quarta-feira, 4 de junho de 2025

ARTIGO DE OPINIÃO: O MENINO ESTÁ FORA DA PAISAGEM - FRAGMENTO - JABOR A. - COM GABARITO

 Artigo de opinião: O menino está fora da paisagem – Fragmento

        Jabor A.

        O menino parado no sinal de trânsito vem em minha direção e pede esmola. Eu preferiria que ele não viesse. A miséria nos lembra de que a desgraça existe, e a morte também. Como quero esquecer a morte, prefiro não olhar o menino. Mas não me contenho e fico observando os movimentos do menino na rua. Sua paisagem é a mesma que a nossa: a esquina, os meios-fios, os postes. Mas ele se move em outro mapa, outro diagrama. Seus pontos de referência são outros. 

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiPzLxropUpUFYerqhF-n3QEhjGwqnsHItU7JY5iCxLYYg4Or0Xy1RFuG8s0VB6OQe42TED_hKGcojV6oLmLmmKUA54AukmlTKQ2noaMCOy_QXZMA80ab2U50YXW_57T1QNIu2AdipDwA4rnaWvRekLphubrmIEx8ryGS2RaMjY1jFHyvyFPgZ37kPMhbo/s320/muros_por_derrubar.jpg


        Como não tem nada, pode ver tudo. Vive num grande playground, onde pode brincar com tudo, desde que “de fora”. O menino de rua só pode brincar no espaço “entre” as coisas. Ele está fora do carro, fora da loja, fora do restaurante. A cidade é uma grande vitrine de impossibilidades. [...]. Seu ponto de vista é o contrário do intelectual: ele não vê o conjunto nem tira conclusões histéricas – só detalhes interessam. O conceito de tempo para ele é diferente do nosso. Não há segunda-feira, colégio, happy hour. Os momentos não se somam, não armazenam memórias. Só coisas “importantes”: "Está na hora de o português da lanchonete despejar o lixo...” ou "Estão dormindo no meu caixote...”

        [...]

        Se não sentir fome ou dor, ele curte. Acha natural sair do útero da mãe e logo estar junto aos canos de descarga pedindo dinheiro. Ele se acha normal; nós é que ficamos anormais com a sua presença.

        [...].

Jabor A. O menino está fora da paisagem. O Estado de São Paulo, São Paulo, 14 abr. 2009. Caderno 2, p. D 10.

Fonte: Livro – Português: Linguagens, 3ª Série – Ensino Médio – William Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães, 9ª ed. – São Paulo: Saraiva Editora, 2013. p. 292.

Entendendo o artigo:

01 – Qual a primeira reação do narrador ao ver o menino no sinal de trânsito e o que essa reação revela sobre o observador?

      A primeira reação do narrador é de desconforto e aversão, preferindo que o menino não viesse em sua direção. Essa reação revela o desejo de ignorar a miséria e, por extensão, a própria mortalidade e o lado desagradável da existência, buscando manter uma ilusão de normalidade e esquecimento da dor alheia.

02 – Como o autor descreve a "paisagem" do menino de rua em contraste com a nossa, e qual a diferença fundamental entre seus "mapas"?

      O autor descreve a paisagem física do menino como a mesma nossa ("a esquina, os meios-fios, os postes"). No entanto, a diferença fundamental é que o menino se move em "outro mapa, outro diagrama", com "pontos de referência outros". Isso significa que, embora compartilhem o mesmo espaço físico, suas realidades, prioridades e formas de interação com esse ambiente são completamente distintas devido à sua condição de marginalidade e exclusão.

03 – De que forma o "ponto de vista" do menino de rua é caracterizado como o "contrário do intelectual"?

      O ponto de vista do menino de rua é caracterizado como o "contrário do intelectual" porque ele não vê o conjunto nem tira conclusões históricas, focando apenas em "detalhes" que lhe são importantes para a sobrevivência ("Está na hora de o português da lanchonete despejar o lixo..." ou "Estão dormindo no meu caixote..."). Isso contrasta com a visão abrangente e analítica típica do pensamento intelectual.

04 – Como o artigo descreve a percepção do tempo para o menino de rua?

      O artigo afirma que o conceito de tempo para o menino de rua é "diferente do nosso". Para ele, "Não há segunda-feira, colégio, happy hour. Os momentos não se somam, não armazenam memórias". Isso sugere que o tempo do menino é vivido em um presente contínuo e imediato, ditado pelas necessidades básicas e pelos eventos momentâneos de sua sobrevivência, sem a linearidade e o planejamento que caracterizam a vida organizada da sociedade.

05 – Qual a conclusão do autor sobre a percepção do menino de rua a respeito de sua própria condição?

      A conclusão do autor é que o menino de rua "se acha normal" em sua condição. Ele "acha natural sair do útero da mãe e logo estar junto aos canos de descarga pedindo dinheiro". A "anormalidade" e o desconforto, segundo Jabor, são sentidos por "nós" (a sociedade "normal") com a presença dele, e não o contrário.

 

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