Texto: INUNDAÇÃO
Há um rio que atravessa a casa.
Esse rio, dizem, é o tempo. E as lembranças são peixes nadando ao invés da
corrente. Acredito, sim, por educação. Mas não creio. Minhas lembranças são
aves. A haver inundação é de céu, repleção de nuvem. Vos guio por essa nuvem, minha
lembrança.
A
casa, aquela casa nossa, era morada mais da noite do que dia. Estranho, dirão.
Noite e dia não são metades, folha e versos? Como podiam o claro e o escuro
repartir-se em desigual? Explico. Bastava que a voz de minha mãe em canto se
escutasse para que, no mais lúcido meio-dia, se fechasse a noite. Lá fora, a
chuva sonhava, tamborileira. E nós éramos meninos para sempre.
Certa
vez, porém, de nossa mãe escutámos o pranto. Era um choro delgadinho, um fio de
água, um chilrear de morcego. Mão em mão, ficámos à porta do quarto dela.
Nossos olhos boquiabertos. Ela só suspirou:
---
Vosso pai já não é meu. [...]
COUTO, Mia. O fio das missangas: contos.
São Paulo: Companhia das
Letras, 2009. P 25. (Fragmento).
Entendendo o texto:
01 – Que tipo de linguagem se observa no texto? Justifique sua resposta.
A linguagem é subjetiva ou figurada, carregada de lirismo. Há o emprego da 1ª
pessoa, de metáforas, antíteses e personificação de elementos como “a chuva
sonhava, tamborileira”.
02 – Segundo o narrador, ele “acredita” por educação, mas não
“crê”.
Explique a diferença de
sentido entre esses verbos no contexto.
Crer
expressa uma ação mais firme e tem, no texto, conotação religiosa: exige
maior convicção do que simplesmente a de acreditar.
03 – As lembranças eram aves para o narrador, e não peixes, como
afirmavam alguns. Por quê? O que representavam as nuvens?
Suas lembranças não eram barradas por nenhuma corrente, nem
desapareciam com a inundação de um rio. Eram livres como as aves, podiam
voar pelo céu, onde cada nuvem representava uma lembrança.
04 – A partir do segundo parágrafo, o que se pode concluir quanto
ao relacionamento entre mãe e filhos? Esclareça sua resposta.
A mãe deveria ser muito severa, pois os filhos a obedeciam de imediato, quando
apenas ouviam sua voz. Por isso, o dia parecia tornar-se noite, o
que acontecia com frequência. Restava-lhes, escutar o barulho da
chuva e, levados pela imaginação, ser crianças de novo.
05 – No último parágrafo, em vez da “voz em canto”, os filhos
ouviram o choro da mãe Explique a reação deles diante desse fato.
A
mãe representava para eles, até então, a imagem de uma mulher forte, autoritária,
a quem não se podia refutar. O choro dela mostrou-lhes seu lado humano, frágil,
e isso os assustou.
06 – No terceiro parágrafo, observe o acento gráfico na 1ª pessoa
do plural do pretérito prefeito do indicativo das formas verbais: escutámos e
ficámos.
Nesse caso, de que maneira
elas são pronunciadas?
Pronunciam-se
as vogais acentuadas de forma aberta.
07 – Copie no caderno o sentido dos adjetivos nestas frases:
- “Era um choro delgadinho”.
- “Nossos olhos boquiabertos”.
Na
1ª frase, um choro manso, baixo; na 2ª, olhos arregalados.
08 – Explique por que foram empregadas as palavras destacadas nas
frases a seguir e que sentido elas expressam.
- “...a voz de minha
mãe”. - “Mão em mão
...”
- Vivo num rio sem fundo.
- ...me preparo para ir...
Essas palavras têm a função de ligar uma palavra a outra. De determina
de quem é a voz. Em indica o modo como as mãos estavam. Sem expressa
falta de um fundo. Para indica a finalidade da
preparação.
09 – Às vezes, esse tipo de palavras pode ter outra função.
Explique qual é essa função e que sentido essas palavras apresentam nestas
frases.
- “Vos guio por essa
nuvem, minha lembrança”.
- “Como podiam o claro e o
escuro repartir-se em desigual?”.
As palavras por e em ligam
termos que completam o sentido das formas verbais guio e
repartir-se, respectivamente. Por expressa direção ou lugar; e em,
o modo.
Amo as tuas atividades.
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