domingo, 22 de maio de 2022

ROMANCE: OS SERTÕES - CAPÍTULO III - EUCLIDES DA CUNHA - COM GABARITO

 Romance: OS SERTÕES – Capítulo III

                  Euclides da Cunha

        O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.

        A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das organizações atléticas.

        É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Quasímodo, reflete no aspecto a fealdade típica dos fracos. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase gigante e sinuoso, aparenta a translação de membros desarticulados. Agrava-o a postura normalmente abatida, num manifestar de displicência que lhe dá um caráter de humildade deprimente. A pé, quando parado, recosta-se invariavelmente ao primeiro umbral ou parede que encontra; a cavalo, se sofreia o animal para trocar duas palavras com um conhecido, cai logo sobre um dos estribos, descansando sobre a espenda da sela. Caminhando, mesmo a passo rápido, não traça trajetória retilínea e firme. Avança celeremente, num bambolear característico, de que parecem ser o traço `geométrico os meandros das trilhas sertanejas. E se na marcha estaca pelo motivo mais vulgar, para enrolar um cigarro, bater o isqueiro, ou travar ligeira conversa com um amigo, cai logo – cai é o termo – de cócoras, atravessando largo tempo numa posição de equilíbrio instável, em que todo o seu corpo fica suspenso pelos dedos grandes dos pés, sentado sobre os calcanhares, com uma simplicidade a um tempo ridícula e adorável.

        É o homem permanentemente fatigado.

        Reflete a preguiça invencível, a atonia muscular perene, em tudo: na palavra remorada, no gesto contrafeito, no andar desaprumado, na cadência langorosa das modinhas, na tendência constante à imobilidade e à quietude.

        Entretanto, toda esta aparência de cansaço ilude.

        Nada é mais surpreendedor do que vê-la desaparecer de improviso. Naquela organização combalida operam-se, em segundos, transmutações completas. Basta o aparecimento de qualquer incidente exigindo-lhe o desencadear das energias adormidas. O homem transfigura-se. Empertiga-se, estadeando novos relevos, novas linhas na estatura e no gesto; e a cabeça firma-se-lhe, alta, sobre os ombros possantes, aclarada pelo olhar desassombrado e forte; e corrigem-se-lhe, prestes, numa descarga nervosa instantânea, todos os efeitos do relaxamento habitual dos órgãos; e da figura vulgar do tabaréu canhestro, reponta, inesperadamente, o aspecto dominador de um titã acobreado e potente, num desdobramento surpreendente de força e agilidade extraordinárias.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Nova Cultural, 2002.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 277-9.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Acobreado: amorenado.

·        Atonia: perda de tônus; inércia.

·        Canhestro: desajeitado, torto.

·        Combalido: abalado, enfraquecido.

·        Desempeno: elegância.

·        Empertigar-se: aprumar-se, endireitar-se.

·        Espenda: parte da sela em que se apoia a coxa do cavaleiro.

·        Estadear: demonstrar, ostentar.

·        Hércules-Quasímodo: substantivo formado a partir de: Hércules (indivíduo de força incomum, assim como o herói grego) e Quasímodo (indivíduo monstruoso, feio, assim como a personagem literária).

·        Remorado: adiado.

·        Sofrear: suspender ou modificar a marcha de uma cavalgadura puxando as rédeas.

·        Tabaréu: caipira.

·        Titã: pessoa de características físicas ou morais extraordinárias.

·        Translação: movimento de um corpo em que todos os componentes se deslocam paralelamente e mantêm as mesmas distâncias entre si.

·        Umbral: local de entrada, cada uma das peças verticais que compõem as aberturas em que se encaixam portas ou janelas.

02 – Euclides da Cunha afirma: “O sertanejo é, antes de tudo, um forte”.

a)   Se, de acordo com o pensamento desse autor, o sertanejo é antes de tudo um forte, por que sua força não se revela numa observação inicial?

Porque, de acordo com o texto, suas características físicas mostrariam-no, à primeira vista, como alguém desgracioso, desengonçado. Seus gestos e sua postura indicariam uma pessoa preguiçosa, ou seja, sua presença acabaria contrariando a ideia de que ele é um forte.

b)   Considerando o texto, em que situação essa força se revelaria?

Quando aparecesse um incidente que exigisse dele algum tipo de reação. Daí sua postura e seus gestos se modificariam, ele se tornaria um gigante ágil e determinado na realização de seus intentos.

03 – A forma é fundamental na construção desse trecho. O termo “Hércules-Quasímodo” resume as ideias apresentadas pelo autor sobre aquilo que, para ele, seria a essência contraditória do sertanejo. Mas o autor não se restringe a esse termo; ele enumera diversas características para construir sua visão.

a)   Aponte no caderno algumas expressões do texto que aproximam o sertanejo de um Hércules.

Ombros possantes, olhar desassombrado e forte, aspecto dominador de um titã acobreado e potente, desdobramento surpreendente de força e agilidade extraordinárias.

b)   Aponte agora algumas expressões que o relacionam a um Quasímodo.

Desgracioso, desengonçado, torto; fealdade típica dos fracos; andar sem firmeza, sem aprumo, quase gigante e sinuoso, membros desarticulados; humildade deprimente; uma simplicidade ridícula e adorável.

04 – A descrição do sertanejo feita por Euclides da Cunha confirma ou contraria a visão que Lentz, do livro Canaã, tem do brasileiro em geral? Justifique sua resposta.

      Contraria. Lentz considera os brasileiros preguiçosos, diz que a mestiçagem é negativa. O narrador de Os sertões escreve que o sertanejo tem certo aspecto aparentemente fatigado, o que parecia confirmar a visão de Lentz, mas logo destaca a força, o aspecto dominador e ágil revelado diante de uma necessidade.

05 – A visão da personagem Lentz sobre o outro – ou seja, o diferente – é francamente negativa e preconceituosa, já que considera a mestiçagem dos brasileiros algo que os tornaria inferiores aos europeus. De outro lado, o escritor brasileiro Euclides da Cunha, ao descrever o brasileiro do sertão, enumera diversos aspectos que também demonstram a sua visão sobre o outro. Pensando nisso, responda:

a)   De acordo com o ponto de vista atual, que tipos de preconceito podem ser percebidos no discurso apresentado em Os sertões? Explique.

O autor de Os sertões, embora procure compreender o outro, baseia-se em preconceitos relacionados ao aspecto físico do sertanejo, que ele considera inferior, “desgracioso”, “desengonçado”, para construir o seu discurso.

b)   Qual a sua relação com pessoas que possuem características diferentes das suas? É difícil par você compreender essas diferenças?

Resposta pessoal do aluno.

 

ROMANCE: CANAÃ - FRAGMENTO - GRAÇA ARANHA - COM GABARITO

 Romance: Canaã – Fragmento  

                  Graça Aranha

Fragmento 1

        Milkau e Lentz caminham floresta adentro. Seguem em direção às terras onde viverão. Enquanto caminham, conversam: Lentz expõe sua visão preconceituosa e racista, Milkau, seu idealismo.

        E mudos continuavam a caminhar pela estrada coberta, os olhos de ambos a desmancharem-se de admiração.

        Passado algum tempo, Lentz exprimiu alto o que ia pensando:

        — Não é possível haver civilização neste país… A terra só por si, com esta violência, esta exuberância, é um embaraço imenso…

        — Ora, interrompeu Milkau, tu sabes bem como se tem vencido aqui a natureza, como o homem vai triunfando…

        — Mas o que se tem feito é quase nada, e ainda assim é o esforço do europeu. O homem brasileiro não é um fator do progresso: é um híbrido. E a civilização não se fará jamais nas raças inferiores. Vê a História…

        — Um dos erros dos intérpretes da História está no preconceito aristocrático com que concebem a ideia de raça. Ninguém, porém, até hoje soube definir a raça e ainda menos como se distinguem umas das outras; fazem-se sobre isto jogos de palavras, mas que são como esses desenhos de nuvens que ali vemos no alto, aparições fantásticas do nada… E, depois, qual é a raça privilegiada para que só ela seja o teatro e agente da civilização?

Fragmento 2

        Milkau e Lentz, no dia seguinte, prosseguiam a caminhada. O tema propriedade privada também evidencia a diferença de ponto de vista dos dois alemães. Milkau questiona:

        — Não seria muito mais perfeito que a terra e as suas coisas fossem propriedade de todos, sem venda, sem posse?

        — O que eu vejo é o contrário disto. É antes a venalidade de tudo, a ambição, que chama a ambição e espraia o instinto da posse. O que está hoje fora do domínio, amanhã será a presa do homem. Não acreditas que o próprio ar que escapa à nossa posse será vendido, mais tarde, nas cidades suspensas, como é hoje a terra? Não será uma nova forma da expansão da conquista e da propriedade?

        — Ou melhor, não vês a propriedade tornar-se cada dia mais coletiva, numa grande ânsia de aquisição popular, que se vai alastrando e que um dia, depois de se apossar dos jardins, dos palácios, dos museus, das estradas, se estenderá a tudo?… O sentimento da posse morrerá com a desnecessidade, com a supressão da ideia da defesa pessoal, que nele tinha o seu repouso…

        — Pois eu, ponderou Lentz, se me fixar na ideia de converter-me em colono, desejarei ir alargando o meu terreno, chamar a mim outros trabalhadores e fundar um novo núcleo, que signifique fortuna e domínio… Porque só pela riqueza ou pela força nos emanciparemos da servidão.

        — O meu quinhão de terra, explicou Milkau, será o mesmo que hoje receber; não o ampliarei; não me abandonarei à ambição, ficarei sempre alegremente reduzido à situação de um homem humilde entre gente simples. Desde que chegamos, sinto um perfeito encantamento: não é só a natureza que me seduz aqui, que me festeja, é também a suave contemplação do homem. […]

GRAÇA ARANHA. Canaã. São Paulo: Ática, 1997.

        Franz Kraus é um dos colonos do Jequitibá, lugar distante de Porto do Cachoeiro. Alguns anos após a morte de seu pai, as autoridades da região resolveram ir a sua casa exigir um inventário — soma dos bens deixados pelo falecido. Leia o trecho sobre o encontro de Kraus com essas autoridades e atente ao tipo de relação que ali se estabelece.

Fragmento 3

        — Você se chama Franz Kraus? Perguntou o mulato de cima da montaria, desdobrando uma folha de papel, que tirara do bolso.

        O colono disse que sim.

        — Pois, então, tome conhecimento disto. E desdenhoso entregou o papel ao outro.

        Kraus olhou o escrito e, como, apesar de estar no Brasil havia trinta anos, não sabia ler o português, ficou embaraçado.

        — Não posso ler… Que é?

        — Também vocês vivem aqui na terra a vida inteira e estão sempre na mesma, bradou o mulato. Venho por aqui furando este mundo, e de casa em casa sempre a mesma coisa: ninguém sabe a nossa língua… Que raça!

        O colono ficou aturdido com aquele tom insolente. Ia replicar meio encolerizado, quando o mulato continuou:

        — Pois fique sabendo que isto é um mandado de Justiça. É um mandado do juiz municipal para que vosmecê dê a inventário os bens de seu pai Augusto Kraus. Não era assim o nome dele? A audiência é amanhã, aqui, ao meio-dia… A Justiça pernoita em sua casa. Prepare do que comer… e do melhor. E os quartos… São três juízes, o Escrivão e eu, que sou o Oficial do Juízo, que também se conta.

        O colono, ouvindo falar em Justiça, tirou o chapéu submisso, e ficou como fulminado.

        […]

        Na manhã seguinte, a “colônia” estava ordenada. Kraus, vestido como nos domingos, pôs-se inquieto a andar no terreiro, espreitando a chegada dos magistrados. As mulheres, também vestidas com os seus melhores fatos, não se arredavam do trabalho da cozinha.

        […]

        — Mas, senhores, entremos… A casa é nossa em nome da Lei, disse o Juiz de Direito, encaminhando-se para dentro.

        — Mas onde está esse inventariante imbecil? Perguntou com arrogância o Promotor.

        — O sandeu fica todo este tempo a arranjar os animais e nos deixa aqui ao deus-dará, explicou o Escrivão.

        E todos passeavam pela sala com estrépito, batendo com o chicote nos móveis, ou praguejando, ou rindo das pobres estampas nas paredes, ou farejando para dentro, de onde vinha um capitoso cheiro de comida.

        […]

        Ouvindo tanto rumor, Kraus correu à sala atarantado, como se já tivesse cometido o primeiro delito, e pôs-se como um criado à espera das ordens.

        — Traga parati! Ordenou o Escrivão. Mas que seja do bom.

        O colono sumiu-se para logo voltar com uma garrafa e um cálice.

        — Não há mais copos nesta casa? Perguntou com desprezo o Escrivão.

        O colono tornou ao interior e depois reapareceu, balbuciando desculpas, e pôs em cima da mesa quatro copos.

        — Vamos a isto, meus senhores! Propôs o Promotor.

GRAÇA ARANHA, op. cit.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 273-6.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Fato: traje.

·        Sandeu: idiota, tolo.

·        Estrépito: alarido, algazarra.

·        Capitoso: estonteante.

·        Parati: aguardente, cachaça, pinga.

·        Híbrido: aquele que é fruto do cruzamento de dois progenitores de espécies ou genótipos diferentes.

·        Venalidade: condição ou qualidade do que pode ser vendido.

·        Espraiar: lançar para todos os lados.

·        Quinhão: o que cabe ou deveria caber a uma pessoa.

·        Furar: percorrer de ponta a ponta; atravessar.

·        Aturdido: atordoado.

·        Encolerizado: com raiva.

02 – No caderno, relacione as personagens Milkau (1) e Lentz (2) às características abaixo e, em seguida, identifique o trecho do texto que comprova sua resposta.

        Otimista – idealista – insubmisso – ambicioso – racista – desprendido – realista.

      Otimista: 1 – “Ou melhor, não vês a propriedade tornar-se cada dia mais coletiva, numa grande ânsia de aquisição popular”. Idealista: 1 – “Não seria muito mais perfeito que a terra e as suas coisas fossem propriedade de todos, sem venda, sem posse?”. Insubmisso: 2 – “Porque só pela riqueza ou pela força nos emanciparemos da servidão”. Ambicioso: 2 – “desejarei ir alargando o meu terreno [...] e fundar um novo núcleo, que signifique fortuna e domínio”. Racista: 2 – “O homem brasileiro não é um fator do progresso: é um híbrido. E a civilização não se fará jamais nas raças inferiores”. Desprendido: 1 – “ficarei sempre alegremente reduzido à situação de um homem humilde entre gente simples”. Realista: 2 – “que eu vejo é o contrário disto. É antes a venalidade de tudo, a ambição, que chama a ambição e espraia o instinto da posse”.

03 – Releia este trecho da fala de Lentz:

        “— Mas o que se tem feito é quase nada, e ainda assim é o esforço do europeu. O homem brasileiro não é um fator do progresso: é um híbrido. E a civilização não se fará jamais nas raças inferiores.”

Observe as informações presentes nas entrelinhas do texto:

I – O pouco que foi realizado nesta terra é obra do esforço do europeu e o homem brasileiro não é um fator de pregresso. Conclusão: o homem brasileiro não é esforçado.

II – O homem brasileiro não é um fator de pregresso porque é híbrido. Conclusão: é a mistura de raças que faz com que o homem brasileiro não seja esforçado.

Agora responda: o que torna falha, de acordo com os conhecimentos atuais, a argumentação de Lentz?

      A argumentação de Lentz é falha, de acordo com os conhecimentos científicos atuais, porque usa a características étnica de um grupo para justificar a ausência de progresso de um país.

04 – Releia as duas diferentes visões da relação do homem com a propriedade privada indicadas a seguir, levando em conta também as informações contidas nas entrelinhas, que podem ser pressupostas pela organização geral do trecho.

a)   Vamos compreender primeiro o raciocínio de Milkau: do fragmento 1, releia o trecho das linhas 9 (“Ora, interrompeu Milkau”) a 13 (“Vê a História...”). Complete então as frases a seguir em seu caderno. Segundo Milkau:

·        A propriedade se tornará coletiva à medida que a ânsia de aquisição popular se alastrar e se apossar dos jardins, palácios, museus, etc.

·        A morte do sentimento de posse se dará com a supressão da ideia de defesa pessoal.

·        Ou seja, o sentimento de posse só poderá acabar com a desnecessidade.

·        Conclusão: os conflitos acabarão quando as pessoas não precisarem mais lutar para defender o que é seu, pois todos terão o necessário.

b)   Agora, vamos acompanhar o raciocínio de Lentz. Releia o trecho do fragmento 2 das linhas 20 (“— Pois eu, ponderou”) a 24 (“nos emanciparemos da servidão”). Complete as frases em seu caderno. Segundo Lentz:

·        Sua possibilidade de ter fortuna e domínio está em alargar seu terreno e contratar outros trabalhadores, podendo, assim, fundar um novo núcleo.

·        A riqueza e a força são os únicos meios para livrar-se da servidão.

c)   Complete a frase a seguir no caderno: As ideias de Milkau diferenciam-se das de Lentz, estabelecendo uma oposição clara entre ...............

·        Crença na distribuição dos bens X ênfase no valor da propriedade privada.

·        Distribuição dos bens individuais adquiridos X ampliação das riquezas por meio da força.

·        Crença no esforço pessoal X crença na aquisição cada vez maior de terras.

05 – Releia o fragmento 3.

a)   Aponte as situações que tornam claro o abuso de poder das autoridades da cidade.

A chegada das autoridades à casa do colono, as exigências de bebida, alimento, bom tratamento. A impossibilidade de defesa ou contestação do colono.

b)   Por que, nessa relação, fica evidente o despreparo das autoridades para o exercício de seus cargos?

Eles claramente abusam do poder que têm. Usam o cargo para obter vantagens e não para atender às demandas do estado ou mesmo dos colonos.

 

 

TIRA: VÁ PENTEAR MACACOS! - FERNANDO GONZALES - ORAÇÃO SUBORDINADA SUBSTANTIVA - COM GABARITO

 Tira: Vá pentear macacos!

Fonte da imagem - https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh_uq-ZLnTtm6nhP9AmG19iejgZltzYUgwFbc_jqWQMvJIH0luy4JKTeZ2x28PhrxiLpgtRO8OrWm0jebHN44rf7XedXQEhCny4uGQdsypYS4Ge9diS6spAhBghML_xuNK2ixoiVsbgEm7YL-CXGR6UxXthNl2dO2nQtsU16uVni8O_vxz6hRvq5ZDm/s320/macacos.jpg

GONZALES, Fernando. Níquel Náusea – Vá pentear macacos! São Paulo: Devir, 2004.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 259.

Entendendo a tira:

01 – A que informação anterior se refere a oração principal “Sei” do primeiro quadrinho?

      Refere-se à informação “Eu não sou trouxa!”.

02 – Qual a classificação da oração subordinada substantiva “que você jogou carne com remédio”?

      Objetiva direta.

03 – Se o cachorro sabia que a carne tinha sonífero, por que a comeu?

      Resposta pessoal do aluno.

 

ROMANCE: AMOR DE PERDIÇÃO - CAPÍTULO IV - CAMILO CASTELO BRANCO - COM GABARITO

 Romance: Amor de perdição Capítulo IV

                  Camilo Castelo Branco

        [...]

        Ao romper d’alva, dum domingo de Junho de 1803, foi Teresa chamada para ir com seu pai à primeira missa da igreja paroquial. Vestiu-se a menina assustada, e encontrou o velho na antecâmara a recebe-la com muito agrado, perguntando-lhe se ela se erguia de bons humores para dar ao autor de seus dias um resto de velhice feliz. O silencio de Teresa era interrogador.

        — Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltazar, minha filha. É preciso que te deixes cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que deres este passo difícil, conhecerás que a tua felicidade é daquelas que precisam ser impostas pela violência. Mas repara, minha querida filha, que a violência dum pai é sempre amor. Amor tem sido a minha condescendência e brandura para contigo. Outro teria subjugado a tua desobediência com maus-tratos, com os rigores do convento, e talvez com o desfalque do teu grande patrimônio. Eu, não. Esperei que o tempo te aclarasse o juízo, e felicito-me de te julgar desassombrada do diabólico prestígio do maldito, que acordou o teu inocente coração. Não te consultei outra vez sobre este casamento, por temer que a reflexão fizesse mal ao zelo de boa filha com que tu vais abraçar teu pai, e agradecer-lhe a prudência com que ele respeitou o teu gênio, velando sempre a hora de te encontrar digna do seu amor.

        Teresa não desfitou os olhos do pai; mas tão abstraída estava, que escassamente lhe ouviu as primeiras palavras, e nada das últimas.

        — Não me respondes, Teresa?! – tornou Tadeu, tomando-lhe cariciosamente as mãos.

        — Que hei de eu responder-lhe, meu pai? — balbuciou ela.

        — Dá-me o que te peço? Enches de contentamento os poucos dias que me restam?

        — E será o pai feliz com o meu sacrifício?

        — Não digas sacrifício, Teresa... Amanhã a estas horas verás que transfiguração se fez na tua alma. Teu primo é um composto de todas as virtudes; nem a qualidade de ser um gentil moço lhe falta, como se a riqueza, a ciência e as virtudes não bastassem a formar um marido excelente.

        — E ele quer-me depois de eu me ter negado? — disse ela com amargura irônica.

        — Se ele está apaixonado, filha!... e tem bastante confiança em si para crer que tu hás de ama-lo muito!...

        — E não será mais certo odiá-lo eu sempre!? Eu agora mesmo o abomino como nunca pensei que se pudesse abominar! Meu pai... — continuou ela, chorando, com as mãos erguidas — mate-me; mas não me force a casar com meu primo! É escusada a violência, porque eu não caso!

        Tadeu mudou de aspecto, e disse irado:

        — Hás de casar! Quero que cases! Quero!... Quando não, amaldiçoada serás para sempre, Teresa! Morrerás num convento! Esta casa irá para teu primo! Nenhum infame há de aqui pôr pé nas alcatifas de meus avós. Se és uma alma vil, não me pertences, não és minha filha, não podes herdar apelidos honrosos, que foram pela primeira vez insultados pelo pai desse miserável que tu amas! Maldita sejas! Entra nesse quarto, e espera que daí te arranquem para outro, onde não verás um raio de sol.

        Teresa ergueu-se sem lágrimas, e entrou serenamente no seu quarto.

        [...].

CASTELO BRANCO, Camilo. Op. cit.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 39-40.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Abstraído: distraído.

·        Alcatifa: tapete.

·        Desassombrado: serenado; livre de susto, de receio.

·        Escusado: justificado, perdoável.

·        Irado: furioso, enraivecido.

·        Velar: estar alerta, vigiar.

02 – Como era, provavelmente, o tom de voz de Tadeu Albuquerque em sua primeira fala à filha? Copie no caderno alguns termos ou expressões do trecho que o(a) levaram a essa conclusão.

      Provavelmente era um tom de voz calmo, amável: “Encontrou o velho na antecâmara a recebe-la com muito agrado”, “minha querida filha”, “A violência de um pai é sempre amor”, “Amor tem sido a minha condescendência e brandura para contigo”, etc.

03 – Ao expressar-se dessa maneira, o pai esperava de Teresa uma resposta positiva a seu pedido. Destaque alguns dos argumentos usados nessa primeira fala para convencer a filha a casar-se com o primo.

      “A tua felicidade é daquelas que precisam ser impostas pela violência”, “Outro teria subjugado a tua desobediência com maus tratos, com os rigores do convento, e talvez com o desfalque do teu grande patrimônio. Eu, não. Esperei que o tempo te aclarasse o juízo”, etc.

04 – Em que momento do diálogo o tom de voz de Tadeu possivelmente começa a se alterar?

      Possivelmente após Teresa perguntar a ele se conseguirá ser feliz com seu sacrifício.

05 – Em que fala o pai de Teresa se mostra irado? E como costuma ser a fala de alguém que está irado?

      Na última fala (penúltimo parágrafo). É provável que uma pessoa irada fale em voz alta, em tom ameaçador, com impetuosidade, etc.

06 – Você imagina que a voz de Teresa tenha se alterado ao longo do diálogo? Por quê?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Não, porque na época da narrativa, os filhos deviam obediência total ao pai, principalmente as filhas. Assim sendo, a Teresa mesmo sob forte emoção, não ousou alterar o tom de voz.

07 – Agora forme dupla com um colega e preparem a representação do diálogo entre Tadeu Albuquerque e Teresa para apresentar à sala.

      Resposta pessoal do aluno.

ROMANCE: AMOR DE PERDIÇÃO - CAPÍTULO II - CAMILO CASTELO BRANCO - COM GABARITO

 Romance: Amor de perdição Capítulo II

                Camilo Castelo Branco 

        [...] 

        No espaço de três meses fez-se maravilhosa mudança nos costumes de Simão. As companhias da relé desprezou-as. Saía de casa raras vezes, ou só, ou com a irmã mais nova, sua predileta. O campo, as árvores e os sítios mais sombrios e ermos eram o seu recreio. Nas doces noites de estio demorava-se por fora até ao repontar da alva. Aqueles que assim o viam admiravam-lhe o ar cismador e o recolhimento que o sequestrava da vida vulgar. Em casa encerrava-se no seu quarto, e saía quando o chamavam para a mesa. 

        D. Rita pasmava da transfiguração, e o marido, bem convencido dela, ao fim de cinco meses, consentiu que seu filho lhe dirigisse a palavra. 

        Simão Botelho amava. Aí está uma palavra única, explicando o que parecia absurda reforma aos dezessete anos. 

        Amava Simão uma sua vizinha, menina de quinze anos, rica herdeira, regularmente bonita e bem-nascida. Da janela do seu quarto é que ele a vira pela primeira vez, para amá-la sempre. Não ficara ela incólume da ferida que fizera no coração do vizinho: amou-o também, e com mais seriedade que a usual nos seus anos. 

        Os poetas cansam-nos a paciência a falarem do amor da mulher aos quinze anos, como paixão perigosa, única e inflexível. Alguns prosadores de romances dizem o mesmo. Enganam-se ambos. O amor dos quinze anos é uma brincadeira; é a última manifestação do amor às bonecas; é a tentativa da avezinha que ensaia o voo fora do ninho, sempre com os olhos fitos na ave-mãe, que a está de fronte próxima chamando: tanto sabe a primeira o que é amar muito, como a segunda o que é voar para longe. 

        Teresa de Albuquerque devia ser, porventura, uma exceção no seu amor. 

        O magistrado e sua família eram odiosos ao pai de Teresa, por motivo de litígios, em que Domingos Botelho lhe deu sentenças contra. Afora isso, ainda no ano anterior dois criados de Tadeu de Albuquerque tinham sido feridos na celebrada pancadaria da fonte. É, pois, evidente que o amor de Teresa, declinando de si o dever de obtemperar e sacrificar-se ao justo azedume de seu pai, era verdadeiro e forte. 

        [...] 

CASTELO BRANCO, Camilo. Amor de perdição. São Paulo: Ática, 2001.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 37-8.

Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Alva: primeira claridade da manhã. 

·        Cismador: pensativo. 

·        Declinar: eximir-se, recusar. 

·        Ermo: deserto. 

·        Estio: verão. 

·        Incólume: ileso, livre de dano ou perigo. 

·        Litígio: questão judicial. 

·        Obtemperar: obedecer, pôr-se de acordo. 

·        Pasmar: admirar-se de algo. 

·        Relé: ralé; a camada mais baixa da sociedade. 

·        Transfiguração: transformação na maneira de pensar e proceder. 

02 – Segundo o texto, que grande transformação o amor provocou em Simão? 

      Simão deixou de ser um rapaz intempestivo e baderneiro e passou a se dedicar a seus pensamentos, a seus afazeres pessoais. Passava mais tempo em casa, quando saía, ia a lugares mais calmos. 

03 – O que essa alteração de comportamento revela sobre o novo estado de espírito de Simão? 

      Simão encontra-se enamorado; seus pensamentos são totalmente ocupados pela pessoa que motiva esse sentimento. Tal é o seu estado de paixão que nenhuma outra sensação consegue distraí-lo. 

04 – Leia: 

        "[...] O campo, as árvores e os sítios mais sombrios e ermos eram o seu recreio. Nas doces noites de estio demorava-se por fora até ao repontar da alva. [...]" 

        O espaço é fundamental em uma narrativa não só porque determina muitas das ações das personagens, mas porque pode revelar seu estado de espírito. Por que os novos espaços por onde circula Simão são coerentes com sua transformação? 

      Porque são espaços de recolhimento, de solidão, apropriados à vivência de um sentimento intenso, que modifica e arrebata a personagem. 

05 – Explique o que é, segundo o narrador, o amor dos 15 anos. 

      É uma brincadeira que se pode realizar em segurança.

06 – Por que Teresa de Albuquerque é uma exceção em seu amor? 

      Porque a paixão que ela sente em hipótese alguma pode ser vivida em segurança, uma vez que a sua família e inimiga da de seu amado. Trata-se, portanto, de um sentimento arriscado, de uma ousadia.