domingo, 10 de agosto de 2025

POEMA: PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR QUE LÊ - BERTOLD BRECHT - COM GABARITO

 Poema: Perguntas de um trabalhador que lê

             Bertold Brecht

Quem construiu a Tebas de sete portas?

Nos livros estão nomes de reis.

Arrastaram eles os blocos de pedra?

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjLdxYjBpp-JSUsUs6wL57NmkEGxyqZQzc6cYd_tgpDnjcTcJLK2FoBRD2wqVPFwFJPUDaLZ9axZxmIrEWK97iVMFVcDlfHRmzZVU7l56lEYbmT8fefiMdH16xa_0wOkpXYPlfBRbnMkyk-eVVVXOYy6vivV7y-5aFAoGx_u351Sx_eukiM95Sm8Ge18s0/s1600/images.jpg


E a Babilônia várias vezes destruída

Quem a reconstruiu tantas vezes? Em que casas

Da Lima dourada moravam os construtores?

Para onde foram os pedreiros, na noite em que

A Muralha da China ficou pronta?

A grande Roma está cheia de arcos do triunfo

Quem os ergueu? Sobre quem

Triunfaram os césares? A decantada Bizâncio

tinha somente palácios para os seus habitantes?

Mesmo na lendária Atlântida

Os que se afogavam gritaram por seus escravos

Na noite em que o mar a tragou?

O jovem Alexandre conquistou a Índia.

Sozinho?

César bateu os gauleses.

Não estava sequer um cozinheiro?

Felipe da Espanha chorou, quando sua armada

naufragou. Ninguém mais chorou?

Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.

Quem venceu além dele?


Cada página uma vitória.

Quem cozinhava o banquete?

A cada dez anos um grande Homem.

Quem pagava a conta?


Tantas histórias.

Tantas questões.

Bertold, Brecht. Poemas 1913-1956. 5. ed. São Paulo: Ed. 34, 2000.

Fonte: Arte em Interação – Hugo B. Bozzano; Perla Frenda; Tatiane Cristina Gusmão – volume único – Ensino médio – IBEP – 1ª edição – São Paulo, 2013. p. 256-257.

Entendendo o poema:

01 – Qual é a principal tese ou argumento que Bertolt Brecht desenvolve no poema "Perguntas de um Trabalhador que Lê"?

      A principal tese do poema é questionar a história oficial e tradicional, que frequentemente foca apenas em grandes líderes, reis e generais, ignorando ou minimizando o papel fundamental das massas trabalhadoras na construção das civilizações e na realização de grandes feitos. Brecht argumenta que, por trás de cada monumento, conquista ou avanço, houve o esforço anônimo e o trabalho árduo de inúmeros indivíduos, cujas contribuições raramente são registradas nos livros de história. O poema busca desmistificar a glória individual e trazer à tona a importância da ação coletiva e do trabalho braçal.

02 – Como Brecht utiliza a enumeração de grandes feitos históricos (Tebas, Babilônia, Muralha da China, Roma, Bizâncio, Atlântida, conquistas de Alexandre e César) para fortalecer seu argumento?

      Brecht utiliza a enumeração de grandes feitos históricos para demonstrar a universalidade e a recorrência do problema que ele aponta: a invisibilidade do trabalhador comum. Ao listar monumentos e eventos de diferentes épocas e civilizações, como a construção de Tebas, a reconstrução de Babilônia, a conclusão da Muralha da China, os arcos de triunfo de Roma e os palácios de Bizâncio, Brecht mostra que em todas essas grandezas, a figura do trabalhador é sistematicamente apagada. A repetição dessas perguntas sobre quem realmente construiu ou trabalhou nesses projetos serve para acumular evidências e reforçar a tese de que a história está incompleta e distorcida ao focar apenas nos nomes dos poderosos.

03 – Qual o significado da pergunta "Arrastaram eles [os reis] os blocos de pedra?" e de outras perguntas semelhantes no poema?

      A pergunta "Arrastaram eles [os reis] os blocos de pedra?" é central para o poema, pois ela representa a desconstrução da imagem heroica e autossuficiente dos líderes. Brecht, através dessa e de outras perguntas semelhantes ("Em que casas / Da Lima dourada moravam os construtores?", "Não estava sequer um cozinheiro?" etc.), força o leitor a reconhecer a divisão de trabalho e a dependência dos grandes feitos em relação ao trabalho de muitos. A implicação é que reis e imperadores, por mais poderosos que fossem, não realizavam as tarefas braçais e cotidianas necessárias para construir impérios ou vencer guerras. Essas perguntas retóricas servem para expor a hipocrisia da narrativa histórica que atribui todo o mérito a uma única figura.

04 – Como o poema "Perguntas de um Trabalhador que Lê" sugere uma crítica à forma como a história é escrita e transmitida?

      O poema sugere uma crítica incisiva à forma como a história é escrita e transmitida, ao apontar que "Nos livros estão nomes de reis", mas não os nomes dos construtores. Brecht critica a historiografia tradicional, que se concentra em indivíduos notáveis, feitos militares e grandes eventos políticos, ignorando as condições de vida, o trabalho e as perspectivas das classes subalternas. Ele questiona a seletividade dos registros históricos, que glorificam os vencedores e os poderosos, silenciando as vozes e as contribuições daqueles que efetivamente construíram e sustentaram essas sociedades. A repetição de "Tantas histórias. / Tantas questões." no final do poema reforça a ideia de que a versão apresentada é parcial e incompleta, necessitando de um olhar crítico e questionador.

05 – Qual o impacto da perspectiva de um "trabalhador que lê" para a mensagem do poema?

      A perspectiva de um "trabalhador que lê" é crucial para a mensagem do poema. Ela confere autenticidade e legitimidade às perguntas levantadas. Não é um historiador ou um intelectual que faz essas indagações, mas alguém que, por sua própria condição social e experiência de trabalho, entende a importância do esforço físico e coletivo. O "trabalhador que lê" é capaz de enxergar as lacunas na história oficial porque sua vivência o conecta com a realidade do trabalho e da produção. Essa perspectiva subverte a autoridade das narrativas dominantes e valida um ponto de vista que normalmente é marginalizado, tornando o poema uma voz para aqueles que foram esquecidos pela história.

06 – Analise as duas últimas estrofes: "Cada página uma vitória. / Quem cozinhava o banquete? / A cada dez anos um grande Homem. / Quem pagava a conta?" O que elas adicionam ao argumento central?

      As duas últimas estrofes servem como um resumo conciso e uma generalização do argumento central do poema, ampliando a crítica para além dos exemplos históricos específicos.

      "Cada página uma vitória. / Quem cozinhava o banquete?": Essa estrofe questiona a glorificação contínua das vitórias nos anais da história. A "vitória" é frequentemente associada a generais ou líderes militares, mas Brecht nos lembra que por trás de qualquer triunfo há um vasto aparato de suporte e trabalho não reconhecido. O "banquete" simboliza não apenas a celebração, mas toda a infraestrutura e o esforço logístico e humano que permitem tais eventos, geralmente realizados por pessoas comuns.

      "A cada dez anos um grande Homem. / Quem pagava a conta?": Aqui, Brecht satiriza a periodicidade com que a história celebra "grandes Homens", sugerindo que essa exaltação individual é um padrão. A pergunta "Quem pagava a conta?" é um questionamento direto sobre os custos humanos e materiais por trás do sucesso desses "grandes Homens". Implica sacrifícios, exploração e o ônus sobre as massas, que sustentam esses feitos sem receber o devido reconhecimento ou benefício. Essas estrofes, portanto, sintetizam a crítica à invisibilidade do trabalho e do sacrifício coletivo em prol da glória individual.

07 – Qual é a relevância do poema de Brecht para a compreensão da história e da sociedade contemporânea?

      A relevância do poema de Brecht para a compreensão da história e da sociedade contemporânea é profunda. Ele nos convida a adotar um olhar crítico e descolonizado sobre as narrativas históricas, questionando quem as escreve, de que perspectiva e com quais propósitos. Em um mundo onde a fama e o reconhecimento ainda são predominantemente atribuídos a poucos, o poema de Brecht é um lembrete de que o funcionamento de qualquer sociedade depende do trabalho e da contribuição de milhões de indivíduos muitas vezes anônimos. Ele nos encoraja a valorizar o trabalho coletivo, a desafiar as hierarquias de valor e a reconhecer as vozes marginalizadas na construção da história e da realidade social. O poema continua a ser um chamado à conscientização sobre as desigualdades e a importância de uma análise histórica mais inclusiva e abrangente.

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário