BIOGRAFIA - UM
ESCRITOR NASCE
Nasci
numa tarde de julho, na pequena cidade onde havia uma cadeia, uma igreja e uma
escola bem próximas umas das outras, e que se chamava Turmalina. A cadeia era
velha, descascada na parede dos fundos. Deus sabe como os presos lá dentro
viviam e comiam, mas exercia sobre nós uma fascinação inelutável (era o lugar
onde se fabricavam gaiolas, vassouras, flores de papel, bonecos de pau). A
igreja também era velha, porém não tinha o mesmo prestígio. E a escola, nova de
quatro ou cinco anos, era o lugar menos estimado de todos. Foi aí que nasci.
Nasci na sala do 3º ano, sendo a
professora D. Emerenciana Barbosa, que Deus a tenha. Até então, era analfabeto
e despretensioso. Lembro-me: nesse dia de julho, o sol que descia da serra, era
bravo e parado. A aula era de Geografia, e a professora traçava no quadro-negro
nomes de países distantes. As cidades vinham surgindo na ponte dos nomes, e
Paris era uma torre ao lado de uma ponte e um rio. A Inglaterra não se
enxergava bem no nevoeiro, um esquimó, um condor surgiam misteriosamente,
trazendo países inteiros. Então, nasci. De repente nasci, isto é, senti necessidade
de escrever. Nunca pensara no que podia sair do papel e do lápis, a não ser
bonecos sem pescoço, com cinco riscos representando as mãos. Nesse momento,
porém, minha mão avançou para a carteira à procura de um objeto, achou-o,
apertou-o irresistivelmente, escreveu alguma coisa parecida com a narração de
uma viagem de Turmalina ao Polo Norte.
É talvez a mais curta narração no
gênero. Dez linhas, inclusive o naufrágio e a visita ao vulcão. Eu escrevia com
o rosto ardendo, e a mão veloz tropeçando sobre complicações ortográficas, mas
passava adiante. Isso durou talvez um quarto de hora, e valeu-me a interpelação
de D. Emerenciana.
– Juquita, que que você está fazendo?
O rosto ficou mais quente, não
respondi. Ela insistiu:
–
Me dá esse papel aí… me dá aqui.
Eu relutava, mas seus óculos eram
imperiosos. Sucumbido, levantei-me, o braço duro segurando a ponta do papel, a
classe toda olhava para mim, gozando o espetáculo da humilhação. D. Emerenciana
passou os óculos pelo papel e, com assombro para mim, declarou à classe:
– Vocês estão rindo do Juquita. Não
façam isso. Ele fez uma descrição muito chique, mostrou que está aproveitando
bem as aulas.
Uma pausa, e rematou:
– Continue, Juquita. Você ainda será um
grande escritor.
A maioria, na sala, não avaliava o que
fosse um grande escritor. Eu próprio não avaliava. Mas sabia que no Rio de
Janeiro havia um homem pequenino, de cabeça enorme, que fazia discursos muito
compridos e era inteligentíssimo. Devia ser, com certeza, um grande escritor, e
em meus nove anos achei que a professora me comparava a Rui Barbosa.
Carlos Drummond de
Andrade. Contos de Aprendiz.
4a Edição, Editora do
Autor.
Entendendo
o texto:
01 – Como
se explica a frase: “Nasci numa tarde de julho, na pequena cidade onde havia
uma cadeia, uma igreja e uma escola…”.
O nascimento de que trata a frase se
refere à maneira como um futuro escritor começou a escrever em uma pequena
cidade.
02 – Por que
a cadeia exercia sobre as crianças uma fascinação inelutável?
Porque esbarrava no desconhecido para as
crianças.
03 – Qual
era a contribuição dos presos para a cidade?
Fabricavam gaiolas, vassouras, flores de
papel e bonecos de pau.
04 – Como
se sabe que a professora já morreu?
Pela expressão bem popular “que Deus a
tenha”.
05 – Onde
aconteceu o “nascimento” do escritor?
Durante a aula de Geografia, na escola.
06 – Até aquele
dia, o que o Autor pensava sobre o ato de escrever?
Não o conhecia propriamente, pois só
praticava o desenho.
07 – Por quanto
tempo o Autor escreveu o texto, na aula de Geografia?
Aproximadamente quinze minutos.
08 – Que reação
provocou, na classe, a advertência inicial de Dona Emerenciana?
Criou uma atmosfera de expectativa e de
gozação da humilhação a ser impingida ao aluno.
09 – O aluno
entregou o papel imediatamente? O que determinou a entrega?
Não. O aluno relutava, mas não resistiu
ao olhar imperioso da professora.
10 – A professora
fez um elogio ao garoto. Por quê?
O texto escrito pelo autor referia-se
aos assuntos de Geografia tratados durante as aulas.
11 – O elogio
levou o garoto a concluir o quê?
Julgou que a mestra o comparava à Rui
Barbosa.
12 – As previsões
da professora estavam certas? O que você sabe a respeito de Carlos Drummond de
Andrade?
Sim. O escritor nasceu em Itabira, em
1902. Formado em Farmácia, dedicou-se ao jornalismo e, posteriormente, foi
funcionário público. É um dos maiores poetas brasileiros e cronista de renome.
Escreveu principalmente sobre os problemas humanos, usando de ironia e
criticando o homem.
13 – Qual
é o protagonista da história e que idade tem?
É o próprio narrador. Tem nove anos.
14 –
Localize no texto uma frase que demonstre a respeito do protagonista:
a)
obediência – “Sucumbido, levantei-me…”
b)
curiosidade – “Mas exercia sobre nós uma fascinação inelutável…”
c)
constrangimento – “O rosto ficou mais quente, não respondi.”
d)
sofreguidão, pressa – “Eu escrevia com o rosto ardendo e a mão veloz tropeçando sobre
complicações ortográficas…”
15 – A história
da narrativa se passa no tempo:
a. ( ) presente
b. (X) passado c. ( ) futuro.
16 – Qual
é a duração e o ambiente físico em que ocorrem os fatos?
“Eu escrevia com o rosto ardendo e a mão
veloz tropeçando sobre complicações ortográficas…”
17 – Qual
é a principal mensagem que se encontra no texto?
Escrever pode ser uma atividade
muito agradável se o indivíduo se sentir motivado. Escrever não é fruto de um
“dom especial” mas de um longo aprendizado. Outras mensagens que o texto
indica: os professores são, na maioria das vezes, responsáveis pelo nascimento
ou morte de um escritor. No caso do autor, sua professora fez um elogio ao seu
escrito, mesmo quando poderia ter chamado sua atenção diante dos colegas. Isto
é, a atitude da professora foi positiva diante da “falta de atenção” em plena
aula de Geografia.
Ksksksksk
ResponderExcluirAs questões 10 e 16 estão erradas.
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