FÁBULA: TROPEÇÕES
DA INTELIGÊNCIA
RUBEM ALVES
Há a história dos dois ursos que caíram
numa armadilha e foram levados para o circo. Um deles, com certeza mais
inteligente que o outro, aprendeu logo a se equilibrar na bola e a andar no monociclo,
o seu retrato começou a aparecer em cartazes e todo o mundo batia palmas: “Como
é inteligente”. O outro, burro, ficava amuado num canto, e, por mais que o
treinador fizesse promessas e ameaças, não dava sinais de entender. Chamaram o
psicólogo do circo e o diagnóstico veio rápido: “É inútil insistir. O QI é
muito baixo...”.
Ficou abandonado num canto, sem
retratos e sem aplausos, urso burro, sem serventia... O tempo passou. Veio a
crise econômica e o circo foi à falência. Concluíram que a coisa mais caridosa
que se poderia fazer aos animais era devolvê-los às florestas de onde haviam
sido tirados. E, assim, os dois ursos fizeram a longa viagem de volta.
Estranho que em meio à viagem o urso
tido por burro parece ter acordado da letargia, como se ele estivesse
reconhecendo lugares velhos, odores familiares, enquanto seu amigo de QI alto
brincava tristemente com a bola, último presente Finalmente, chegaram e foram
soltos. O urso burro sorriu, com aqueles sorrisos que os ursos entendem, deu um
urro de prazer e abraçou aquele mundo lindo de que nunca se esquecera. O urso
inteligente subiu na sua bola e começou o número que sabia tão bem. Era só o
que sabia fazer. Foi então que ele entendeu, em meio às memórias de gritos de
crianças, cheiro de pipoca, música de banda, saltos de trapezistas e peixes
mortos servidos na boca, que há uma inteligência que é boa para circo. O
problema é que ela não presta para viver.
Rubens Alves. Estórias de quem gosta de ensinar.
São Paulo: Cortez, 1987. p. 12-3.
1 – Escreva como os dois
ursos se comportam:
a)
No circo.
- O Urso “inteligente”: equilibra-se na bola, anda de monociclo, faz
sucesso.
- O Urso “burro”: tem baixo
QI; não aprende nada.
b)
Na floresta.
- O Urso “inteligente”: fica triste, repetindo o que sabia fazer no
circo.
- O Urso “burro”: acorda, fica feliz e se adapta imediatamente ao
lugar.
2 – Copie em seu caderno o
resumo esquematizado do texto e complete-o na sequência dos acontecimentos.
Urso na
armadilha; sucesso de um dos ursos: fracasso do outro e o retorno para a
floresta.
3 – Por que o autor criou o
texto com uma estrutura circular? Procure no texto outros elementos que têm
essa estrutura.
O autor fala em bola, monociclo, objetos
que lembram o círculo. O próprio circo, com seu picadeiro e sua estrutura,
lembra o círculo. Daí a “estrutura circular” do texto. O significado dessa
estrutura pode estar ligado ao fato de estarmos presos a uma rotina ou a um
círculo vicioso à medida que temos conceitos errados sobre a situações do
ensino e não fazemos nada para muda-las. Chamar a atenção dos alunos para o
fato de que o texto figurativo é muito mais interessante que o temático porque
traz à mente do leitor imagens concretas: neste caso, é toda a vida mágica e
aventureira do circo, com suas cores (bolas, trapezistas) sons (aplausos,
gritos, banda) cheiros (animais, pipocas), além, é claro, da imagem da floresta
que se reconstitui na memória do leitor com toda sua beleza e naturalidade.
4 – No segundo período do
primeiro parágrafo, existe uma afirmação categórica do autor. Essa afirmação é
confirmada ou negada no final do texto? Com que intenção o autor a usou? Na sua
opinião, por que escolheu narrar a história em terceira pessoa?
“Um deles, com
certeza mais inteligente que o outro...” A afirmação é negada. A intenção do
autor era mostrar que a “inteligência” do urso era apenas aparente ou
específica para determinadas habilidades. O narrador em terceira pessoal
procura distanciar-se dos acontecimentos para imprimir uma certa neutralidade
ao texto. Há uma tentativa de imitar a fábula: conta-se um fato que aconteceu
num lugar não definido, num tempo mítico, que ele não define qual é. Trata-se,
na verdade, de uma estratégia, de um “despistamento” da verdadeira intenção de
seu texto.
5 – Seria correto afirmar
que “Tropeções da inteligência” é uma fábula? Por quê? O que você sabe sobre as
personagens desse tipo de história?
Sim, é uma espécie de fábula porque as
personagens são animais, e ela procura passar um ensinamento Mas é uma fábula
moderna porque também há personagens que são pessoas.
6 – O autor introduz na
história algumas modernizações que não estão presentes nas fábulas
convencionais. Quais?
Ele cita
psicólogo e diagnóstico. O circo passa por crise econômica e vai à falência.
Fala também em QI (quociente de inteligência).
7 – Que passagem, no
terceiro parágrafo, nos revela que o urso só poderia ser compreendido em seu
verdadeiro hábitat?
“O urso burro sorriu, com aquele sorriso
que os burros entendem...”.
8 – É comum haver psicólogo
em um circo? Qual a verdadeira intenção do autor ao colocá-lo na história?
Afinal, o que o circo representa?
Não. Ao falar em psicólogo e QI, o autor
quer fazer referência às escolas e não aos circos.
9 – A partir da afirmação de
que “há uma inteligência que é boa para circo. O problema é que ela não presta
para viver”, que relações poderíamos estabelecer entre o texto e nossa
realidade? Quem são, na verdade, os ursos? Quem é o inteligente? Quem é o
“burro”? (Lembre-se que os animais sobrevivem; nós, humanos, é que utilizamos
nossos conhecimentos para viver).
Poderíamos estabelecer relações entre o
texto e um determinado tipo de ensino que é dado aos alunos e que não lhes
serve para enfrentar a vida. Os ursos, simbolicamente, seriam os alunos: os
“inteligentes” seriam os que se deixam adestrar; os “burros”, os que não
aceitam esse tipo de “adestramento”.
10 – Reflita sobre o título
do texto: Quem está “tropeçando” afinal? A que inteligência o autor se refere?
A hipótese que você formulou a partir do título se confirmou?
Verificar se as
hipóteses dos alunos se confirmaram. O título dá origem a várias interpretações:
tropeções podem ser enganos, erros, equívocos; a “inteligência” pode ser
interpretada aqui em seu sentido convencional. “Tropeçam” aqueles que têm um
julgamento incorreto sobre o que é ser inteligente e então fica bem clara a
crítica contundente feita às escolas.
11 – Leia esta frase de
Rubem Alves:
“Para construir uma bomba atômica é
preciso ser muito inteligente.
Para tomar a decisão de desmontar todas
elas é necessário ser sábio”.
a)
Relacione o que ele diz ao texto que você
leu.
No texto “Tropeções da inteligência”, o urso considerado “burro”
podia não ter as habilidades necessárias ao malabarismo do circo (habilidades
que, no circo, eram interpretadas como inteligência). Mas tinha a sabedoria que
o integrava a seu habitat.
b)
Escreva o que você entende por inteligência e
o que você entende por sabedoria.
Resposta pessoal do aluno.
12 – Alguns recursos
normalmente usados em poemas podem dar expressividade à prosa.
Observe como alguns fonemas se repetem:
“O urso
burro sorriu (...) deu um urro...”
a)
Localize no texto outros recursos
semelhantes.
Há vários exemplos; observar, principalmente, a repetição de vogais
fechadas (o e u), em especial quando o texto se refere ao “urso burro”.
b)
Encontre também, no segundo parágrafo, a
repetição de uma preposição utilizada como recurso de linguagem e explique por
que esse recurso foi empregado.
Observar, também, a repetição da preposição sem (tira-se tudo do
urso: retrato, aplauso, serventia).
Qual a abordagem da questão dos estereótipos? Qual a sua opinião a respeito?
ResponderExcluirgostei deste testo..
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