed., São Paulo, 2020. Ed. Saraiva. p. 80-1.

Entendendo o Diário:

01 – Que termos a escritora usa para indicar:

a)   O espaço físico onde vivia.

“Os visinhos das casas de tijolos diz: – Os políticos protegem os favelados”; “O senhor Cantidio Sampaio quando era vereador em 1963 passava os domingos aqui na favela”; “Eu classifico São Paulo assim: O Palácio é a sala de visita. A Prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o quintal onde jogam os lixos”.

b)   O contexto histórico em que ocorreram os fatos relatados.

“O senhor Cantidio Sampaio quando era vereador em 1953...”; “Eu estava com dois cruzeiros”.

02 – Que trechos do texto não apenas relatam os acontecimentos, mas expressam uma reflexão de Carolina Maria de Jesus?

      “É um dia simpático para mim. É o dia da Abolição”; “Mas o brancos são mais cultos”; “E no inverno a gente come mais”; “E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava contra a escravidão atual – a fome!”; “Que Deus ilumine os brancos para que os pretos seja feliz”.

03 – A fome percorre o diário todo, como se esta fosse uma personagem. No trecho lido, como ela aparece?

      Aparece no relato, quando a escritora pede alimentos emprestados e na reflexão dela a respeito da fome.

04 – O título da obra parece ser mais do que uma síntese da favela. Que sentido(s) você consegue perceber nele?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Aceite as respostas que lhe pareçam bem argumentadas.

 

domingo, 31 de outubro de 2021

DIÁRIO ESCONDIDO DE SERAFINA (FRAGMENTO)- CRISTINA PORTO - COM GABARITO

 DIÁRIO ESCONDIDO DE SERAFINA(FRAGMENTO)

                 Cristina Porto


Querido esconderijo,
Eu ainda não contei nada sobre as aulas, a escola, a professora nova, chamada Catarina (que faz aniversário no dia do professor, eu perguntei), os colegas...
Quanto a eles, os colegas, só chegou um novo, de outra escola. É outro Chiquinho, que já teve caxumba, pois eu não aguentei e perguntei. Por que fiz isso? Ora, porque me lembrei daquele Chiquinho, que também estudava na minha classe, que teve caxumba, ficou uma semana sem aparecer e só então me fez descobrir o quanto eu gostava dele!
Pois é. Parece que os Franciscos estão sempre atravessando o meu caminho. Mas esse Chiquinho novo é muito mais gato que o antigo! Sabe o que mais me impressionou nele? O olhar! Que olhos, diário! Que olhos!
Com aqueles cílios longos e tão viradinhos! Ah, e o sorriso, então? Que sorriso, que dentes branquinhos ele tem! Não tem nenhum dente remontado no outro!
Será que eu vou ficar gostando desse Chiquinho também esconderijo? Será?
Bom, agora é melhor voltar para casa, porque já faz muito tempo que estou aqui, escondida, com o diário no colo e o Chiquinho novo na cabeça. Tchau.


PENSANDO SOBRE O TEXTO

01. Observe a saudação inicial do texto e releia o trecho abaixo:

“Será que eu vou ficar gostando desse Chiquinho também esconderijo? Será?”

a) A Serafina se refere algumas vezes ao “esconderijo”. Explique como seria para você esse esconderijo?

    Resposta pessoal.

b) Qual a relação entre o esconderijo e o diário? O que um tem haver com o outro? Explique:

Eles são um só. É o nome que ela deu ao seu Diário.

02.Em que época do ano escolar Serafina anotou isso em seu diário? Explique sua resposta:

É o início do ano letivo. Primeiro dia de aula.

03. Aprendemos que um diário como qualquer tipo de texto precisa de uma organização da escrita em sequência. E que essa organização pode ser cronológica, pode ser por importância de assunto ou aleatório.

a) Como foi organizado o diário de Serafina? Explique:

     Aleatório, pois falou de vários assuntos.

04. Retire do texto um trecho que comprove o uso da primeira pessoa (eu) no registro.

      “Eu ainda não contei nada sobre as aulas...”

05. Sabemos que o uso da pontuação é muito importante em qualquer tipo de texto, e que ela pode ser muito expressiva.
a) Em que momento do texto a autora conseguiu passar para você, uma emoção a mais? Observe a pontuação!

    Quando ela usa interjeição.

  b) Justifique a sua escolha:

      Ela usou a interjeição quando estava suspirando pelo novo Chiquinho, admirando o olhar, os olhos.

06. A forma como Serafina se expressa em seu diário revela que sentimentos? Marque com um X as respostas corretas:

(  ) Raiva
( x ) alegria (  ) amor (  ) fé

(  ) confiança (  ) impaciência
( x ) curiosidade

07.  Releia a frase:
“Parece que os Franciscos estão sempre atravessando o meu caminho.”
a) Explique com suas palavras o que Serafina quis dizer com essa frase.

Resposta pessoal.

8- Durante a nossa vida utilizamos em diversos momentos a linguagem formal e a linguagem informal, observando sempre a ocasião e o objetivo que pretendemos.

a) Nesse texto que você leu que tipo de linguagem foi usada e por quê?

Linguagem informal, coloquial. Porque é uma conversa entre amigos.

9- Nas frases abaixo pinte de acordo com a legenda:

Vermelho – para os verbos.
Azul – para os substantivos.
Amarelo – para os adjetivos.

a) “...pois eu não aguentei e perguntei.”

b) “Ora, porque me lembrei daquele Chiquinho...”

c) “Com aqueles cílios longos e tão viradinhos!”

 

quarta-feira, 19 de maio de 2021

DIÁRIO: MINHA VIDA DE MENINA - HELENA MORLEY - COM GABARITO

 DIÁRIO: MINHA VIDA DE MENINA


1893

Domingo, 26 de novembro

Será que quando eu me casar vou gostar tanto de meu marido como mamãe de meu pai? Deus o permita. Mamãe só vive para ele e não pensa noutra coisa. Quando ele está em casa, os dois passam juntinhos o dia inteiro numa conversa sem fim. Quando meu pai está na Boa Vista, que é a semana toda, mamãe leva cantando umas cantigas muito ternas que a gente vê que são saudades e só arranjando-lhe as roupas, juntando ovos e engordando os frangos para os jantares de sábado e domingo. São dias de se passar bem em casa.

Segunda-feira tio Joãozinho levou meu pai para verem um serviço no Biribiri e voltarem no fim da semana. Terça-feira cedo, quando chegamos à janela, estava na porta a besta nossa conhecida, esperando a ração.

 Admirei a energia de mamãe. Ela foi logo dizendo: "Preparem-se para seguirmos amanhã de madrugada. Aconteceu alguma coisa a Alexandre". E com os olhos cheios de lágrimas mandou Cesarina matar dois frangos para a matalotagem.

De tarde pôs na maleta um vestido para cada uma de nós, uma roupa para meus irmãos e mandou chamar José Pedro para carregar a mala. O cesto da matalotagem Renato levava. Deitamos cedo, com a roupa ao lado, para nos levantar de madrugada, vestir e sairmos. Mamãe não se deitou dizendo que não podia dormir e passaria rezando. Nós não tínhamos ainda tirado um bom sono quando mamãe nos acordou: "Levantem que o galo já cantou duas vezes. Devem ser quatro horas. É bom que o dia clareie conosco para lá da Pedra Grande". Levantamos, tomamos o café e saímos, mamãe, meus irmãos e os dois crioulinhos, Cesarina e José Pedro.

Quando chegamos à rua achei o céu muito estrelado e a noite muito escura para quatro horas. Fomos andando, e nada do dia clarear. Quando já estávamos muito longe ouvimos o relógio da igreja do Seminário bater duas horas. Aí caímos todos no riso mas mamãe, a única responsável, não achou graça. Ela dizia: "O pior não é a hora. Até é bom viajar com a noite. Mas é que estou achando o caminho diferente. A estrada do Biribiri é bem mais larga". Fomos andando até não sabermos mais onde estávamos. Aí mamãe disse: "Esse caminho está estúrdio demais. É melhor sentarmos e esperarmos o dia clarear". Ela sentou-se numa pedra, estendeu o xale no chão para meus irmãos deitarem, colocou minha cabeça e a de Luisinha no colo, tirou o rosário e pôs-se a rezar enquanto dormíamos.

Quando o dia clareou, que abismo! Tínhamos errado o caminho. Estávamos num lugar de onde parecia que não seríamos capazes de sair. Era no alto da Serra dos Cristais e de lá de cima avistamos a estrada lá embaixo. Estávamos num precipício! Nós sempre confiantes em mamãe e suas orações; mas ela estava muda e só rezando. Perguntamos o que havíamos de fazer. Ela disse: "Esperem. Estou rezando a Santa Maria Eterna e só depois é que vou saber o que tenho de fazer". Esperamos. Pouco depois ela disse: "Voltar para trás está difícil, porque não sabemos o caminho. O que temos que fazer é seguir com fé em Deus, procurando sair daqui escorregando pela serra abaixo".

Nós, que parecíamos uns cabritos, escorregamos às vezes pedaços tão grandes, que só embaixo é que vimos o absurdo do que fazíamos. Renato quis fazer uma estripulia pendurando-se numa árvore pequena. Ela quebrou e ele caiu num buraco da serra e nós o perdemos de vista. Nessa hora pusemo-nos a chorar e a gritar. Mamãe, com os olhos cheios de lágrimas olhava para o céu e rezava: "Santa Maria Eterna, Virgem das Virgens, valei-me nesta ocasião, livrai-me desta aflição". Então o negrinho pediu o guarda-chuva, amarrou uma correia e deu a Renato para segurar e subir. Essa tentativa falhou umas três vezes. Por fim mamãe lhe deu o xale para segurar e ele subiu até em cima. Continuamos a rolar até cairmos na estrada.

Esta descida calculo que levou umas seis horas, pois o sol estava alto quando chegamos embaixo. Quando reparamos em nossas figuras rimos horrorizados. Nossos vestidos ensopados e em farrapos. Só nesta hora é que mamãe viu que Luisinha estava com o rosto disforme com caxumba! Estávamos com fome e não havia mais nada que comer; a matalotagem tinha acabado. Fomos para trás de uma moita, enquanto mamãe vigiava a estrada e mudamos a roupa.

Nesse lugar, enquanto descansávamos, passou um beija-flor-de-rabo-branco e aproximou-se de nós. Renato deu com o chapéu no pobrezinho e atirou-o morto no chão. Mamãe lhe disse: "Que malvado! Você vai ver o que te acontece. Afianço que você não vai ganhar nem um presentinho no Biribiri!". Sempre que vamos ao Biribiri voltamos carregados de presentes. Dona Mariana dá-nos das fazendas da fábrica; meu tio, dinheiro e latas de doces.

Depois de descansar seguimos para o Biribiri. Fomos recebidos com alegria e espanto. Quando mamãe contou a história do aparecimento da besta e as aventuras da viagem, todos riram à grande. Só então meu pai soube que a besta tinha fugido do pasto e voltado para casa.

Passamos lá dois dias e voltamos ontem para a cidade com um fardo dos presentes que todos nós ganhamos. Menos Renato, que não ganhou nem um lenço. Depois há gente que não acredita em castigo de quem mata beija-flor. Eu não poderei mais duvidar.

MORLEY, Helena. Minha vida de menina. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 73-75.

Fonte: Livro: Língua Portuguesa: linguagem e interação/ Faraco, Moura, Maruxo Jr. – 3.ed. São Paulo: Ática, 2016. p. 193-6.

 Glossário:

afiançar: garantir.

à grande: demasiadamente; em excesso.

besta: animal irracional, quadrúpede, em geral doméstico.

fazenda: tecido.

matalotagem: provisão de mantimentos para ser consumida durante uma viagem.

Entendendo o texto

1. A narrativa de Helena Morley dá-se em uma fase em que a jovem transita da infância à maturidade. Identifique e escreva no caderno uma passagem em que se observa a "fala" de uma Helena mais madura.

Há três passagens explícitas: 1ª) "Quando meu pai está na Boa Vista, que é a semana toda, mamãe leva cantando umas cantigas muito ternas que a gente vê que são saudades [...]"; 2ª) "Admirei a energia de mamãe."; 3ª) "Esta descida calculo que levou umas seis horas, pois o sol estava alto quando chegamos embaixo."

2.Observe: "Esse caminho está estúrdio demais". Mesmo sem consultar o dicionário, você certamente consegue deduzir, pelo contexto, o sentido da palavra destacada. Qual é?

Estranho, esquisito.

3. Releia este trecho:

Será que quando eu me casar vou gostar tanto de meu marido como mamãe de meu pai? Ao utilizar a expressão destacada, o enunciador espera mesmo uma resposta? Explique.

Não. A expressão indica incerteza, dúvida.

4. Releia este outro trecho e responda no caderno:

[...] que a gente vê que são saudades [...]

A expressão destacada é mais comum na linguagem informal. Que palavra corresponde a essa expressão na linguagem formal?

Nós.

5.Reescreva este trecho, utilizando uma linguagem menos coloquial.

Fomos andando, e nada do dia clarear.

Sugestões de resposta: Fomos andando, mas o dia não clareava.

 

 

 

 

sexta-feira, 11 de setembro de 2020

DIÁRIO: VOLTAS E VOLTAS - FANNY ABRAMOVICH - COM GABARITO

 Diário: Voltas e voltas

            Fanny Abramovich

        1° de janeiro de 1968.

        Que noite! Que festa!!! De arromba!!!

        Um grande réveillon! A mais fantástica e linda passagem de ano-novo que já vivi. Se todo o ano de 1968 for assim, não pararei nem um minuto. De me mexer, de falar, de vibrar, de compartilhar. De viver gostosamente. Dum jeito mais solto. Vibrante. Tomara que tudo aconteça nesse ritmo e nesse entusiasmo. Se for mesmo assim, não pararei em nenhum segundo.

        Feliz ano-novo! Feliz 1968!!

              Fanny Abramovich. As voltas do meu coração. 19. Ed. São Paulo: Atual, 2003. P. 21. (Entre linhas).

Fonte: Se liga na língua. Língua Portuguesa. P. 225.

Entendendo o diário:

01 – Que experiência é contada nessa página de diário?

      A narradora conta como passou o réveillon de 1968.

02 – No texto alternam-se dois tipos de frase. Quais são eles?

      Frases declarativas e frases exclamativas.

03 – O que explica a alternância desses dois tipos?

      As frases declarativas contam o que aconteceu e a opinião da narradora sobre suas experiências; as exclamativas expressam suas sensações de maneira mais viva, emotiva.

04 – Observe o uso do ponto de exclamação. O que é sugerido pela repetição desse sinal no final de uma frase?

      Uma fala mais emocional e enfática.

05 – Releia o primeiro parágrafo do texto. Como se classificam as frases quanto à estrutura? Justifique.

      São frases nominais, porque não apresentam verbo.

06 – Transcreva as demais frases com essa mesma classificação.

      “Um grande réveillon”, “Dum jeito mais solto”, “Vibrante”, “Feliz ano-novo!” e “Feliz 1968!!”

07 – Como se classifica, quanto à estrutura, o fragmento “Se todo o ano de 1968 for assim, não pararei nem um minuto”? Justifique.

      Trata-se de um período composto, porque é formado por duas orações (organizadas em torno das formas verbais for e pararei).

08 – As frases do texto são curtas e fragmentadas. Algumas delas, muitas vezes, complementam frases anteriores. Por que essa linguagem não é inadequada no gênero diário?

      O gênero diário traz a expressão de vivencias e sentimentos, constituindo uma comunicação informal e íntima, por isso aceitam-se construções que pareçam seguir o ritmo do pensamento e se mostram mais espontâneas.

domingo, 21 de junho de 2020

DIÁRIO: GENTE É BICHO E BICHO É GENTE - PEDRO ANTÔNIO OLIVEIRA - COM GABARITO

Texto: GENTE É BICHO E BICHO É GENTE

         Pedro Antônio Oliveira

   Querido Diário, não tenho mais dúvida de que este mundo está virado ao avesso! Fui ontem à cidade com minha mãe e você não faz ideia do que eu vi. Uma coisa horrível, horripilante, escabrosa, assustadora, triste, estranha, diferente, desumana... E eu fiquei chateada.

        Eu vi um homem, um ser humano, igual a nós, remexendo na lata de lixo. E sabe o que ele estava procurando? Ele buscava, no lixo, restos de alimento. Ele procurava comida!

        Querido Diário, como pode isso? Alguém revirando uma lata cheia de coisas imundas e retirar dela algo para comer? Pois foi assim mesmo, do jeitinho que estou contando. Ele colocou num saco de plástico enorme um montão de comida que um restaurante havia jogado fora. Aarghh!!! Devia estar horrível!

        Mas o homem parecia bastante satisfeito por ter encontrado aqueles restos. Na mesma hora, querido Diário, olhei assustadíssima para a mamãe. Ela compreendeu o meu assombro. Virei para ela e perguntei: “Mãe, aquele homem vai comer aquilo?” Mamãe fez um “sim” com a cabeça e, em seguida, continuou: “Viu, entende por que eu fico brava quando você reclama da comida?”.

        É verdade! Muitas vezes, eu me recuso a comer chuchu, quiabo, abobrinha e moranga. E larguei no prato, duas vezes, um montão de repolho, que eu odeio! Puxa vida! Eu me senti muito envergonhada!

        Vendo aquela cena, ainda me lembrei do Pó, nosso cachorro. Nem ele come uma comida igual àquela que o homem buscou do lixo. Engraçado, querido Diário, o nosso cão vive bem melhor do que aquele homem. Tem alguma coisa errada nessa história, você não acha?

        Como pode um ser humano comer comida do lixo e o meu cachorro comer comida limpinha? Como pode, querido Diário, bicho tratado como gente e gente vivendo como bicho? Naquela noite eu rezei, pedindo que Deus conserte logo este mundo. Ele nunca falha. E jamais deixa de atender os meus pedidos. Só assim, eu consegui adormecer um pouquinho mais feliz.

                          OLIVEIRA, Pedro Antônio. Gente é bicho e bicho é gente. Diário da Tarde. Belo Horizonte, 16 out. 1999.

Entendendo o texto:

01 – Esse texto faz parte de:

a)   Uma carta.

b)   Um livro.

c)   Uma crônica.

d)   Um diário.

02 – O objetivo desse tipo de texto é:

a)   Informar as pessoas o que acontece com muitos seres humanos com fome.

b)   Listar os tipos de legumes e verduras que as crianças devem comer.

c)   Relatar diariamente experiências e sentimentos de uma pessoa, bem como seus anseios pessoais.

d)   Narrar fatos cotidianos de uma cidade em relação ao destino do lixo.

03 – Esse texto é característico de:

a)   Cadernos e blogs pessoais.

b)   Correios eletrônicos.

c)   Jornais e revistas para adolescentes.

d)   Livros didáticos diversos.

04 – O texto: “Gente é bicho e bicho é gente” de Pedro Antônio de Oliveira é do gênero relato pessoal. As marcas que comprovam essa afirmativa são:

a)   Narrador em primeira pessoa, o tempo passado não é muito distante do tempo atual.

b)   Narrador em primeira pessoa, os fatos narrados aconteceram há muito tempo.

c)   Narrador em terceira pessoa, o tempo passado é próximo ao tempo presente.

d)   Narrador em terceira pessoa, os fatos narrados aconteceram há muito tempo.

05 – Qual o tema abordado nesse texto?

a)   A diferença de tratamento dado aos homens e aos cães.

b)   A importância de alimentos naturais na alimentação.

c)   A preocupação e a indignação com as ações desumanas na nossa sociedade.

d)   O valor da oração para adormecer um pouquinho mais feliz e tranquilo.

06 – Releia este trecho do texto: “É verdade! Muitas vezes, eu me recuso a comer chuchu, quiabo, abobrinha e moranga. E larguei no prato, duas vezes, um montão de repolho, que eu odeio! Puxa vida! Eu me senti muito envergonhada!” Do que ela se envergonha?

a)   Em saber que seu cachorro come melhor do que alguns seres humanos.

b)   Em ver um ser humano, igual a ela, procurando o que comer na lata de lixo.

c)   Por conseguir adormecer mesmo sabendo que muitos não tem o que comer.

d)   Por recusar a comida oferecida pela mãe enquanto outros passam fome.

07 – No final do relato, a narradora deposita sua confiança no Ser Divino. Por que ela faz isso?

a)   Porque a coisa está horripilante, escabrosa, assustadora, desumana.

b)   Porque somente o Ser Divino poderia dar uma solução para uma situação tão degradante.

c)   Porque a situação de fome nas cidades é muito grande e causa morte.

d)   Porque os donos de restaurante colocam comida nas lixeiras para quem precisar.