POEMA: UM
BOI VÊ OS HOMENS
Carlos Drummond de Andrade
Tão delicados (mais que um arbusto) e
correm e correm de um para o outro lado, sempre esquecidos de alguma coisa.
Certamente, falta-lhes não sei que atributo essencial, posto se apresentam
nobres e graves, por vezes. Ah, espantosamente graves, até sinistros. Coitados,
dir-se-ia não escutam nem o canto do ar nem os segredos do feno, como também
parecem não enxergar o que é visível e comum a cada um de nós, no espaço. E
ficam tristes e no rasto da tristeza chegam à crueldade.
Toda a expressão deles mora nos olhos –
e perde-se a um simples baixar de cílios, a uma sombra.
Nada nos pelos, nos extremos de
inconcebível fragilidade, e como neles há pouca montanha, e que secura e que
reentrâncias e que impossibilidade de se organizarem em formas calmas,
permanentes e necessárias. Têm, talvez, certa graça melancólica (um minuto) e
com isto se fazem perdoar a agitação incômoda e o translúcido vazio interior
que os torna tão pobres e carecidos de emitir sons absurdos e agônicos: desejo,
amor, ciúme (que sabemos nós?), sons que se despedaçam e tombam no campo como
pedras aflitas e queimam a erva e a água, e difícil, depois disto, é ruminarmos
nossa verdade.
Carlos Drummond de Andrade. In Claro enigma. Graña
Drummond
Rio de
Janeiro: Record.
Entendendo
o texto:
01
– Explique por que, sob a perspectiva do boi, o homem é um ser
contraditório.
Porque algumas vezes s mostra delicado, sério, inofensivo; em outras, é
sinistro, perigoso, cruel.
02
– Ao analisar o homem, o boi assume certa superioridade. Quais são no
poema os indícios dessa superioridade?
O fato de o boi chamar os homens de “coitados” e as conclusões que indicam que
faltam aos homens alguns atributos (como não conseguir escutar os sons da
natureza, não enxergar a realidade) e que eles seriam pobres e vazios sugerem
uma perspectiva de superioridade por parte do boi.
03
– Qual a única afirmação que não pode ser associada às interpretações do
boi?
- Dominado pela solidão, o homem reage
de maneiras distintas: tanto pode entritecer-se quanto enfurecer-se.
- Os homens parecem perdidos, desorientados, pois estão profundamente afastados
da natureza.
- As crueldades cometidas pelos homens não podem ser compreendidas ou
perdoadas.
- O vazio interior que os homens carregam impõe-lhes perturbação e desassossego
constantes.
04
– O poema encerra-se com o verso “e difícil, depois disto, é ruminarmos
nossa verdade”.
a)
Qual o sentido do verbo ruminar nesse verso?
Ele tem o
sentido de “refletir, meditar, pensar profundamente”.
b)
O verso pode ser considerado um desabafo do boi. Em que consiste
esse desabafo?
O boi
desabafa sua perturbação provocada pela percepção da atormentada condição
humana.
Você participaria dessa campanha? em caso afirmativo como procederia?
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