domingo, 22 de maio de 2022

ROMANCE: AMOR DE PERDIÇÃO - CAPÍTULO IV - CAMILO CASTELO BRANCO - COM GABARITO

 Romance: Amor de perdição Capítulo IV

                  Camilo Castelo Branco

        [...]

        Ao romper d’alva, dum domingo de Junho de 1803, foi Teresa chamada para ir com seu pai à primeira missa da igreja paroquial. Vestiu-se a menina assustada, e encontrou o velho na antecâmara a recebe-la com muito agrado, perguntando-lhe se ela se erguia de bons humores para dar ao autor de seus dias um resto de velhice feliz. O silencio de Teresa era interrogador.

        — Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltazar, minha filha. É preciso que te deixes cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que deres este passo difícil, conhecerás que a tua felicidade é daquelas que precisam ser impostas pela violência. Mas repara, minha querida filha, que a violência dum pai é sempre amor. Amor tem sido a minha condescendência e brandura para contigo. Outro teria subjugado a tua desobediência com maus-tratos, com os rigores do convento, e talvez com o desfalque do teu grande patrimônio. Eu, não. Esperei que o tempo te aclarasse o juízo, e felicito-me de te julgar desassombrada do diabólico prestígio do maldito, que acordou o teu inocente coração. Não te consultei outra vez sobre este casamento, por temer que a reflexão fizesse mal ao zelo de boa filha com que tu vais abraçar teu pai, e agradecer-lhe a prudência com que ele respeitou o teu gênio, velando sempre a hora de te encontrar digna do seu amor.

        Teresa não desfitou os olhos do pai; mas tão abstraída estava, que escassamente lhe ouviu as primeiras palavras, e nada das últimas.

        — Não me respondes, Teresa?! – tornou Tadeu, tomando-lhe cariciosamente as mãos.

        — Que hei de eu responder-lhe, meu pai? — balbuciou ela.

        — Dá-me o que te peço? Enches de contentamento os poucos dias que me restam?

        — E será o pai feliz com o meu sacrifício?

        — Não digas sacrifício, Teresa... Amanhã a estas horas verás que transfiguração se fez na tua alma. Teu primo é um composto de todas as virtudes; nem a qualidade de ser um gentil moço lhe falta, como se a riqueza, a ciência e as virtudes não bastassem a formar um marido excelente.

        — E ele quer-me depois de eu me ter negado? — disse ela com amargura irônica.

        — Se ele está apaixonado, filha!... e tem bastante confiança em si para crer que tu hás de ama-lo muito!...

        — E não será mais certo odiá-lo eu sempre!? Eu agora mesmo o abomino como nunca pensei que se pudesse abominar! Meu pai... — continuou ela, chorando, com as mãos erguidas — mate-me; mas não me force a casar com meu primo! É escusada a violência, porque eu não caso!

        Tadeu mudou de aspecto, e disse irado:

        — Hás de casar! Quero que cases! Quero!... Quando não, amaldiçoada serás para sempre, Teresa! Morrerás num convento! Esta casa irá para teu primo! Nenhum infame há de aqui pôr pé nas alcatifas de meus avós. Se és uma alma vil, não me pertences, não és minha filha, não podes herdar apelidos honrosos, que foram pela primeira vez insultados pelo pai desse miserável que tu amas! Maldita sejas! Entra nesse quarto, e espera que daí te arranquem para outro, onde não verás um raio de sol.

        Teresa ergueu-se sem lágrimas, e entrou serenamente no seu quarto.

        [...].

CASTELO BRANCO, Camilo. Op. cit.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 39-40.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Abstraído: distraído.

·        Alcatifa: tapete.

·        Desassombrado: serenado; livre de susto, de receio.

·        Escusado: justificado, perdoável.

·        Irado: furioso, enraivecido.

·        Velar: estar alerta, vigiar.

02 – Como era, provavelmente, o tom de voz de Tadeu Albuquerque em sua primeira fala à filha? Copie no caderno alguns termos ou expressões do trecho que o(a) levaram a essa conclusão.

      Provavelmente era um tom de voz calmo, amável: “Encontrou o velho na antecâmara a recebe-la com muito agrado”, “minha querida filha”, “A violência de um pai é sempre amor”, “Amor tem sido a minha condescendência e brandura para contigo”, etc.

03 – Ao expressar-se dessa maneira, o pai esperava de Teresa uma resposta positiva a seu pedido. Destaque alguns dos argumentos usados nessa primeira fala para convencer a filha a casar-se com o primo.

      “A tua felicidade é daquelas que precisam ser impostas pela violência”, “Outro teria subjugado a tua desobediência com maus tratos, com os rigores do convento, e talvez com o desfalque do teu grande patrimônio. Eu, não. Esperei que o tempo te aclarasse o juízo”, etc.

04 – Em que momento do diálogo o tom de voz de Tadeu possivelmente começa a se alterar?

      Possivelmente após Teresa perguntar a ele se conseguirá ser feliz com seu sacrifício.

05 – Em que fala o pai de Teresa se mostra irado? E como costuma ser a fala de alguém que está irado?

      Na última fala (penúltimo parágrafo). É provável que uma pessoa irada fale em voz alta, em tom ameaçador, com impetuosidade, etc.

06 – Você imagina que a voz de Teresa tenha se alterado ao longo do diálogo? Por quê?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Não, porque na época da narrativa, os filhos deviam obediência total ao pai, principalmente as filhas. Assim sendo, a Teresa mesmo sob forte emoção, não ousou alterar o tom de voz.

07 – Agora forme dupla com um colega e preparem a representação do diálogo entre Tadeu Albuquerque e Teresa para apresentar à sala.

      Resposta pessoal do aluno.

ROMANCE: AMOR DE PERDIÇÃO - CAPÍTULO II - CAMILO CASTELO BRANCO - COM GABARITO

 Romance: Amor de perdição Capítulo II

                Camilo Castelo Branco 

        [...] 

        No espaço de três meses fez-se maravilhosa mudança nos costumes de Simão. As companhias da relé desprezou-as. Saía de casa raras vezes, ou só, ou com a irmã mais nova, sua predileta. O campo, as árvores e os sítios mais sombrios e ermos eram o seu recreio. Nas doces noites de estio demorava-se por fora até ao repontar da alva. Aqueles que assim o viam admiravam-lhe o ar cismador e o recolhimento que o sequestrava da vida vulgar. Em casa encerrava-se no seu quarto, e saía quando o chamavam para a mesa. 

        D. Rita pasmava da transfiguração, e o marido, bem convencido dela, ao fim de cinco meses, consentiu que seu filho lhe dirigisse a palavra. 

        Simão Botelho amava. Aí está uma palavra única, explicando o que parecia absurda reforma aos dezessete anos. 

        Amava Simão uma sua vizinha, menina de quinze anos, rica herdeira, regularmente bonita e bem-nascida. Da janela do seu quarto é que ele a vira pela primeira vez, para amá-la sempre. Não ficara ela incólume da ferida que fizera no coração do vizinho: amou-o também, e com mais seriedade que a usual nos seus anos. 

        Os poetas cansam-nos a paciência a falarem do amor da mulher aos quinze anos, como paixão perigosa, única e inflexível. Alguns prosadores de romances dizem o mesmo. Enganam-se ambos. O amor dos quinze anos é uma brincadeira; é a última manifestação do amor às bonecas; é a tentativa da avezinha que ensaia o voo fora do ninho, sempre com os olhos fitos na ave-mãe, que a está de fronte próxima chamando: tanto sabe a primeira o que é amar muito, como a segunda o que é voar para longe. 

        Teresa de Albuquerque devia ser, porventura, uma exceção no seu amor. 

        O magistrado e sua família eram odiosos ao pai de Teresa, por motivo de litígios, em que Domingos Botelho lhe deu sentenças contra. Afora isso, ainda no ano anterior dois criados de Tadeu de Albuquerque tinham sido feridos na celebrada pancadaria da fonte. É, pois, evidente que o amor de Teresa, declinando de si o dever de obtemperar e sacrificar-se ao justo azedume de seu pai, era verdadeiro e forte. 

        [...] 

CASTELO BRANCO, Camilo. Amor de perdição. São Paulo: Ática, 2001.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 37-8.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Alva: primeira claridade da manhã. 

·        Cismador: pensativo. 

·        Declinar: eximir-se, recusar. 

·        Ermo: deserto. 

·        Estio: verão. 

·        Incólume: ileso, livre de dano ou perigo. 

·        Litígio: questão judicial. 

·        Obtemperar: obedecer, pôr-se de acordo. 

·        Pasmar: admirar-se de algo. 

·        Relé: ralé; a camada mais baixa da sociedade. 

·        Transfiguração: transformação na maneira de pensar e proceder. 

02 – Segundo o texto, que grande transformação o amor provocou em Simão? 

      Simão deixou de ser um rapaz intempestivo e baderneiro e passou a se dedicar a seus pensamentos, a seus afazeres pessoais. Passava mais tempo em casa, quando saía, ia a lugares mais calmos. 

03 – O que essa alteração de comportamento revela sobre o novo estado de espírito de Simão? 

      Simão encontra-se enamorado; seus pensamentos são totalmente ocupados pela pessoa que motiva esse sentimento. Tal é o seu estado de paixão que nenhuma outra sensação consegue distraí-lo. 

04 – Leia: 

        "[...] O campo, as árvores e os sítios mais sombrios e ermos eram o seu recreio. Nas doces noites de estio demorava-se por fora até ao repontar da alva. [...]" 

        O espaço é fundamental em uma narrativa não só porque determina muitas das ações das personagens, mas porque pode revelar seu estado de espírito. Por que os novos espaços por onde circula Simão são coerentes com sua transformação? 

      Porque são espaços de recolhimento, de solidão, apropriados à vivência de um sentimento intenso, que modifica e arrebata a personagem. 

05 – Explique o que é, segundo o narrador, o amor dos 15 anos. 

      É uma brincadeira que se pode realizar em segurança.

06 – Por que Teresa de Albuquerque é uma exceção em seu amor? 

      Porque a paixão que ela sente em hipótese alguma pode ser vivida em segurança, uma vez que a sua família e inimiga da de seu amado. Trata-se, portanto, de um sentimento arriscado, de uma ousadia. 

 

ROMANCE: IRACEMA CAPÍTULO XV - JOSÉ DE ALENCAR - COM GABARITO

 Romance: Iracema Capítulo XV          

                 José de Alencar

        [...]

        Nasceu o dia e expirou.

        Já brilha na cabana de Araquém o fogo, companheiro da noite. Correm lentas e silenciosas no azul do céu, as estrelas, filhas da lua, que esperam a volta da mãe ausente.

        Martim se embala docemente; e como a alva rede que vai e vem, sua vontade oscila de um a outro pensamento. Lá o espera a virgem loura dos castos afetos; aqui lhe sorri a virgem morena dos ardentes amores.

        Iracema recosta-se langue ao punho da rede; seus olhos negros e fúlgidos, ternos olhos de sabiá, buscam o estrangeiro e lhe entram n'alma. O cristão sorri; a virgem palpita; como o saí, fascinado pela serpente, vai declinando o lascivo talhe, que se debruça enfim sobre o peito do guerreiro.

        Já o estrangeiro a preme ao seio; e o lábio ávido busca o lábio que o espera, para celebrar nesse ádito d'alma, o himeneu do amor.

        No recanto escuro o velho Pajé, imerso em funda contemplação e alheio às cousas deste mundo, soltou um gemido doloroso Pressentira o coração o que não viram os olhos? Ou foi algum funesto presságio para a raça de seus filhos, que assim ecoou n'alma de Araquém?

        Ninguém o soube.

        O cristão repetiu do seio a virgem indiana. Ele não deixará o rasto da desgraça na cabana hospedeira. Cerra os olhos para não ver; e enche sua alma com o nome e a veneração de seu Deus:

        — Cristo! . . . Cristo! . . .

        Volta a serenidade ao seio do guerreiro branco, mas todas as vezes que seu olhar pousa sobre a virgem tabajara, ele sente correr-lhe pelas veias uma onda de ardente chama. Assim quando a criança imprudente revolve o brasido de intenso fogo, saltam as faúlhas inflamadas que lhe queimam as faces.

        Fecha os olhos o cristão, mas na sombra de seu pensamento surge a imagem da virgem, talvez mais bela. Embalde chama o sono às pálpebras fatigadas; abrem-se, malgrado seu.

        Desce-lhe do céu ao atribulado pensamento uma inspiração.

        — Virgem formosa do sertão, esta é a última noite que teu hóspede dorme na cabana de Araquém, onde nunca viera, para teu bem e seu. Faze que seu sono seja alegre e feliz.

        — Manda; Iracema te obedece. Que pode ela para tua alegria?

        O cristão falou submisso, para que não o ouvisse o velho Pajé:

        — A virgem de Tupã guarda os sonhos da jurema que são doces e saborosos!

        Um triste sorriso pungiu os lábios de Iracema:

        — O estrangeiro vai viver para sempre à cintura da virgem branca; nunca mais seus olhos verão a filha de Araquém, e ele já quer que o sono feche suas pálpebras, e que o sonho o leve à terra de seus irmãos!

        — O sono é o descanso do guerreiro, disse Martim; e o sonho a alegria d'alma. O estrangeiro não quer levar consigo a tristeza da terra hospedeira, nem deixá-la no coração de Iracema!

        A virgem ficou imóvel.

        — Vai, e torna com o vinho de Tupã.

        Quando Iracema foi de volta, já o Pajé não estava na cabana; tirou a virgem do seio o vaso que ali trazia oculto sob a carioba de algodão entretecida de penas. Martim lho arrebatou das mãos, e libou as gotas do verde e amargo licor.

        Agora podia viver com Iracema, e colher em seus lábios o beijo, que ali viçava entre sorrisos, como o fruto na corola da flor. Podia amá-la, e sugar desse amor o mel e o perfume, sem deixar veneno no seio da virgem.

        O gozo era vida, pois o sentia mais forte e intenso; o mal era sonho e ilusão, que da virgem não possuía senão a imagem.

        Iracema afastara-se opressa e suspirosa.

        Abriram-se os braços do guerreiro adormecido e seus lábios; o nome da virgem ressoou docemente.

        A juruti, que divaga pela floresta, ouve o terno arrulho do companheiro; bate as asas, e voa a conchegar-se ao tépido ninho. Assim a virgem do sertão, aninhou-se nos braços do guerreiro.

        Quando veio a manhã, ainda achou Iracema ali debruçada, qual borboleta que dormiu no seio do formoso cacto. Em seu lindo semblante acendia o pejo vivos rubores; e como entre os arrebóis da manhã cintila o primeiro raio do sol, em suas faces incendidas rutilava o primeiro sorriso da esposa, aurora de fruído amor.

        A jandaia fugira ao romper d'alva e para não tornar mais à cabana.

        Vendo Martim a virgem unida ao seu coração, cuidou que o sonho continuava; cerrou os olhos para torná-los a abrir.

        A pocema dos guerreiros, troando pelo vale, o arrancou ao doce engano; sentiu que já não sonhava, mas vivia. Sua mão cruel abafou nos lábios da virgem o beijo que ali se espanejava.

        — Os beijos de Iracema são doces no sonho; o guerreiro branco encheu deles sua alma. Na vida, os lábios da virgem de Tupã amargam e doem como o espinho da jurema.

        A filha de Araquém escondeu no coração a sua ventura. Ficou tímida e inquieta, como a ave que pressente a borrasca no horizonte. Afastou-se rápida, e partiu.

        As águas do rio banharam o corpo casto da recente esposa.

        Tupã já não tinha sua virgem na terra dos tabajaras.

        [...].

ALENCAR, José de. Iracema. Porto Alegre: L&PM, 2002.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 41-4.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Arrebóis: os tons avermelhados do céu no amanhecer e no entardecer.

·        Borrasca: temporal com chuvas e ventos intensos.

·        Carioba: espécie de camisa de algodão.

·        Corola: conjunto de pétalas da flor.

·        Entretecida: entrelaçada, intercalada.

·        Espanejar: desabrochar.

·        Fluído: gozado, desfrutado.

·        Jandaia: designação comum a várias aves semelhantes, como papagaios e periquitos.

·        Juruti: designação comum a várias aves semelhantes, como pombas e rolinhas.

·        Libar: beber, sorver; beber mais por prazer do que por necessidade.

·        Pejo: pudor, vergonha.

·        Pocema: grito de guerra.

·        Pungir: começar a apontar, começar a aflorar.

·        Rubor: a cor vermelha nas faces provocada por vergonha.

·        Rutilar: fazer brilhar, resplandecer.

·        Troar: retumbar, trovejar.

·        Viçar: desenvolver-se com força.

02 – Releia:

        “— A virgem de Tupã guarda os sonhos da jurema que são doces e saborosos!

        Um triste sorriso pungiu os lábios de Iracema:

        — O estrangeiro vai viver para sempre à cintura da virgem branca; nunca mais seus olhos verão a filha de Araquém, e ele já quer que o sono feche suas pálpebras, e que o sonho o leve à terra de seus irmãos!”. O que Iracema imaginava que Martim desejava sonhar sob o efeito da bebida da jurema?

      Iracema imaginava que os sonhos de Martim seriam ligados a sua terra (Portugal) e a tudo que deixara por lá.

03 – Diante do desejo de Martim de provar a jurema, um sorriso triste aponta nos lábios da índia. Qual pode ter sido a razão da tristeza de Iracema?

      Ela possivelmente imaginou que, com a proximidade da partida, Martim preferisse ficar mais tempo com ela a sonhar com a mulher branca que deixara em Portugal.

04 – As diversas comparações e metáforas presentes ao longo do romance Iracema são responsáveis pela criação do tom poético da obra, como em:

        “— O sono é o descanso do guerreiro, disse Martim; e o sonho a alegria d'alma. O estrangeiro não quer levar consigo a tristeza da terra hospedeira, nem deixá-la no coração de Iracema!

        Observe a oposição representada pelos termos destacados e complete a frase a seguir no caderno. O elemento, nesse contexto, que poderia corresponder à tristeza da terra hospedeira, aquilo que um sonho bom deveria substituir, é .............

·        A saudade da própria terra, Portugal, que Martim deixou há bastante tempo.

·        A saudade da noiva, que o espera em sua terra de origem.

·        A impossibilidade de ter Iracema, de amá-la.

·        As tristezas e as decepções vividas no Brasil.

·        A melancolia observada em todos os índios da tribo em que estava.

05 – Releia:

        “Agora podia viver com Iracema, e colher em seus lábios o beijo, que ali viçava entre sorrisos, como o fruto na corola da flor. Podia amá-la, e sugar desse amor o mel e o perfume, sem deixar veneno no seio da virgem.”. Se o amor de Martim pela índia era impossível, por que, nesse momento, ele acredita poder “viver com Iracema, e colher em seus lábios o beijo”?

      Porque o efeito da jurema lhe dava a possibilidade de viver em sonho algo que não poderia ser vivido na realidade.

06 – Complete as frases no caderno. No contexto do trecho: “Podia amá-la, e sugar desse amor o mel e o perfume, sem deixar veneno no seio da virgem”, mel e perfume significam a sensação agradável sentida naquele estado de sonho. A frase “sem deixar veneno no seio da virgem”, portanto, pode significar .........

·        Não permitir que Iracema bebesse o licor de Tupã, bebida destinada apenas aos guerreiros.

·        Viver as delícias do contato com Iracema apenas em sonho, sem de fato consumar o amor, protegendo, assim, a virgindade da índia.

·        Não permitir que Iracema tomasse contato com seus sonhos, seus desejos.

·        Não deixar que, durante seus sonhos, a jurema vertesse sobre o corpo de Iracema.

·        Proteger Iracema de qualquer agressão que pudesse vir dos índios de sua tribo.

07 – A certeza de Martim de que havia estado com Iracema apenas em sonho pode ser comprovada pelo seguinte trecho:

a)   “[...] e colher em seus lábios o beijo, que ali viçava entre sorrisos, como o fruto na corola da flor.”

b)   “O gozo era vida, pois o sentia mais forte e intenso [...]”.

c)   “[...] o mal era sonho e ilusão, que da virgem não possuía senão a imagem”.

08 – É possível, no trecho lido, verificar uma integração entre as ações e descrições das personagens e os elementos da paisagem. Releia:

        “Quando veio a manhã, ainda achou Iracema ali debruçada, qual borboleta que dormiu no seio do formoso cacto. Em seu lindo semblante acendia o pejo vivos rubores; e como entre os arrebóis da manhã cintila o primeiro raio do sol, em suas faces incendidas rutilava o primeiro sorriso da esposa, aurora de fruído amor.”

a)   A manhã que surge ainda encontra a índia junto de Martim. Em seu rosto brilha um sorriso, “o primeiro sorriso da esposa”. A que elemento da paisagem é comparado o sorriso de Iracema?

Ao primeiro raio do sol que cintila entre os arrebóis da manhã.

b)   O que essa comparação revela sobre esse momento da vida de Iracema?

A comparação enfatiza a nova condição de Iracema, que nasce para uma nova vida. Ela não é mais a virgem de Tupã, ela traz agora o “primeiro sorriso da esposa”.

 

 

 

ROMANCE: CAPITÃES DE AREIA - REFORMATÓRIO - FRAGMENTO - JORGE AMADO -COM GABARITO

 Romance: Capitães de Areia – Reformatório - Fragmento

                Jorge Amado

        [...]

        No refeitório, enquanto bebiam o café aguado e mastigavam o bolachão duro, seu vizinho de mesa fala:

        – Tu é o chefe dos Capitães da Areia? – sua voz é baixíssima.

        – Sou, sim.

        – Vi teu retrato no jornal... Tu é um macho! Mas te acabaram – olha o rosto magro de Bala.

        Mastiga o bolachão. Continua:

        – Tu vai ficar aqui?

        – Vou arribar...

        – Eu também. Tenho um plano... Quando eu bater asa, posso ir pra teu grupo?

        – Pode.

        – Onde fica o buraco?

        Pedro Bala olha com desconfiança:

        – Tu encontra a gente no Campo Grande toda tarde

        – Pensa que vou dizer?

        O bedel Campos bate as mãos. Todos se levantam. Dirigem-se para as diversas oficinas ou para os terrenos cultivados.

        Pelo meio da tarde Pedro Bala vê o Sem-Pernas que passa na estrada. Vê também um bedel que o tange.

        Castigos... Castigos... É a palavra que Pedro Bala mais ouve no reformatório. Por qualquer coisa são espancados, por um nada são castigados. O ódio se acumula dentro de todos eles.

        No extremo do canavial passa um bilhete a Sem-Pernas. No outro dia encontra a corda entre as moitas de cana. Com certeza a puseram durante a noite. É um rolo de corda fina e resistente. Está novinha. No meio dela o punhal que Pedro mete nas calças. A dificuldade é levar o rolo para o dormitório. Fugir durante o dia é impossível, com a vigilância dos bedéis. Não pode levar o rolo entre a roupa, que notariam.

        De repente surge uma briga. Jeremias se joga sobre o bedel Fausto com o facão na mão. Outros meninos se atiram também, mas vem um grupo de bedéis armados de chicotes. Estão sujeitando Jeremias.

        Pedro mete o rolo de corda debaixo do paletó, abre para o dormitório. Um bedel vem descendo a escada com um revólver na mão. Pedro se esconde atrás de uma porta.

        O bedel vem rápido, passa.

        Empurra a corda para baixo do colchão, volta para o canavial. Jeremias foi levado para a cafua. Os bedéis agora juntam os meninos. Ranulfo e Campos foram em perseguição de Agostinho, que pulou a cerca na confusão da briga. O bedel Fausto, com um talho no ombro, foi para a enfermaria. O diretor está entre eles, os olhos fuzilando de raiva. Um bedel conta os meninos. Pergunta a Pedro Bala:

        – Onde estava metido?

        – Saí pra não me meter no barulho.

        O bedel o olha desconfiado, mas passa.

        Voltam Ranulfo e Campos com Agostinho. O fujão é surrado na vista de todos. Depois o diretor diz:

        – Metam-no na cafua.

        – Já está Jeremias – fala Ranulfo.

        – Ficam os dois. Assim podem conversar...

        Pedro Bala se arrepia. Como irão ficar dois na pequenez da cafua?

        Nesta noite a vigilância é grande, ele não tenta nada. Os meninos rangem os dentes de raiva.

        Duas noites depois, quando o bedel Fausto já tinha se recolhido há muito ao seu quarto de tabiques e quando todos dormiam, Pedro Bala se levantou, tirou a corda de sob o colchão. Sua cama ficava junto a uma janela. Abriu. Amarrou a corda num dos armadores de rede que existiam na parede. Deixou que a corda caísse pela janela.

        Era curta. Faltava ainda muito. Recolheu. Procurava fazer o menor barulho possível, mas assim mesmo um dos seus vizinhos de cama acordou:

        – Tu vai bater asa?

        Aquele não tinha boa fama. Costumava delatar. Por isso mesmo fora colocado ao lado de Pedro Bala. Bala puxou o punhal, mostrou a ele.

        – Olha, xereta, trata de dormir. Se tu piar, eu te abro a garganta, palavra de Pedro Bala. E se tu disser alguma coisa depois que eu sair... Tu já viu falar nos Capitães da Areia?

        – Já.

        – Pois eles me vinga.

        Põe o punhal ao alcance da mão. Recolhe completamente a corda, amarra o lençol na ponta com um daqueles nós que o Querido-de-Deus lhe ensinou. Ameaça mais uma vez o menino, joga a corda, passa o corpo pela janela, começa a descida. Ainda no meio ouve os gritos denunciadores do delator.

        [...].

AMADO, Jorge. Capitães de Areia. São Paulo: Companhia de Bolso, 2009.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 16-8.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Arribar: partir sem dizer para onde.

·        Cafua: quarto escuro onde se prendiam os alunos castigados.

·        Tabique: parede fina, geralmente de madeira.

·        Tanger: acelerar de algum modo a marcha de uma pessoa ou de um animal.

02 – Descreva o espaço onde acontecem os fatos narrados.

      Trata-se de um reformatório onde há um refeitório, oficinas, campos de cultivo, dormitório e uma cafua. Sabemos que o dormitório não fica no térreo, pois Pedro precisa de corda e lençol para alcançar o chão.

03 – O comportamento de Pedro Bala durante o diálogo no refeitório e no momento da briga revela algumas de suas características. Quais?

      Pedro Bala é bastante esperto, tem senso de oportunidade, mas também é bastante desconfiado.

04 – O trecho foi interrompido num momento decisivo da narrativa. Que momento é esse? Que perguntas nos fazemos nesse momento?

      O momento em que Pedro Bala tenta uma fuga. Perguntamo-nos se ele vai conseguir, se os gritos do companheiro de quarto despertarão os bedéis a tempo de conseguirem impedir a fuga do garoto.

05 – Levante uma hipótese de desfecho para o capítulo.

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Se deixa escorregar pela corda, salta ao chão. O pulo é grande, mas ela já salta correndo. Pula a cerca, após evitar os cachorros policiais que estão soltos. Desaba pela estrada. Tem alguns minutos de vantagem. O tempo dos bedéis se vestirem e saírem em sua perseguição e soltarem os cachorros também. Pedro Bala prede o punhal nos dentes, tira a roupa. Assim os cachorros não o conhecerão pelo faro. E nu, na madrugada fria, inicia a carreira para o sol, para a liberdade.