terça-feira, 28 de novembro de 2017

POEMA - GREGÓRIO DE MATOS - COM GABARITO

POEMA: Aos afetos, e lágrimas derramadas na ausência da a quem queria bem
Gregório de Matos


Ardor em firme coração nascido;
Pronto por belos olhos derramado;
Incêndio em mares de água disfarçado;
Rio de neve em fogo convertido.
Tu, que em um peito abrasas escondido;
Tu, que em um rosto corres desatado;
Quando fogo, em cristais aprisionado;
Quando cristal, em chamas derretido.

Se és fogo, como passas brandamente,

Se és neve, como queimas com porfia?
Mas ai, que andou Amor em ti prudente!

Pois para temperar a tirania,
Como quis que aqui fosse a neve ardente,
Permitiu parecesse a chama fria.

                                       Matos, Gregório de. In: Wisnik, José Miguel
                                             (Sel., Intr. e notas). Poemas escolhidos.
                                                         São Paulo: Cultrix, 1997. p. 218.
Interpretação do texto:
01 – Quais são os dois elementos da natureza que se opõem e representam as contradições que o sentimento amoroso desperta no eu lírico?
      O fogo (ardor) e a água (pranto, contenção).

a)   O que cada um deles simboliza no poema?
O fogo simboliza a paixão que toma o eu lírico, e a água, o pranto pelo sofrimento amoroso, mas também pode ser interpretada como a contenção dessa paixão.

b)   Nas duas primeiras estrofes, quais as imagens e metáforas utilizadas pelo eu lírico para fazer referência a esses elementos?
As imagens utilizadas para fazer referência ao fogo são: “ardor”; “incêndio”; “abrasas”, “chamas”.
As imagens para a água temos: “pranto”; “mares de água”; “rio de neve”; “corres desatado”; “cristais”.

02 – Releia:
        “Incêndio em mares de água disfarçado;
        Rio de neve em fogo convertido”.

a)   Qual é a figura de linguagem que indica a tensão entre os opostos? Explique.
A figura que indica essa tensão é a antítese: o eu lírico opõe os termos “incêndio” a “mares de água”; e “fogo” a “rio de neve”.

b)   Há outros exemplos dessa figura no poema? Quais?
Abrasas X corres desatado; fogo X cristais; cristal X chamas; fogo X neve.

c)   O Barroso apresenta não apenas o confronto dos opostos, mas também sua fusão ou aproximação. Como ela pode ser observada nos versos transcritos?
A fusão ou aproximação dos opostos se dá pela transformação dos elementos que simbolizam os sentimentos descritos: o “incêndio” está disfarçado em “mares de água”; o “rio de neve” se converte em “fogo”. Assim, a paixão se funde com a manifestação de seu refreamento/sofrimento.

03 – Quem é o interlocutor a que o eu lírico se refere na segunda e na terceira estrofes?
      O interlocutor é o sentimento amoroso, a paixão.

a)   Como ele é caracterizado?
A paixão é caracterizada a partir de duas diferentes manifestações: ela “queima” escondida no peito do eu lírico e corre em pranto pelo seu rosto. Além disso, é fogo e, quando assim se manifesta, está aprisionada em cristais, simbolizando a contensão ou a prudência com relação a esse sentimento; quando cristal, é derretido pelas chamas.

b)   Qual é o questionamento feito pelo eu lírico nesses versos?
O eu lírico questiona a contradição na manifestação do sentimento amoroso: se ele é fogo, não deveria passar brandamente; se é neve, não poderia queimar tanto. Mais uma vez, temos as contradições da paixão, que confundem o eu lírico por uma manifestação conflituosa.

04 – No soneto, vemos a habilidade de Gregório de Matos em trabalhar a linguagem para conciliar os opostos. Releia os versos a seguir, observando os trechos destacados em negrito e em itálico.

“Se és fogo, como passas brandamente,
 Se és neve, como queimas com porfia?”
“Como quis que aqui fosse a neve ardente,
 Permitiu parecesse a chama fria.”

a)   No início do poema, o eu lírico apresenta a oposição entre o calor e o frio, o fogo e a água, a paixão e a contenção (ou refreamento). Explique de que maneira os dois primeiros versos transcritos acima encaminham a fusão que ocorrerá entre esses elementos opostos no fim do poema.
Nos dois versos, há paradoxos que encaminham a fusão completa entre os opostos que se concretizam nos versos finais. Ao questionar a contradição extrema que há entre um “fogo que passa brandamente” e a “neve que queima”, o eu lírico aproxima os elementos que se fundirão em uma única expressão nos últimos versos (“neve ardente” / “chama fria”).

b)   As expressões destacadas nos dois últimos versos são paradoxos, construídos a partir da oposição dos mesmos elementos: frio x calor; fogo x neve. Elas encerram o mesmo sentido? Por quê?
Não. Embora sejam construídas a partir da oposição dos mesmos elementos, temos uma inversão na porção de cada um deles: em “neve ardente”, o primeiro elemento refere-se ao frio e o segundo ao calor; em “chama fria”, temos primeiro a referência ao calor e depois ao frio. Por si só, essa inversão já altera o significado de cada expressão, mas, no contexto do poema, essa diferença é mais significativa.

c)   Considerando que a neve simboliza a prudência/o controle e o fogo, a paixão, qual é o significado, no contexto do poema, das expressões “neve ardente” e “chama fria”?
O paradoxo “neve ardente” pode ser interpretado como a contenção que desaparece quando a paixão nasce; por oposição, “chama fria” pode significar a paixão “controlada”, que não representa ameaça ou descontrole (não queima).

05 – O eu lírico afirma que o Amor “temperou” sua tirania. De que maneira isso foi feito? Por quê?
      O Amor, segundo o eu lírico, utilizou uma estratégia para “disfarçar” a sua tirania, fazendo com que parecesse menos ameaçadora: o que ele desejava era despertar um sentimento mais arrebatado (“como quis que aqui fosse a neve ardente”) que eliminasse qualquer defesa ou prudência contra a paixão. Para que isso de fato ocorresse, fez com que a paixão parecesse, primeiro, um sentimento contido (“Permitiu parecesse a chama fria”). Assim, garantiu que o eu lírico não se precavesse contra a paixão que ameaçava dominá-lo.

06 – Releia a linha do tempo. Que acontecimento ilustra como o século XVII era uma época dividida entre a razão e a fé?
      O julgamento de Galileu Galilei pelo Tribunal do Santo Ofício.

a)   Explique de que forma esse acontecimento exemplifica o contexto que gera o conflito do ser humano durante o Barroco.
Gostaríamos que os alunos, ao refletirem sobre o julgamento de Galileu, percebessem que a condenação do cientista ilustra o embate que caracteriza o conflito barroco. De um lado, está a razão: de outro, estão a fé e os dogmas da Igreja Católica, que condena a teoria de Copérnico por contradizer a visão geocêntrica defendida por ela.



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