segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

CRÔNICA: PEQUENAS APRENDIZAGENS - JAMIL SNEGE - COM GABARITO

 Crônica: Pequenas aprendizagens

             Jamil Snege

        Bastou relatar, na última crônica, minha experiência com a descoberta de um câncer, para que meu telefone triplicasse o volume de chamadas recebidas. Eram os amigos, os parentes e, em número menor porém muito significativo, os colegas de fado e de sina. Descobri, de repente, que o mundo ao redor não é tão são como parece. E que muitas pessoas, com as quais cruzamos na rua, no shopping ou na fila do cinema, guardam dentro de si, mais ou menos inviolado, um idêntico segredo.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgQ1XZdeSlNklTeKhWKv1CTMzGryT-CSACUO9wEnm9x-TTYMWbPnqjln2PuXJ2ju4YlUheYtJTZWJcpC-_4k-PD8jAcaHrAdw0FWjeIVb0nzVoPciG8p_c-LgsgEclw1QKgtvHP38rOEQTXJSIHV8p-noP-xTb83vFlG3wrPbQTqXcgJ0qbDBEoitfG_1Y/s1600/solid%C3%A3o.jpg


        Têm elas, como eu, um alien alojado em alguma parte de seus corpos (ou fluídico e difuso em seu todo), com o qual mantêm relações estranhas e contraditórias. Em algumas, a relação é de beligerância declarada – e estas geralmente exibem a fisionomia contrita do guerreiro. Querem vencer e tudo farão para expulsar o invasor e destruí-lo. Outras, ao contrário, procuram ouvir o que o invasor tem a lhes dizer e o tratam antes como mensageiro do que como inimigo. Não cedem a ele, mas também não o afrontam com iras desmedidas. E um ser que está ali, com sua sintaxe desordenada, querendo expressar algo. Curiosamente, essa atividade as ilumina.

        Ainda sou neófito nas artes de convivência com meu alien, mas tendo a imitar essa última postura. Procuro decodificar as mensagens que ele me envia, sempre tomando o cuidado de interpretar o conteúdo delas. Nesses poucos dias, aprendi mais sobre mim do que em muitos anos de saudável pastio pelas rotinas da vida. Descobri afetos insuspeitados, docilidades, relevâncias onde antes nada havia. E, simetricamente, a absoluta irrelevância de certas coisas que julgávamos muito importantes.

        Os males imaginários, por exemplo, nos infundem muito mais terror que um bando de células malucas embutido em nosso peito. Pois são apenas células malucas – e não passam disso. Tememos todas as mortes possíveis, sofremos a iminência trágica e retumbante de cada uma delas – mas somente uma única mortezinha, singular e vulgar, nos arrebatará deste mundo.

        Como quem descobre uma nova ruga ou um novo fio de cabelo branco, você descobre que o espírito também envelhece e fica mais sábio. E ficar mais sábio, neste caso, não significa mergulhar em transcendência, mas, ao contrário, buscar a imanência das coisas mais simples. Onde estão elas, você perguntará. Não há resposta verbal, nem construção conceituai, que indique onde estão e o que são as coisas simples. Podemos fazer algumas aproximações, através da sensibilidade, na direção delas. Por exemplo: desligar o televisor, ao primeiro sinal de tédio, e olhar com um interesse completamente novo, inaugural, para o rosto da pessoa que há anos vive a nosso lado.

SNEGE, Jamil. Gazeta do Povo, Curitiba, 21 jul. 2002, p. G-3.

Fonte: livro Português: Língua e Cultura – Carlos Alberto Faraco – vol. único – Ensino Médio – 1ª edição – Base Editora – Curitiba, 2003. p. 15-16.

Entendendo a crônica:

01 – A experiência com a doença levou o autor a uma profunda reflexão sobre a vida. Quais foram as principais mudanças de perspectiva que ele experimentou?

      Essa pergunta busca explorar as transformações internas do autor, como a valorização de relacionamentos, a mudança de prioridades e a nova visão sobre a vida e a morte.

02 – O autor menciona duas posturas diferentes diante da doença: a beligerância e a aceitação. Qual dessas posturas ele escolheu e por quê?

      A questão explora a decisão pessoal do autor e as razões que o levaram a adotar uma determinada postura frente ao diagnóstico.

03 – A crônica destaca a importância das relações interpessoais. De que forma a doença aproximou o autor das pessoas ao seu redor?

      A pergunta aprofunda a análise sobre como a experiência da doença influenciou os relacionamentos do autor e como as pessoas ao seu redor reagiram.

04 – O autor afirma que aprendeu mais sobre si mesmo nos últimos dias do que em muitos anos. Quais são as principais lições que ele aprendeu?

      A questão busca identificar as lições mais significativas que o autor extraiu da experiência, como a importância de viver o presente, a fragilidade da vida e a necessidade de buscar o simples.

05 – A crônica faz uma crítica à sociedade contemporânea. Qual é essa crítica e como ela se relaciona com a experiência do autor?

      A pergunta busca analisar a visão crítica do autor sobre a sociedade, que valoriza o materialismo e a superficialidade, contrastando com a busca por significado e simplicidade que ele experimenta.

06 – O autor menciona a importância de "decodificar as mensagens" que a doença envia. O que você entende por essa frase?

      A questão busca uma interpretação mais profunda da metáfora utilizada pelo autor, convidando o leitor a refletir sobre o significado da doença como uma forma de comunicação.

07 – A crônica termina com uma reflexão sobre a simplicidade. Qual é a importância da simplicidade na vida, segundo o autor?

      A pergunta busca compreender a valorização da simplicidade como um caminho para uma vida mais plena e significativa, contrastando com a complexidade e a superficialidade do mundo moderno.

 

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