Machado de Assis
--- (...) Deixe ver os olhos Capitu.
Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles, “olhos de cigana
oblíqua, dissimulada”. Eu não sabia o que era oblíqua, mas dissimulada sabia, e
queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me
perguntava o que era, se nunca os vira; eu nada achei extraordinário; a cor e a
doçura eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que lhe deu outra
ideia do meu intento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto,
com os meus olhos longos, constantes, enfiado neles, e a isto atribuo que
entrassem a ficar crescidos, crescidos e sombrios, com tal expressão que...
Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que
foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, em quebra da
dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de
ressaca. É o que me dá ideia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido
misterioso e energético, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que
se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às
outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos
ombros mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha
crescendo, cava e escura ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me. (...)
Machado de Assis, Dom Casmurro.
Entendendo
o texto:
01 – O
que levou o narrador a caracterizar os olhos de Capitu como “olhos de ressaca”?
Em função da grande emoção que Capitu exercia sobre ele, Bentinho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário