quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

CONTO: UMA ESTRANGEIRA DA NOSSA RUA - FRAGMENTO - MILTON HATOUM - COM GABARITO

 Conto: Uma estrangeira da nossa rua – Fragmento

            Milton Hatoum.

        No caminho do aeroporto para casa, eu observava os lugares da cidade agora irreconhecível. Quase toda a floresta em torno da área urbana havia degenerado em aglomerações de barracos ou edifícios horrorosos. Em casa, tia Mira me recebeu com entusiasmo e contou uma ou outra novidade que, para mim, já não faziam sentido. Deixei a mala no quarto e quase sem querer perguntei pelos Doherty.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhwMBpQ9Y1SfQQs_r3H0n4JNFhYChqU1z7BGE4MYng17n5LrB5FD2BNmdE_PKpUEl9Z-0xf7LaxfBchEf6Dt10sysPVZEdzzKFuZrWJuyariGSfLYOfClnkPiDqe43JWjwwMbHjN4TfeGuCV8ZdCTJkUJsaY4jDHvn9GB7-Ubxicv2J_t9ju1BfQmbDGqI/s320/TURISTA.png


        Nunca mais voltaram, disse tia Mira. O pai ainda passou uns meses aqui, vendeu o bangalô e foi embora. O comprador derrubou o muro, a casa, a acácia. Tudo.

        Para onde foram?

        E quem pode saber? Aquela família vivia em outro mundo.

        Eu tinha acabado de chegar à cidade, e notara com tristeza a ausência da casa azul na nossa rua. Era um bangalô bonito, cercado por um muro de pedras vermelhas que uma trepadeira cobria; no pátio dos fundos uma acácia solitária floria nos meses de chuva e sombreava o quarto das duas irmãs. Agora um monte de escombros enchia o terreno na rua em declive.

        Na varanda de casa, ao olhar as ruínas do bangalô, me lembrei de Lyris, mais alta e também menos arredia que a irmã. O cabelo quase ruivo, o rosto anguloso e os olhos verdes e um pouco puxados embaralhavam traços do pai e da mãe. Só me dei conta dessa beleza estranha e misturada no fim da infância, quando senti alguma coisa terrível e ansiosa parecida com a paixão.

        Lyris devia ter uns dezoito anos, e a irmã era quase da minha idade: quinze.

        [...]

HATOUM, Milton. A cidade ilhada: contos. São Paulo: Companhia da Letras, 2009. p. 15-16. Fragmento.

Fonte: Português – Literatura, Gramática e Produção de texto – Leila Lauar Sarmento & Douglas Tufano – vol. 2 – Moderna – 1ª edição – São Paulo, 2010, p. 449.

Entendendo o conto:

01 – Qual a principal mudança ocorrida na cidade e no entorno da casa do narrador?

      A principal mudança é a devastação da natureza e a urbanização desenfreada. A floresta que antes rodeava a cidade foi substituída por aglomerações de barracos e edifícios, e a casa dos Doherty, com seu jardim e árvores, foi demolida, dando lugar a um terreno baldio. Essa transformação reflete uma perda da identidade e da história do lugar.

02 – Qual o significado da ausência da casa dos Doherty para o narrador?

      A ausência da casa dos Doherty representa a perda de um ponto de referência e de uma figura feminina que despertou nele sentimentos de paixão e admiração. A casa e seus habitantes simbolizavam um mundo diferente, mais livre e misterioso, que contrasta com a realidade da cidade transformada.

03 – Como o narrador descreve Lyris?

      O narrador descreve Lyris como uma jovem bela e enigmática, com traços físicos que misturam a herança de seus pais. Ele destaca a beleza de seus olhos verdes e a sua altura, contrastando-a com a irmã mais nova. A descrição de Lyris é marcada por um tom de admiração e desejo.

04 – Qual a importância da figura de Lyris para o narrador?

      Lyris representa o despertar da sexualidade e dos primeiros amores do narrador. Ela é uma figura idealizada, que desperta nele sentimentos complexos e contraditórios, como admiração, desejo e um pouco de medo. A figura de Lyris marca um momento importante na formação da identidade do narrador.

05 – Qual a atmosfera geral criada no fragmento?

      A atmosfera geral do fragmento é marcada por um sentimento de nostalgia e perda. O narrador expressa tristeza pela transformação da cidade e pela ausência da família Doherty. A descrição da casa demolida e a lembrança de Lyris evocam um passado idealizado e irrevogavelmente perdido.

 

 

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