Texto: SEU PAULINO
Seu Paulino vivia de uma pequena loja de fazendas e miudezas, e era pastor
protestante. Andava sempre de preto, colarinho alto, camisa de peito duro,
punhos engomados adaptáveis.
Casado, não tinha filhos. Às quintas e sábados funcionava na Casa de Deus. Aos
domingos guardava o respeito. Às quatro e meia jantava e às seis já se
preparava para o sono. Método e economia. Quando não havia luz elétrica era
para não gastar querosene e pavio; depois da luz elétrica, para não gastar
lâmpada, porque afinal, na bela cidade de Barbacena, luz elétrica era um fluido
que se consumia em taxa fixa de cinco mil-réis mensais para cada casa.
Havia na sua loja um divisa caprichosamente emoldurada, que só foi alterada uma
vez: HOJE NÃO SE FIA. Dava-se que Pedrinho era um garoto de bom comportamento e
que merecia frequentes afagos das mãos muito brancas e muito finas de seu
Paulino, que gostava de crianças.
Ora, os papagaios estavam empinados no céu, em plena Rua Quinze, e só Pedrinho
não tinha papagaio e acompanhava de olho comprido as evoluções dos brinquedos
dos amigos. Como a freguesia não era muita, seu Paulino estava na porta
observando os olhos compridos de Pedrinho. Seu Paulino falava fino:
--- Não tem papagaio, Pedrinho?
Pedrinho falava mais grosso que seu Paulino:
--- Não, seu Paulino, não tenho dinheiro para comprar papagaio.
Naqueles tempos felizes, uma folha de papel de seda custava um vintém. Um
carretel de linha “Três correntes” custava cento e vinte réis, taquara é coisa
que toda horta tem, graças a Deus. Seu Paulino, depois de uma hora de lutas
interiores, resolveu fiar o papel de seda e o carretel de linha. E Pedrinho
teve o seu papagaio, não com caco de garrafa no rabo, como era costume entre os
garotos malvados ou belicosos, mas um papagaio verde e macio, com papelotes no
rabo.
Os anos rodaram, Pedrinho estudou, saiu da cidade, voltou doutor formado. Houve
festa para recebe-lo. Doze anos tinham se passado. Foi com emoção que seu
Paulino o abraçou – estava contente com o seu amiguinho. Aí, porém, seu Paulino
tremeu – Doutor Pedrinho tinha uma pequena dívida na cidade e era bom começar
uma carreira sem dívidas. Doutor Pedrinho pagou duzentos e quarenta réis a seu
Paulino, que, como se vê, não cobrou juros.
Marques
Rebelo. Cenas da Vida Brasileira, in Seleta.
Págs. 149-150. Editora José Olympio, Rio, 1974.
Entendendo
o texto:
01 – O
caso narrado por Marques Rebelo se passou na cidade de Barbacena, que
fica no Estado de Minas Gerais.
02 – Cite
uma passagem do texto que nos dá uma ideia aproximada da época em que
aconteceram os fatos narrados no texto:
“Quando não havia luz elétrica era para não gastar querosene e pavio, depois da
luz elétrica, para não gastar lâmpada.”
03 –
Assinale as afirmações verdadeiras com relação ao senhor Paulino:
(X) Era um
homem metódico e econômico.
(X) Era pastor protestante e vivia da renda de um pequeno armarinho.
( ) Vendia fiado para muitos fregueses.
(X) Gostava de crianças.
04 – Como
você entende a frase da linha 6: “Aos domingos guardava o respeito”?
Não trabalhava.
05 – Em
linguagem moderna, como você diria em vez de “HOJE NÃO SE FIA”?
Hoje não se
vende fiado.
06 – Que
sentimento traduz a expressão “de olho comprido”?
Traduz desejo.
07 – Com
a frase “depois de uma hora de lutas interiores”, o autor quis dizer que seu
Paulino:
(X) Ficou
indeciso, hesitou muito se ia vender fiado ou não.
( ) Receou que o papagaio se tornasse motivo de brigas entre
Pedrinho e seus colegas.
08 –
Deduz-se do texto que Pedrinho era um menino:
( ) Invejoso, briguento e malvado.
(X)
Estudioso e bem comportado.
( ) Rico e pretensioso.
09 – No
final da história, o autor diz que seu Paulino tremeu, Por que tremeu?
( ) Porque estava muito emocionado.
(X)
De constrangimento, por ter de lembrar ao Dr. Pedrinho a velha dívida.
10 – Na
última frase do texto, o autor:
( ) Enganou-se, pois seu Paulino cobrou 100 réis de juros.
(X) Ironizou seu Paulino, dando a entender o contrário o que afirmou.
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