quarta-feira, 8 de novembro de 2017

ARTIGO DE OPINIÃO: O DIFÍCIL, MAS POSSÍVEL, DIÁLOGO ENTRE A ARTE E A CIÊNCIA - DANIEL MARTINS DE BARROS - COM GABARITO

O difícil, mas possível, diálogo entre a arte e a ciência

                                                       Daniel Martins de Barros

Estabelecer pontes entre a ciência e a arte não é tarefa fácil. Se a revolução científica, com sua valorização da metodologia experimental e sua necessidade de rigor, trouxe avanços inegáveis para a humanidade, por outro lado também tornou o trabalho científico distante do homem comum. Com isso, distanciou-o também da arte, que talhada para captar a essência humana, o faz de maneira basicamente intuitiva. Tentativas de reaproximação até existem, mas a inconstância e variabilidade no seu sucesso atestam a dificuldade da empreitada. Um dos diálogos mais interessantes entre ciência e arte se deu nas primeiras décadas do século 20, na relação entre o surrealismo e a psicanálise.
Os sonhos eram considerados proféticos e reveladores, até que, em 1899, Sigmund Freud apresentou uma das primeiras tentativas de interpretá-los cientificamente no livro A Interpretação dos Sonhos. Simplificando bastante, sonhos seriam um momento em que conteúdos inconscientes surgiriam para nós, ainda que disfarçados, e caberia à psicanálise desmascarar seu real significado.
O movimento artístico do surrealismo imediatamente se apropriou dessas teorias. Os surrealistas já nutriam um interesse especial pelo
inconsciente, tentando retratar esses conteúdos em suas obras, mas após a tradução do livro de Freud para o espanhol, o pintor catalão Salvador Dalí tornou-se um dos maiores entusiastas da obra freudiana. Segundo ele mesmo, o objetivo de sua pintura era materializar as imagens de sua “irracionalidade concreta”.
Desde que se tornou fã declarado do médico austríaco, Dalí tentou se encontrar com ele. Tanto insistiu que conseguiu, quando Freud já estava idoso e bastante doente. A reunião não foi das mais frutíferas, já que os dois eram incapazes de conversar: Dalí não falava alemão nem inglês, e Freud, além do câncer de mandíbula, não estava ouvindo bem. A interação ficou limitada: Freud analisou um quadro recente de Dalí, enquanto esse passava o tempo desenhando o psicanalista e o observava a conversar com o amigo e escritor Stephan Zweig.
O resultado tímido do encontro poderia bem ser emblemático da complicada engenharia que é construir pontes entre tão distantes universos. As conversas nem sempre são frutíferas, as trocas muitas vezes são frustrantes. Mas a retomada desse episódio na peça Histeria, do dramaturgo Terry Johnson, mostra que não desistimos, e que novas maneiras podem ser tentadas. Usando a liberdade que só se encontra na arte, Johnson expande o diálogo que não aconteceu, mostrando – ainda que numa realidade alternativa e em chave cômica – que os caminhos que ligam arte e ciência podem ser acidentados, mas não deixam de ser possíveis. Embora a psicanálise não seja mais considerada científica pelos critérios atuais e o surrealismo já não exista como movimento organizado, o encontro dessas duas formas de saber, no alvorecer do século 20, persiste como emblema de um diálogo que, mesmo que cheio de ruídos, não pode ser abandonado.

Adaptado de: http://m.cultura.estadao.com.br/noticias/teatro-e-danca, analise-o-dificil–mas-possivel–dialogo-entre-a-arte-e-a-ciencia,10000048930 Acesso em 17 de maio de 2016.

Em relação ao texto “O difícil, mas possível, diálogo entre a arte e a ciência”, assinale a alternativa correta.

 a)  Em um contexto pós-revolução científica, é por meio dos trabalhos de Sigmund Freud e Salvador Dalí, os quais representam respectivamente o movimento artístico do surrealismo e o pensamento científico da psicanálise, que se estabeleceu um diálogo entre a arte e a ciência.
 b)  A apropriação que o surrealista Salvador Dalí fez da interpretação científica dos sonhos, proposta pela psicanálise de Sigmund Freud, é um representante do difícil, mas possível, diálogo entre a arte e a ciência, do qual trata o texto.
 c)  O interessante diálogo entre ciência e arte, sobre o qual trata o texto, faz referência, especificamente, ao evento em que o psicanalista Sigmund Freud recebeu a visita de Salvador Dalí, quando, apesar das dificuldades comunicativas, puderam dialogar os representantes da ciência e da arte daquele momento.
 d)  Por meio da revolução científica, apesar de terem trazido inegáveis avanços para a humanidade, ciência e arte se distanciaram à medida que o trabalho científico se distanciou do homem comum, já que a arte é produzida de modo intuitivo por esse homem comum.
 e)  Um dos diálogos entre a ciência e a arte se estabeleceu na psicanálise, por meio da metodologia psicanalítica de interpretação dos sonhos proposta por Sigmund Freud a partir da publicação do livro Interpretação dos Sonhos.


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