quarta-feira, 8 de maio de 2024

CRÔNICA: O SILÊNCIO DO ROUXINOL(FRAGMENTO) - JEAN-CLAUDE CARRIÉRE - COM GABARITO

 Crônica: O silêncio do rouxinol (Fragmento)

                Jean-Claude Carriére

                   [...]

 Na época de Salomão, o melhor dos reis, um homem comprou um rouxinol que possuía uma voz excepcional. Colocou-o numa gaiola em que nada faltava ao pássaro e na qual ele cantava, horas a fio, para encanto da vizinhança.

 

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjcFG8ftLzpQZv30CA8RaCTzTf2tD7grlqb5Gh2rBH10o0xsKvIstelkx_V16qt-ZiRJJWneWI62a3mg6fU8YnmHel7tXBxsWMDYf27K73KOjMPEFxC0a6gWUCNFbbokwLw8QfuNIzyf_XcERYEpWMjH1_wJZ7ywm3FZ3rhli9EMxoVy5zg8V7QfsaS2tQ/s320/ROUXINOL.jpg 

 Certo dia, em que a gaiola havia sido transportada para uma varanda, outro pássaro se aproximou, disse qualquer coisa ao rouxinol e voou. A partir desse momento, o incomparável rouxinol emudeceu.

 Desesperado, o homem levou seu pássaro à presença do profeta Salomão, que conhecia a linguagem dos animais, e lhe pediu que perguntasse ao pássaro o motivo de seu silêncio.

                   O rouxinol disse a Salomão:

  – Antigamente eu não conhecia nem caçador, nem gaiola. Depois me apresentaram a uma armadilha, com uma isca bem apetitosa, e caí nela, levado pelo meu desejo. O caçador de pássaros levou-me, vendeu-me no mercado, longe da minha família, e fui parar na gaiola deste homem que aí está. Comecei a me lamentar noite e dia, lamentos que este homem tomava por cantos de gratidão e alegria. Até o dia em que outro pássaro veio me dizer: ―Pare de chorar, porque é por causa dos seus gemidos que eles o mantêm nessa gaiola‖. Então, decidi me calar.

  Salomão traduziu essas poucas frases para o proprietário do pássaro. O homem se perguntou: ―De que adianta manter preso um rouxinol, se ele não canta?‖. E lhe devolveu a liberdade.

 CARRIÈRE. Jean-Claude. O círculo dos mentirosos: contos filosóficos do mundo inteiro. São Paulo: Códex, 2004.

 

Entendendo o texto

01. Qual é o motivo pelo qual o rouxinol parou de cantar na história?

a) Ele ficou doente.

b) Ele foi ameaçado por outro pássaro.

c) Ele foi vendido em um mercado.

d) Ele foi capturado por um caçador.

02. Quem foi o personagem que conhecia a linguagem dos animais e ajudou a entender o motivo do silêncio do rouxinol?

      a) O rei Salomão.

b) O profeta Elias.

c) O caçador.

d) O vendedor do mercado.

03. Por que o rouxinol decidiu parar de cantar na gaiola?

a) Ele estava doente e não conseguia mais cantar.

b) Ele descobriu que seus gemidos eram interpretados como cantos de gratidão.

c) Ele estava assustado com os outros pássaros na gaiola.

d) Ele não gostava do ambiente da gaiola.

04. Qual foi a reação do proprietário do rouxinol ao descobrir que o pássaro não cantava na gaiola?

a) Ele decidiu mantê-lo preso para sempre.

b) Ele devolveu a liberdade ao rouxinol.

c) Ele tentou ensinar o rouxinol a cantar novamente.

d) Ele levou o rouxinol de volta ao mercado.

05. O que o rouxinol aprendeu após ser informado por outro pássaro?

a) A arte de cantar melodias novas.

b) Que sua liberdade era mais importante do que seu canto. c) Como construir uma nova gaiola.

d) A dançar com outros pássaros.

   06.  Identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa.

          No texto, o que gera o conflito da narrativa é o fato de o rouxinol    

          a. calar-se após receber a visita de outro pássaro.

          b. possuir uma voz excepcional.

          c. encantar a vizinhança com sua música.

         d. ser transportado para uma varanda.

 

 

ARTIGO DE OPINIÃO: RESGATAR O RESPEITO AOS MAIS VELHOS (FRAG)- FLÁVIO GIKOVATE - COM GABARITO

 Artigo de Opinião: Resgatar o respeito aos mais velhos

 

[...] Nos últimos 50 anos temos vivido uma fase de rápidas e importantes transformações na nossa vida prática graças aos significativos avanços da ciência e da tecnologia. Ao menos em seus aspectos externos, o mundo está muito diferente do que era até o início deste século. Esses progressos práticos trouxeram vários problemas para as pessoas mais velhas. O primeiro é o surgimento mais claro de uma tendência conservadora que todos temos. Pessoas de mais idade não veem com bons olhos as novidades: ou não se adaptam a elas, ou o fazem muito lentamente. Afinal de contas, viveram tantas décadas sem um dado equipamento que não o acham tão necessário. Eu mesmo, que ainda não estou tão velho, tenho grande resistência aos novos equipamentos eletrônicos.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh7GQ8IT7CB8qpfQOnafhJrLP0AFGLW3cpUygZuI8jO421r8iQ8n3mrz9BRd09PGJ6y0LrebRSgf_BsV1umW6Kz19uSu4O3U5Wr1G_FqvhvzA2-yY-UA3ZjkDGmx223PZutJBPSQBeDvX4ic7rzf37-7EU9Yq1puMIVfJs4d1F138RF5F2lm4ajl_nmTzA/s320/IDOSO.jpg


Mas, a consequência mais grave desse avanço rápido foi a ideia de que as pessoas mais velhas não podem acompanhá-lo, nem mesmo do ponto de vista intelectual. Há uns vinte anos atendi uma senhora de idade. Ela me olhou e disse: “Que bom que o senhor é jovem. Não gosto de médicos mais velhos porque estão desatualizados”. Ou seja, os próprios idosos passaram a achar que toda a luz e sabedoria estavam com os jovens. Isso trouxe vários desdobramentos, todos eles negativos, do meu ponto de vista. Os jovens passaram a se achar muito sábios. Perderam a capacidade de serem “discípulos” porque não tinham mais condições de ver os mais velhos como “mestres”. Não estavam — e não estão — preparados para isso nem intelectualmente, nem emocionalmente. Um jovem deveria ter alguém mais velho com quem se aconselhar, até para aliviar o peso da responsabilidade que recai sobre suas costas.

O subproduto mais grave disso foi a tendência de relegarmos às pessoas mais idosas um papel menor, desprezível mesmo. Nossos velhos passaram a ser vistos como um fardo a ser carregado, como pessoas inúteis e chatas. Afinal de contas, não sabem nem mesmo como é bom navegar na internet! Estão fora da realidade. Não têm nada a nos ensinar. Assim, perderam o direito de serem tratados com o respeito e a reverência que eram dedicados aos idosos em outros tempos.

[...] Eram respeitados, tratados por senhor e senhora; os filhos e netos lhes beijavam a mão e pediam a bênção. Esse tratamento diferenciado e reverente dava sentido e importância para este período dificílimo da vida. O velho [...] tem que assistir à própria decadência física e, às vezes, intelectual. O respeito e a admiração dos mais novos eram um pequeno alimento para a vaidade das pessoas nessa fase — vaidade abalada por todos esses fatores inerentes à idade. A verdade é que a velhice sem essas pequenas honrarias se torna [...] triste e dolorosa.

Acho que hoje já podemos fazer uma avaliação crítica dos tempos modernos. Já podemos dar o devido peso ao progresso técnico e às vantagens que ele nos trouxe. Já sabemos que as belas máquinas não resolvem nossas questões íntimas mais importantes. Já sabemos que as vivências e as experiências acumuladas ao longo das décadas valem mais do que elas. Já podemos, pois, voltar a olhar para as pessoas mais velhas não como um estorvo e sim como criaturas com quem podemos aprender muitas coisas. Se isso acontecer, penso que os idosos também tenderão a voltar a valorizar sua condição e sua experiência. Sim, porque, hoje, muitos velhos só pensam em como conseguir manter a aparência típica da mocidade. Vão atrás de cirurgias plásticas [...] e outros recursos tecnológicos para adiar o máximo possível a chegada dessa fase da vida, que deveria ser rica em reflexões e filosofia e livre de disputas e competições.

Disponível em: http://flaviogikovate.com.br/resgatar-o-respeito-aos-mais-velhos/

 Entendendo o texto

 01. Qual é a tese do texto? Justifique sua resposta.

A tese do texto é que a sociedade moderna tende a menosprezar e desvalorizar os idosos, especialmente devido ao rápido avanço da tecnologia e à ideia equivocada de que os mais velhos são incapazes de acompanhar o progresso. O autor defende a importância de resgatar o respeito e a reverência pelos mais velhos, valorizando suas experiências e sabedoria acumulada ao longo da vida.

02. O autor fala das mudanças ocorridas nos últimos 50 anos e como as mesmas não parecem acessíveis às pessoas mais velhas. Quais são as limitações que os idosos enfrentam em relação à tecnologia?

Os idosos enfrentam dificuldades em se adaptar à rápida evolução tecnológica devido a uma combinação de fatores como falta de familiaridade com novos equipamentos, menor flexibilidade mental para aprender novos sistemas e interfaces, e possíveis barreiras físicas (como visão e destreza). Além disso, muitos não veem a necessidade imediata de adotar essas tecnologias por terem vivido a maior parte de suas vidas sem elas.

03. Você concorda com a posição do autor? Refletindo sobre a atualidade e a rotina, você acredita que é possível viver sem nenhum objeto ou serviço resultante da tecnologia?

Embora seja possível viver sem certos objetos ou serviços tecnológicos, a integração da tecnologia em nossas vidas modernas é inevitável e traz muitos benefícios. No entanto, é essencial considerar como introduzir essas mudanças de forma inclusiva, respeitando as diferentes experiências e ritmos de aprendizado das pessoas mais velhas.

04. O trecho "[...] Um jovem deveria ter alguém mais velho com quem se aconselhar, até para aliviar o peso da responsabilidade [...]" é um dos argumentos utilizados pelo autor para sustentar sua tese. Qual(is) outro(s) argumento(s) ele usa?

Outro argumento utilizado pelo autor é o impacto negativo que a desvalorização dos mais velhos causa tanto nos mais jovens, privando-os da oportunidade de aprender com a sabedoria acumulada, quanto nos próprios idosos, que perdem sua dignidade e importância na sociedade.

05. "O autor traz a polêmica entre a valorização da experiência dos mais velhos e o olhar para os idosos como estorvo". Copie do texto um trecho que confirme esta afirmação.

"Nossos velhos passaram a ser vistos como um fardo a ser carregado, como pessoas inúteis e chatas."

06. Releia o 4º parágrafo. Nele autor retrata um comportamento dos jovens em relação aos idosos, que já foi usual e hoje parece obsoleto. De acordo com suas vivências e conhecimento prévio, levante hipóteses que expliquem como a tecnologia pode ter influenciado essa mudança.

A influência da tecnologia pode ter levado os jovens a confiar mais em fontes de informação instantâneas e contemporâneas, desvalorizando as experiências acumuladas ao longo do tempo. Além disso, a predominância das redes sociais e das interações online pode ter diminuído a valorização das relações interpessoais face a face, incluindo aquelas com os mais velhos.

07. Quais tecnologias da informação você acredita que são mais complicadas para as pessoas da 3ª idade? Na sua opinião, como é ser um idoso em 2017?

As tecnologias da informação que envolvem interfaces complexas, como smartphones e computadores, podem ser mais desafiadoras para os idosos devido à necessidade de habilidades técnicas e visuais específicas.

08. Ser um idoso em 2017 provavelmente envolve lidar com uma rápida mudança na sociedade, especialmente em termos de comunicação e acesso à informação, o que pode ser tanto estimulante quanto desafiador.

          Você concorda com o autor em relação a que? Justifique.

          Concordo com o autor em relação à importância de valorizar e respeitar os idosos como detentores de sabedoria e experiência valiosas. É essencial reconhecer que o progresso tecnológico não deve descartar ou marginalizar as contribuições e a dignidade das pessoas mais velhas.

09. Após a leitura do texto e levantamento de hipóteses em relação ao tema, escreva um parágrafo expondo sua opinião sobre a importância da relação entre jovens e idosos.

A relação entre jovens e idosos é crucial para uma sociedade saudável e equilibrada. Os mais velhos têm o potencial de transmitir conhecimentos valiosos e perspectivas únicas, enquanto os mais jovens podem oferecer energia e novas ideias. É importante cultivar um ambiente em que ambos os grupos se respeitem mutuamente, compartilhando experiências e aprendendo uns com os outros. Esta troca intergeracional não apenas enriquece a vida individual, mas também fortalece o tecido social, promovendo uma comunidade mais inclusiva e solidária.

 

POEMA: RECEITA DE ESPANTAR A TRISTEZA - ROSEANA MURRAY - COM GABARITO

  Poema: Receita de espantar a tristeza

                Roseana Murray

Faça uma careta

E mande a tristeza

Para longe, pro outro lado

Do mar ou da lua.

 

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgg9qYyjrJM06GwZEJo-ChcRCpOK0YvNV5h6b5zauaIT3fQDw7g2HgidJrj6RE0NEQcL_y7Z_Qfxu2_UtOOmSCeAYxT-xoBQSy5gq0Wu6dykDGbnb6-WI5SMp3jLR9Qx6PKIGISQ5Al17W7VcNmMMYiYC6i7wqI67byE0aEz-ET2y-qt1sPsrxxocMnLjU/s320/careta.png

Vá para o meio da rua

E plante bananeira

Faça alguma besteira.

 

Depois estique os braços

Apanhe a primeira estrela

E procure o melhor amigo

Para um longo e apertado abraço.


           
Roseana Murray. Receitas de olhar. São Paulo: FTD, 1997.

Entendendo o texto
 01. Os versos do poema que expressam o significado da expressão “espantar a tristeza”, presente no título do texto, é:

        a - ”Vá para o meio da rua

             E plante bananeira”.

        b - “Depois estique os braços

             Apanhe a primeira estrela”.

        c - “E mande a tristeza

            Pra longe, pro outro lado”.

        d - ”E procure o melhor amigo

            Para um longo e apertado abraço”.

  02. O que o poema sugere que você faça para espantar a tristeza?

       a) Ficar sozinho em casa.

       b) Fazer uma careta e mandar a tristeza para longe.

       c) Ir para a cama e dormir.

       d) Ficar quieto e esperar a tristeza passar.

   03. Onde o poema sugere que a tristeza seja mandada?

        a) Para o mar ou para a lua.

        b) Para o jardim.

        c) Para a cidade.

        d) Para o coração.

      04. O que você deve fazer após mandar a tristeza embora?  

        a) Chorar ainda mais.

        b) Ficar quieto e esperar.

        c) Ir para a rua e plantar bananeira.

        d) Ir para a cama e dormir.

    05. Que ação é sugerida após plantar bananeira?

          a) Ficar parado.

          b) Fazer alguma besteira.

          c) Telefonar para um amigo.

          d) Ler um livro.

   06. Qual é o último passo da "receita" para espantar a tristeza?

         a) Procurar um desconhecido.

         b) Pegar uma estrela e abraçá-la.

         c) Ficar em casa sozinho.

         d) Procurar o melhor amigo para um abraço.

 

 

CRÔNICA: LOUCURAS DE VERÃO - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: Loucuras de Verão

                Walcyr Carrasco  

 Há duas maneiras de conhecer bem uma pessoa. A primeira é casar. A segunda é viajar junto. Ou pelo menos observar seu comportamento nas férias. Todas as loucuras afloram como cogumelo. Um grupo de amigos trintões alugou uma casa em Camburi, no litoral norte. Arrumaram as malas inundados de felicidade. Pretendiam fortalecer a amizade de anos. Fizeram compras. Cada um levou ainda petiscos variados. O mais madrugador acordou com o canto do galo — sim, no litoral norte ainda há galo cantando, embora não se saiba por quanto tempo. Fez café. Abriu a geladeira, repleta. Escolheu um potinho de patê. Passou no pão e olhou pela janela para contemplar a natureza. Mordeu. O gosto era estranho. Nada que pudesse identificar. Tentou ler a embalagem, em inglês.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhukYOWbSjCyY5pdhn9_6bM9j8XjGSwrw2NMmT2uZbp0LkqSsAoOX81UA0uOm9ka_TAWsXduJBoVaALG3gOx2l34_mgrDnQtZU5wbRkWWCTJKBQ6AOz_5p8jcE8ret7dum93fQ_A7QuyMJq3DKwrlVKI-ynRMGgFWGg9t8w7ezIdskFoR0RuGuLBMAbeOM/s320/camburi.jpeg


— É alguma espécie de creme. Mas do quê? — preocupou-se.

Mordeu de novo. Ouviu-se um grito, Do alto da escada Marcolino, um alto executivo, se desesperava:

-— Largue meu creme rejuvenescedor!

Fórmula importada, caríssima. O outro havia passado quase o pote todo no pão. Um teve dor de estômago. O outro, no bolso. Pior: a geladeira estava repleta de produtos de beleza, e a comida, de fora. Até camarão estava estragando. Deu briga. O vaidoso mudou-se para um hotel. Nem se falam mais.

Minha amiga Lalá é outra que sabe surpreender. Passou meses planejando sua estada nas areias quentes. Quinze dias antes iniciou um tratamento rejuvenescedor à base de ácido retinóico. Mal chegamos à praia da Baleia, avisou:

— Não posso tomar sol.

— E a praia? E o mar?

— Estou gorda para pôr maio. Passear na praia, só de chapéu e protetor solar 45.

Claro que no dia seguinte esqueceu chapéu e protetor. Quinze minutos depois estourou uma bolha no rosto. Saiu correndo antes que a pele derretesse como em um daqueles filmes de terror. A noite parecia um torresmo.

— Por que começar um tratamento desses justamente no verão?

— Você não compreende — ela rosnou.

Quem entende? É incrível o número de pessoas que correm para a praia e passam o tempo todo se escondendo do sol.

Há um lado do paulistano que só surge no verão. Ele se torna, por assim dizer, mais... carioca! Tão correto em sua agenda, perde a exatidão nas férias. Como se o descompromisso fosse essencial nas férias. Já não suporto mais quando telefonam:

— Olha, viemos fazer umas compras, depois vamos comer alguma coisa e aí a gente passa na sua casa.

Observo o sol lá fora. O mar deve estar uma delícia. Devo ficar de plantão?

— Mais ou menos a que horas?

— Lá pelas 4 ou 5. Talvez 6 ou 7.

Suspiro fundo. Pego um livro. Duas páginas depois, adormeço. Acordo com a noite escura e o telefone chamando.

— Oi, tudo bem? O restaurante estava cheio, ficamos exaustos. Voltamos para casa. Não vai dar mais para passar aí. Acho que amanhã de manhã, lá pelas 10...

Começo a rugir. Meus amigos reclamam. Dizem que ando mal-humorado. Mas há vantagens. Eu também me transformo quando vou ao litoral. Viro um paranormal. Minha intuição fica exacerbada, principalmente no tocante à comida. Tenho uma intuição precisa. Se vou visitar alguém, chego sempre na hora do almoço. Em férias os hábitos mudam muito. Mesmo assim nunca perco uma visita.

Bato na porta e sinto o aroma da carne grelhada. Entro com ar surpreso.

— Ih... cheguei na hora certa!

As pessoas sorriem. Na praia ficam mais hospitaleiras. Às vezes alguém comenta:

— Qualquer hora dessas a gente precisa ir almoçar na sua casa.

Quase engasgo com uma folha de alface.

— E, sim. A gente marca.

Espeto o garfo numa fatia de picanha e mudo de assunto.

Como disse, nada melhor para conhecer uma pessoa do que vê-la em férias. A praia faz aflorar, inevitavelmente, meu lado bicão. 

Entendendo o texto

01. O que motivou os amigos trintões a alugarem uma casa em Camburi?

a. Fortalecer a amizade.

b. Fazer compras.

c. Evitar o sol.

d. Conhecer a região.

02. Qual foi a reação de Marcolino ao descobrir que seu creme rejuvenescedor foi usado?

a. Ficou com dor de estômago.

b. Mudou-se para outro país.

c. Gritou desesperadamente.

d. Ignorou o acontecimento.

03. Por que Lalá não pôde aproveitar o sol na praia da Baleia?

a. Estava chovendo.

b. Tinha medo do mar.

c. Estava em tratamento rejuvenescedor.

d. Esqueceu o protetor solar.

04. O que Lalá esqueceu no dia seguinte após avisar que não podia tomar sol?

a. Óculos de sol.

b. Protetor solar.

c. Bolsa de praia.

d. Toalha de banho.

05. Qual característica o autor atribui aos paulistanos no verão?  a. Tornam-se mais caseiros.

b.  Ficam mais descontraídos.

c. Trabalham mais horas.

d. Evitam atividades ao ar livre.

06. O que o narrador acha do comportamento de seus amigos quando marcam visitas durante as férias?

a. Acha divertido.

b. Fica impaciente.

c. Admira a organização deles.

d. Não se importa com os atrasos.

07. Como o narrador descreve sua intuição em relação à comida durante as férias?

a.  Fica menos confiável.

b.  Fica mais confiável.

c.  Desaparece completamente.

d. Não faz diferença.

08. O que o narrador sente ao entrar na casa de amigos na hora do almoço durante as férias?

a. Fome.

b. Felicidade.

c. Surpresa.

d. Raiva.

09. O que o narrador sente ao ouvir alguém sugerir um almoço em sua casa durante as férias?

a. Fica entusiasmado.

b. Fica constrangido.

c. Fica indiferente.

d. Fica com medo.

10. Qual é o principal efeito das férias na personalidade do narrador?

a. Fica mais tímido.

b. Torna-se mais extrovertido.

c. Torna-se menos comunicativo.

d. Fica mais estressado.

 

terça-feira, 7 de maio de 2024

CRÔNICA: PEQUENAS VIRTUDES - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: Pequenas Virtudes

                Walcyr Carrasco

 Aceno desesperadamente para um táxi. É final de tarde. Estou próximo da avenida da Liberdade. Tenho os braços sobrecarregados com vários pacotes, contendo quimonos, doces de feijão, molho de soja, peixes secos e outros quitutes orientais. O carro estaciona. Atiro tudo no banco de trás e sento no da frente. Dou o endereço. O melhor caminho seria à esquerda. Ele entra à direita.

 

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjE4VlOVmeYZLBowQxTo0cMLHwdvBMnvY1GR83u3fbRNG_pYq6_JkoZLEKQHQIzXtWFz7zP6kTqhNYyign4W4RMq-Y5DaaOFmE6wxtZFtztGf_0YWPMBohwcdp-cFYEuen9ePiUxmHykJ9TamDvELhJi0-8isw48-D7vjom3eooAik87DiV5_yHG9SZQZQ/s1600/liberdade.jpg 

Suspiro. Decido não reclamar. Como discutir e descer no trânsito caótico, com aquela tralha toda? Sinto raiva. Para minha surpresa, ao entrar na avenida, o motorista se surpreende.

— Pensei que pudesse virar aqui. Eu me confundi.

—: Tudo bem — respondo, mal-humorado.

         Ele desliga o taxímetro. Não entendo.    

— Que aconteceu?

— Eu errei o caminho. O senhor só paga a partir do lugar certo.

Protestei. Ele insistiu. A situação se inverteu: eu brigando para pagar, ele dizendo que não. Rodou vários quarteirões. Ligou exatamente onde estaria se tivesse entrado à esquerda e não à direita. Quando desci, ainda me ajudou a carregar os pacotes.

         Estou surpreso até agora.     

Conservo também uma sensação de bem-estar. Verdade seja dita. Algo de bom anda acontecendo. Ainda ouço histórias sobre pessoas que desembarcam na rodoviária e caem nas mãos de motoristas desonestos, capazes de rodar horas a fio para depenar o passageiro. Mas a categoria dos taxistas tem melhorado. Raramente pego um que queira inventar caminho. Lembro até hoje de um táxi que tomei, na época das compras de Natal, há poucos anos. Quando cheguei, o motorista queria bem mais do que o valor da corrida. Brigou porque eu estava cheio de pacotes e me ameaçou quando me recusei a pagar o extra. .Ultimamente, não tenho visto acontecer esse tipo de coisa. A honestidade parece despontar em lugares inesperados. Recentemente, estava na fila do caixa de uma grande locadora. À minha frente, um cliente mostrou dois filmes ao atendente. Pediu a opinião. O rapaz foi sincero.

— Este aqui é muito ruim. E óbvio.

Seguiu-se uma pequena conversa. Ao final, o cliente levou o vídeo. Era o gênero que desejava. Podem argumentar que a locadora treina seus caixas. Mas em outra, muito menor, sempre me aconteceu o mesmo. Clodô, misto de gerente, caixa e supervisor artístico, me advertia:

         — Muito chato. Este é melhor.       

Nem sempre o meu gosto artístico coincidia. Clodô tinha um fraco por filmes de ação. Muitas vezes acabei diante de metralhadoras enfurecidas, agentes de espionagem rodopiando com carros, serial killers esfaqueando donas-de-casa em cozinhas anti-sépticas. A intenção, porém, é o que conta. Esses pequenos toques de honestidade tornam a vida melhor.

Restaurantes costumam me irritar com a questão do troco. Basta pagar em dinheiro para que as moedas nunca cheguem à mesa. Muitos desenvolvem um conjunto de pequenas mesquinharias para o cliente gastar mais. Como cobrar caríssimo pelo converte enviar uns patês safados acompanhando rodelas de pão. Dia desses fui com meu amigo publicitário João Paulo a um novo restaurante asiático, na região dos Jardins. A dona é uma bonita ex-modelo. Veio até a mesa e perguntou o que havíamos pedido. Arregalou os olhos:

-— É muita comida. Cada prato dá para dois. Como dois gordos gulosos, insistimos. Comemos a ponto de ter dificuldade em levantar da mesa.

Também já ouvi, numa loja de sapatos do Shopping Eldorado, o conselho de uma humilde vendedora, que provavelmente vive de comissão.

— Esse modelo não fica bem para o senhor. Diminui o pé. Era verdade. Meus pés pequenos ficavam menores do que já são. Naquele dia não comprei nada. Mas sempre que preciso de um sapato-, apareço. Vivo me defendendo das desonestidades do cotidiano. Por isso dou tanta importância às pequenas virtudes. Apesar da violência e dos tempos tão difíceis, o paulistano está aprendendo a ser um cidadão melhor. Será que sou bobo?

Ando perdido em uma selva de palavras. Existem termos destinados a dar a impressão de que algo não é exatamente o que é. Ou para botar verniz sobre uma atividade banal. Já estão, sim, incorporados no vocabulário. Servem para dar uma impressão enganosa. E também para ajudar as pessoas a parecer inteligentes e chiques porque parecem difíceis. Resolvi desvendar algumas dessas armadilhas verbais.

Seminovo — Já não se fala em carro usado, mas em seminovo. Vendedores adoram. O termo sugere que o carro não é tão velho assim, mesmo que se trate de uma Brasília sem motor. Ou que o câmbio saia na mão do comprador logo depois da primeira curva. E pura técnica de vendas. Vou guardá-lo para elogiar uma amiga que fez plástica. Talvez ela adore ouvir que está "seminova". Mas talvez...

Sale — É a boa e velha liquidação. As lojas dos shoppings devem achar liquidação muito chula. Anunciam em inglês. Sale quer dizer que o estoque encalhou. A grife está liquidando, sim!

Não se envergonhe de pedir mais descontos. Pode ser que não seja chique, mas aproveite. 

Lofi — Quando o lofi surgiu, nos Estados Unidos, era uma moradia instalada em antigos galpões industriais. Sempre enorme e sem paredes divisórias. Vejo anúncios de lofts a torto e a direito. A maioria corresponde a um antigo conjugado. Só não tem paredes, para lembrar seu similar americano. E preciso ser compreensivo. Qualquer um prefere dizer que está morando em um lofi a dizer em uma quitinete de luxo.

Cult — Não aguento mais ouvir falar que alguma porcaria é cult. O cult é o brega que ganhou status. O negócio é o seguinte: um bando de intelectuais adora assistir a filmes de terceira, programas de televisão populares e afins. Mas um intelectual não pode revelar que gosta de algo considerado brega. Então diz que é cult. Assim, se pode divertir com bobagens, como qualquer ser humano normal, sem deixar de parecer inteligente. Como conceito, próximo do cult está o trash. E o lixo elogiado. Trash é muito usado para filmes de terror. Um candidato a intelectual jamais confessa que não perde um episódio da série Sexta-Feira 13, por exemplo. Ergue o nariz e diz que é trash. Depois, agarra um saquinho de pipoca, senta na primeira fila e grita a cada vez que o Jason ergue o machado.

Workshop — E uma espécie de curso intensivo. Existem os bons. Mas o termo se presta a muita empulhação. Pois, ao contrário dos cursos, no workshop ninguém tem a obrigação de aprender alguma coisa específica. Basta participar. Muitas vezes botam um sujeito famoso para dar palestras durante dois dias seguidos. Há alunos que chegam a roncar na sala. Depois fazem bonito dizendo que participaram de um workshop com fulano ou beltrano. A palavra é imponente, não é?

Releitura — Ninguém, no meio artístico ou gastronômico, consegue sobreviver sem usar essa palavra. Está em moda. Fala-se em releitura de tudo: de músicas, de receitas, de livros. Em culinária, releitura serve para falar de alguém que achou uma receita antiga e lhe deu um toque pessoal. Críticos culinários e donos de restaurantes badalados adoram falar em cardápios com releitura disso e daquilo. Ora, um cozinheiro não bota seu tempero até na feijoada? Isso é releitura? Então minha avó fazia releitura e não sabia, coitada. O caso fica mais complicado em outras áreas. Fazer uma releitura de uma história não é disfarçar falta de ideia? Claro que existem casos e casos. Mas que releitura serve para disfarçar cópia e plágio, serve. Seria mais honesto dizer "adaptado de..." ou "inspirado em...", como faziam antes.

Daria para escrever um livro inteiro a respeito. Fico arrepiado quando alguém vem com uma conversa abarrotada de termos como esses. Parece que vão me passar a perna. Ou a culpa é minha, e não sou capaz de entender a profundidade da conversa. Nessas horas, fico pensando: será que sou bobo? Ou tem gente esperta demais?

Entendendo o texto

01. O narrador acena desesperadamente para um táxi porque:

a) Está perdido na cidade.

b) Precisa transportar vários pacotes.

c) Quer evitar o trânsito caótico.

d) Está com pressa para chegar em casa.

     02. O motorista do táxi erra o caminho porque:

           a) Não conhece bem a cidade.

           b) Se confunde com as direções.

           c) Está distraído com a conversa.

           d) Quer prolongar a corrida.

    03. O motorista desliga o taxímetro porque:

           a) Quer agradar o passageiro.

           b) Está com problemas no carro.

           c) Errou o caminho propositalmente.

           d) Pretende cobrar mais no final.

    04. Como o narrador se sente ao perceber a honestidade do taxista?

          a) Desapontado.

          b) Surpreso e bem-humorado.

          c) Desconfiado.

          d) Indiferente.

    05. Qual é a opinião do narrador sobre a categoria dos taxistas atualmente?

          a) Acredita que piorou nos últimos anos.

          b) Considera-os geralmente desonestos.

          c) Observa uma melhora na honestidade.

          d) Não tem uma opinião definida.

   06. Por que o narrador dá importância às "pequenas virtudes"?

           a) Para parecer inteligente.

           b) Porque se defende das desonestidades do cotidiano.

           c) Porque quer ser um cidadão melhor.

         d) Porque tem medo de ser passado para trás.

    07. O narrador menciona uma experiência negativa em:

          a) Uma locadora de carros.

          b) Um restaurante.

          c) Uma loja de sapatos.

          d) Uma loja de eletrônicos.

    08. Qual é a crítica do narrador sobre a questão do "troco" nos restaurantes?

          a) O serviço é sempre excepcional.

          b) O troco nunca é dado ao cliente.

          c) Os clientes recebem sempre moedas na mesa.

          d) Os restaurantes cobram caro por itens adicionais.

   09. O narrador cita um conselho que recebeu de uma vendedora em uma loja de sapatos. Qual foi esse conselho?

          a) Não comprar um modelo específico de sapato.

          b) Comprar um sapato maior para conforto.

          c) Escolher um sapato mais caro.

          d) Ignorar os modelos disponíveis.

 10. Como o narrador se sente em relação aos termos utilizados para dar uma impressão enganosa?

          a) Desinteressado.

          b) Confuso.

          c) Desconfiado.

          d) Preocupado com a manipulação.