domingo, 20 de setembro de 2020

LIVRO(FRAGMENTO): O MENINO DO DEDO VERDE - CAPÍTULO SEIS - MAURICE DRUON - COM GABARITO

 LIVRO(FRAGMENTO): O MENINO DO DEDO VERDE - CAPÍTULO SEIS

                                      Maurice Druon

  Onde Tistu recebe uma lição de jardim e descobre, ao mesmo tempo, que possui polegar verde.

         Tistu pôs chapéu de palha para ir à aula de jardim.

        Era a primeira experiência do novo sistema. O Sr. Papai havia julgado melhor começar por aí. Uma lição de jardim, afinal de contas, é uma lição de terra, essa terra em que caminhamos, que produz os legumes que comemos e o capim com que os animais se alimentam, até ficarem bastante gordos para serem comidos...

       A terra, tinha declarado o Sr. Papai, está na origem de tudo.

      "Tomara que o sono não venha!" — dizia Tistu consigo mesmo, a caminho da aula.

      O jardineiro Bigode, prevenido pelo Sr. Papai, já esperava o aluno na estufa.

      O jardineiro Bigode era um velho macambúzio, de pouca conversa, e não lá muito amável. Uma extraordinária floresta, cor de neve, brotava-lhe entre o nariz e a boca.

     Como descrever os bigodes de Bigode? Uma das maravilhas da natureza. Nos dias de vento, quando o jardineiro passava de pá ao ombro, era um verdadeiro espetáculo: pareciam duas chamas que lhe saíssem do nariz para queimar-lhe as orelhas.

     Tistu bem que gostava do velho jardineiro, mas tinha um pouco de medo.

     — Bom dia, Sr. Bigode — disse Tistu, tirando o chapéu.

     — Ah! Você já chegou... Vamos ver do que é capaz. Está vendo este monte de terra e estes vasos? Você vai encher os vasos de terra e enfiar o polegar bem no meio, para fazer um buraco. Depois ponha tudo em fila, ao longo do muro. Então a gente coloca nos buracos as sementes que quiser.

       As estufas do Sr. Papai eram admiráveis e dignas, em tudo, do resto da casa. Sob a proteção dos vidros cintilantes, mantinha-se, graças a um aquecedor, um ar úmido e quente. Ali mimosas 27 floresciam em pleno inverno, cresciam palmeiras importadas da África, e cultivavam-se lírios pela sua beleza e jasmins pelo seu perfume. E até orquídeas, que não são belas nem cheiram, por um motivo inteiramente inútil para uma flor: a raridade.

        Bigode era o senhor daquele recinto. Quando Dona Mamãe, aos domingos, trazia as amigas para ver a estufa, ele postava-se à porta, de avental novo, tão amável e falante quanto um cabo de enxada.

        À menor tentativa de acender um cigarro ou tocarem numa flor, Bigode saltava sobre a imprudente:

          — Era o que faltava! Será que as senhoras querem sufocar e estrangular minhas flores?

          Tistu, ao realizar o trabalho que Bigode lhe confiara, teve uma agradável surpresa: esse trabalho não lhe dava sono. Ao contrário, dava-lhe um grande prazer. Ele achava que a terra tinha um cheiro gostoso. Um vaso vazio, uma pá de terra, um buraco com o dedo, e o serviço estava pronto. Passava-se logo ao seguinte. Os vasos iam-se alinhando rente ao muro.

          Enquanto Tistu prosseguia o trabalho com afinco, Bigode dava lentamente uma volta pelo jardim. E Tistu descobriu aquele dia por que é que o velho jardineiro falava tão pouco com as pessoas: ele conversava com as flores.

          Vocês compreendem facilmente que depois de cumprimentar cada rosa de um ramo, cada cravo de uma touceira, já não há voz que chegue para distribuir "Boa noite, meu senhor!" ou "Bom apetite, minha senhora!" ou "Saúde!" quando alguém espirra, — todas essas coisas, enfim, que fazem os outros dizerem: "Como ele é bem educado!"

          Bigode ia de uma flor a outra, preocupando-se com a saúde de 28 cada uma.

         — Então, rosa-chá, sempre fazendo das suas! Guarda os botões escondido para fazê-los abrir quando ninguém espera... E você, trepadeira, está pensando que é a rainha da montanha, querendo fugir pelo alto dos caixilhos... Veja se isso são modos!

         Em seguida, virou-se para Tistu e gritou-lhe de longe:

         — Então, é para hoje ou para amanhã?

         — Um pouco de paciência, professor! Só faltam três vasos — respondeu Tistu.

         Apressou-se em terminar e foi ao encontro de Bigode, na outra ponta do jardim.

        — Pronto, acabei.

        — Bom, vamos ver — resmungou o jardineiro.

        Voltaram devagarinho, porque Bigode aproveitava, ora para cumprimentar uma grande peônia pelo seu belo aspecto, ora para encorajar uma hortênsia a se tornar mais azul... De repente, eles pararam imóveis, boquiabertos, estupefatos, fora de si.

        — Será que eu estou sonhando? — disse Bigode, esfregando os olhos. — Você está vendo o mesmo que eu?

        — Estou, Sr. Bigode.

        Ao longo do muro, ali mesmo, a poucos passos, todos os vasos que Tistu enchera haviam florescido em menos de cinco minutos!

        Mas é preciso explicar: não se tratava de uma tímida floração, hastes pálidas e hesitantes. Nada disso! Em cada vaso se avolumavam as mais soberbas begônias. E todas formavam, alinhadas, uma espessa sebe vermelha.

      — É inacreditável! — dizia Bigode. — É preciso pelo menos dois meses para begônias assim!

       Um prodígio é um prodígio. Primeiro, a gente o constata. Depois, procura explicá-lo. Tistu perguntou:

      — Mas, se não se havia posto semente, Sr. Bigode, de onde é que saíram estas flores?

     — Mistério, mistério... — respondeu Bigode.

     Em seguida, tomou bruscamente nas suas mãos calejadas a mãozinha de Tistu.

      — Deixe ver o polegar!

      Examinou atentamente o dedo do menino, em cima e embaixo, na sombra e na luz.

      — Meu filho — disse enfim, após madura reflexão — ocorre com você uma coisa extraordinária, surpreendente! Você tem polegar verde...

      — Verde! — exclamou Tistu muito espantado. — Acho que é cor-de-rosa, e até que está bem sujo! Verde coisa alguma!

      Olhou seu polegar, muito normal.

      — É claro, é claro que você não pode ver — replicou Bigode,.

      — O polegar verde é invisível. A coisa se passa por dentro da pele: é o que se chama um talento oculto. Só um especialista é que descobre. Ora, eu sou um especialista. Garanto que você tem polegar verde.

     — E para que serve isto de polegar verde?

    — Ah! é uma qualidade maravilhosa — respondeu o jardineiro. — Um verdadeiro dom do céu! Você sabe: há sementes por toda parte. Não só no chão, mas nos telhados das casas, no parapeito das janelas, nas calçadas das ruas, nas cercas e nos muros. Milhares e milhares de sementes que não servem para nada. Estão ali esperando que um vento as carregue para um jardim ou para um campo. Muitas vezes elas morrem entre duas 30 pedras, sem ter podido transformar-se em flor. Mas, se um polegar verde encosta numa, esteja onde estiver, a flor brota no mesmo instante. Aliás, a prova está aí, diante de você! Seu polegar encontrou na terra sementes de begônia, e olhe o resultado! Que inveja que eu tenho! Como seria bom para mim, jardineiro de profissão, um polegar verde como o seu!

        Tistu não pareceu muito entusiasmado com a descoberta.

        — Já vão dizer de novo que eu não sou como todo mundo — resmungou.

        — O melhor — replicou-lhe Bigode — é não falar nada com ninguém. Que adianta despertar curiosidade ou inveja? Os talentos ocultos, em geral, trazem aborrecimentos. Você tem o polegar verde, está acabado. Mas guarde para você, e fique em segredo entre nós.

         E no caderninho de notas, entregue pelo Sr. Papai e que Tistu devia fazer assinar no fim de cada aula, o jardineiro Bigode escreveu apenas:

         "Este menino revela boas disposições para a jardinagem."

 DRUON, Maurice. O menino do dedo verde. tradução de D. Marcos Barbosa 35.ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989.

ENTENDENDO O TEXTO

 1)   Sobre os bigodes do jardineiro...

a)   No trecho “Como descrever os bigodes de Bigode?”, temos uma mesma palavra escrita de dois modos diferentes. Por quê?

Porque a grafia do nome próprio (Bigode) e o bigode se refere a um substantivo, ou seja, ao vistoso bigode que o jardineiro tem.

 b)   A que o autor comparou os bigodes do Sr. Bigode? Copie do texto.

“Uma extraordinária floresta, cor de neve, brotava-lhe entre o nariz e a boca.”

“...pareciam duas chamas que lhe saíssem do nariz...”.

 2)   Releia com os seus colegas: “Bigode era o senhor daquele recinto. Quando Dona Mamãe aos domingos, trazia as amigas para ver a estufa, ele postava-se à porta, de avental novo, tão amável e falante quanto um cabo de enxada.”

a) Que recinto é esse?

O recinto é a estufa, um local que absorve o calor do sol e protege as plantas.

 b)   Que elementos estão sendo comparados em “tão amável e falante quanto um cabo de enxada”?

Compara-se aqui o jardineiro Bigode ao cabo de uma enxada.

 c)   Um cabo de enxada pode ser amável e falante? O que significa, então, essa comparação?

Foi levada em conta a característica de Bigode: ser pouco comunicativo, assim como um cabo de enxada ou qualquer outro objeto inanimado.

 d)   Talvez você, agora, possa deduzir o significado da palavra destacada em “O jardineiro Bigode era um velho macambúzio, de pouca conversa, e não lá muito amável.”

Resposta pessoal.

Macambúzio significa “tristonho, mal-humorado”.

 3)   O jardineiro Bigode é um adulto que conversa com as flores, mas é carrancudo com as pessoas. Que sentimento você percebe na relação desse adulto com suas plantas?

Ele demonstrava amor e interesse por elas, preocupava-se com a saúde delas, animava-se com seus progressos. Seus comentários podem ser comparados aos de responsáveis por

Crianças pequenas sobre suas travessuras.

 4)   Releia: “Tistu, ao realizar o trabalho que Bigode lhe confiara, teve uma agradável surpresa: esse trabalho não lhe dava sono. Ao contrário, dava-lhe um grande prazer. Ele achava que a terra tinha um cheiro gostoso.”

Que opinião o menino tinha sobre sua atividade com Bigode?

Ele gostava do trabalho e achava que a terra tinha um cheiro bom.

5)   O que significa ter um polegar verde? Que consequências isso traria para um jardineiro?

Ter polegar verde significa ter uma ótima capacidade para lidar com as plantas, cultivá-las, cuidar delas. Um jardineiro com esse dom produziria linda flores, que cresceriam muito mais rápido, além de seu cultivo dar menos trabalho.

 6)   “De repente, eles pararam imóveis, boquiabertos, estupefatos, fora de si.” Observe que Tistu e Bigode tiveram as mesmas reações e suas emoções foram aumentando de intensidade. Que fato desencadeou essas reações?

Todos os vasos que Tistu havia enchido de terra haviam florescido em menos de cinco minutos, e as flores eram lindas!

 7)   Tistu não ficou nem um pouco animado com a novidade. Que fala do menino expressa seu descontentamento?

“Já vão dizer de novo que eu não sou como todo mundo”.

 

8)   O que a expressão de novo, na resposta anterior, revela?

A expressão revela que ele já havia ouvido alguém dizer que ele não era como todo mundo.

 

9)   No trecho “Tistu, ao realizar o trabalho que Bigode lhe confiara teve uma agradável surpresa: esse trabalho não lhe dava sono.” O fato de não ficar com sono, durante o trabalho solicitado por Bigode, foi uma surpresa para o menino. O que essa surpresa indica?

Indica que, em outras situações, Tistu teria ficado com sono, já que as atividades realizadas não lhe teriam dado prazer.

 

10)              Que atitude de Bigode demonstra um profundo respeito pelo talento oculto de Tistu?

O fato de manter segredo.

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