quinta-feira, 14 de agosto de 2025

CRÔNICA: AS METAMORFOSES DA VELHICE - FRAGMENTO - RUBEM ALVES - COM GABARITO

 Crônica: As metamorfoses da velhice – Fragmento

              Rubem Alves

        Matsuó Bashô (1644-1694), poeta japonês, foi o mestre supremo dos haikais. Leminski, valendo-se de uma sugestão de Jorge Luís Borges, descreve um haicai como um objeto poético mínimo de peso intolerável.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhuIICK3YtwzcYUst0irrPJPx7boyxaopvhaVTzNfH7NyAkK1PeNlz3EGrj_N3XeHDTR6H48jiFdzz5KFtEzmlxyoir4dLi4in4uLfVxPBo_ttO5neYUQQQp_vffBerpj3JLk29LRF_0eOHzfpPK5J6-BdL97UDdMAFykyvkWzXLGnAtzzb9-Y2Y2BddcM/s320/cropped-imagem-cabecalho-metamorfose-1.jpeg


        Esse é um dos seus mais famosos haicais de Bashô:

        “Casca oca:

        a cigarra

        cantou-se toda.” 


        Bashô é apelido; significa “bananeira”. Era a árvore favorita do poeta. Trata-se de árvore estranha: dá um cacho de bananas somente. Seu caule extremamente macio deve então ser cortado – o que pode ser feito com um único golpe de facão. Cortado o caule, de dentro do cepo velho nasce um broto que cresce e vira outra bananeira. Eu havia cortado várias bananeiras que impediam o acesso a uma cachoeira, em Pocinhos do Rio Verde. Algumas semanas depois voltei àquele lugar, e esse haicai apareceu-me instantaneamente:

        “Bananeira cortada:

        no cepo velho

        um broto criança”.

        Entendi, então, a razão do gosto de Bashô pelas bananeiras: elas simbolizam a nova vida que brota sempre de dentro da vida velha, acabada. Foi isso que Bashô viu ao contemplar as cascas vazias das cigarras: [...].

        As cigarras são seres subterrâneos silenciosos – algumas chegam a ficar 17 anos enterradas sob a forma de larva. De repente saem da terra, arrebentam as cascas duras que as continham (eram ataúdes) e se tornam artistas, seres alados, cantantes. Antes mesmo de ter lido o haicai de Bashô colhi, no bosque onde caminho, algumas cascas vazias de cigarra e as coloquei num bonsai, no meu consultório: tinha esperança de que as pessoas entendessem aquele haicai sem palavras: seres subterrâneos podem se tornar seres alados!

        As lagartas, cuja vida se resume em devorar as folhas sobre que se arrastam, após esgotarem essa fase rastejante e gastronômica, entram num sarcófago que elas mesmas tecem, mergulham num sono profundo, e quando acordam não mais se reconhecem: tornaram-se uma outra coisa: seres coloridos, voantes de flor em flor, borboletas.

        Metamorfoses… acontecem sempre de repente – e embora não pareça, somos nós, seres humanos, aqueles que passam por elas com mais facilidade. Nossos corpos são mais leves que os corpos dos animais. É que nossas cascas, diferentes das dos animais, são feitas com palavras, carne e palavras misturadas. Basta que as palavras se alterem para que o corpo se metamorfoseie num outro.

        [...]

Rubem Alves. Livro sem fim. São Paulo: Edições Loyola, 2002. p. 43. (Fragmento adaptado).

Fonte: Língua Portuguesa: Singular & Plural. Laura de Figueiredo; Marisa Balthasar e Shirley Goulart – 7º ano – Moderna. 2ª edição, São Paulo, 2015. p. 192-193.

Entendendo a crônica:

01 – Quem foi Matsuó Bashô e como Leminski descreve o haicai, valendo-se de uma sugestão de Jorge Luís Borges?

      Matsuó Bashô foi um poeta japonês, considerado o mestre supremo dos haikais. Leminski, seguindo Borges, descreve o haicai como um "objeto poético mínimo de peso intolerável".

02 – Qual o significado do apelido "Bashô" e por que a bananeira era a árvore favorita do poeta?

      "Bashô" significa "bananeira". A árvore era sua favorita porque ela simboliza a nova vida que brota sempre de dentro da vida velha e acabada, pois, ao ser cortada, um novo broto nasce do cepo.

03 – Qual o haicai criado por Rubem Alves após cortar as bananeiras, e o que ele entendeu com isso?

      O haicai criado por Rubem Alves foi: "Bananeira cortada: no cepo velho um broto criança". Com ele, o autor entendeu a razão do gosto de Bashô pelas bananeiras, percebendo que elas simbolizam a renovação da vida.

04 – Descreva o processo de metamorfose da cigarra, conforme o texto.

      As cigarras são seres subterrâneos e silenciosos que podem passar até 17 anos como larvas. De repente, elas saem da terra, rompem suas cascas duras (como ataúdes) e se tornam artistas, seres alados e cantantes.

05 – Com que propósito Rubem Alves colocou cascas vazias de cigarra em um bonsai em seu consultório?

      Ele fez isso na esperança de que as pessoas entendessem "aquele haicai sem palavras", transmitindo a mensagem de que "seres subterrâneos podem se tornar seres alados!".

06 – Como o texto descreve a metamorfose das lagartas e o que elas se tornam ao final do processo?

      As lagartas, após uma fase rastejante e gastronômica de devorar folhas, entram em um sarcófago que elas mesmas tecem, mergulham em um sono profundo e, ao acordar, se tornam borboletas, seres coloridos e voantes de flor em flor.

07 – Segundo Rubem Alves, por que os seres humanos são aqueles que passam por metamorfoses com mais facilidade, e o que as nossas "cascas" são feitas?

      Os seres humanos passam por metamorfoses com mais facilidade porque nossos corpos são mais leves que os dos animais e nossas cascas são feitas com palavras, carne e palavras misturadas. Basta que as palavras se alterem para que o corpo se metamorfoseie.

 

 

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