terça-feira, 30 de agosto de 2022

PALESTRA: MANUAL DE INSTRUÇÃO PARA O USO DA LIBERDADE - (FRAGMENTO) - JOÃO AUGUSTO POMPEIA - COM GABARITO

 Palestra: Manual de instrução para o uso da liberdade – Fragmento

               João Augusto Pompeia

         Bom dia a todos. Ahn... é um prazer tá aqui de volta. Eu tive aqui há umas... quatro semanas atrás falando pra pais. [...] É uma experiência nova para mim falar pra pessoas na faixa de idade de vocês. Eu, em geral, tenho como interlocutores pessoas mais velhas. Então, vocês, ahn..., por favor, me desculpem se eu ficar um pouco mais formal do que vocês tão acostumados a se relacionar, né?

        [...] Por que falar deste tema agora para vocês, né? E a razão disso é exatamente o momento de vida que vocês estão vivendo. Vocês estão começando a exercer uma liberdade que tende a se ampliar aí nos próximos anos. Vocês estão na iminência de começar a tomar algumas decisões que têm implicações pro resto da vida de vocês, como a escolha da profissão, e acho que, por isso, nesse momento, pensar um pouquinho sobre o uso da liberdade pode ser uma coisa interessante, né?

        E acho que a gente tinha que começar primeiro dando uma caracterização, não exatamente uma definição precisa, mas uma caracterização do que que eu tô chamando de “liberdade”. É uma palavra que vai ter muitos significados. E eu queria tomar uma... uma referência, né?, bem simples, e aí eu recorri inclusive a Aristóteles, embora ele seja um autor complexo, à definição que ele dá a uma certa altura. Ele diz assim: “Liberdade é uma pessoa poder fazer o que quer”.

        Essa definição, ela é bastante concreta e bastante simples, né? E parece que satisfaz, pelo menos num primeiro momento. E você poder fazer o que quer é aquilo que é caracterizado pelo fato de você ter liberdade, mas você usar a liberdade é diferente de você ter a liberdade. Porque você ter a liberdade é você PODER fazer o que quer; você usar a liberdade é você FAZER o que quer, né? E como o número das possibilidades que a gente tem é muito maior do que o número de coisas que a gente de fato chega a fazer, quando você vai usar a liberdade, quando você vai passar do TER LIBERDADE pra condição de SER LIVRE, você necessariamente tem que escolher, né?

        Então, o uso da liberdade impõe que necessariamente vocês façam a escolha. Se vocês entram num restaurante, pegam um cardápio, no cardápio tem trinta pratos que vocês podem comer... Vocês não vão comer os trinta pratos, por isso vocês têm que escolher um prato, né?, pra comer. Algumas vezes, nas discussões entre os filósofos aparece isso. Se a gente fosse imortal, se a gente vivesse num tempo infinito, a escolha da profissão, por exemplo, seria só uma escolha de ordem. Que profissão você quer ser primeiro? Porque, pra quem não vai morrer nunca, com o passar do tempo você acabaria fazendo todas as profissões.

        O diabo é que nós somos mortais, nós temos um tempo limitado, e esse tempo limitado impõe que as escolhas ganhem uma radicalidade muito grande. Quando você escolhe alguma coisa, você, na verdade, abre mão das demais. Então isso torna a escolha uma coisa bastante complicada.

        Por isso eu pensei já alguns anos atrás em tentar organizar um manual de instrução pro uso da liberdade, né? Para aqueles que estão começando a exercer a liberdade, que aspectos deveriam ser trazidos na presença... pra que o uso da liberdade fosse o melhor possível. Ahn... esse manual não é uma determinação, esse manual não diz o que que vocês devem fazer, ou como vocês devem usar. Apenas levanta algumas questões que estão envolvidas no uso da liberdade concretamente. E na primeira folha do manual tem uma advertência. E a advertência diz assim: “Atenção: a má utilização do produto pode acarretar danos irreparáveis ao mesmo”. Quando vocês usam a liberdade de vocês pra escolher certas opções, vocês põem em risco a liberdade de vocês, né? A experiência concreta, por exemplo, do... do uso de drogas que desenvolvem dependência. Se [...] você usa droga e se torna dependente, você teve uma severa perda de liberdade, porque o dependente químico é severamente limitado na sua liberdade. Da mesma forma, se você bebe bastante e pega sua moto para ir passear, a chance que você tem de ganhar, né?, uma lesão às vezes com caráter irrecuperável pro resto da vida e, portanto, uma privação radical de liberdade é, às vezes, bastante grande. Por isso, é conveniente que pra usar a liberdade algumas questões tenham sido refletidas.

        [...]

        Então, a primeira coisa que eu queria... quando você for usar a liberdade lembra do seguinte: ser livre não é só você fazer o que quer, é também você poder continuar querendo o que você fez. Porque quando, no desdobrar do tempo, você não quer mais ter feito o que você fez, você vai descobrir que o seu pior carcereiro é você mesmo. E isso é extremamente frustrante, isso é extremamente pesado, e por isso o exercício da liberdade obriga você a compreender a vida numa visão que vai pra além do imediato.

        [...]

POMPEIA, Guto. Palestra proferida em maio de 2012. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=LLk4jGEFP7s.  Acesso em: 24 nov. 2015.

       Fonte: Língua Portuguesa – Se liga na língua – Literatura, Produção de texto, Linguagem – 2 Ensino Médio – 1ª edição – São Paulo, 2016 – Moderna – p. 169-171.

Entendendo a palestra:

01 – A liberdade é o tema da palestra.

a)   Segundo o texto, qual é a preocupação imediata dos alunos que assistem à palestra?

A escolha profissional.

b)   De que maneira o palestrante vincula essa preocupação ao tema de sua fala?

A escolha profissional é um exercício de liberdade que pressupõe a abdicação de outras possibilidades e, por isso, exige reflexão.

c)   Que outro tema relativo à vida do jovem também foi associado à questão da liberdade? Explique como tal associação foi realizada.

O palestrante associou o tema da liberdade ao uso de drogas, cujas consequências podem restringir severamente a liberdade do usuário.

02 – Segundo o palestrante, por que o tema da liberdade está diretamente relacionado ao tema da escolha?

      O palestrante desenvolve a ideia de que as pessoas têm a liberdade de escolher, mas só são efetivamente livres quando realizam esse ato.

03 – O palestrante afirma ter organizado um “manual de instrução para o uso da liberdade”.

a)   Por que o uso do gênero “manual de instrução” parece conflitar com sua proposta?

Segundo o palestrante, sua intenção com o manual de instrução não é ditar orientações, o que contrasta com as características desse gênero.

        manual de instrução é um gênero textual voltado a apresentar explicações de como usar, manter ou fazer algo. É bastante comum nesse gênero o emprego de verbos no imperativo ou no infinitivo com valor de imperativo, já que o texto é injuntivo, ou seja, destinado a indicar procedimentos.

b)   O palestrante está ciente de que as características do gênero não se aplicam integralmente ao seu objetivo? Justifique.

Sim. Ele explicita isso ao introduzir uma ressalva: “esse manual não é uma determinação, esse manual não diz o que que vocês devem fazer, ou como vocês devem usar”.

c)   No texto da advertência — “Atenção: a má utilização do produto pode acarretar danos irreparáveis ao mesmo” —, a que se refere o termo “produto”? Justifique.

“Produto” refere-se a “liberdade”. O manual dedica-se a explicar como usar a liberdade.

04 – Releia o final do texto.

        “[...] e por isso o exercício da liberdade obriga você a compreender a vida numa visão que vai pra além do imediato.”

a)    Esse comentário alude a uma importante característica do adolescente. Qual?

A tendência a se preocupar apenas com o momento presente, desconsiderando as questões futuras.

b)    Qual seria a intenção do palestrante ao concluir a primeira parte de sua exposição com essa reflexão?

Resposta pessoal do aluno. Sugestão: É importante que o aluno associe a discussão sobre liberdade e visão de futuro ao tema da escolha, tratado para abordar a escolha profissional.

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