Notícia: A triste saga de Jayson Blair – OMBUDSMAN
BERNARDO AJZENBERG
A Folha deu pouca bola para o
assunto na semana, mas o fato é que, desde domingo, o jornalismo, em especial o
norte-americano, levou um brutal soco no estômago.
Ele foi produzido por uma extensa
reportagem do "New York Times" daquele dia sobre erros, fraudes,
plágios e invenções contidas em textos produzidos ao longo de cinco meses por
um de seus repórteres, Jayson Blair, 27, que deixou o jornal dia 1º.
O levantamento, feito por repórteres,
editores e pesquisadores do próprio "Times", ocorreu a partir da
constatação de que um texto de Blair publicado em 26/4 sobre a família de um
soldado desaparecido no Iraque plagiava reportagem de oito dias antes do
"San Antônio Express-News", do Texas.
Constataram-se ao menos 36 fraudes nas
73 reportagens dele publicadas entre outubro de 2002 e abril último, detalhadas
nas quatro páginas que o "Times" usou para o caso domingo.
Blair fingia mandar matérias de lugares
onde não estava, usava fotos para forjar detalhes que não presenciara,
inventava declarações. Cerca de 600 reportagens de sua autoria publicadas desde
1998 estão sendo checadas.
Crise
O "New York Times", com 152
anos de existência, é considerado o jornal mais influente dos EUA e um dos mais
importantes do mundo. Faz parte das instituições que estruturam a democracia
naquele país. Publica diariamente uma seção de "Correções", goza uma
tradição de independência e credibilidade.
O próprio fato de ter divulgado o caso
com estardalhaço, em evidente tom de mea-culpa, conta, nesse sentido, a seu
favor.
História e transparência, porém, não
respondem à questão principal: como foram possíveis tantas fraudes durante
tanto tempo num jornal como esse?
Na quarta-feira, cerca de 500 de seus
jornalistas se reuniram por duas horas, com a direção, numa sala de cinema de
Nova York para discutir o problema.
Embora o encontro tenha sido a portas
fechadas, relatos da própria mídia norte-americana dão conta de que o clima,
ali, foi de tensão e crise declarada, com abertos questionamentos em relação
aos mecanismos de controle do jornal, critérios de recrutamento e promoção,
subestimação da comunicação interna.
Questiona-se, inclusive, se não houve
excessiva tolerância da cúpula com Blair – sobre quem circulavam advertências
quanto a imprecisões e comportamento duvidoso já no início de 2002 – devido ao
fato de ele ser negro e de o jornal adotar uma política de recrutamento que
valoriza a chamada "ação afirmativa".
Desde outubro, por exemplo, o
jornalista enviara textos supostamente de 20 cidades em seis Estados sem ter
submetido à administração um único recibo para prestação de contas.
Em
programa na CNN, o colunista de mídia do "Washington Post", Howard
Kurtz, chegou a pôr em dúvida o próprio procedimento do "Times" para
apurar os erros de Blair.
"Acho que esse é um exemplo
clássico em que o jornal poderia usar um ombudsman com visão independente,
pois, no fim das contas, os editores que, em última instância, estão envolvidos
no caso são os mesmos que supervisionam essa investigação", disse o
jornalista.
Alguém fora da estrutura de poder do
jornal, argumenta Kurtz, poderia, por exemplo, questionar Howell Raines
(editor-executivo) sobre o fato de ele próprio ter congratulado Blair num
e-mail sobre sua cobertura no caso do atirador de Washington ano passado.
Momento
delicado
Casos assim já ocorreram nos EUA, mas
não num veículo tão portentoso, por tanto tempo, com tamanha dimensão – tampouco
num momento tão delicado, em que, além de sofrer forte crise econômica, a mídia
é questionada por sua quase generalizada subserviência ao
"patriotismo" de George W. Bush.
A Folha, porém, deu ao assunto,
segunda-feira, apenas uma notinha em pé de página, diferentemente de
concorrentes, que tiveram mais sensibilidade para captar a sua dimensão
histórica.
Na terça, recuperou-se um pouco ao
noticiar, com foto de Blair, que o jornal "The Boston Globe", no qual
ele também trabalhara por alguns meses, deflagara a sua própria investigação.
Houve um editorial na edição de quarta
e só – ao menos até o fechamento desta coluna.
Aliás, a ombudsman do
"Globe", Christine Chinlund, com quem troquei e-mails, lamenta o
ocorrido de modo simples:
"A saga de Jayson Blair é, acima
de tudo, uma saga muito triste. Ela se institui como uma lembrança a todos os
jornalistas e editores sobre a necessidade de uma vigilância extrema quanto à
exatidão. Não podemos, jamais, abrir mão disso".
O "Times", o
"Globe" e outros jornais dos EUA anunciaram uma revisão de
procedimentos internos de checagem e controle.
No Brasil, revelaram-se até o momento
poucos casos de fraude ou plágio. A "triste saga" de Jayson Blair
deve servir, no mínimo, como um enorme sinal amarelo.
Folha de São Paulo, 18/5/03, p. A-6.
Fonte: livro Português:
Língua e Cultura – Carlos Alberto Faraco – vol. único – Ensino Médio – 1ª
edição – Base Editora – Curitiba, 2003. p. 184-185.
Entendendo a notícia:
01
– Qual foi o principal impacto do caso Jayson Blair no jornalismo?
O caso de Jayson Blair
abalou profundamente a credibilidade do New York Times, um dos jornais mais
respeitados do mundo. Revelou falhas nos sistemas de checagem e controle do
jornal, gerando uma crise de confiança e levando a uma revisão dos
procedimentos internos em diversas redações.
02
– Quais foram as principais fraudes cometidas por Jayson Blair?
Jayson Blair
cometeu diversas fraudes, como inventar informações, plagiar outros
jornalistas, e atribuir a si mesmo a autoria de reportagens que não realizou.
Ele também falsificou dados e localizações, enganando tanto os leitores quanto
seus colegas de trabalho.
03
– Por que o caso de Jayson Blair gerou tanta repercussão?
O caso gerou
tanta repercussão por diversos motivos: o New York Times é um dos jornais mais
influentes do mundo, e a descoberta das fraudes de um de seus repórteres abalou
a confiança no jornalismo como um todo. Além disso, o caso levantou questões
importantes sobre a ética profissional, a importância da checagem de fatos e os
mecanismos de controle nas redações.
04
– Quais as principais consequências do caso para o New York Times?
O caso levou à
demissão de Jayson Blair e de dois altos executivos do jornal. Além disso, o
New York Times implementou novas medidas de controle de qualidade e criou a
figura do ombudsman, um profissional independente responsável por investigar
queixas e garantir a integridade jornalística.
05
– Quais as implicações do caso para o jornalismo brasileiro?
O caso de Jayson
Blair serviu como um alerta para o jornalismo brasileiro, que também precisa
estar atento à necessidade de manter altos padrões de qualidade e ética. A
história mostrou a importância de mecanismos de checagem rigorosos e da
transparência nas redações.
06
– Qual a importância da figura do ombudsman no jornalismo?
O ombudsman
desempenha um papel fundamental no jornalismo, atuando como um defensor dos
leitores e garantindo a independência editorial. Ele investiga queixas, analisa
o trabalho dos jornalistas e faz recomendações para melhorar a qualidade do
jornalismo.
07
– Qual a importância da cobertura desse tipo de caso pela imprensa?
A cobertura de
casos como o de Jayson Blair é fundamental para manter a transparência e a
credibilidade do jornalismo. Ao divulgar as falhas e os erros, a imprensa
contribui para um debate público sobre a ética profissional e a importância da
verdade. Além disso, a cobertura desse tipo de caso pode levar a melhorias nos
processos internos das redações e fortalecer a confiança dos leitores.
Nenhum comentário:
Postar um comentário