terça-feira, 27 de novembro de 2018

CRÔNICA: VISTA CANSADA - OTTO LARA RESENDE - COM QUESTÕES GABARITADAS

Crônica: Vista cansada
            Otto Lara Resende


        Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira vez? Pela primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa ideia de olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a vida continua, não admira que o Hemingway tenha acabado como acabou.
        Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não-vendo. Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.
        Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.
        Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima ideia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer. Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o rito, pode ser também que ninguém desse por sua ausência. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.
        Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.
                                                                           (Otto Lara Resende)
Entendendo a crônica:
01 – O título do texto é "Vista cansada". A que tipo de cansaço esse título faz referência? Justifique sua resposta com uma frase tirada do texto.
      O título do texto faz referência ao cansaço dos costumes, nos traz a mesmice de sempre que muitas das vezes nos cegam. "Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver." 

02 – Em que frase da crônica o escritor diz que foi preciso jogar luz sobre a nossa indiferença, a banalização do olhar?
      “Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver.”

03 – Responda com base nesse trecho e nos argumentos apresentados ao longo da crônica: Otto Lara Resende defende que cada coisa deve ser olhada como se fosse vista pela última ou pela primeira vez? Justifique sua resposta. 
      Deve ser olhada com atenção, como se fosse sempre uma novidade. Pois, caso contrário acabamos por banalizar as coisas e achamos que são como todas as outras. E muita das vezes perdemos uma bela paisagem, uma boa companhia. 

04 – Em vez de tratar apenas do olhar banalizado, o cronista apresenta, no último parágrafo, alternativas que mostram ao leitor outros modos possíveis de enxergar as coisas. Quais são essas
alternativas?
      Como o olhar de uma criança que se encanta com tudo o que vê, que tem vontade de mostrar a todos a descoberta. O autor deixa a dica, nos mostra que há sempre muitas coisas para se admirar e podem estar no nosso quintal, por exemplo. 

05 – Ao apresentar a consequência desse olhar banalizado, o cronista usa um termo que revela sua opinião sobre esse problema. Destaque esse termo do último parágrafo do texto e explique-o.
      O autor nos mostra que ao nos acostumarmos com nossa rotina, banalizamos o que está ao nosso redor, e por consequência a indiferença invade nossas vidas. E a partir deste momento nos tornamos insensíveis até mesmo para com as pessoas que amamos.

06 – O tema da crônica é:
a)   O modo de ver dos poetas.
b)   O caso de um profissional que não “enxergava” o porteiro do prédio.
c)   A forma de olhar de quem não crê que a vida continua.
d)   A incapacidade de enxergar o que vemos repetidamente no cotidiano.
e)   O encontro de Lima sobre as mudanças climáticas.

07 – Segundo o autor:
a)   Olhar com um olhar de despedida é a melhor forma de ver.
b)   A rotina amplia nosso campo visual.
c)   É preciso experimentar ver pela primeira vez o que se vê todo dia.
d)   A familiaridade do que nos rodeia aguça nossa curiosidade.

08 – Qual das frases abaixo tem o mesmo sentido de “O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem”.
a)   A rotina torna nosso olhar opaco.
b)   A familiaridade aguça nossa atenção, mas distorce a percepção.
c)   Olhos embaçados só percebem o que é familiar.
d)   O hábito suja os olhos de quem não tem curiosidade.

09 – Que tipo de relação que o autor estabelece entre a incapacidade de ver e a indiferença:
a)   Uma relação de equivalência.
b)   Uma correlação.
c)   Uma interação.
d)   Uma relação de causa e efeito.






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