Texto: Medo, medinho, medão
Pororoca ainda não havia entendido por
que teria de passar por aquele estranho teste para fazer parte definitivamente
da turma do Balau, na rua da sua casa.
– É hoje à noite, Pororoca. Hoje ou
nunca.
Pororoca fez um resumo rápido das suas
lembranças: tinha mudado com sua família (ele, o pai, a mãe, a avó e sua irmã
Terê) para aquela rua há três semanas. A casa era grande e gostosa, tinha até
quintal no fundo e jardim na frente. Aos poucos foi se acostumando com a nova
escola, que não era tão nova assim, com os novos colegas da classe, com os
novos conhecidos da simpática rua onde viera morar. De pouco em pouco, ele foi
conhecendo a turma da rua: Rodrigo, Mané, Chico Santos, Paulo Gabriel. Era uma
turma alegre, brincalhona. De cara ele ganhou o apelido de Pororoca, certamente
por causa das muitas sardas no rosto. Gostou do apelido e nem se incomodou com
isso. Afinal o apelido que ele tinha na outra escola, também por causa das
pintas no rosto, era Mata-Borrão.
Bem ... Pororoca já se sentia um membro
da turma, e foi com surpresa que recebeu a informação de Chico Santos:
– Olha aqui, Pororoca, se você quer
fazer parte da nossa turma terá de passar por um teste.
Pororoca achou engraçado, mas topou.
Ele já tinha feito vários testes na sua vida e um a mais ou a menos não
afetaria nada. Por isso topou na hora.
– Eu topo, Chico. É só marcar. Me avisa
uns dias antes pra eu me preparar.
– Que preparar o quê, Pororoca! Se você
quiser, o teste é amanhã à noite. Só preciso de tempo pra avisar todo mundo.
– À noite!?
– É, à noite, cara. De dia não tem
graça e não dá pra fazer o teste.
Pororoca, sem entender muito bem, pediu
mais esclarecimentos:
–
Bem ... mas que tipo de teste é esse?
– Teste de coragem, meu amigo.
Precisamos saber se você tem medo ou não.
– Medo? Medo do quê?
– Do escuro, de assombração, de
fantasma, de almas do outro mundo ...
– Mas... por quê?
– Olha aqui, Pororoca, não vou ficar
dando entrevista. Ou você quer ou não quer!
Pororoca não teve outro jeito, mesmo
sabendo que medo era uma coisa que ele tinha de sobra. Mas pior que isso era
ficar desenturmado.
– Eu topo. Pode marcar o teste.
– Amanhã eu te aviso o local e a hora.
Pois bem, o local e a hora foram
marcados: nove horas da noite, no fim da rua tranquila, perto de uma praça.
Na hora combinada, lá estavam Pororoca
e os futuros colegas de turma.
– Bem ... Qual é o teste?
– É simples! - começou explicando o
Balau. - Naquela rua ali, depois da praça, no número 83, tem uma casa. Faz mais
de trinta anos que ela está abandonada. As pessoas mais velhas daqui dizem que
ali um casal sem filhos se suicidou logo depois do casamento. Depois disso
ninguém nunca mais morou na casa. Também dizem que toda noite o casal volta e
fica vagando pela casa, feito alma penada que ainda não sabe que morreu.
– Arre! E o que tem isso a ver com o
teste?
– Tem tudo. O teste é lá.
– Lá? Você está louco!?
– Eu não. Se você não quer, voltamos e
fim de papo.
– Bem ...
– Está com medo?
Pororoca estufou o peito, morrendo de
medo, e respondeu:
– Nem medo, nem medinho, nem medão!
Estou pronto.
– Ok. O teste é o seguinte: hoje de
manhã eu joguei uma laranja dentro da casa. Você deverá ir lá, entrar na casa,
achar a laranja e trazer de volta. Nós esperamos aqui.
– E onde você jogou a laranja?
– Lá dentro, ué.
Pororoca pensou em desistir. Mas aí
ficaria sem turma ali na rua e todo mundo o chamaria de Pororoca, o medroso.
Por isso decidiu ir de qualquer jeito. Não tinha outra saída: era ir ou ... ir.
A
casa era simples, pequena, abandonada, mas se não fosse a história de Balau,
ninguém pensaria que era mal-assombrada. O mato crescia por todos os lados e as
duas janelas estavam parcialmente arrebentadas e abertas. A porta da frente,
depois do pequeno alpendre, também estava meio
aberta. Era por ali que ele iria entrar. Pororoca juntou os cacos de coragem e
entrou na casa ...
Mas foi a conta de entrar, e um treco
mole e fedido encostou-se na cabeça e no rosto dele. Isso bastou para que
Pororoca arregalasse os olhos, suspendesse a respiração. No mesmo instante, deu
meia volta e disparou na maior carreira da sua vida.
Chegou quase morto onde os meninos
esperavam por ele.
-- Não deu certo ... não deu ... ufa!
Não deu ... me faltou coragem, fiquei com medo! ...
Todos os amigos caíram na risada. E foi
o próprio Balau quem puxou a palavra:
-- Ainda bem, Pororoca, que você teve
medo.
-- Ainda bem, Balau? E você ainda fica
me gozando?
-- Não. Nada disso. Você está aprovado
no teste.
-- Como aprovado???
-- Aprovado! Isso mesmo. A gente só
aprova quem tem medo.
-- Só quem tem medo?
-- É, nessa turma todo mundo tem medo
da casa abandonada. Imagine se a gente ia deixar entrar alguém que seja
corajoso!
-- Pô, Balau! Quer dizer que com medo e
tudo eu já sou da turma?
-- Já! Nessa turma só entra quem tem
medo.
E foram embora da praça, todos os
amigos, a turma do medo com mais um membro.
Edson Gabriel Garcia.
Meninos & meninas: traquinagens,
Brincadeiras e
emoções na rua. São Paulo, Loyola, 1992.
Entendendo o texto:
01 – Onde se passa a
história que você leu?
Na rua para a
qual Pororoca recentemente havia se mudado com a família.
02 – Quanto tempo durou a
história? Explique o que você observou para responder.
Cerca de dois
dias. Pororoca tinha se mudado havia três semanas, os fatos da história começam
quando Pororoca é desafiado a passar por um teste no dia seguinte à noite.
03 – Por que Pororoca teria
de fazer o teste?
Para fazer parte de uma turma de amigos.
04 – Se você fosse Pororoca,
aceitaria fazer esse teste? Por quê?
Resposta pessoal
do aluno.
05 – Em que momento Pororoca
sentiu mais medo?
Pororoca sentiu
mais medo quando um treco mole e fedido encostou em sua cabeça e em seu rosto
dentro da casa mal-assombrada.
06 – Que sentimento o
desfecho da narrativa provocou em você?
Resposta pessoal
do aluno.
07 – Crie outro título para
esse texto e escreva no espaço abaixo.
Resposta pessoal
do aluno.
08 – Em sua opinião, o que
teria acontecido se o teste fosse para valer, isto é, se Pororoca realmente
tivesse de provar que era corajoso? Os amigos iriam aceita-Io na turma? Por
quê?
Resposta pessoal
do aluno.
09 – Releia um trecho da
história.
"Aos
poucos, foi se acostumando com a nova escola, que não era tão nova
assim."
O que você entendeu por meio
da expressão destacada?
Essa expressão
explica que a escola, apesar de ser nova para Pororoca, já tinha algum tempo de
existência e funcionamento.
10 – Retire do texto:
a)
Uma frase pontuada com reticências.
“— Bem... mas que tipo de teste é esse?”
b)
Uma frase pontuada com três pontos de
interrogação.
“— Mas... por quê???” / “Como aprovado???”.
c)
Uma frase pontuada com ponto de exclamação e
de interrogação.
“— À noite!?”
11 – Numere os fatos de
acordo com a ordem em que aparecem no texto.
(7) Todos os amigos foram embora da
praça.
(1) Pororoca deveria passar por um
teste estranho.
(3) Pororoca topou fazer o teste.
(6) Pororoca foi aprovado no teste.
(5) Pororoca pensou em desistir.
(2) De cara ele ganhou o apelido de
Pororoca.
(4) Balau explicou o teste.
12 – Reescreva as frases de
acordo com a indicação do tempo verbal dos parênteses.
·
Todos os amigos caíram na risada. (Futuro)
Todos os amigos cairão na risada.
·
Pororoca fez um resumo rápido de suas
lembranças. (Presente)
Pororoca faz um resumo rápido de suas lembranças.
·
De cara ele ganhou o apelido de Pororoca. (Futuro)
De cara ele ganhará o apelido de Pororoca.
13 – Utilize os verbos do quadro para completar as
frases abaixo. Observe o tempo solicitado nos parênteses.
|
·
Os meninos corriam
atrás das meninas na hora do intervalo. (Pretérito)
·
A professora lerá
um livro para os alunos durante a aula. (Futuro)
·
João dança
muito no clube. (Presente)
·
Maria digitou
muito no seu trabalho. (Pretérito)
·
As meninas brincarão na festa do colégio. (Futuro)
·
Meninos e meninas nadam na competição. (Presente)
·
Carlos escreveu
em seu caderno novo. (Pretérito)
·
As crianças rirão do palhaço. (Futuro).
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