segunda-feira, 1 de abril de 2019

TEXTO: AMOR À PRIMEIRA VISTA - IRACEMA - CAP. II - JOSÉ DE ALENCAR - COM GABARITO

Texto: Amor à primeira vista – Iracema cap. II
             
                                José de Alencar

        Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema.
        Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira.
        O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.
        Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu?" onde campeava sua guerreira tribo da grande nação tabajara, o pé grácil e nu, mal roçando alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.
        Um dia, ao pino do sol, ela repousava em um claro da floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra da oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os úmidos cabelos Escondidos na folhagem os pássaros ameigavam o canto
        Iracema saiu do banho; o aljôfar d'água ainda a roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de chuva Enquanto repousa, empluma das penas do gará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste
        A graciosa ará, sua companheira e amiga, brinca junto dela.  Às vezes sobe aos ramos da árvore e de lá chama a virgem pelo nome; outras remexe o uru te palha matizada, onde traz a selvagem seus perfumes, os alvos fios do crautá, as agulhas da juçara com que tece a renda, e as tintas de que matiza o algodão.
        Rumor suspeito quebra a doce harmonia da sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol não deslumbra; sua vista perturba-se.
        Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das areias que bordam o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas. Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.
        Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A flecha embebida no arco partiu Gotas de sangue borbulham na face do desconhecido.
        De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a cruz da espada, mas logo sorriu. O moço guerreiro aprendeu na religião de sua mãe, onde a mulher é símbolo de ternura e amor. Sofreu mais d'alma que da ferida.
        O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto, não o sei eu. Porém a virgem lançou de si o arco e a uiraçaba, e correu para o guerreiro, sentida da mágoa que causara.
        A mão que rápida ferira, estancou mais rápida e compassiva o sangue que gotejava. Depois Iracema quebrou a flecha homicida: deu a haste ao desconhecido, guardando consigo a ponta farpada.
        O guerreiro falou:
        — Quebras comigo a flecha da paz?
        — Quem te ensinou, guerreiro branco, a linguagem de meus irmãos? Donde vieste a estas matas, que nunca viram outro guerreiro como tu?
        — Venho de bem longe, filha das florestas. Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje têm os meus.
        — Bem-vindo seja o estrangeiro aos campos dos tabajaras, senhores das aldeias, e à cabana de Araquém, pai de Iracema.

                       ALENCAR, José de. Iracema. São Paulo: Moderna.
Entendendo o texto:

01 – “Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira.” Observe que, para realçar a beleza de Iracema, o autor compara seu corpo a elementos da natureza brasileira. Essa forma de descrever Iracema é usada em outras passagens do texto. Aponte-as.
      Por exemplo: “O favo do jati não era doce como seu sorriso, nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.”

02 – Iracema é colocada num cenário natural de grande beleza, estando perfeitamente integrada nesse meio, pois a própria natureza parece rodeá-la de cuidados e carinhos. Destaque pelo menos uma passagem do texto em que isso se observa.
      “Banhava-lhe o corpo a sombra da oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os úmidos cabelos.”

03 – Que fato vem quebrar “a doce harmonia da sesta”?
        A chegada do desconhecido guerreiro branco de estranha aparência.

04 – Como se explica a reação violenta de Iracema?
      Ele sentiu-se ameaçada com a chegada do estranho guerreiro.

05 – Que fato revela o caráter nobre de Martim?
      O fato de não ter reagido; o respeito à mulher foi mais forte que a dor e o impulso de revidar a agressão.

06 – Que gesto de Iracema também revela sua nobreza de caráter?
      O gesto de estancar o sangue que sua flecha fizera correr.

07 – Transcreva fala de Martim em que ele revela ser um inimigo da tribo de Iracema.
      “Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje têm os meus.”

08 – O que teria feito com que Iracema se arrependesse de haver atirado a flecha?
      O sentimento expresso no rosto e através dos olhos de Martim.


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