Artigo de Opinião: Os
extraterrestres poderiam fazer a nossa felicidade
João Ubaldo Ribeiro
Uma das minhas maiores frustações é
nunca ter visto um disco voador. Até porque conheço gente que já viu, às vezes
em circunstâncias portentosas. Um desses felizardos, conceituado médico e amigo
de minha família, estava dirigindo numa estrada deserta, quando um forte
clarão, acompanhado por uma espécie de frufrulhar (ele usou esta palavra, que
nos remeteu ao Aurélio, como a vocês agora), surgiu acima do carro, cujo motor
morreu instantaneamente. Tudo deixou de funcionar, os faróis se apagaram, o
rádio desligou-se. Em cima, persistiam o frufrulhar e uma luz eucrômica (ele
também usou esta palavra, que não achamos no Aurélio, mas adivinhamos de
qualquer forma e não demos o braço a torcer, porque estava na cara que ele
tinha uma fonte para provar que a palavra existia e ninguém era besta para
abrir o jogo; com baiano, palavra difícil é questão de honra).
Quanto tempo isso durou, ele não sabia
bem, pois até seu Rolex parou, mas devia ter sido coisa de uns dez
mesmerizantes minutos. Inopinadamente, contudo, o frufrulhar tornou-se um cicio
e a luz eucrômica um inconstante bruxuleio. Tudo no carro voltou a funcionar,
inclusive o Rolex. Ele, apesar do choque, manteve a atenção vigilante. A pouca
distância de seu para-brisas, em baixa altura, viu um objeto piriforme (esta
não fez sucesso, não foi preciso Aurélio), que girava em torno de si mesmo.
Pairou alguns instantes e, com o cicio já promovido a silvo, partiu tão célere
em direção ao espaço que desapareceu num segundo.
Não tenho razões para duvidar do
relato. Tratava-se de pessoa idônea a quem a sorte (ou a Providência, quem
sabe, há sempre os eleitos) escolhera para ver o disco voador, ou melhor, um
objeto voador não-identificado, porque, sendo piriforme, não era disco. Mas só
podia ser OVNI mesmo, é claro. Fico injuriado com essa discriminação. Que pelo
menos me fosse dado ver uma fita cassete voadora, ou outro objeto, mesmo que
não piriforme ou não emitindo luz eucrômica.
Mas, ai de mim, nunca vi nada. Nem em
fotografias. Fotos de OVNIs têm o curioso dom de parecer qualquer coisa, desde
a consequência de haverem esfregado uma panqueca na lente da câmara, ao
flagrante de um traseiro de galinha logo após a postura. São como as fotos do
Abominável Homem das Neves ou do monstro do Lago Ness. O Abominável lembra
invariavelmente uma mancha de chantili numa gravata pied-de-poule e o monstro
do lago evoca o close desfocado de uma minhoca com problemas de obesidade.
Houve as fotos publicadas na antiga revista O Cruzeiro, que eram claras e tão
bem-produzidas que, ao que parece, o consenso hoje é que não se tratava de
coisa autêntica.
Antes que comece a receber cartas
revoltadas de ufologistas radicais (é engraçado como quem vê um disco voador
pegar freguesia e vê muitos outros; esse médico mesmo acabou vendo vários, só
que em condições não tão espetaculares), apresso-me a esclarecer: como muita
gente, inclusive cientistas respeitáveis, também acho improvável que, neste
Universo inimaginavelmente vasto, só o nosso planetinha abrigue vida. Todo
mundo já ouviu esse raciocínio e não aceita-lo parece tornar-nos meio
ptolemaicos, achando que a Terra é o centro do Universo. Apenas ninguém, que se
saiba ao certo, tem provas de que haja vida fora da Terra e, muito menos, de
que outras civilizações deem passeios por aqui.
Existe o pessoal que tem certeza de que
o Pentágono e a Nasa dispõem de dados concretíssimos e mantêm tudo guardado a
sete chaves. Agora mesmo, voltam a publicar velhas fotos de Marte, mostrando
indícios de civilizações, a escultura de um rosto humano, pirâmides e outros
(eu próprio, do mesmo jeito que como Abominável, não vejo nada, mas admito que
enxergo mal), para sublinhar como é suspeito o fato de a nova sanda que ia
mapear Marte pifar bem na hora de começar o serviço. Deve ter sido mesmo um
acidente, como tantos outros que já ocorreram no espaço. Mas, como os governos
mentem muito, há um certo direito de duvidar do que dizem. Faz alguns dias, não
saiu nos jornais que os propalados êxitos do programa reaganista “Guerra nas
Estrelas” foram blefes para assustar os então soviéticos?
O problema é que a maior parte dos
ufólogos, pelo menos dos que conheço, tem mais espírito religioso do que
científico. Há uma necessidade de acreditar nos OVNIs, pois somente o contato
com civilizações superiores poderia orientar esta Humanidade enlouquecida. Pois
sim. Uma civilização capaz de viajar à vontade dezenas ou centenas de anos-luz
teria tanto interesse em nossas mazelas quanto um biólogo em indagar dos
sentimentos dos paramécios que vê em seu microscópio. Mas a certeza de que eles
virão, ou estão vindo, persiste. A ufologia é uma vocação que deve trazer
grande apelo à alma brasileira. Já que D. Sebastião não volta (o Dr. Sarney
talvez volte), mais dia menos dia um disco voador aterrissa aqui, acaba a
inflação, cura o câncer e a Aids, transforma os meninos de rua em harvardianos
e estabelece a felicidade geral. Pode até ser. Mas, por enquanto, o único
objeto exótico com cuja aparição podemos contar é o fusca 94 – e com o Dr.
Itamar ao volante.
João Ubaldo
Ribeiro. O Estado de São Paulo.
Entendendo o texto:
01 – O que é frustação?
É não ter conseguido o que desejava.
02 – Quando as circunstâncias
são portentosas?
Quando são
maravilhosas, prodigiosas, assombrosas.
03 – Qual o significado de
conceituado?
De bom conceito, afamado.
04 – O que frufrulhar?
É produzir um rumor de folhas.
05 – A palavra eucrômino é formada pelo prefixo grego eu, que bom, belo, e o radical crôn.
que é cor, seguido pelo prefixo ico. Como você interpreta o
significado de luz eucrômica?
Luz de bela cor.
06 – O que significa não dar o braço a torcer?
Não se considerar vencido.
07 – Qual o sinônimo de besta em: ninguém era besta?
Bobo.
08 – Rolex é marca de quê?
Relógio.
09 – Se mesmerizar é
hipnotizar, o que quer dizer mesmerizantes
minutos?
Minutos
hipnotizantes.
10 – Inopinadamente é de
modo inopinado. O que é inopinado?
Imprevisto.
11 – Que é cicio?
Barulho fraco,
rumor brando.
12 – Explique o significado
de inconstante bruxuleio.
Brilho oscilante de modo não constante.
13 – Piriforme é o mesmo que
periforme. O que ambas significam?
Em forma de pera.
14 – O que é pairar?
Mover-se com lentidão no alto.
15 – Um sinônimo de célere.
Rápido.
16 – Existem duas palavras
parecidas (parônimas): descriminação e discriminação. Que significam?
Descriminação:
ato de inocentar de um crime.
Discriminação: ato de distinguir, separar.
17 – No texto, há palavras
estrangeiras, como a francesa pied-de-poule
(pé de galinha), a inglesa close,
parte de close-up (fotografia de objeto próximo). Há, também, uma palavra
francesa aportuguesada pelo autor. Em francês é chantilly. Como o autor usou? O
que esta palavra designa?
Chantili –
designa um saboroso creme.
18 – Desfocado é um vocábulo
comum em fotografia. Como é uma foto desfocada?
Fora de foco, não é nítida.
19 – Quando há consenso no seu
grupo?
Quando todos
concordam.
20 – Ufologista é o mesmo
que ovniologista. E qual é o significado?
Estudioso dos objetos voadores não
identificados.
21 – O que caracteriza uma
pessoa radical?
É inflexível, durona.
22 – O sistema ptolemaico é
geocêntrico. O que é geocêntrico?
É o que considera a Terra como centro do
Universo.
23 – Quais são as
atribuições do Pentágono e da Nasa?
Pentágono
é o que trata da defesa militar dos E.U.A.
Nasa
é agência do programa espacial.
24 – Que significa guardar a
sete chaves?
Guardar muito bem guardado.
25 – De um sinônimo de
pifar.
Quebrar, deixar
de funcionar.
26 – O que é propalar
êxitos?
Divulgar bons resultados.
27 – Reaganista é
relacionado com Ronald Reagan, que foi presidente de um país da América do
Norte. Que país é?
Estados Unidos da América.
28 – Qual o sentido de
blefe?
Engano, logro.
29 – Que são mazelas?
Feridas, doenças, aborrecimentos.
30 – João Ubaldo usou a
palavra paramécios, que são protozoários. O que é protozoário?
É um animal unicelular.
31 – Harvardiano é adjetivo
relacionado com Harvard University, uma famosa universidade norte-americana.
Fica em que país?
Nos Estados Unidos da América.
32 – Dê um sinônimo de
exótico.
Estranho, incomum.
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