segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

TEXTO: MEU PROFESSOR INESQUECÍVEL - MARCOS REY - COM INTERPRETAÇÃO/GABARITO

TEXTO: MEU PROFESSOR INESQUECÍVEL


   Mesmo antes de saber ler eu já vivia num mundo de histórias, que meu pai, um gráfico, me contava. A realidade para mim resumia-se em escovar os dentes e amarrar os sapatos. O resto, fantasia das mil e uma noites e de mil historietas infantis. Algumas, ele próprio inventava, mas não era seu forte. Geralmente fazia a maior confusão, improvisando finais que nenhuma relação tinham com o princípio. Sua memória nunca foi grande coisa. [...] Tendo terminado seu trabalho, íamos para o fundo do quintal. Toda casa tinha um, comprido e arborizado. [...]

      Íamos felizes para o extremo da casa e sentávamos sobre caixotes. Eu adorava suas histórias [...].
      - Como acaba a história, pai?
      - Qual?
      - A que está contando.
      - Refere-se à Branca de Neve?
      - Essa o senhor já contou, mas pode contar outra vez.
      - Bem, o Lobo Mau andava pela floresta de olho na Branca de Neve. Seguia a menina por toda parte, o malvado.
      Estranhei.
      - Não foi esse lobo que comeu a avozinha de Chapeuzinho Vermelho?
      Meu pai hesitou. Era ou não era? Eu exigia.
      - Primo dele.
      - A inimiga da Branca de Neve não era a bruxa?
      [...]
      - E quem diz que não? Diabo de bruxa.
      - O que o lobo faz nessa história?
      - Pergunta oportuna. Ele passava pela floresta, como se não quisesse nada, quando viu a menina com os cinco anões.
    - Sete anões, pai.
    - No momento eram cinco. Dois estavam em casa com gripe. Tinham tomado muito sorvete. E cuidado você também com os gelados. Mas o lobo se deu mal porque o Pequeno Polegar, usando um estilingue, deu cabo dele. Dias depois a Branca de Neve e o Pequeno Polegar casavam-se.
     - Ela não casou com um príncipe, pai? [...]
     - Um príncipe?
     - Sim, foi com um príncipe.
     - Em segundas núpcias – esclareceu. – Coisas da vida.
     Algum tempo depois, com o auxílio de uma cartilha, ele me ensinou a ler, tarefa então mais complicada porque cavalo era assim - cavallo. Farmácia era assim – pharmacia. Ontem era hontem. E a cidade de Niterói escrevia-se Nictheroy.
     Dentro de casa, porém, não me sentia ainda alfabetizado. O prazer da leitura eu descobriria, também com ele, nos anúncios expostos no interior dos bondes, os reclames, como então dizíamos. Notadamente no camarão, o bonde fechado, apelido derivado de sua cor vermelha. Silabando, eu lia os anúncios um a um. Na maioria remédios. Capivarol, Biotônico Fontoura, Xarope São João. Eu e todo mundo porque a própria propaganda, uma novidade, chamava a atenção geral. Os bondes era uma cartilha animada para os meninos daquela geração.
     [...] Foi ele quem ergueu o dedo, apontando-me o Martinelli, ainda em andaimes. Levou-me para conhecer o Viaduto do Chá e presenciar a abertura da Nove de Julho. Outra de suas paixões citadinas eram os bairros ricos. Aos domingos, pela manhã, costumava passear à sombra das mansões dos barões do café, em Higienópolis. Quando via uma delas desocupada, dava um jeito de visitá-la. Lembro-me de nós percorrendo uma infinidade de cômodos vazios de um verdadeiro palácio. Ele punha os olhos em tudo, observando os detalhes da construção. Amava lustres, escadas de mármore e ladrilhos portugueses. Nos banheiros exultava se as torneiras fossem douradas. Homem exigente. Requintado, sim.

                                                                                  Marcos Rey


ENTENDENDO O TEXTO:

Nesta narrativa, o narrador apresenta o pai como seu primeiro e inesquecível professor.
01 – Porque os fatos narrados foram marcantes para o narrador?
    a) Porque foram momento de aprendizagem.
    b) Porque o pai contava histórias inventadas.
    c) Porque ele se divertia com as falhas de memória do pai.
    d) Porque ele se encantava com as histórias de mil e uma noite.

02 – Como eram transmitidos os ensinamentos do pai para o filho:
     a) Por meio de histórias de vida.
     b) Por meio de livros de literatura infantil.
     c) Nos passeios pela cidade.
     d) Por meio da narração.

03 – Como o narrador descobriu o prazer da leitura?
     a) Nos livros de história.
     b) Nos anúncios expostos no bonde.
     c) Na cartilha.
     d) Nas histórias que o pai escrevia.

04 – O que o narrador quer dizer com "os bondes eram uma cartilha animada para os meninos"?
      a) Que os passeios de bonde eram animados e divertidos.
     b) Que passeando de bonde os meninos iam aprendendo a ler com os cartazes de rua.
     c) Que nos bondes a propaganda chamava atenção e funcionava como uma cartilha, porque os meninos se esforçam para ler os anúncios.
      d) Que os anúncios expostos no bonde eram divertidos.




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