sábado, 27 de agosto de 2022

PRÓLOGO: ROMANCE ÚRSULA - (FRAGAMENTO) - MARIA FIRMINA DOS REIS - COM GABARITO

 Prólogo: Romance Úrsula – Fragmento

               Maria Firmina dos Reis

        [...]

        Mesquinho e humilde livro é este que vos apresento, leitor. Sei que passará entre o indiferentismo glacial de uns e o riso mofador de outros, e ainda assim o dou a lume.

        Não é a vaidade de adquirir nome que me cega, nem o amor próprio de autor. Sei que pouco vale este romance, porque escrito por uma mulher, e mulher brasileira, de educação acanhada e sem o trato e conversação dos homens ilustrados, que aconselham, que discutem e que corrigem, com uma instrução misérrima, apenas conhecendo a língua de seus pais, e pouco lida, o seu cabedal intelectual é quase nulo. 

        [...]

        Então por que o publicas? – Perguntará o leitor.

        Como uma tentativa, e mais ainda, por este amor materno, que não tem limites, que tudo desculpa – os defeitos, os achaques, as deformidades do filho – e gosta de enfeitá-lo e aparecer em toda a parte, mostrá-lo a todos os conhecimentos e vê-lo mimado e acariciado.

        O nosso romance, gerou-o a imaginação, e não no soube colorir, nem aformosentar. Pobre avezinha silvestre anda terra a terra, e nem olha para as planuras onde gira a águia.

        [...]

        Mas, ainda assim, não o abandoneis na sua humildade e obscuridade, senão morrerá à míngua, sentido e magoado, só afagado pelo carinho materno.

        Ele semelha à donzela, que não é formosa porque a natureza negou-lhe as graças feminis, e que por isso não pode encontrar uma afeição pura, que corresponda ao afeto da sua alma: mas que, com o pranto de uma dor sincera e viva, que lhe vem dos seios da alma, onde arde em chamas a mais intensa e abrasadora paixão, e que embalde quer recolher a corrução, move ao interesse aquele que a desdenhou e o obriga ao menos a olhá-la com bondade.

        [...]

        Deixai pois que a minha ÚRSULA, tímida e acanhada, sem dotes da natureza, nem enfeites e louçanias de arte, caminhe entre vós.

        Não a desprezeis, antes amparai-a nos seus incertos e titubeantes passos para assim dar alento à autora de seus dias, que talvez com essa proteção cultive mais o seu engenho, e venha a produzir cousa melhor, ou quando menos, sirva esse bom acolhimento de incentivo para outras, que com imaginação mais brilhante, com educação mais acurada, com instrução mais vasta e liberal, tenham mais timidez do que nós.

        [...].

                            REIS, Maria Firmina dos. Úrsula. 2. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2019. p. 12-3.

Fonte: Língua Portuguesa – Estações – Ensino Médio – Volume Único. 1ª edição, São Paulo, 2020 – editora Ática – p. 170-1.

Entendendo o prólogo:

01 – De acordo com o texto, o que significa a palavra corução?

      É uma ave de hábitos noturnos que se alimenta de insetos. 

02 – Qual parece ser o objetivo do prólogo?

      Buscar apresentar a obra para o leitor, explicar o objetivo de sua publicação e fazer um apelo para que ele a leia.

03 – Como a autora justifica a escrita do livro e que ela espera de seus leitores?

      A autora afirma ter escrito o romance como uma tentativa, por amor à escrita. Ela declara que alguns leitores permanecerão indiferentes ao seu esforço e que outros vão criticá-la, porque é mulher, brasileira, de pouca instrução. Ainda assim, espera que acolham o romance, isto é, que o leiam. Ela busca, ainda, poder melhorar sua técnica a partir da crítica dos leitores e incentivar outras escritoras a escrever.

04 – O que a autora diz a respeito do romance?

      A autora diz que o romance é “mesquinho e humilde”, de pouco valor, e que não soube colori-lo nem enfeitá-lo. Compara sua obra a uma avezinha silvestre, que vive com os pés no chão e não tem grandes pretensões, e a uma donzela sem beleza ou enfeites, mas que tem vivacidade e se expressa com toda emoção e sinceridade.

05 – O que é possível destacar sobre a linguagem da autora já no prólogo?

      É possível destacar o uso da comparação e dos adjetivos para caracterizar o livro e da ironia ao tratar do olhar de outros escritores e críticos sobre ela.

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