terça-feira, 22 de janeiro de 2019

TEXTO: RITUAIS ANTROPOFÁGICOS - JORGE CALDEIRA - COM QUESTÕES GABARITADAS

Texto: Rituais antropofágicos
                  
    Jorge Caldeira

        A antropofagia foi o ritual indígena que mais atraiu a atenção dos europeus. Provavelmente surgido na época de guerras, esse ritual estava muito longe da selvageria. Era antes uma homenagem à coragem do adversário batido em combate. Nos guerreiros que caíam prisioneiros era posto um colar de algodão – em casos especiais suas mãos eram atadas ao colar. Antes de entrar na aldeia, recebiam tratamento especial: tinham o cabelo cortado e ganhavam vistosos cocares. Na entrada, eram saudados por todos com gritos.
        A vida do prisioneiro não era difícil. Ofereciam-lhe uma mulher, que lhe garantia alimentação e com quem dividia a rede. Embora proibido de deixar a aldeia, podia andar por onde quisesse e conversar com todos. Muitas vezes, nascia um filho de seu relacionamento com a mulher que lhe fora destinada. A esta, na hora do sacrifício, cabiam várias providências, como preparar as vasilhas e as bebidas do evento. Enquanto isso, os homens tratavam de espalhar a notícia, convidando membros de outras tribos.
        A cerimônia podia durar vários dias. No primeiro, o prisioneiro recebia uma corda de algodão especial e era conduzido ao terreiro, onde lhe pintavam todo o corpo. No segundo e no terceiro dia realizavam-se danças em torno da grande figura. No quarto, ele era levado logo cedo para um banho, e só então começava o sacrifício propriamente dito. Sua coragem era testada durante todo o tempo, e esperava-se que demonstrasse altivez para merecer morte tão importante.
        No quinto dia consumava-se o sacrifício. Pela manhã a mulher se despedia e ia chorar em sua oca. Toda a preparação ritual, as danças e os cantos chegavam ao fim. Armado de borduna, um guerreiro valente o abatia; se caía de costas, era sinal de que o matador iria morrer; de bruços, que a tribo teria grande futuro. Então seus restos eram levados para o lado de uma fogueira. Algumas partes do corpo eram comidas cruas; outras, mais nobres, eram moqueadas ou assadas.

                        CALDEIRA, Jorge. Viagem pela História do Brasil.
Cia das Letras: São Paulo, p. 17.
Entendendo o texto:

01 – Qual é a finalidade desse texto?
      Informar o leitor sobre o ritual indígena da antropofagia.

02 – Qual é a informação mais importante de cada parágrafo?  Escreva-a no seu caderno.
      1° parágrafo: A antropofagia, ritual indígena que atraiu a atenção dos europeus, era uma homenagem à coragem do prisioneiro.
      2° parágrafo: O prisioneiro era bem tratado durante os dias que antecedem sua morte: recebia alimentação e a ele era destinada uma mulher.
      3° parágrafo: O cerimônia podia durar vários dias e sua coragem era testada o tempo todo.
      4° parágrafo: Depois do sacrifício, algumas partes de seu corpo eram comidas pelos adversários.

03 – Considere que esse texto faz parte de um livro que tem, como finalidade, contar a História do Brasil. A descrição detalhada do ritual antropofágico indígena constitui uma pausa no decorrer do relato histórico, organizado em uma narração sistemática e cronológica dos acontecimentos históricos. Que justificativa se dá para essas informações?
      O fato de este ser o ritual indígena que mais atraiu a atenção dos europeus da época.

04 – Releia este comentário: “Esse ritual estava muito longe da selvageria”.
a)   O dicionário traz alguns significados para a palavra “selvagem”, que origina “selvageria”. Considerando o contexto linguístico em que está inserida, responda: qual das acepções é a adequada?
1.   Das selvas, ou próprio delas; selvático, silvático, silvestre.
2.   Habitante das selvas; silvícola, selvícola.
3.   Silvestre.
4.   Inculto, sáfaro, agreste.
5.   Desabitado, deserto, ermo.
6.   Bravo, bravio, feroz.
7.   Que ainda não foi domado, amansado, domesticado, ou que é difícil de o ser.
8.   Sem civilização, primitivo, bárbaro.

b)   O termo possui conotação positiva ou negativa?
Negativa.

c)   Com esse comentário, o autor estaria dando uma resposta a quem considera o ritual uma selvageria. De quem poderia ser essa tese?
Da cultura europeia, religiosa cristã, que não vê com bons olhos a ideia de comer carne humana.

d)   Pode-se afirmar, portanto, que o comentário pressupõe um leitor “ideal”? Explique.
Sim. Explicar que o ritual não era uma “selvageria”, significa pressupor leitores que assim pensem ou leitores que conheçam a tese dos europeus da época.

05 – Releia este trecho do texto: “Sua coragem era testada o tempo todo, e esperava-se que demonstrasse altivez para merecer morte tão importante”. O autor descreve como eram os “testes”? Por que não o faz?
      Não. Provavelmente porque se supõe que o leitor poderia considerar esse detalhes “atos de selvageria”.

06 – Além do pressupor um leitor ideal, o comentário de que “esse ritual estava muito longe da selvageria” também pode ser lido como uma tese, ou seja, uma proposição que se expõe para ser defendida. Como o autor a defende?
      O autor defende tal tese com dois procedimentos: primeiro, descrevendo apenas os aspectos do ritual que a cultura religiosa europeia cristã considera positivos: o prisioneiro era bem tratado, recebia tratamento especial, podia andar e conversar com quem quisesse, tinha mulher e era alimentado. Segundo, omitindo detalhes das “provas” que testavam a coragem do prisioneiro e da execução propriamente dita, detalhes esses que poderiam ser considerados pelo leitor, atos de “selvageria”.

07 – Observe que a descrição dos fatos sempre passa pela interpretação subjetiva do historiador. Considere, por exemplo, o fato de o prisioneiro “ganhar” uma mulher para “dividir a rede” com ele, e a possibilidade inclusa de se gerar um filho. O fato foi interpretado pelo historiador de forma positiva, como um “presente”, uma cortesia do inimigo. Há outra interpretação para esse aspecto do ritual? Comente.
      Sim. Considerando que as nações indígenas admiravam a força, a coragem e a valentia do prisioneiro a ser morto, a finalidade de promover o relacionamento com alguém da aldeia poderia ser justamente a geração de um filho com as mesmas características que tanto admiravam. Portanto, não haveria nenhuma relação com “cortesia”.

08 – O texto “Rituais antropofágicos” informa que a coragem do prisioneiro “era testada durante todo o tempo, e esperava-se que demonstrasse altivez para merecer morte tão importante”. Pode-se deduzir, a partir desse trecho, alguns valores atribuídos à cultura indígena. Quais?
      A valentia e a coragem eram os valores cultuados. A morte em um ritual antropofágico era um prêmio para o guerreiro corajoso.

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