sábado, 20 de janeiro de 2018

CONTO: O IRMÃO IMAGINÁRIO - MOACYR SCLIAR- COM GABARITO

CONTO: O irmão imaginário
             Moacyr Scliar

    Até os nove anos, Paulinho foi filho único. Filho único e muito amado. Os pais não eram ricos - o pai era mecânico, a mãe trabalhava como caixa num supermercado -, mas cuidavam do menino com o maior carinho; colocaram-no numa boa escola, compravam-lhe roupas, brinquedos, livros. Era como se quisessem indenizá-lo pelo fato de ser filho único.
        Paulinho não sabia porque os pais não haviam lhe dado um irmão ou uma irmã. Algum problema havia; muitas vezes surpreendia os dois sentados lado a lado na sala, muito tristes, a mãe frequentemente com os olhos vermelhos de choro. Nas poucas vezes que perguntou a respeito, recebeu respostas evasivas; logo se deu conta de que aquele era um assunto difícil, sobre o qual não poderia falar.
        Mas a verdade é que, mesmo tendo amigos - e ele tinha muitos amigos na vizinhança - Paulinho sentia-se só. Precisava de companhia. Precisava de um irmão com quem pudesse partilhar suas dúvidas, suas aflições, seus sonhos também.
        Acabou por criar um irmão imaginário.
        Chamava-se Joel. Porque escolhera esse nome, não saberia dizer; ocorrera-lhe de repente, e pronto, Joel passara a existir. Mas não morava na casa, junto com a família; com tábuas e lona, Paulinho construiu para ele uma cabana, no fundo do pátio. Era uma cabana pequena, mas servia bem: como Paulinho, Joel era pequeno e magro. Na verdade os dois eram idênticos, quase como se fossem gêmeos.
        Todos os dias Paulinho visitava Joel. Entrava na cabana escura e ali ficava, sentado ao lado do irmão imaginário. Falava horas; contava coisas sobre os pais, sobre os amigos, sobre a escola... Era um monólogo, porque Joel nunca respondia. Não era preciso; tudo o que Paulinho queria do irmão imaginário era que ele o ouvisse. E tinha certeza de que Joel era um ouvinte atento, como um verdadeiro irmão deve ser. Atento e inspirador: Paulinho fazia-lhe uma pergunta - e de imediato a resposta lhe ocorria. E era sempre a resposta certa, a resposta confortadora.
        Vários anos se passaram assim. Anos felizes, mas com momentos de apreensão. Cada vez que caía um temporal, por exemplo, Paulinho entrava em pânico: como estaria o Joel em sua cabana? Não estaria assustado, molhado de chuva? Não foi uma nem duas noite que correu para o fundo do pátio, debaixo do aguaceiro, para se certificar de que estava tudo bem, que a cabana continuava no lugar.
        Os pais não desconfiavam de nada. Achavam que a cabana era um lugar de brinquedo do filho, só isso. Paulinho nunca lhes falou do irmão imaginário; era um segredo dele, não podia ser partilhado.
        Mas então um dia aconteceu. Poucos dias antes de Paulinho completar dez anos, os pais o chamaram. Vacilando muito, o pai lhe disse que, durante todos aqueles anos, eles tinham tentado dar ao filho um irmão ou uma irmã, mas por vários problemas não o haviam conseguido. Agora, porém, tinham chegado a uma decisão:
        Paulinho ganharia, sim, um irmão. Adotivo.
        ---Até pensamos num nome - disse a mãe, emocionada. - Um nome do qual sempre gostamos. Mas caberá a você decidir. O que você acha de chamarmos seu irmãozinho de Joel?
        Os olhos cheios de lágrimas, Paulinho fez que sim com a cabeça. Mais tarde, foi até a cabana. Entrou, contou o que havia sucedido ao irmão imaginário. Que, como de costume, nada disse. Mas quando Paulinho estava saindo, ouviu uma voz sussurrando baixinho:
        ---Seja feliz, Paulinho, com seu irmão.
        E nesse momento ele teve a certeza de que seria feliz, muito feliz, com o irmão Joel.

Entendendo o texto:

01 – Na literatura, flashback é a interrupção da sequência cronológica para introdução de fatos ocorridos anteriormente. Em quais parágrafos do texto lido ocorre flashback?
      Do 2º ao 9º parágrafos.

02 – Nem todos gostam de ser filho único. Paulinho, por exemplo, não gostava. Por que Paulinho era filho único e quais eram as consequências desse fato?
      Os pais não conseguiam ter outro filho, resultando em tristeza para eles; além da solidão de Paulinho, daí ele criou um irmão imaginário.

03 – Paulinho tinha bons amigos, mas esse relacionamento não lhe era suficiente. O que o menino buscava na figura de Joel, o irmão imaginário?
      Um confidente e amigo, com quem conversaria livremente, contando seus segredos, problemas e alegrias.

04 – Após vários anos, os pais de Paulinho decidiram adotar um menino. Por que a emoção de Paulinho foi tão intensa, nesse momento?
      O grande sonho de ter um irmão se tornaria realidade.


3 comentários:

  1. Todo conto apresenta situação inicial,conflito, clímax, e desfecho.
    Nesse texto, a situação inicial é a vida de Paulinho com seu irmão imaginário.
    Qual é o conflito ?

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    1. O conflito é o momento em que Paulinho decide criar um irmão imaginário.

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  2. Ao se ver,como os pais devem agir quando têm um assunto difícil para falar com um filho ?

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