Poema: O operário em construção – Fragmento
Vinicius
de Moraes
Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.
[...]
Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
— Garrafa, prato, facão —
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.
Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
[...].
Poesia completa e
prosa, cit. p. 293-294.
Fonte: Livro –
Português: Linguagens, 3ª Série – Ensino Médio – William Roberto Cereja,
Thereza Cochar Magalhães, 9ª ed. – São Paulo: Saraiva Editora, 2013. p. 274.
Entendendo o poema:
01 – Qual a principal
atividade do operário descrita no início do poema e qual a comparação inusitada
utilizada para ilustrar sua ascensão nas construções?
A principal
atividade do operário é erguer casas onde antes só havia chão. A comparação
inusitada utilizada para ilustrar sua ascensão é a de "um pássaro sem
asas", que, paradoxalmente, sobe com as casas que lhe "brotavam da
mão", enfatizando a força de seu trabalho manual.
02 – Segundo o poema, que
aspectos importantes da sua própria obra o operário desconhecia inicialmente?
Inicialmente, o
operário desconhecia a "grande missão" do seu trabalho.
Especificamente, não sabia que a casa de um homem é um "templo sem
religião" e que a casa que ele construía, embora representasse a liberdade
para outros, era para ele uma forma de "escravidão", aprisionando-o
em um ciclo de trabalho.
03 – Que "fato
extraordinário" o operário passa a compreender em um determinado momento,
e qual a situação cotidiana que desencadeia essa revelação?
O "fato extraordinário" que o operário passa a
compreender é que "o operário faz a coisa / E a coisa faz o
operário", revelando uma relação de interdependência e transformação mútua
entre o trabalhador e o produto do seu trabalho. Essa revelação ocorre em uma
situação cotidiana, à mesa, ao cortar o pão.
04 – Após a súbita emoção, o
que o operário constata de forma "assombrada" ao olhar ao seu redor?
Ao olhar ao seu
redor, o operário constata de forma "assombrada" que praticamente
tudo o que está à sua volta – desde os objetos simples da mesa ("garrafa,
prato, facão") até estruturas maiores como "gamela, banco, enxerga,
caldeirão", e até mesmo conceitos abstratos como "casa, cidade,
nação" – era ele quem fazia, ele, um humilde operário em construção.
05 – Qual a mudança na
autopercepção do operário que o poema destaca ao final do fragmento?
A mudança na
autopercepção do operário é que ele passa de ser um mero executor de tarefas
("um humilde operário / Um operário em construção") para um indivíduo
consciente do seu papel fundamental na criação do mundo material ("Ele, um
humilde operário / Um operário que sabia / Exercer a profissão"). Há um
reconhecimento do seu valor e da sua habilidade.
06 – A quem o eu lírico se
dirige na penúltima estrofe e qual a sua afirmação sobre o conhecimento do
operário naquele momento?
O eu lírico se
dirige aos "homens de pensamento" e afirma que eles nunca saberão o
quanto aquele humilde operário soube naquele momento. Isso sugere que a
compreensão do operário, embora não intelectualizada, possui uma profundidade e
um significado que escapam àqueles que apenas teorizam sobre o trabalho.
07 – Qual a principal reflexão
sobre o trabalho e a consciência do trabalhador que emerge deste fragmento do
poema?
A principal reflexão que emerge é sobre a
complexa relação entre o trabalhador e o seu trabalho, a alienação inicial da
sua importância e o potencial despertar para a consciência do seu papel
fundamental na construção da realidade. O poema destaca a dignidade do trabalho
manual e a profunda compreensão que pode surgir da experiência prática,
contrastando com a mera abstração intelectual.
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