segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

ARTIGO DE OPINIÃO: RESPONSABILIDADE PENAL - LINHA DIVISÓRIA - ALYRIO CAVALLIERI- COM GABARITO

ARTIGO DE OPINIÃO:  RESPONSABILIDADE PENAL -  LINHA DIVISÓRIA


        Fixar uma idade a partir da qual o adolescente está em condições de responder por crimes que venha a cometer é uma decisão que tem necessariamente uma grande dose de arbitrariedade.
        É natural que não se possa processar criminalmente uma criança de 5 anos, mas que um rapaz de 19 anos que tenha cometido um crime deva cumprir pena; quanto a isso, dificilmente haverá quem discorde. Entretanto, não se conhece um critério definitivo para estabelecer que, por exemplo, quem completou 14 anos já está em condições de assumir responsabilidade penal. Porque o discernimento, é evidente, não surge magicamente, num determinado dia, e sim se forma gradualmente.
        Não existe, entretanto, alternativa razoável. É impossível evitar a arbitrariedade, pois em algum ponto será preciso traçar a linha divisória, exatamente como se faz para determinar em que idade se deve cumprir o serviço militar ou votar, ou em que idade se pode tirar a carteira de motorista – e todos sabem que um carro, em mãos irresponsáveis, pode se tornar uma arma mortal.
        Os 18 anos de idade para a responsabilidade penal, se algum dia foram justos, hoje certamente são demais. Em países desenvolvidos, como a Inglaterra, Estados Unidos França e outros, menores de 18 anos vão a julgamento, e por todos os motivos uma política semelhante deveria ser adotada no Brasil. Não há como supor que um rapaz de 16 anos seja incapaz de distinguir o que é ilícito ou de prever as consequências de seus atos; de saber para que serve uma arma ou de compreender a diferença entre o roubo e uma travessura.
        Contra a ideia de diminuição da idade da responsabilidade penal costumam ser apresentados argumentos aparentemente válidos, como o de que a cadeia é na realidade uma escola do crime, ou de que os criminosos são sempre fruto da sociedade em que vivem. Mas essas considerações, embora convincentes, são irrelevantes. Fazem parte de uma discussão bem mais ampla, sobre a maneira mais eficiente de combater a criminalidade e de fazer justiça, mas não tem aplicação na questão da responsabilidade penal, pois dizem respeito a qualquer idade.

        MENOR NA CADEIA?

        O Congresso Nacional começa a discutir projeto que pretende alterar a idade da responsabilidade penal.
        Quando se pergunta ao auditório, em aulas ou conferências, com que idade o menor deve ir para a cadeia pela prática de um crime, a quase unanimidade responde: 16 anos. Alguns preferem os 14 ou até menos. Se escolhe alguém para explicar o porquê, a resposta é infalível: “Se pode votar, pode ir para a cadeia.” Esta resposta está dentro do raciocínio do “se sabe o que faz, deve pagar pelo que fez”. No entanto, este argumento é o mais frágil de todos e por duas razões.
        O sistema não é baseado no “sabe o que está fazendo”, mas na idade, independentemente da sabedoria. O critério da idade não é justo, nem científico, porque, primeiro, um único dia determina uma diferença absoluta quanto aos direitos e deveres; segundo, porque não existe ciência no mundo que garanta que o discernimento de um ser humano começa ou acaba no dia de um aniversário.
        No entanto, embora imperfeito o sistema da idade é o único capaz de evitar discriminação, porque é absolutamente universal. É por isso que mulher só casa com 16, com autorização dos pais, e homem com 18 anos;
Com 16 anos até o analfabeto vota; mas o deputado mais votado do Brasil não pode ser senador antes dos 35 anos; o mais hábil motorista não consegue a carteira antes dos 18 anos; o mais sábio desembargador deixa de julgar no dia em que completa 70 anos. E o criminoso só vai para a cadeia com 18 anos. Em nenhum caso, qualquer que seja a “sabedoria” da pessoa, ela adquire ou perde direitos se não tiver essa idade, mesmo que haja uma diferença de um único dia. Afinal, a consciência do certo e do errado todos tem, desde tenra idade.
        A discussão tem que mudar de eixo. Deve-se indagar é se a cadeia é a solução para a delinquência juvenil. A prisão e a gravidade de pena por si só não resolvem.
        Temos um exemplo histórico. A pena máxima para o traficante de drogas aumentou de cinco para sete e para 15 anos e, agora, é crime hediondo; os maiores criminosos estão em presídio de segurança máxima e o tráfico não diminuiu. Uma boa lei para menores infratores impõe consequências dentro de um sistema de justiça, muito mais eficazes que o puro e simples encarceramento.
        Solução? Manter os 18 anos para a responsabilidade penal e um exame profundo do Estatuto da Criança e do Adolescente, nove anos depois de sua vigência. Ele não permite que um menor traficante, preso em flagrante com grande quantidade de tóxicos e armas, seja internado; fixa prazos para as medidas socioeducativas, impedindo a reeducação; e muitas outras imperfeições estão demonstrando que é hora de ser avaliado. A cadeia, por si só, não é a solução.

                                  Alyrio Cavallieri é desembargador e ex-juiz de menores.
                                                                                              O Globo, 18/04/1999.

1 – Por que o autor intitulou o texto de Linha Divisória?
      O estabelecimento de limite entre ser ou não responsável por atos praticados.

2 – O que é definido como arbitrariedade no texto?
       Julgamento pessoal.

3 – Reescreva, com suas próprias palavras, o 1º parágrafo do texto, resumindo-o.
       Resposta pessoal.

4 – De que argumento o autor se utiliza, no 2º parágrafo, para comprovar a ideia veiculada sobre a dificuldade de estabelecer-se um critério definitivo para que o adolescente tenha condições de assumir responsabilidades?
       Da falta de critério para julgar se um jovem está ou não em condições de assumir responsabilidade sobre seus atos.

5 – Reescreva, com suas próprias palavras, o 2º parágrafo, resumindo-o.
       Resposta pessoal.

6 – No 3º parágrafo, de que recurso lança mão o autor para sustentar o argumento principal de seu texto?
       A exemplificação.

7 – E no 4º parágrafo, qual o recurso?
       A citação exemplificativa.

8 – O último parágrafo do texto contém argumentos e contra-argumento. Aponte-o.
        Argumentos: A cadeia é uma escola do crime e os criminosos são frutos da sociedade em que vivem.
       Contra-argumento: A maneira mais eficiente de combater a criminalidade e de fazer justiça.

9 – No 2º parágrafo de Menor na Cadeia, ocorre a frase “se sabe o que faz, deve pagar pelo que fez”. Com que finalidade ela foi utilizada?
       Servir como argumento para quem defende a ideia de responsabilidade criminal para jovens com 16 anos, ou menos, de idade.

10 – Cite dois pontos de contato entre os textos, ou seja, pontos de vista com idêntica base de sustentação.
        Na discussão da “linha divisória” e na necessidade de rever-se o combate da criminalidade em suas formas de atuação.

11 – E você? Qual é o seu ponto de vista sobre o tema?
        Resposta pessoal.


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