Música (Atividades): Tropicália Lixo Lógico
A pureza Chapeuzinho
Passeando na floresta
Enquanto Seu Lobo não vem:
Mas o Lobo entrou na festa
E não comeu ninguém.

Era uma tentação,
Ele tinha belos motes,
O Lobo Seu Aristotes:
Expulsava todo incréu
Ali do nosso céu
Não era melhor, tampouco pior,
Apenas outra e diferente a concepção
Que na creche dos analfatóteles regia
Nossa moçárabe estrutura de pensar
Mas na escola, primo dia,
Conhecemos Aristotes,
Que o seu grande pacote
De pensar oferecia
Não recusamos
Suas equações
Mas, por curiosidade, fez-se habitual
Resolver também com nossas armas a questão -
Uma moçárabe possível solução
Tudo bem, que legal,
Resultado quase igual,
Mas a diferença que restou
O lixo lógico
Aprendemos a jogá-lo
No poço do hipotalo*.
Mas o lixo, duarteiro,
O córtex invadia:
Caegitano entorta rocha
Capinante agiu.
Composição: Tom Zé.
Tropicália lixo lógico, 2012. Gravadora independente.
Fonte: Arte em
Interação – Hugo B. Bozzano; Perla Frenda; Tatiane Cristina Gusmão – volume
único – Ensino médio – IBEP – 1ª edição – São Paulo, 2013. p. 328-329.
Entendendo a música:
01 – Qual é a crítica central
que Tom Zé faz à "pureza" e à entrada do "Lobo" na festa no
início da música?
No início da
música, Tom Zé utiliza a metáfora da "pureza Chapeuzinho / Passeando na
floresta / Enquanto Seu Lobo não vem" para representar uma visão ingênua
ou idealizada da cultura e do pensamento. A "pureza" pode ser
interpretada como uma forma de pensamento ocidental dominante, talvez o
racionalismo cartesiano ou a lógica aristotélica, que busca a ordem e evita o
caos. A entrada do "Lobo" – que não "comeu ninguém" – é uma
reviravolta irônica. Esse "Lobo" é, na verdade, "Seu
Aristotes", uma personificação da lógica aristotélica e do pensamento
ocidental racional. A crítica central é que essa imposição de uma lógica
"pura" ou hegemônica, embora não seja destrutiva no sentido literal
("não comeu ninguém"), tenta expulsar ou silenciar outras formas de
pensar ("Expulsava todo incréu / Ali do nosso céu"), especialmente as
que não se encaixam em seus moldes.
02 – Como a música apresenta a
relação entre a "concepção" "moçárabe" de pensar e o
"pacote de pensar" de Aristóteles?
A música
apresenta a relação entre a "concepção" "moçárabe" de
pensar e o "pacote de pensar" de Aristóteles como um confronto de
sistemas de lógica e raciocínio. A "moçárabe estrutura de pensar"
refere-se a uma forma de conhecimento híbrida, que emerge da mistura de
culturas (como a árabe e a ibérica na Península Ibérica durante a Idade Média),
caracterizada por sua flexibilidade e talvez uma menor rigidez lógica. Em
contrapartida, o "pacote de pensar" de Aristóteles representa a
lógica ocidental formal, com suas "equações" e regras bem definidas.
Tom Zé sugere que, embora não recusem as equações de Aristóteles, há uma
curiosidade e uma necessidade de resolver questões "com nossas
armas", ou seja, com a própria lógica moçárabe. O resultado, embora
"quase igual", revela uma "diferença que restou" – o
"lixo lógico". Isso indica que a lógica ocidental não é a única nem a
superior, e que outras formas de raciocínio, mesmo que consideradas
"impuras" ou "ilógicas" por ela, são válidas e necessárias.
03 – O que Tom Zé quer dizer
com "lixo lógico" e como ele se relaciona com a ideia de
"Tropicália"?
O "lixo
lógico" é a diferença que resta quando se tenta aplicar a lógica
aristotélica (ocidental e racional) a uma realidade que não se encaixa
perfeitamente nela. É aquilo que é descartado, considerado irracional, absurdo
ou sem sentido pelas regras estabelecidas. Para Tom Zé, esse "lixo"
não é desprezível; ao contrário, ele é valorizado e se torna a essência da
"Tropicália". O movimento tropicalista defendia a antropofagia cultural,
a apropriação e a digestão de elementos diversos (nacionais, estrangeiros,
populares, eruditos) para criar algo novo e autêntico, que muitas vezes
desafiava as categorizações e as lógicas estabelecidas. O "lixo
lógico" é justamente a riqueza da contradição, da ambiguidade e do
sincretismo que define a identidade brasileira, algo que a lógica pura tenta
descartar, mas que o Tropicalismo abraça como fonte de criatividade e verdade.
04 – Qual é o significado de
"Aprendemos a jogá-lo / No poço do hipotalo" e o que acontece quando
"o lixo... o córtex invadia"?
A frase
"Aprendemos a jogá-lo / No poço do hipotalo" sugere que, em algum
momento, as formas de pensar consideradas "ilógicas" ou
"desviantes" foram suprimidas ou relegadas às áreas do cérebro
associadas a funções mais primitivas, emoções ou inconsciente (o hipotálamo). É
como se houvesse um esforço para reprimir ou esconder aquilo que não se encaixa
na lógica dominante. No entanto, o poema afirma que "Mas o lixo,
duarteiro, / O córtex invadia". O córtex é a parte do cérebro associada ao
raciocínio, à linguagem e à consciência. Isso significa que o "lixo
lógico" – as formas de pensar não convencionais, a criatividade, a
irreverência, o hibridismo – não pode ser contido. Ele irrompe, toma conta do
pensamento racional e o subverte. Essa invasão é uma vitória do pensamento
não-linear e da cultura híbrida sobre a lógica cartesiana, resultando em novas
formas de expressão e percepção.
05 – Como as últimas linhas,
"Caegitano entorta rocha / Capinante agiu", personificam a ideia do
"lixo lógico" em ação?
As últimas
linhas, "Caegitano entorta rocha / Capinante agiu", são uma
personificação vibrante da ideia do "lixo lógico" em ação, usando
neologismos e nomes próprios para ilustrar essa subversão.
"Caegitano
entorta rocha": "Caegitano" é uma fusão de Caetano Veloso e
Gilberto Gil, figuras centrais do Tropicalismo. "Entorta rocha"
sugere um poder transformador, quase mágico, que desafia a rigidez e a solidez
da lógica estabelecida ("rocha"). É a ideia de que a criatividade e a
irreverência tropicalista são capazes de moldar e redefinir a realidade,
quebrando paradigmas.
"Capinante
agiu": "Capinante" remete à ação de "capinar", de
limpar ou cortar mato, mas aqui ganha um sentido de ação direta e talvez
inesperada, "agindo" de forma transformadora. Pode também ser uma
alusão a Capinam, outro artista ligado ao movimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário