segunda-feira, 21 de setembro de 2020

CRÔNICA: CHEGOU O OUTONO - RUBEM BRAGA - COM GABARITO

 CRÔNICA: CHEGOU O OUTONO

                  Rubem Braga

 Não consigo me lembrar exatamente o dia em que o outono começou no Rio de Janeiro neste 1935. Antes de começar na folhinha ele começou na Rua Marquês de Abrantes. Talvez no dia 12 de março. Sei que estava com Miguel em um reboque do bonde Praia Vermelha. [...]

Eu havia tomado o bonde na Praça José de Alencar; e quando entramos na Rua Marquês de Abrantes, rumo de Botafogo, o outono invadiu o reboque. Invadiu e bateu no lado esquerdo de minha cara sob a forma de uma folha seca. Atrás dessa folha veio um vento, e era o vento do outono. Muitos passageiros do bonde suavam.

No Rio de Janeiro faz tanto calor que depois que acaba o calor a população continua a suar gratuitamente e por força do hábito durante quatro ou cinco semanas ainda.

Percebi com uma rapidez espantosa que o outono havia chegado. Mas eu não tinha relógio, nem Miguel. Tentei espiar as horas no interior de um botequim, nada conseguindo. Olhei para o lado. Ao lado estava um homem decentemente vestido, com cara de possuidor de relógio.

– O senhor pode ter a gentileza de me dar as horas?

Ele espantou-se um pouco e, embora sem nenhum ar gentil, me deu as horas: 13:48. Agradeci e murmurei: chegou o outono.

Chegara o outono. Vinha talvez do mar e, passando pelo nosso reboque, dirigia-se apressadamente ao centro da cidade, ainda ocupado pelo verão.

As folhas secas davam pulinhos ao longo da sarjeta; e o vento era quase frio, quase morno, na Rua Marquês de Abrantes. E as folhas eram amarelas, e meu coração soluçava, e o bonde roncava.

[...] Era iminente a entrada em Botafogo; penso que o resto da viagem não interessa ao público. [...] O necessário é que todos saibam que chegou o outono. Chegou às 13:48 horas, na Rua Marquês de Abrantes, e continua em vigor. Em vista do que, ponhamo-nos melancólicos.

BRAGA, Rubem. 200 crônicas escolhidas. Rio de Janeiro: Record, 2004.

 

VOCABULÁRIO:

folhinha – expressão popularmente usada para se referir ao calendário impresso, com meses e dias de um ano. Pode-se dizer que se trata de uma “expressão de antigamente”, uma vez que, atualmente, quase não é usada para se referir a calendário.

ESTUDO DO TEXTO

1)   O gênero do texto é:

a)   Editorial

b)   Artigo de opinião

c)   Reportagem

d)   Crônica

 

2)   O trecho que expressa uma opinião do narrador é:

a)   “Muitos passageiros do bonde suavam”. – 2º parágrafo.

b)   “...penso que o resto da viagem não interessa ao público.” – último parágrafo.

c)   “Sei que estava com Miguel em um reboque do bonde Praia Vermelha”. – 1º parágrafo

d)   “Tentei espiar as horas no interior de um botequim, nada conseguindo”. – 4º parágrafo.

 

3)    No 1º parágrafo, o termo que expressa a dúvida do narrador sobre o dia em que se passou o fato narrado é

 (A) “Não”.

 (B) “exatamente”.

 (C) “neste”.

 (D) “Antes”.

 (E) “Talvez”.

 

    4) No 3º parágrafo, a palavra “gratuitamente” foi usada com o sentido de

      (A) sem motivo.

     (B) por gratidão.

     (C) com espanto.

     (D) de brincadeira.

     (E) de graça, sem valor.

 5)  Pela leitura da crônica e observando trechos como “E as folhas eram amarelas, e meu coração soluçava, e o bonde roncava.”, no penúltimo parágrafo, e “Em vista do que, ponhamo-nos melancólicos.”, no final da crônica, percebemos que uma característica marcante do narrador é ser

(A) apressado e inquieto.

(B) desatento e desligado.

(C) irritadiço e impaciente.

(D) sentimental e desligado.

(E) sentimental e emotivo.

 6) O trecho do texto que contém uma personificação, ou seja, o recurso de atribuir a objetos ou a seres não humanos ações ou emoções que são próprias dos seres humanos, é

(A) “... dia em que o outono começou no Rio de Janeiro...” – 1° parágrafo

(B) “No Rio de Janeiro faz tanto calor (...).” – 3º parágrafo

(C) “... um homem decentemente vestido (...).” – 4º parágrafo

(D) “As folhas secas davam pulinhos ao longo da sarjeta (...).” – penúltimo parágrafo

(E) “Em vista do que, ponhamo-nos melancólicos.” – final da crônica

7) O narrador afirma que “ponhamo-nos melancólicos” porque

(A) ele se vê triste diante das pessoas que estão viajando no bonde.

(B) o frio do outono o entristece porque não há mais o calor típico do verão carioca.

(C) a folha que caiu e o frio que soprou em seu rosto o deixou saudoso de outras épocas.

(D) o homem bem vestido com cara de possuidor de relógio o maltratou dentro do bonde.

(E) o frio o deixa doente e saudoso por causa dos maus tratos do homem bem vestido.

 8) O narrador afirma que o calor do Rio de Janeiro frequentemente

(A) sobrevive mesmo depois da folhinha marcar o início do outono.

 (B) acaba sempre às 13:48 horas de 12 de março.

(C) traz muito suor ao rosto das pessoas.

(D) vem através das horas no interior de um botequim.

(E) dirigia-se apressadamente ao centro da cidade.

9) O narrador afirma que “E as folhas eram amarelas, e meu coração soluçava...” o termo destacado expressa a ideia de

(A) alegria.

(B) perplexidade.

(C) tristeza.

(D) resignação.

(E) reflexão.

10)  O fato do cotidiano que levou o cronista a escrever esse texto foi

(A) o homem ter-lhe dito as horas de má vontade no bonde.

(B) ele estar no bonde acompanhado de seu amigo Miguel.

(C) o bonde estar passando pela Rua Marques de Abrantes.

(D) o narrador sentir um frio inesperado durante seu trajeto no bonde.

(E) o outono estar chegando à cidade do Rio de Janeiro antes do previsto.

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