quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

CONTO: A DESCOBERTA DO AMOR POR E-MAIL - ELIAS JOSÉ - COM GABARITO


Conto: A descoberta do amor por e-mail
      
                               Elias José

        Quando distribuiu os trabalhos sobre os contos de Machado de Assis, o professor Almir nunca pensou que fosse fazer tanto sucesso e mexer com a turma. Tentou unir os gostos dos alunos com a tarefa a ser desenvolvida. Os que gostam de teatro deveriam montar uma peça com um dos contos, observando bem as roupas, cenários e a linguagem da época. Os que desenham bem recontariam um conto através de imagens. Os que tocam instrumentos ou cantam, criariam músicas falando do tema ou das personagens. Os que gostam de História pesquisariam sobre usos, costumes e cultura do Rio de Janeiro da época. Os que gostam de escrever recontariam conto mudando o narrador ou transformariam o destino das personagens no desfecho. Os que gostavam de corresponder-se com amigos, em duplas, trocariam cartas comentando o conto e o estilo do autor. Tê e Diego, que tanto gostam de computação, comentariam a descoberta do amor no conto Missa do Galo, com comentários pessoais e críticas via e-mail. Redigiriam caprichadamente e imprimiriam cada e-mail e depois, como os demais grupos, exporiam oralmente o trabalho, deixando-o afixado no mural da escola [...].
        Tê e Diego gostaram muito da ideia. Anotaram e discutiram as orientações, leram e releram o conto, combinaram os vários passos do trabalho. E, naquele mesmo dia à noite, começaram a trocar e-mails.
        [...]
        Querido amigo Diego:
        [...]
        Não sei se você leu tantas vezes o conto. Acho que sou meio lerda. Reli muito para perceber mais coisas daquele tempo, daquela casa e daquelas personagens, tive que reler umas dez vezes. Confesso, depois disto, amei o conto. Se você me perguntasse qual seria o texto mais belo que já li, eu falaria: Missa do Galo, de Machado de Assis.
        Vamos terminando por aqui? Antes, como o Almir pediu, quero dizer o que achei do trabalho e do meu parceiro. Acho que foi o trabalho mais gostoso que fiz, que cresci muito com ele, pois aprendi a reler uma história literária muitas vezes, até que encontrasse a razão de ser tão elogiada e de ter uma fama tão duradoura. Se fosse professora, só daria contos e poemas para os alunos lerem, pois não há jeito de ficar relendo romances longos. Descobri, também, que um autor antigo pode ser amado hoje, por jovens, desde que bem lido.
        O meu parceiro foi ótimo, parece que se envolveu muito com o trabalho. Demonstrou inteligência e sensibilidade. Conversamos horas sobre o assunto, antes de cada e-mail, tanto na escola, como no caminho de casa ou por telefone. A amizade se fortaleceu no diálogo. Obrigada, Di. Você foi um amor! Merecemos nota dez. Você não acha?
        Um abraço bem carinhoso da amiga
        Tê.
        Cara Tê:
        Gostei do trabalho porque deixamos de responder àquelas cretinas fichas de leitura para desenvolver algo bem mais criativo. Acho que, na apresentação oral, vamos enriquecê-lo mais, pois não somos destas pessoas tímidas e enrustidas. Não acha? A escola deveria dar trabalhos assim para a gente, não acha? Por que só Almir?
        Quanto à companheira de viagem, não poderia ser mais inteligente e melhor. Devo confessar que comecei na brincadeira, depois tive que ler e reler o conto também, para acompanhar a sua firmeza, caríssima Tê. Além do trabalho, ficarão os nossos laços afetivos mais firmes. Espero.
        Um grande abraço que é mais que um abraço do
        Di
           UM RECADO FORA DO NOSSO TRABALHO. LEIA, PENSE E ME RESPONDA. NÃO VALE IMPRIMIR E ACRESCENTAR AO TRABALHO.
        Querida Tê:
        Queria fazer-lhe uma revelação importante e secreta: estou apaixonadão por minha colega de classe e de trabalho. A Tê, que toda a turma admira e gosta. Só que eu estou gostando e admirando-a de modo mais intenso e diferente. Sabia, Tê, que, ao contrário do Nogueira, sempre achei você bonita. Só que, agora, com maior convívio, fui observando os seus belos detalhes (olhos, cabelos, nariz, lábios, dentes, corpo, modo carinhoso de falar, modo alegre de rir, etc., etc.). E hoje acho você linda, lindíssima. Confesso que o meu coração dispara quando me aproximo de você. Não sei como você não notou, como a classe toda não notou. Estou soltando fogos pelos olhos. Gostou desta? Virei poeta sem sentir... Acho que daqui a muitos anos, vou me lembrar deste P.S. do nosso trabalho, seja qual for a sua resposta. E vou escrever um conto ou poema. Creia, Tê, que você foi o meu primeiro alumbramento. E como me sinto loucamente alumbrado!
        Um beijão, com muito amor do
        Di
           E-MAIL PARA SER LIDO E APAGADO DA MEMÓRIA DO COMPUTADOR. NADA DE IMPRIMI-LO.
        Amigo Di:
        Você me desconcertou. Por esta declaração de amor, eu não esperava. Cheguei a pensar que fosse uma das suas mil brincadeiras carinhosas. Depois, vi que era coisa séria. Valeu o carinho, mas hoje sou só a sua amiga Tê. Estamos afetivamente envolvidos por causa do nosso trabalho. Creio que nunca convivi tanto tempo com um colega, e de maneira agradável e inteligente. Confesso que as suas palavras de amor quase me balançaram. Devo ser sincera e confessar que tenho outro alumbramento, no momento ainda vivo e intenso. Se um dia passar o que sinto por um garoto, amigo nosso, quem sabe a gente poderá tentar. Assim é melhor. Se o seu amor for verdadeiro, saberá esperar. Se a minha paixão de hoje não der em nada, se eu continuar meio balançando para o seu lado (como segunda opção), poderemos tentar. Está certo assim?
        Vamos destruir as mensagens complementares, a sua e a minha, pois assim será bem melhor. Não acha? Toda a classe vai continuar achando que somos os melhores amigos do mundo, que tudo nos une, inclusive Machado de Assis e a mania de passar e-mail por tudo e por nada.
        Abraço carinhoso da amiga
       
                   JOSÉ, Elias. A descoberta do amor por e-mail. In: José, Elias e outros.
A descoberta do amor em prosa. São Paulo: Companhia Editora Nacional. s.d. p. 9-31.
(Coleção Literatura em Minha Casa).
Entendendo o conto:
01 – Sublime apenas as informações corretas a respeito do texto:
(   ) Na primeira parte do texto, há um narrador-personagem.
(X) Na primeira parte do texto, há um narrador observador.
(X) As personagens do texto são o professor Almir e seus alunos.
(   ) A história se passa no século XIX.

02 – As duas personagens da troca de e-mail são:
(X) Colegas de classe.
(   ) Namorados.
(   ) Apaixonados, mas não namorados.
(   ) Grande e velhos amigos.

03 – O título do texto – “A descoberta do amor por e-mail” – justifica-se:
(   ) Pela animação da turma com o trabalho proposto pelo professor Almir.
(X) Pela revelação do amor de Diego e Tê.
(   ) Pela revelação do amor de Tê por Diego.

04 – Relacione cada um dos trechos abaixo a uma característica de Diego:
        Divertido – apaixonado – observador – sincero.
a)   “Cheguei a pensar que fosse uma das suas mil brincadeiras carinhosas.”
Divertido.

b)   “Confesso que o meu coração dispara quando me aproximo de você.”
Apaixonado.

c)   “Queria fazer-lhe uma revelação importante e secreta: estou apaixonado por minha colega de classe e de trabalho.”
Sincero.

d)   “[...] fui observando os seus belos detalhes (olhos, cabelos, nariz, dentes, corpo, modo carinhoso de falar, modo alegre de rir, etc., etc., etc.).”
Observador.

05 – Por meio da correspondência, as pessoas têm oportunidade de falar a respeito de suas emoções, de seus desejos, de seus planos. Lendo o e-mail de Diego e o que Tê respondeu para ele, o que se pode perceber a respeito dessas duas personagens?
      Percebe-se que Diego está apaixonado por Tê, mas não é correspondido, pois a garota está apaixonada por outro garoto.

06 – O que você acha do trabalho que o professor Almir passou a seus alunos? Você já fez trabalhos assim?
      Resposta pessoal do aluno.


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