quarta-feira, 16 de setembro de 2020

TEXTO: A FESTA DE ENCERRAMENTO - SEMPÉ E GOSCINNY - COM GABARITO

 Texto: A festa de encerramento

          Sempé e Goscinny

        O diretor disse que ele nos via partir com um monte de emoções e que tinha certeza de que a gente dividia as emoções com ele, e que ele desejava que a gente tivesse muito prazer nas férias, porque na volta às aulas não ia mais ser hora de brincadeira, que a gente ia ter que trabalhar pra burro, e a festa de encerramento acabou.

        Foi uma festa de encerramento muito legal. Nós chegamos de manhã na escola, com os nossos pais e as nossas mães, que tinham vestido a gente que nem bonecos. Todo o mundo estava de terno azul, de camisa branca de um pano que brilha como a gravata vermelha e verde do papai, que a mamãe comprou para o papai e que o papai nunca usa pra não sujar. [...] A gente também estava com o cabelo grudado na cabeça – eu tenho um remoinho –, com as orelhas limpas e as unhas cortadas. Nós estávamos incríveis.

        Eu e os meus colegas não aguentávamos mais esperar a festa de encerramento. Não era tanto por causa dos prêmios, não; isso até que estava deixando a gente um pouco preocupado, mas é que depois da festa de encerramento a gente não vai mais para a escola, e são as férias. Faz muitos e muitos dias que eu fico perguntando para o papai, lá em casa, se as férias vão chegar logo e se eu vou ter que ir à escola até o último dia, porque eu tenho alguns colegas que não vão mais e que isso não é justo, e que de todo o jeito a gente não faz mais nada na escola e que eu estou muito cansado, aí eu choro e o papai fala que é para eu ficar quieto, que eu vou deixar ele louco.

        Teve prêmio pra todo o mundo. O Agnaldo, que é o primeiro da classe e o queridinho da professora, ganhou o prêmio de matemática, o prêmio de história, o prêmio de geografia, o prêmio de gramática, o prêmio de ortografia, o prêmio de ciências e o prêmio de comportamento. O Agnaldo é louco. O Eudes, que é muito forte e que gosta de dar soco no nariz dos colegas, ganhou o prêmio de ginástica. O Alceu, um colega gordo que fica comendo o tempo todo, ganhou o prêmio de assiduidade; [...], porque a mãe do Alceu não quer saber dele na cozinha, e se não for pra ficar na cozinha ele prefere vir para a escola mesmo. O Godofredo, aquele que tem um pai muito rico que compra tudo que ele quer, ganhou o prêmio de elegância, porque ele está sempre bem vestido. [...] O Rufino ganhou o prêmio de desenho, porque ele ganhou uma caixa grande de lápis de cor de presente de aniversário. O Clotário, que é o último da classe, ganhou o prêmio de camaradagem e eu ganhei o prêmio de eloquência. Meu pai ficou muito contente, mas parece que ele ficou meio desapontado quando a professora explicou que, no meu caso, o prêmio era pela quantidade, e não pela qualidade. Preciso perguntar para o papai o que quer dizer isso.

        A professora também ganhou prêmios. Cada um de nós deu um presente para ela, que os nossos pais e as nossas mães tinham comprado. Ela ganhou quatorze canetas e oito caixas de talco. Ela ficou supercontente e disse que nunca tinha ganho tantas, nem nos outros anos [...] Nós todos saímos da escola e na calçada os pais e as mães começaram a conversar uns com os outros. Eles diziam um monte de coisas, como: “O seu foi muito bom” e “O meu ficou doente” e também “O nosso é preguiçoso, é pena, porque ele tem muita facilidade” e depois “Quando eu tinha a idade desse cretino eu sempre era o primeiro, mas hoje em dia as crianças não se interessam mais pelos estudos, é por causa da televisão”. E aí eles agradavam a gente, davam tapinhas na nossa cabeça e limpavam as mãos por causa da brilhantina.

        [...] as mães riam muito, contando as coisas que nós tínhamos feito durante o ano, e nós ficamos admirados, porque quando nós fizemos essas coisas as mães não riram nem um pouco, elas até bateram na gente.

        Os colegas e eu, a gente estava falando das coisas incríveis que nós íamos fazer nas férias e o que estragou tudo foi quando o Clotário disse que ele ia salvar as pessoas que estavam se afogando, como no ano passado. Eu disse que aquilo era mentira, que eu tinha visto ele na piscina: ele não sabe nadar, e deve ser difícil salvar alguém sem largar a prancha. Então o Clotário bateu na minha cabeça com o livro que ele tinha ganho de prêmio de camaradagem. O Rufino começou a rir e eu dei um tapa nele, e aí ele começou a chorar e a dar pontapés no Eudes. Todo mundo começou a empurrar e estava muito divertido, mas os pais e as mães vieram correndo, eles iam pegando as mãos dentro da confusão, iam puxando e dizendo que a gente era incorrigível e que aquilo era uma vergonha. Aí cada pai e mãe pegou o colega que era dele e todo mundo foi embora.

        No caminho para casa eu fui pensando como era tudo legal, que a escola tinha terminado, que não ia mais ter lição de casa, nem castigo, nem recreio e que eu ia ficar um monte de tempo sem ver os meus colega, que a gente não ia mais fazer palhaçada junto e que eu ia me sentir sozinho toda vida.

        -- Então, Nicolau, você não vai dizer nada? – O papai perguntou – Afinal, chegaram as benditas férias!

        Aí eu comecei a chorar e o papai disse que eu ia deixar ele louco.

           Sempé e Goscinny. O pequeno Nicolau no recreio. São Paulo, Martins Fontes, 1991.

Fonte: Língua Portuguesa. Entre palavras – Edição renovada. Mauro Ferreira. 5ª série. Ed. FTD – São Paulo – 1ª edição – 2002. P. 64-8.

Entendendo o texto:

01 – Releia o primeiro parágrafo.

a)   Esse parágrafo permite ao leitor supor que a festa foi igual às festas comemorativas que geralmente acontecem nas escolas? Por quê?

Sim, pois o fecho da festa ficou a cargo do diretor, que fez um discurso. Geralmente é isso que acontece nas festas tradicionais.

b)   A continuidade do texto confirma ou contradiz (nega) essa suposição?

Confirma. “As crianças e os pais estavam todos com roupas novas”; “Houve entrega de prêmios”; etc.

02 – Segundo Nicolau, ele e seus colegas estavam vestidos iguais a bonecos.

a)   O que ele quis dizer com isso?

Ele dá a entender que todos estavam iguais e com a roupa bem arrumada. Isso os obrigava a ficar quietos, parados, para que as roupas não amassassem nem sujassem.

b)   Se você fosse a uma festa, gostaria de ir vestido como boneco? Por quê?

Resposta pessoal do aluno. Sugestão: não, bonecos não têm vontade própria; não tem personalidade.

03 – Releia.

        “... como a gravata vermelha e verde do papai, que a mamãe comprou para o papai e que o papai nunca usa pra não sujar. [...] A gente também estava com o cabelo grudado na cabeça – eu tenho um remoinho –, com as orelhas limpas e as unhas cortadas.”

a)   O pai de Nicolau tem, em relação a roupas novas, a mesma atitude que pode ser observada em muitos adultos. Qual é essa atitude?

É comum as pessoas comprarem coisas e depois deixa-las guardadas, evitando que se estraguem.

b)   Os alunos estarem com as orelhas limpas e as unhas cortadas é um fato rotineiro na vida deles? Justifique.

Não. Se fosse rotina, o garoto certamente não faria referência a ele. Ao dizer que tinham as orelhas limpas e as unhas cortadas, Nicolau revela que os pais prepararam as crianças para a festa.

04 – Nicolau diz que eles estavam ansiosos pela festa, mas, ao mesmo tempo, estavam preocupados com os prêmios.

a)   Por que eles queriam que a festa acontecesse logo?

Eles queriam que a festa se realizasse logo porque, começariam as férias. Na verdade, eles estavam ansiosos pelas férias, não pela festa.

b)   Qual dos prêmios estava realmente preocupando os alunos? Por quê?

O prêmio de camaradagem, porque ele é dado ao aluno de pior desempenho. Quem ganhou esse prêmio foi o Clotário, que é o último da classe.

05 – Releia.

        “...eu ganhei o prêmio de eloquência. Meu pai ficou muito contente, mas parece que ele ficou meio desapontado quando a professora explicou que, no meu caso, o prêmio era pela quantidade, e não pela qualidade. Preciso perguntar para o papai o que quer dizer isso.”

a)   O que a professora quis dizer ao pai de Nicolau ao explicar que o garotinho ganhara o prêmio de eloquência pela quantidade, e não pela qualidade?

Ela quis dizer que Nicolau fala exageradamente, mas do que ele fala pouco é aproveitado, isto é, não tem qualidade.

b)   Considerando que o narrador desse texto é o próprio Nicolau, você acha que ele mereceu mesmo o prêmio? Por quê?

Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Sim, pois Nicolau é um tagarela, fala demais.

06 – Segundo Nicolau, depois da festa os pais e as mães ficaram conversando e alguém disse: “Quando eu tinha a idade desse cretino eu sempre era o primeiro, mas hoje em dia as crianças não se interessam mais pelos estudos, é por causa da televisão”.

a)   Escreva as palavras que, por estarem no gênero masculino, deixam claro que foi um pai que falou essa frase.

“O” e “primeiro”.

b)   O “modo de falar” dessa pessoa (a linguagem que ela utiliza) também permite supor que foi um pai que usou a frase. Por quê?

Porque normalmente os homens são mais duros / exigentes com os filhos, indicando a expressão “esse cretino” para exemplificar esse comportamento.

07 – No final da festa, Nicolau e seus colegas conversavam a respeito do que pretendiam fazer as férias; de repente, começou a confusão.

a)   Como Nicolau concluiu que Clotário estava mentindo?

Ele tinha visto Clotário brincando na piscina com uma prancha e notou que o colega não sabia nadar.

b)   A atitude de Clotário foi coerente, isto é, combinou com o prêmio que ele havia recebido? Justifique.

Não. Clotário ganhou o prêmio de camaradagem. E esse título é uma atitude d amizade, de companheirismo, e não de alguém mentiroso e briguento.

08 – É válido afirmar que Nicolau tem, em relação às férias, um sentimento ambíguo, ou seja, duplo? Por quê?

      Sim. Por um lado, ele está feliz com a chegada das férias, porque não terá que ir à escola; por outro, está triste, pois sabe que ficará sozinho e sentirá falta dos colegas e das brincadeiras de sua turma.

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