terça-feira, 3 de abril de 2018

LENDA: A LENDA DO SACI - MONTEIRO LOBATO - COM GABARITO

LENDA: A LENDA DO SACI
                 Monteiro Lobato

  A curiosidade tem levado os homens de todos os tempos a indagar sobre as origens do Universo, dos seres, das coisas e sobre os fatos que não têm explicação lógica. Os cientistas estudam o mundo à procura de respostas objetivas a essas questões. As lendas constituem outra forma de responder a essas perguntas. Fruto da imaginação, elas não explicam cientificamente os seres e as coisas, mas contam uma história que fala de como teria surgido.

       Você já ouviu falar do Sítio do Pica-pau Amarelo, um lugar imaginado por Monteiro Lobato? O sítio é uma pequena fazenda onde moram Narizinho, Dona Benta, Pedrinho, Tia Nastácia, a boneca Emília, o Visconde de Sabugosa e Rabicó. Criadas por Monteiro Lobato, o primeiro escritor brasileiro a escrever para crianças, essas personagens vivem incríveis aventuras no sítio e falam de muitas tradições de nosso país. 
       O texto que você vai ler a seguir se refere a uma delas. Pedrinho, muitas vezes, tinha ouvido falar em saci e queria saber se ele realmente existia. Foi então perguntar ao Tio Barnabé, um negro de mais de 80 anos e bom contador de histórias, que vivia perto de sua fazenda. 
    Tio Barnabé não apenas confirmou que o saci existia, mas também informou que existiam vários sacis. E contou muitas histórias sobre eles, as artes que essas criaturas fazem e até ensinou como se pega um saci. Pedrinho, então, armou um plano. Vamos conhecer o plano do garoto?

 PEDRINHO PEGA UM SACI

        Tão impressionado ficou Pedrinho com esta conversa que dali por diante só pensava em saci, e até começou a enxergar sacis por toda parte. Dona Benta caçoou, dizendo:
        — Cuidado! Já vi contar a história de um menino que de tanto pensar em saci acabou virando saci… 
      Pedrinho não fez caso da história e, um dia, enchendo-se de coragem, resolveu pegar um. Foi de novo em procura do tio Barnabé.
      — Estou resolvido a pegar um saci, disse ele, e quero que o senhor me ensine o melhor meio. 
        Tio Barnabé riu-se daquela valentia.
      — Gosto de ver um menino assim. Bem mostra que é neto do defunto sinhô velho, um homem que não tinha medo nem de mula sem cabeça. Há muitos jeitos de pegar saci, mas o melhor é o de peneira. Arranja-se uma peneira de cruzeta…
       — Peneira de cruzeta? – interrompeu o menino – Que é isso?
      — Nunca reparou que certas peneiras têm duas taquaras mais largas que se cruzam bem no meio e servem para reforço? Olhe aqui. – e tio Barnabé mostrou ao menino uma das tais peneiras que estava ali num canto – Pois bem, arranja-se uma peneira destas e fica-se esperando um dia de vento bem forte, em que haja rodamoinho de poeira e folhas secas. Chegada essa ocasião, vai-se com todo o cuidado para o rodamoinho e zás! joga-se a peneira em cima. Em todos os rodamoinhos há saci dentro, porque fazer rodamoinhos é justamente a principal ocupação dos sacis neste mundo.
        — E depois?
        — Depois, se a peneira foi bem atirada e o saci ficou preso, é só dar jeito de botar ele dentro de uma garrafa e arrolhar muito bem. Não esquecer de riscar uma cruzinha na rolha, porque o que prende o saci na garrafa não é a rolha e sim a cruzinha riscada nela. É preciso ainda tomar a carapucinha dele e a esconder bem escondida. Saci sem carapuça é como cachimbo sem fumo. Eu já tive um saci na garrafa, que me prestava muitos bons serviços. Mas veio aqui um dia aquela mulatinha sapeca que mora na casa do compadre Bastião e tanto lidou com a garrafa que a quebrou. O perneta pulou em cima da sua carapuça, que estava ali naquele prego, e "Até logo, tio Barnabé!" 
      Depois de tudo ouvir com a maior atenção, Pedrinho voltou para casa decidido a pegar um saci, custasse o que custasse. Contou o seu projeto a Narizinho e longamente discutiu com ela sobre o que faria no caso de escravizar um daqueles seres terríveis. Depois de arranjar uma boa peneira de cruzeta, ficou à espera do dia de S. Bartolomeu, que é o mais ventoso do ano. 
       Custou a chegar esse dia, tal era sua impaciência, mas afinal chegou e, desde muito cedo, Pedrinho foi postar-se no terreiro, de peneira em punho, à espera de rodamoinhos. Não esperou muito tempo. Um forte rodamoinho formou-se no pasto e veio caminhando para o terreiro.
        — É hora! – disse Narizinho – Aquele que vem vindo está com muito jeito de ter saci dentro. 
     Pedrinho foi se aproximando pé ante pé e, de repente, zás! Jogou a peneira em cima.
        — Peguei! – gritou no auge da emoção, debruçando-se com todo o peso do corpo sobre a peneira emborcada – Peguei o saci! … A obra de Monteiro Lobato já divertiu muitas gerações de crianças. Na foto, alguns dos atores que vivem as personagens da nova adaptação do Sítio do Pica-pau Amarelo para a televisão.
       A menina correu a ajudá-lo.
      — Peguei o saci! – repetiu o menino vitoriosamente – Corra, Narizinho, e traga-me aquela garrafa escura que deixei na varanda. Depressa! 
       A menina foi num pé e voltou noutro.
    — Enfie a garrafa dentro da peneira – ordenou Pedrinho – enquanto eu cerco dos lados. Assim! Isso! … 
     A menina fez como ele mandava e, com muito jeito, a garrafa foi introduzida dentro da peneira.
     — Agora tire do meu bolso a rolha que tem uma cruz riscada em cima. – continuou Pedrinho – Essa mesma. Dê cá. 
      Pela informação do tio Barnabé, logo que a gente põe a garrafa dentro da peneira, o saci por si mesmo entra dentro dela, porque, tem a tendência de procurar sempre o lugar mais escuro. De modo que Pedrinho o mais que tinha a fazer era arrolhar a garrafa e erguer a peneira. Assim fez, e foi com o ar de vitória de quem houvesse conquistado um império que levantou no ar a garrafa para examiná-la contra a luz. 
       Mas a garrafa estava tão vazia como antes. Nem sombra do saci dentro…
     A menina deu-lhe uma vaia e Pedrinho, muito desapontado, foi contar o caso ao tio Barnabé.
      — É assim mesmo. – explicou o negro velho – Saci na garrafa é invisível. A gente só sabe que ele está lá dentro quando a gente fica sonolento. Num dia bem quente, quando os olhos da gente começam a piscar de sono, o saci pega a tomar forma, até que fica perfeitamente visível. É desse momento em diante que a gente faz dele o que quer. Guarde a garrafa bem fechada, que garanto que o saci está dentro dela. 
      Pedrinho voltou para casa orgulhosíssimo com a sua façanha.
    — O saci está aqui dentro, sim. – disse ele a Narizinho – Mas está invisível, como me explicou tio Barnabé. 
     Quem não gostou da brincadeira foi a pobre tia Nastácia. Como tinha um medo horrível de tudo quanto era mistério, nunca mais chegou nem na porta do quarto de Pedrinho.
     — Deus me livre de entrar num quarto onde há garrafa com saci dentro! Credo! Nem sei como dona Benta consente semelhante coisa em sua casa. Não parece ato de cristão…

                                       (Monteiro Lobato. Viagem ao Céu e O saci.
                                               São Paulo: Brasiliense, s.d. p. 191-5.).

Entendendo o texto:

01 – De acordo com as instruções dadas por tio Barnabé, para Pedrinho ou qualquer pessoa conseguir pegar um saci, só não seria necessário:
       A – ( ) peneira de cruzeta.
       B – ( ) ser um dia de vento forte com rodamoinho.
       C – ( ) uma garrafa escura.
       D – (X) uma pessoa para ajudar.
       E – ( ) uma rolha com uma cruz desenhada nela para tampar a garrafa.

02 – Observe os trechos a seguir:
I – "...que me prestava muitos bons serviços." 
II – "...e, desde muito cedo, Pedrinho foi postar-se..." 
III – "Não esperou muito tempo." 
IV – "...com muito jeito, a garrafa foi introduzida..." 
V – "...Pedrinho, muito desapontado, foi..."

Pode-se declarar que a classe gramatical de muito é advérbio:
       A – ( ) em todos os trechos.
       B – (X) somente nos trechos II e V.
       C – ( ) apenas no trecho IV.
       D – ( ) somente no trecho II.
       E – ( ) apenas nos trechos III e I.

03 – Monteiro Lobato, o autor do texto, viveu há muito tempo, entre 1882 e 1984. Por essa razão, muitas palavras e expressões que ele utilizou em suas histórias não são conhecidas pelas crianças de hoje. Apesar disso, é possível compreender o sentido delas no contexto em que foram empregadas. 

Identifique a opção cuja expressão ou palavra grifada foi substituída inadequadamente pelo que aparece entre parênteses:
       A – ( ) "...Pedrinho não fez caso da história e, a..." (não se importou com a)
       B – ( ) "...que o senhor me ensine o melhor meio."  (modo)
       C – ( ) "...e tanto lidou com a garrafa que a quebrou..." (manuseou)
       D – ( ) "A menina foi num pé e voltou noutro."  (foi e voltou rapidamente)
       E – (X) "...o mais que tinha a fazer era arrolhar a garrafa..." (destampar).

04 – “Saci sem carapuça é como cachimbo sem fumo." 

 No trecho acima, há um conectivo de comparação. Ele só não quer dizer que saci sem carapuça é tão:
       A – (X) proveitoso quanto cachimbo sem fumo.
       B – ( ) inútil quanto cachimbo sem fumo.
       C – ( ) sem importância quanto cachimbo sem fumo.
       D – ( ) ineficaz quanto cachimbo sem fumo.
       E – ( ) irrelevante quanto cachimbo sem fumo.

05 – Quanto à caracterização dos personagens não se pode declarar que:
       A – ( ) Pedrinho – é destemido e corajoso.
       B – ( ) tio Barnabé – é minucioso e detalhista.
       C – ( ) Narizinho – é prestativa e eficiente.
       D – ( ) tia Nastácia – é supersticiosa e medrosa.
       E – (X) dona Benta – é intolerante e encorajadora.


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