Texto: Onde
é a “Cracolândia”
Rachel de Queiroz
A primeira vez em que ouvimos falar no
vício de crack, aqui no Brasil, foi a propósito de um prefeito de Washington,
negro – creio, aliás, o primeiro negro a exercer esse cargo. Escândalo
tremendo, muita gente chegou a pensar que seria campanha dos brancos contra o
chamado “homem de cor”. Mas o coitado confessou; os jornais tiveram de explicar
ao público o que seria esse tal de crack, uma espécie de pasta, cujo
ingrediente principal seria a cocaína. Passou o escândalo, como passam todos, e
sumiram com o prefeito “craquista” no noticiário.
Mas já agora, infelizmente, ninguém
mais no Brasil ignora o que é o crack.
E, pior: já é grande a difusão da droga
entre nós, especialmente entre os jovens, em São Paulo, no Rio, e provavelmente
na maior parte das grandes cidades do País. Há campanhas organizadas por
associações beneficentes, e, claro, um pavor generalizado entre pais e parentes
que já contam, em casa, com meninos e meninas consumidores ou pelo menos conhecedores
da droga.
De São Paulo, recebo agora uma carta
que me comoveu profundamente: uma coisa é a gente encarar um problema, embora
grave, a distância; impressiona, revolta, mas não provoca o impacto, o susto
daquilo que se vê com os próprios olhos, na casa de amigos.
Trata-se de um rapaz, que conheci
garotinho, que sentei no meu colo, que já mostrava então nos olhos vivos uma
inteligência precoce. Na carta, contam os pais, desesperados, que o menino, já
rapaz agora, se tornou viciado em crack, e, dentro dessa rota, que parece sem
retorno, caminha para o desastre final.
Dizem: “Nosso filho, o Junior
(lembra-se como você gostava dele?), é hoje um desses menores perdidos pelas
ruas do que eles chamam ‘Cracolândia’. Hoje, viciado assumido, já tem os pés
danificados, perdeu dentes e traz nas costas as marcas das surras que,
comumente, os jovens como ele levam de elementos da polícia, que por desvio de
formação, talvez, maculam com violências a imagem da sua corporação. Da última
internação que conseguimos para o nosso filho, o resultado foi catastrófico.
Recorremos a uma clínica religiosa, que nos parecia capaz de conseguir uma
solução. Pagamos R$ 200,00 na entrada e o soubemos de volta às ruas dentro de
quatro dias.
Não lhe deram qualquer tipo de
medicamento; como estudo, ensino bíblico, quatro horas por dia; e trabalhos de
limpeza e cozinha como 'terapia'.
Confesso que não temos mais o que
fazer, o que tentar. Recorremos a você, na esperança de que nos dê qualquer
luz, que nos guie, neste pavor em que vivemos.”
Transcrevo aqui essa carta patética,
mas veraz, levada pela mesma esperança desses amigos. Quem sabe o governo, a
sociedade, a imprensa, qualquer pessoa influente ou organização (eles nos falam
numa “Associação de Desenvolvimento Solidário”, que já existe em São Paulo, e
se dedica ao problema) encontre uma solução. Dizem-me ainda os pais que esses
meninos desviados não são só crianças carentes, alguns de classe média, outros
de classe alta; trocam a casa dos pais pela rua, vivem de pequenos furtos e
acabam dominados pelos traficantes de drogas.
Não serei a primeira nem serei a última
a trazer esse assunto à imprensa. (...)
O fato é que alguém tem de descobrir
uma solução, antes que se perca, no crack, toda uma geração de jovens
brasileiros.
Raquel
de Queiroz. O Estado de São Paulo, 15 fev. 1997.
Entendendo o texto:
01 – A palavra cracolândia vem de duas palavras inglesas:
Crack =
rachadura, fenda, queda, dano, desequilíbrio.
Land =
terra.
Você conhece mais palavras
com a terminação “lândia”? Escreva-as:
Resposta pessoal do aluno.
02 – Reescreva as frases,
substituindo as palavras em destaque por sinônimos.
a)
Ninguém mais ignora que o crack seja um grave problema.
Ninguém mais desconhece que o crack seja um sério problema.
b)
A difusão
das drogas é alarmante!
A propagação das drogas é alarmante!
c)
O malandro confessou ser um traficante.
O malandro admitiu ser um traficante.
03 – Construa uma frase
empregando a palavra impacto.
Resposta pessoal
do aluno.
04 – A crônica de Raquel de
Queiroz pode ser dividida em duas partes.
Na primeira parte a autora
fala do crack de forma geral. Qual é a segunda parte do texto? A partir de que
parágrafo ela começa?
No quarto
parágrafo a autora começa a narrar um caso acontecido com um filho de amigos
dela. No final (da carta) ela faz, ainda, umas reflexões sobre o problema.
05 – Os pais do jovem
viciado em crack endereçaram a carta à autora com dois objetivos:
a)
Primeiramente eles contam o que aconteceu com
o Júnior e a que estado deplorável ele chegou.
b)
E o segundo motivo da carta? O que eles pedem
a Raquel?
Eles recorrem a ela pedindo uma luz que os guie e oriente.
06 – Por que o caso do
Júnior provocou um “impacto”, um choque na autora do texto?
Porque o garoto passou de bom a viciado.
Era inteligente, de boa família, e acabou
se envolvendo com drogas.
07 – Escrever quais os danos
físicos causados pela droga em Júnior. (Veja o sexto parágrafo).
·
Pés danificados (machucados).
·
Perda dos dentes.
·
Marcas de surras nas costas.
08 – Explique com suas
palavras o sentido do trecho:
“... essa rota, que parece
sem retorno, caminha para o final.”
O caminho da
droga (do drogado) é de difícil retorno, é uma estrada sem volta, e o resultado
é a destruição e a morte.
09 – A crônica “Onde é a
Cracolândia”? Tem fundamento na vida real ou a autora apenas teria inventado
uma história? Explique.
Sim, é a vida
real de muitas famílias.
10 – Qual é a sua opinião
sobre o uso de drogas?
Resposta pessoal
do aluno.
11 – A autora diz, no final
da crônica, que “... alguém tem que
descobrir uma solução...” para o problema das drogas. Na sua opinião, quais
seriam as saídas, as maneiras de resolver esse grave problema?
Resposta pessoal
do aluno.
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