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sexta-feira, 1 de agosto de 2025

CONTO: O VISCONDE PARTIDO AO MEIO - FRAGMENTO - ÍTALO CALVINO - COM GABARITO

 Conto: O visconde partido ao meio – Fragmento

          Ítalo Calvino

        Havia uma guerra contra os turcos. O visconde Medardo di Terralba, meu tio, cavalgava pelas planícies da Boêmia rumo ao acampamento dos cristãos. Acompanhava-o um escudeiro chamado Curzio.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiud0Vsne_CeVUSJukpWUg3JZF2mkg3CRZ0UQUeySSN5xnq_hUUNCe_xB7rNPDpvL_hi77KI-lgTUMdhZSv2F6_zqMttaHVOhTS5ZEb97DLptbj1zxbf6jirCDwnH20zm66PzbN5xoGtR3rUXxiCDo_lJbkZTmysBzW2Jj2AWqCu5jWHW4tID5W0Onx7xw/s320/MG_4640a-e1556822169613.jpg


        As cegonhas voavam baixo, em bandos brancos, atravessando o ar opaco e parado.

        — Por que tantas cegonhas? — perguntou Medardo a Curzio —, para onde estão voando?

        Meu tio acabava de chegar, se alistara havia pouco, para agradar a alguns duques, nossos vizinhos, empenhados naquela guerra. Munira-se de um cavalo e de um escudeiro no último castelo em mãos cristãs, e ia apresentar-se ao quartel imperial.

        — Estão voando para os campos de batalha — disse o escudeiro, sombrio. — Vão nos acompanhar por todo o caminho.

        O visconde Medardo ficara sabendo que naquelas terras o voo das cegonhas é sinal de boa sorte; e queria mostrar-se alegre por vê-las. Mas, a contragosto, sentia-se inquieto.

        — O que pode atrair as pernaltas aos campos de batalha, Curzio? — perguntou.

        — Agora, também elas comem carne humana — respondeu o escudeiro —, desde que a carestia tornou os campos áridos e a estiagem secou os rios. Onde há cadáveres, as cegonhas, os flamingos e os grous substituíram os corvos e os abutres.

        Meu tio se achava então na primeira juventude: a idade em que os sentimentos se misturam todos num ímpeto confuso, ainda não separados em bem e mal; a idade em que cada experiência nova, também macabra e desumana, é toda trepidante e efervescente de amor pela vida.

        — E os corvos? E os abutres? — perguntou. — E as aves de rapina? Onde foram parar? — Estava pálido, mas seus olhos cintilavam.

        O escudeiro era um soldado de pele escura, bigodudo, que nunca erguia os olhos.

        — À força de comer as vítimas da peste, a peste os atacou também. — E apontou com a lança certas moitas escuras que a um olhar mais atento se revelavam não de plantas, mas de penas e pés ressecados de aves de rapina.

        — Assim, nem dá para saber quem morreu antes, se a ave ou o homem, e quem se lançou sobre o outro para esganá-lo — disse Curzio.

        Para fugir da peste que exterminava as populações, famílias inteiras tinham se encaminhado para os campos, e a agonia havia golpeado a todos ali. Em montes de carcaças, espalhadas pela planície árida, viam-se corpos de homens e mulheres, nus, desfigurados pelas marcas da peste e, coisa a princípio inexplicável, penugentos: como se daqueles braços macilentos e costelas tivessem crescido penas pretas e asas. Eram as carcaças de abutres misturadas com as sobras deles.

        O terreno já ia mostrando sinais de batalhas. A marcha se tornara mais lenta porque os dois cavalos topavam nos restos e lombadas.

        — O que está acontecendo com nossos cavalos? — perguntou Medardo ao escudeiro.

        — Senhor — respondeu ele —, nada desagrada tanto aos cavalos quanto o fedor das próprias tripas.

        A faixa de planície que atravessavam achava-se de fato cheia de carcaças equinas, algumas para cima, com os cascos voltados para o céu, outras de bruços, com o focinho enfiado na terra. 

        — Por que tantos cavalos caídos neste ponto, Curzio? — perguntou Medardo.

        — Quando o cavalo sente que está sendo atingido na barriga — explicou Curzio —, trata de segurar as vísceras. Alguns apoiam a pança no chão, outros se viram de costas para que elas não caiam. Mas a morte não tarda a ceifá-los do mesmo jeito.

        — Quer dizer que são sobretudo os cavalos que morrem nesta guerra?

        — As cimitarras turcas parecem feitas de propósito para rasgar-lhes o ventre com um só golpe. Mais adiante verá os corpos dos homens. Primeiro caem os cavalos e depois os cavaleiros. Pronto, lá está o campo.

        Nos limites do horizonte elevavam-se os pináculos das tendas mais altas, os estandartes do exército imperial e a fumaça.

        Continuando a galopar, viram que os caídos da última batalha tinham sido quase todos removidos e enterrados. Só se viam alguns membros dispersos, especialmente dedos, apoiados nos restolhos.

        — De vez em quando há um dedo indicando o caminho — disse meu tio Medardo. — Que significa?

        — Deus os perdoe: os vivos cortam os dedos dos mortos para arrancar-lhes os anéis.

        — Quem vem lá? — disse uma sentinela com capote coberto de mofo e musgo como a casca de uma árvore exposta à tramontana.

        — Viva a sagrada coroa imperial! — gritou Curzio.

        — E que morra o sultão! — replicou a sentinela. — Mas, por favor, quando chegarem ao comando, digam-lhes para mudar logo o turno, pois começo a deitar raízes!

        Agora os cavalos corriam para escapar da nuvem de moscas que circundava o campo, zumbindo pelas montanhas de excrementos.

        — De muitos valentes — observou Curzio — o esterco de ontem ainda está no chão, e eles já chegaram ao céu. — E benzeu-se.

        Na entrada do acampamento, costearam uma fila de baldaquins, sob os quais mulheres de cabelos encaracolados e corpulentas, com longos vestidos de brocado e os seios nus, acolheram-nos com gritos e risadas.

        — São os pavilhões das cortesãs — disse Curzio. — Nenhum exército possui outras tão lindas.

        Meu tio já cavalgava com o rosto virado para trás, observando-as.

        — Cuidado, senhor — acrescentou o escudeiro —, andam tão sujas e empestadas que nem os turcos as aceitariam como presas de um saque. Além de carregadas de chatos, percevejos e carrapatos, agora até os escorpiões e os lagartos fazem ninhos sobre elas.

        Passaram diante das baterias do campo. À noite, os artilheiros cozinhavam o rancho de água e nabos no bronze das espingardas e dos canhões, abrasado dos intensos disparos da jornada.

        Chegavam carroças cheias de terra e os artilheiros a peneiravam.

        — A pólvora está ficando escassa — explicou Curzio —, mas a terra onde as batalhas aconteceram está tão impregnada que, insistindo-se, dá para recuperar algumas cargas.

        Depois vinham as instalações da cavalaria, onde, entre as moscas, os veterinários trabalhavam sem parar remendando a pele dos quadrúpedes com costuras, faixas e emplastos de alcatrão fervente, todos relinchando e escoiceando, inclusive os doutores.

        As tendas da infantaria seguiam-se por um grande trecho. O sol se punha e diante de cada tenda os soldados estavam sentados com os pés imersos em tinas de água morna. Sendo comuns os alarmes repentinos de dia e de noite, mesmo na hora do pedilúvio continuavam a segurar o capacete e a lança. Em tendas mais altas e montadas em forma de quiosque, os oficiais punham talco nas axilas e se refrescavam com leques de rendas.

        — Não fazem isso por frescura — disse Curzio —, ao contrário: querem mostrar que se acham completamente à vontade em meio à dureza da vida militar.

        O visconde de Terralba foi logo conduzido à presença do imperador. Em seu pavilhão cheio de tapeçarias e troféus, o soberano estudava nos mapas os planos de futuras batalhas. As mesas estavam cobertas de mapas abertos, e o imperador espetava neles alfinetes, retirando-os de uma almofada própria que um dos marechais lhe estendia. Os mapas já estavam tão carregados de alfinetes que não se entendia mais nada, e para ler alguma coisa precisavam tirar os alfinetes e voltar a recolocá-los. Nesse tira e põe, para ficar com as mãos livres, tanto o imperador quanto os marechais mantinham os alfinetes entre os lábios e só podiam falar por meio de ganidos.

        Ao ver o jovem que se inclinava diante dele, o soberano emitiu um ganido interrogativo e tirou depressa os alfinetes da boca.

        — Um cavaleiro recém-chegado da Itália, majestade — apresentaram-no —, o visconde de Terralba, de uma das mais nobres famílias da região de Gênova.

        — Que seja logo nomeado tenente.

        Meu tio bateu as esporas, ficando em sentido, enquanto o imperador fazia um amplo gesto real e todos os mapas se enrolavam sobre si mesmos e caíam.

        Naquela noite, embora cansado, Medardo tardou a dormir. Andava para a frente e para trás perto da tenda, e ouvia os apelos das sentinelas, os cavalos relinchando e a fala entrecortada de soldados durante o sono. Observava no céu as estrelas da Boêmia, pensava na nova patente, na batalha do dia seguinte e na pátria distante, na música dos caniços dentro d’água. No coração não guardava nem nostalgia, nem dúvidas, nem apreensão. Para ele as coisas ainda eram inteiras e indiscutíveis, e assim era ele próprio. Se tivesse podido prever a terrível sorte que o aguardava, talvez também a tivesse considerado natural e acabada, mesmo em toda a sua dor. Estendia o olhar até o limite do horizonte noturno, onde sabia que se localizava o campo dos inimigos, e com os braços cruzados apertava as costas com as mãos, contente por ter certeza ao mesmo tempo de realidades longínquas e diferentes, e da própria presença no meio delas. Sentia o sangue daquela guerra cruel, disseminado por mil córregos sobre a terra, chegar até ele; e se deixava tocar, sem experimentar raiva nem piedade.

        [...]

Ítalo Calvino. O visconde partido ao meio. Trad. Nilson Moulin. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. p. 11-16.

Fonte: Universos – Língua Portuguesa – Ensino fundamental – Anos finais – 7º ano – Camila Sequetto Pereira; Fernanda Pinheiro Barros; Luciana Mariz. Edições SM. São Paulo. 3ª edição, 2015. p. 222-225.

Entendendo o conto:

01 – Quem são os personagens principais introduzidos no fragmento e qual a relação entre eles?

      Os personagens principais introduzidos são o Visconde Medardo di Terralba, um jovem que se alistou na guerra para agradar a duques vizinhos, e seu escudeiro Curzio, um soldado experiente que acompanha Medardo em sua jornada. Curzio serve como guia e informante para o visconde.

02 – Qual é o cenário da guerra e quem são os inimigos?

      O cenário da guerra é nas planícies da Boêmia, e os inimigos são os turcos. Medardo e Curzio estão a caminho do acampamento dos cristãos para que o visconde se apresente ao quartel imperial.

03 – Qual a "boa sorte" que o visconde esperava encontrar ao ver as cegonhas e como Curzio desmistifica essa crença?

      O visconde Medardo havia aprendido que o voo das cegonhas era sinal de boa sorte naquelas terras. No entanto, Curzio desmistifica essa crença ao explicar que as cegonhas agora comem carne humana nos campos de batalha, devido à carestia que deixou os campos áridos e secou os rios, substituindo corvos e abutres.

04 – O que aconteceu com os corvos e abutres, as aves de rapina tradicionais?

      Os corvos e abutres foram atacados pela peste ao se alimentarem das vítimas da doença. O escudeiro aponta moitas escuras que, de perto, revelam-se não de plantas, mas de penas e pés ressecados dessas aves.

05 – Como o texto descreve os restos de batalhas nos campos e o que Medardo e Curzio encontram?

      O terreno mostrava sinais de batalhas com montes de carcaças humanas (nus, desfigurados pela peste e penugentos devido à mistura com abutres), e carcaças equinas (cavalos caídos com as vísceras expostas). Além disso, encontram membros humanos dispersos, especialmente dedos, que Curzio explica serem cortados pelos vivos para roubar anéis dos mortos.

06 – Como os cavalos reagem ao fedor das próprias tripas nos campos de batalha?

      Curzio explica que "nada desagrada tanto aos cavalos quanto o fedor das próprias tripas". Eles tentam segurar as vísceras, alguns apoiando a pança no chão e outros se virando de costas para que elas não caiam.

07 – Que tipo de pessoas habitavam os baldaquins na entrada do acampamento, e qual a advertência de Curzio sobre elas?

      Os baldaquins na entrada do acampamento eram os pavilhões das cortesãs, mulheres de cabelos encaracolados, corpulentas, com longos vestidos de brocado e seios nus. Curzio adverte que elas estavam muito sujas e empestadas, a ponto de "nem os turcos as aceitariam como presas", e carregavam parasitas como chatos, percevejos e carrapatos, além de escorpiões e lagartos fazendo ninhos nelas.

08 – De que forma os artilheiros improvisavam a cozinha e a obtenção de pólvora?

      Os artilheiros cozinhavam o rancho de água e nabos no bronze das espingardas e dos canhões, aquecido pelos disparos do dia. Para obter pólvora, eles peneiravam a terra dos campos de batalha, que estava tão impregnada de resíduos que permitia a recuperação de algumas cargas.

09 – Descreva a cena dos oficiais na tenda e a explicação de Curzio para seu comportamento.

      Os oficiais, em tendas mais altas e luxuosas, punham talco nas axilas e se refrescavam com leques de rendas. Curzio explica que eles não faziam isso por frescura, mas para mostrar que se achavam completamente à vontade em meio à dureza da vida militar, um tipo de desafio à própria realidade.

10 – Qual era o estado de espírito do Visconde Medardo na noite anterior à batalha, e o que isso revela sobre sua personalidade naquele momento?

      Naquela noite, Medardo estava cansado, mas demorou a dormir. Ele observava o céu, pensava na nova patente e na batalha, sem sentir nostalgia, dúvidas ou apreensão. O texto revela que "para ele as coisas ainda eram inteiras e indiscutíveis, e assim era ele próprio". Isso mostra uma personalidade ingênua e imatura, que ainda não havia sido afetada pelas complexidades e horrores da vida, especialmente os da guerra.

 

domingo, 22 de maio de 2022

ROMANCE: O BARÃO NAS ÁRVORES - ÍTALO CALVINO - COM GABARITO

 Romance: O barão nas árvores

                 Ítalo Calvino

        […]

        Porém, João do Mato tinha suas preferências, não era possível dar-lhe um livro qualquer, caso contrário voltava no dia seguinte para Cosme o trocar. Meu irmão estava na idade em que se começa a tomar gosto pelas leituras mais densas, mas era obrigado a ir devagar, desde quando João do Mato devolveu-lhe as Aventuras de Telêmaco advertindo-o de que, se lhe desse outra vez um livro tão chato, ele serraria a árvore em que estivesse.

        A esta altura, Cosme gostaria de separar os livros que desejava ler por conta própria, com toda calma, daqueles que conseguia só para emprestar ao bandido. Que nada: pelo menos uma espiada devia dar também nestes, pois João do Mato tornava-se cada vez mais exigente e desconfiado, e antes de pegar um livro queria que ele lhe contasse um pouco da trama, e ai dele se errasse. Meu irmão tentou passar-lhe romances de amor: o bandido aparecia furioso perguntando se o confundira com alguma mulherzinha. Não dava para adivinhar qual era a preferência dele.

        Em resumo, com João do Mato sempre nos calcanhares, as leituras de Cosme, de distração nas horas vagas, passaram a ocupação principal, objetivo do dia inteiro. E, à força de manejar volumes, de julgá-los e compará-los, de ter de conhecer sempre outros e novos, entre leituras para João do Mato e a crescente necessidade de leituras suas, Cosme foi arrastado a tamanha paixão pelas letras e por todo saber humano que não lhe bastavam as horas do amanhecer ao pôr do sol para aquilo que gostaria de ler, e continuava também no escuro à luz de lanterna.

        Finalmente, descobriu os romances de Richardson. Agradaram a João do Mato. Terminado um, logo queria outro. Orbeque conseguiu-lhe uma pilha de volumes. O bandido tinha o que ler por um mês. Cosme, reencontrada a paz, lançou-se sobre as vidas de Plutarco.

        João do Mato, entretanto, estendido em seu catre, os hirsutos cabelos vermelhos cheios de folhas secas na testa enrugada, os olhos verdes que se avermelhavam com o esforço, lia sem parar, mexendo a mandíbula num soletrar furioso, mantendo no alto um dedo úmido de saliva pronto para virar a página. Ao descobrir Richardson, foi tomado por uma predisposição que já vinha incubando: um desejo de jornadas rotineiras domésticas, de parentes, de sentimentos familiares, de virtude, de aversão pelos maus e pelos viciados. Tudo aquilo que o circundava já não lhe interessava, enchia-o de desgosto. Não saía mais do esconderijo a não ser para ir atrás de Cosme e trocar de livro, especialmente se fosse um romance com mais de um volume e tivesse ficado no meio da história. Vivia assim, isolado, sem perceber a tempestade de ressentimentos que gerava contra ele inclusive entre moradores do bosque, antigamente cúmplices fiéis mas que agora já se tinham cansados de aturar um bandido inativo, que atraía todos os policiais.

        Tempos atrás, tinham estreitado fileiras com ele todos aqueles que, nas redondezas, possuíam contas aa ajustar com a justiça, às vezes pouca coisa, pequenos roubos de rotina, como os daqueles vagabundos que consertavam panelas, ou delitos para valer, como os dos seus companheiros bandidos. Para cada furto ou rapina aquela gente se valia da autoridade e experiência dele, utilizando como escudo seu nome, que corria de boca em boca e deixava o deles na sombra. E mesmo quem não participava dos golpes desfrutava de algum modo dos resultados, pois o bosque enchia-se de objetos roubados e de contrabando, que era preciso desfazer ou revender, e todos aqueles que zangavam por ali encontravam um jeito de traficar com tudo aquilo. E ainda: quem roubava por conta própria, sem avisar João do Mato, servia-se desse nome terrível para assustar as vítimas e obter o máximo. As pessoas viviam aterrorizadas, viam em cada malfeitor um João do Mato ou alguém do seu bando e apressavam-se a desatar os cordões da bolsa.

        Esses bons tempos duraram muito; João do Mato descobrira que podia viver de rendas, e pouco a pouco se acomodara. Achava que tudo continuava como antes, mas, ao contrário, os ânimos haviam mudado e seu nome já não inspirava nenhuma consideração.

        Agora, a quem era útil João do Mato? Ficava escondido com os olhos vermelhos de tanto ler romances, não aplicava mais golpes, no bosque ninguém mais podia cuidar dos próprios negócios, vinham policiais todos os dias para procurá-lo e qualquer desgraçado que tivesse um ar minimamente suspeito era levado. Se acrescentar a tentação que significava a recompensa pela cabeça dele, ficava claro que os dias de João do Mato estavam contados.

        Dois outros bandidos, dois jovens que tinham sido protegidos por ele e não conseguiam resignar-se a perder aquele grande chefe, quiseram dar-lhe a chance de reabilitar-se. Chamavam-se Hugão e Bonitão e haviam integrado o bando dos ladrões de fruta. Agora, adolescentes, tinham se tornado bandidos de respeito.

        Assim, foram procurar João do Mato na caverna. Estava lá, deitado na palha.

        — Sim, quem é? — perguntou sem tirar os olhos do papel.

        — Queríamos propor uma coisa, João do Mato.

        — Hum… O quê? — E lia.

        — Sabe onde é a casa de Constâncio, o fiscal da alfândega?

        — Sim… sim… Hein? O quê? Quem é o fiscal da alfândega?

        Bonitão e Hugão trocaram um olhar contrariado. Se não lhe tirassem aquele maldito livro do alcance da vista, o bandido não entenderia nem uma palavra.

        — Fecha o livro um pouco, João do Mato. Ouve o que temos a dizer.

        João do Mato agarrou o livro com ambas as mãos, levantou-se de joelhos, deu um jeito para apertá-lo contra o peito, mantendo-o aberto no ponto em que chegara, mas a vontade de continuar a ler era tanta que, sempre tendo-o bem próximo, ergueu-se até poder enfiar o nariz dentro dele.

        Bonitão teve uma ideia. Por perto havia uma teia de aranha com sua dona. Bonitão levantou com as mãos ágeis a teia com a aranha dentro e jogou-a em cima de João do Mato, entre livro e nariz. O desgraçado do João do Mato andava tão mole a ponto de ter medo de aranha. Sentiu no nariz aquela mistura de patas de aranha e filamentos pegajosos, e, antes de entender o que era, soltou um grito de susto, deixou cair o livro e começou a abanar as mãos na frente do rosto, os olhos arregalados e a boca cheia de saliva.

        Hugão deu um pulo e conseguiu pegar o livro antes que João do Mato pusesse um pé em cima dele.

        — Me dá esse livro de volta! — disse João do Mato, tentando livrar-se da aranha e da teia com uma das mãos, e com a outra arrancar o livro das mãos de Hugão.

        — Não, ouve antes! — disse Hugão escondendo o livro nas costas.

        — Estava lendo Clarisse. Me dá de volta! Estava no ponto culminante…

        — Escute. Nós vamos levar hoje de noite um carregamento de lenha na casa do fiscal. No saco, em vez de lenha, vai você. De madrugada, sai do saco…

        — Eu quero terminar Clarisse! — Conseguira livrar as mãos das últimas gosmas da teia e tentava lutar contra os dois jovens.

        — Ouça… Quando for de madrugada, você sai do saco, armado com duas pistolas, arranca do fiscal tudo o que foi arrecadado na semana, que ele guarda no cofre que está na cabeceira da cama…

        — Deixem ao menos eu terminar o capítulo… Sejam gentis…

        Os dois jovens pensavam no tempo em que, ao primeiro que tentasse contrariá-lo, João do Mato apontava duas pistolas na barriga. Amarga nostalgia.

        — Você pega os sacos de dinheiro, está bem? — insistiram, tristemente —, entrega tudo para nós, que devolveremos o livro e você poderá ler quanto quiser. Está bem assim? Topa?

        — Não. Não está bem. Não vou!

        — Então não vai… É assim, é… Então olhe! — E Hugão pegou uma página do final do livro (“Não!”, berrou João do Mato), arrancou-a (“Não! Para!”), fez uma bolinha, jogou-a no fogo.

        — Aaah! Cachorro! Não pode fazer isso! Vou ficar sem saber como acaba! — E corria atrás de Hugão para arrancar-lhe o livro.

        — Agora você vai à casa do fiscal?

        — Não, não vou!

        Hugão arrancou mais duas páginas.

        — Pare com isso! Ainda não cheguei aí! Você não pode queimá-las!

        Hugão já tinha mandado as duas para o fogo.

        — Porco! Clarisse! Não!

        — Então, vai?

        — Eu…

        Hugão arrancou mais três páginas e atirou-as no fogo! João do Mato sentou-se com o rosto entre as mãos.

        — Vou — rendeu-se. — Mas vocês me prometem que vão esperar com o livro fora da casa do fiscal.

        O bandido foi fechado num saco, com um feixe de lenha na cabeça. Atrás vinha Hugão com o livro. Às vezes, quando João do Mato com um arrastar de pés ou com um grunhido dentro do saco mostrava estar a ponto de arrepender-se, Hugão o fazia ouvir o rumor de uma página arrancada e João do Mato logo ficava bonzinho.

        Deste jeito o levaram, vestidos de lenhadores, até a casa do fiscal e o deixaram lá. Foram esconder-se por perto, atrás de uma oliveira, esperando a hora em que, executado o trabalho, devia alcançá-los.

        Mas João do Mato estava com muita pressa, saiu antes de acabar de escurecer, ainda havia muita gente pela casa.

        — Mãos ao alto! — Porém, já não era aquele de antes, era como se olhasse de fora, sentia-se meio ridículo.

        — Mãos ao alto, eu disse… Todos nesta sala, encostados na parede… — Mas que nada: nem ele acreditava mais naquilo, dizia por dizer. — Estão todos aqui? — Nem notara que uma menina tinha fugido.

        De qualquer modo, era coisa para não se perder um minuto. Ao contrário, a cena rendeu, o fiscal bancava o tonto, não encontrava a chave, João do Mato percebia que já não o levavam a sério, e no fundo estava contente que fosse assim.

        Finalmente, saiu com os braços cheios de bolsas com moedas. Correu quase às cegas para a oliveira combinada.

        — Aqui está tudo o que havia! Devolvam Clarisse!

        Quatro, sete, dez braços se lançaram sobre ele, imobilizaram-no das costas até as canelas. Tinha sido preso por um grupo de guardas e amarrado como um presunto.

        — Você há de ver Clarisse quadradinha! — e o levaram para o cárcere.

        A prisão era uma pequena torre à beira-mar. Um bosque de pinheiros crescia ao lado. Do alto de uma das velhas árvores, Cosme chegava quase à altura da cela de João do Mato e via o seu rosto atrás das grades.

        Ao bandido não interessava nada dos interrogatórios e do processo; de um jeito ou de outro, terminaria na forca; mas sua preocupação eram aqueles dias vazios ali na cadeia, sem poder ler, e aquele romance deixado pelo meio. Cosme conseguiu outra cópia de Clarisse e levou-a até o pinheiro.

        — Aonde você tinha chegado?

        — Ao ponto em que Clarisse foge da casa de má fama!

        Cosme folheou um pouco e logo:

        — Ah, sim, aqui está. Portanto… — E começou a ler em voz alta, virado para a janela de grades, à qual se agarravam as mãos de João do Mato.

        O processo foi demorado; o bandido resistia ao cerco da corda; para fazê-lo confessar cada um de seus inúmeros crimes eram necessários dias e dias. Todos os dias, antes e depois dos interrogatórios ficava escutando Cosme, que continuava a leitura. Terminada Clarisse, sentindo-o um tanto triste, Cosme achou que Richardson, para quem está preso, talvez fosse meio deprimente; e preferiu começar a ler para ele um romance de Fielding, cujo enredo movimentado lhe compensaria um pouco da liberdade perdida. Eram os dias do processo, e João do Mato só tinha cabeça para os casos de Jonathan Wild.

        Antes que o romance fosse concluído, chegou o dia da execução. Na carroça, acompanhado por um frade, João do Mato fez sua última viagem como ser vivo. Os enforcamentos em Penúmbria eram feitos num alto carvalho no meio da praça. Ao redor, o povo fazia um círculo.

        Já com a corda no pescoço, João do Mato ouviu um assovio entre os galhos. Ergueu o rosto. Descobriu Cosme com o livro fechado.

        — Conta como termina — pediu o condenado.

        — Lamento dizer, João — respondeu Cosme —, Jonas acaba pendurado pela garganta.

        — Obrigado. O mesmo aconteça comigo! Adeus! — E ele mesmo deu um pontapé na escada, enforcando-se.

        Quando o corpo parou de se debater, a multidão foi embora. Cosme permaneceu até a noite, apoiado no ramo do qual pendia o enforcado. Todas as vezes que um corvo se aproximava para bicar os olhos ou o nariz do cadáver, Cosme o expulsava agitando o gorro.

CALVINO, Ítalo. O barão nas árvores. Tradução de Nilson Moulin. São Paulo:
Companhia das Letras, 1991. p. 108-114.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 10-6.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Catre: cama dobrável de lona; cama de ­aspecto rude, tosco.

·        Hirsuto: eriçado, duro.

·        Incubar: preparar, elaborar.

·        Filamento: fio muito fino.

·        Tentilhão: pássaro encontrado na Europa, na Ásia e na África.

·        Torrente: curso de água rápido e impetuoso, geralmente produzido por chuvas abundante.

02 – Antes de levantarmos hipóteses de interpretação para o fragmento do romance “O barão nas árvores”, vamos recuperar algumas informações do texto.

a)   Quais são as personagens principais? Caracterize-as brevemente.

Cosme, jovem que vive nas árvores, e João do Mato, um bandido.

b)   Em que espaços ocorrem as principais ações do texto?

Na estrada, no esconderijo de João do Mato, na casa do fiscal, na prisão, em árvores.

c)   Quanto tempo você imagina que tenha durado o episódio narrado?

Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Imagina-se que o desenrolar dos fatos não pode ter levado menos de um mês.

d)   Quem conta a história? Copie o(s) trecho(s) do texto que comprova(m) sua resposta.

O irmão de Cosme. “Meu irmão estava na idade em que começa [...]” ou “Meu irmão tentou passar-lhe romances de amor [...]”.

e)   Quais são os principais problemas enfrentados pelas personagens centrais ao longo do episódio lido?

Para Cosme, há o problema de o bandido lhe exigir cada vez mais livros – e livros de seu agrado. Para João do Mato, o principal problema é que dois outros bandidos, seus antigos protegidos, forçam-no a voltar ao crime; no assalto, o bandido é capturado e condenado à forca.

03 – O encontro entre Cosme e João do Mato se desenvolve em torno de um elemento comum: ambos estão envolvidos na paixão pela leitura. A partir desse momento, a quantidade de livros que leem é imensa, mas a experiência leitora deles é bastante diferente. Aponte algumas diferenças.

      João do Mato devora livros que prendessem sua atenção, narrativas envolventes, sem complexidade. Já Cosme lia não só os livros que pudessem agradar a João do Mato, mas também os que satisfaziam sua própria necessidade leitora, que começava a se tornar mais densa. Para João do Mato, a leitura era um passatempo, para Cosme tornou-se quase um ofício.

04 – A leitura se torna a ocupação principal de Cosme. Mas, também para o bandido ler passa a ser muito importante. Em que momentos da narrativa essa importância fica evidente para o leitor?

      No momento em que João do Mato deixa de atuar como bandido para ficar em seu esconderijo lendo e passa a sair dele apenas para buscar mais sugestões de livros com Cosme. Também no momento em que Hugão e Bonitão tentam conversar com João do Mato sobre a realização de um assalto e ele só os escuta quando os bandidos lhe arrancam o livro das mãos.

05 – Releia os seguintes trechos e complete a frase no caderno:

        “Ao bandido não interessava nada dos interrogatórios e do processo; de um jeito ou de outro, terminaria na forca; mas sua preocupação eram aqueles dias vazios ali na cadeia, sem poder ler, e aquele romance deixado pelo meio. [...]”.

        “— Conta como termina — pediu o condenado.

         — Lamento dizer, João — respondeu Cosme —, Jonas acaba pendurado pela garganta.

         — Obrigado. O mesmo aconteça comigo! Adeus! — E ele mesmo deu um pontapé na escada, enforcando-se.”.

        Pela leitura dos dois trechos, é possível perceber o nível de envolvimento que João do Mato chegou a ter com a leitura, a qual ...

a)   Passou a ocupar todos os espaços de sua existência, a ponto de ele confundir-se com uma das personagens.

b)   Enfraqueceu sua relação com Cosme, porém, tornou-o mais humano, devolvendo-lhe a dignidade perdida.

06 – Nessa narrativa, o espaço onde acontecem os fatos é sempre importante para a construção da trama, mas vamos nos concentrar nos cenários onde as personagens liam: as árvores de Cosme e a caverna de João do Mato. Tente relacionar a caverna à experiência leitora de João do Mato e as árvores à experiência leitora de Cosme.

      A caverna é um lugar fechado, lugar onde a pessoa se isola do mundo, voltando-se apenas para si. Nesse espaço de isolamento, João do Mato tem a possibilidade de substituir sua existência, suas próprias aventuras por aventuras vividas pelas personagens.

      Estar sobre as árvores é uma forma de distanciamento, mas não de alienação, uma vez que a pessoa por cima consegue enxergar tudo o que se passa sem estar necessariamente envolvida nos acontecimentos. E é dessa forma que Cosme vive sua experiência leitora: ele faz escolhas, analisa, compara, faz com que a leitura possa atender a suas necessidades e às necessidades de quem precisar, mas sem se deixar dominar por ela.

sexta-feira, 12 de maio de 2017

CONTO: A OVELHA NEGRA - ÍTALO CALVINO - COM GABARITO

CONTO:   A OVELHA NEGRA
                   ÍTALO CALVINO

        Havia um país onde todos eram ladrões.
        À noite, cada habitante saía, com a gazua e a lanterna, e ia arrombar a casa de um vizinho. Voltava de madrugada, carregado, e encontrava a sua casa roubada.
        E assim todos viviam em paz e sem prejuízo, pois um roubava o outro, e este, um terceiro, e assim por diante, até que se chegava ao último, que roubava o primeiro. O comercio naquele país só era praticado como trapaça, tanto por quem vendia como por quem comprava. O governo era uma associação de delinquentes vivendo à custa dos súditos, e os súditos por sua vez só se preocupavam em fraudar o governo. Assim a vida prosseguia sem tropeços, e não havia ricos nem pobres.
        Ora, não se sabe como, ocorre que no país apareceu um homem honesto. À noite, em vez de sair o saco e a lanterna, ficava em casa fumando e lendo romances.
        Vinham ladrões, viam a luz acessa e não subiam.
        Essa situação durou algum tempo: depois foi preciso fazê-lo compreender que, se quisesse viver sem fazer nada, não era essa uma boa razão para não deixar os outros fazerem. Cada noite que ele passava em casa era uma família que não comia no dia seguinte.
        Diante desses argumentos, o homem honesto não tinha o que objetar. Também começou a sair de noite para voltar de madrugada, mas não ia roubar. Era honesto, não havia nada a fazer. Andava até a ponte e ficava vendo passar a água embaixo. Voltava para a casa e a encontrava roubada.
        Em menos de uma semana o honesto ficou sem um tostão, sem o que comer, com a casa vazia. Mas até aí tudo bem, porque era culpa sua; o problema era que o seu comportamento criava uma grande confusão. Ele deixava que lhe roubassem tudo e, ao mesmo tempo, não roubava ninguém; assim, sempre havia alguém que, voltando para casa de madrugada, achava a casa intacta: a casa que o homem honesto deveria ter roubado. [...] E, além disso, os que vinham para roubar a casa do homem honesto sempre a encontravam vazia; assim iam ficando pobres. [...]

                                                               Ítalo Calvino. “A ovelha negra”. In Um general na biblioteca.
                                                                                 São Paulo: Companhia da Letras, 2001, pp. 31-32
Entendendo o Conto.
01.   O conto A ovelha negra propõe uma situação inicial em que se apresenta a rotina de uma população.
a.- Qual é a rotina dos habitantes desse país?
Os habitantes do país imaginado por Ítalo Calvino costumam roubar uns aos outros.

b.- Cite um trecho que comprove que a situação inicialmente apresentada na narrativa estabelece um equilíbrio, um estado de normalidade e rotina.
“Assim a vida prosseguia sem tropeços [...]”

c.- O que há de estranho, do povo de vista moral, na situação inicial apresenta no texto?
O fato de o normal ser que cada cidadão roube o outro e que isso proporcione paz parece absurdo do ponto de vista moral.

02.    Na narrativa de Ítalo Calvino, a situação de equilíbrio do país é alterada. Que fato causa desequilíbrio na vida social? Por quê
O surgimento de um homem honesto provoca desequilíbrio, porque ele rompe o ciclo “roubar e ser roubado” que mantinha a sociedade funcionando. A atitude do homem de ficar em sua casa à noite impedia que outros viessem roubá-la.

a.    A partir da situação inesperada que alterou a rotina social, os personagens tomam atitudes.
- Como os habitantes reagiram?
Eles procuraram convencer o homem honesto de que deveria sair de sua casa para que outros a pudessem saquear.
b.- O que pretendiam os moradores com essa reação?
Os moradores pretendiam restabelecer a normalidade daquele país onde todos eram ladrões.

c.   O homem honesto aceitou a sugestão dos habitantes, mas essa atitude intensificou o conflito, instaurando o clímax da narrativa. Explique por quê.
A tentativa de fazer o homem honesto sair de casa não restabeleceu o equilíbrio social porque, como ele continuava não roubando ninguém.

d.    A narrativa de Ítalo Calvino deve ser considerada uma ironia; caso contrário, estaria condenando a existência de homens honestos. Explique em que consiste a ironia do texto “A ovelha negra”.
A ironia do texto de Calvino reside no fato de a honestidade ser entendida como um mal para a sociedade, provocando a injustiça social, enquanto o roubo traia a paz entre os cidadãos.

03.    O título é constituído pela expressão metafórica “ovelha negra”.
a.- Qual o significado habitual dessa expressão?
A expressão “ovelha negra” habitualmente se refere ao membro de um grupo, de uma comunidade que é diferente, causando transtornos, normalmente por cometer ações inaceitáveis, reprováveis.

b.-Por que se pode afirmar que, no contexto da narrativa de Ítalo Calvino, esse título é irônico?
No contexto da narrativa, a expressão é irônica porque, se é verdade que o homem honesto destoa dos demais membros da população, por outro lado, ele age da melhor forma possível, seguindo valores positivos, normalmente elogiáveis e desejáveis.