sexta-feira, 18 de setembro de 2020

CRÔNICA: ESTOJO ESCOLAR - CARLOS HEITOR CONY - COM GABARITO

 Crônica: Estojo escolar

                    Carlos Heitor Cony

     Noite dessas, ciscando num desses canais a cabo, vi uns caras oferecendo maravilhas eletrônicas, bastava telefonar e eu receberia um notebook capaz de me ajudar a fabricar um navio, uma estação espacial.

      Minhas necessidades são mais modestas: tenho um PC mastodôntico, contemporâneo das cavernas da informática. E um laptop da mesma época que começa a me deixar na mão. Como pretendo viajar esses dias, habilitei-me a comprar aquilo que os caras anunciavam como o top do top em matéria de computador portátil.

         No sábado, recebi um embrulho complicado que necessitava de um manual de instruções para ser aberto. Depois de mil operações sofisticadas para minhas limitações, retirei das entranhas de isopor o novo notebook e coloquei-o em cima da mesa. De repente, como vem acontecendo nos últimos tempos, houve um corte na memória e vi diante de mim o meu primeiro estojo escolar. Tinha 5 anos e ia para o jardim de infância.

         Era uma caixinha comprida, envernizada, com uma tampa que corria nas bordas do corpo principal. Dentro, arrumados em divisões, havia lápis coloridos, um apontador, uma lapiseira cromada, uma régua de 20 cm e uma borracha para apagar meus erros.

         Da caixinha vinha um cheiro gostoso, cheiro que nunca esqueci e que me tonteava de prazer. Fechei o estojo para proteger aquele cheiro, que ele ficasse ali para sempre, prometi-me economizá-lo. Com avareza, só o cheirava em momentos especiais.

        Na tampa que protegia estojo e cheiro havia gravado um ramo de rosas muito vermelhas que se destacavam do fundo creme. Amei aquele ramalhete – olhava aquelas rosas e achava que nada podia ser mais bonito.

       O notebook que agora abro é negro, não tem rosas na tampa e, em matéria de cheiro, é abominável. Cheira vilmente a telefone celular, a cabine de avião, ao aparelho de ultrassonografia onde outro dia uma moça veio ver como sou por dentro. Acho que piorei de estojo e de vida.

 CONY, C. H. Crônicas para ler na escola. São Paulo: Objetiva, 2009. Disponível em: . Acesso em: 23 jul. 2019.

ENTENDENDO A CRÔNICA

1) No Texto, o sentido denotativo e o sentido conotativo convivem. O trecho do texto em que há somente denotação é:

(A) “Noite dessas, ciscando num desses canais a cabo, vi uns caras oferecendo maravilhas eletrônicas”.

(B) “Minhas necessidades são mais modestas”.

(C) “contemporâneo das cavernas da informática”.

(D) “retirei das entranhas de isopor o novo notebook e coloquei-o em cima da mesa.”

(E) “houve um corte na memória e vi diante de mim o meu primeiro estojo escolar.”

2) Com base na leitura de todo o Texto, entende-se que ele tem como foco a contraposição entre

(A) cheiro de notebook e cheiro de estojo

(B) requinte e simplicidade

(C) sociedade e indivíduo

(D) presente e passado

(E) trabalho e lazer

3) A partir da frase que finaliza o Texto – “Acho que piorei de estojo e de vida” –, constata-se que o autor

(A) comportava-se de modo nostálgico.

(B) era fortemente apegado ao objeto.

(C) carregava consigo objetos inusitados.

(D) tinha muito cuidado com seus pertences.

(E) apresentava um perfil marcado pelo egoísmo.

 

4) O termo mastodôntico, em “tenho um PC mastodôntico, contemporâneo das cavernas da informática”, pode ser substituído, sem prejuízo do sentido do trecho, por

(A) enorme

(B) potente

(C) grotesco

(D) funcional

(E) imponente

 

5) No que diz respeito à norma-padrão da língua, a frase cujo verbo em destaque apresenta regência adequada é:

(A) A lembrança da infância implica na volta de bons momentos.

(B) Estojos de madeira e lápis coloridos eram os objetos que os alunos mais gostavam.

(C) As minhas mais marcantes lembranças sempre chegam aonde vou.

(D) Quando necessário, os instrutores assistem aos usuários da nova tecnologia, e essa ajuda é fundamental para muitos.

(E) Os alunos de hoje preferem mais o laptop do que lápis e canetas.

 

6) Releia o trecho abaixo.

    Tenho um PC mastodôntico, contemporâneo das cavernas da informática.

a)   Considerando o contexto, qual é o sentido da palavra destacada?

Gigantesco.

b)   Ainda nesse mesmo contexto, por que o cronista diz que seu “PC mastodôntico” é “contemporâneo das cavernas da informática”?

Porque ele é muito antigo. O cronista usa a expressão “cavernas da informática” para sugerir um tempo muito antigo, o tempo das cavernas.

7)   Em relação ao trecho transcrito na questão anterior, responda às questões.

a)   Trata-se de uma oração? Por quê?

Identifique os elementos que justificam sua resposta.

Sim, é uma oração porque é um enunciado organizado em torno de um verbo, tenho.

O sujeito é eu, sujeito oculto (ou desinencial) e o predicado é “tenho um PC mastodôntico contemporâneo das cavernas da informática”.

 

b)   Em que pessoa verbal o trecho está escrito? A mesma pessoa se mantém no restante do texto? Justifique com mais dois exemplos.

Está escrito na 1ª pessoa, que se mantém em todo o texto.

Exemplos: vi, eu receberia, me (ajudar), minhas (necessidades), etc.

 

c)   Que efeito de sentido o uso dessa pessoa verbal produz no texto? De que forma isso se relaciona aos assuntos tratados?

O efeito é de subjetividade. O autor conta alguma coisa que lhe aconteceu recentemente, mas também narra lembranças.

Todo os acontecimentos são observados de acordo com seu próprio ponto de vista.

8)   Para responder às questões a seguir, releia o terceiro parágrafo do texto.

a)   Reconstitua a sucessão de acontecimentos do parágrafo, indicando o aconteceu em cada um dos três momentos seguintes.

·        O que o cronista recebeu no sábado?

Recebeu um embrulho.

·        O que ele fez?

Depois de muito lutar com o pacote, abriu a caixa e retirou seu novo notebook.

·        O que aconteceu de repente?

De repente, houve um corte em sua memória e ele se viu com 5 anos, diante de seu estojo escolar.

 

b)   Essa sucessão de acontecimentos caracteriza que tipo de sequência?

Narrativa.

c)   Quais foram os três marcos temporais usados para assinalar a sucessão dos acontecimentos?

“No sábado”, “depois” e “de repente”.

         9) Releia a última frase da crônica.

              Por que, em sua opinião, o autor diz que piorou de estojo e de vida?” Associe sua resposta à compreensão dos parágrafos anteriores.

Resposta pessoal.

Sugestão: A crônica faz uma comparação entre sua vida no passado e no presente, valorizando positivamente o que ele tinha no passado.  Ao relembrar o estojo, ele o compara ao notebook impessoal que comprou e considera que o estojo tinha suas qualidades. Da mesma forma, sua vida era mais simples e feliz.

10)Entre as características a seguir, quais caracterizam o texto lido como uma crônica? Assinale-as.

a)   Relata um fato atual, apresentando dados objetivos e depoimentos dos envolvidos.

b)   Usa um fato trivial, comum, para falar de emoções, sentimentos e impressões pessoais.

c)   Serve-se de comparações e outros recursos expressivos de valor literário, ainda que utilizando o registro informal.

d)   Dirige-se ao leitor para relembrar acontecimentos e comprovar um ponto de vista usando linguagem formal e culta.

 

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