Crônica: A Etiqueta Carioca
Walcyr Carrasco
MUITOS SÃO OS ERROS que um paulistano comete no
Rio de Janeiro. Cariocas vivem de uma maneira peculiar. Nenhum paulista jamais
passará por carioca, mesmo que exagere nos calções, no torso sem camiseta, nos
óculos escuros, e bote uma lixa dentro da boca para arrastar os
"erres". Parecerá um paulista metido a carioca, no máximo.
A primeira dica (dica é uma palavra muito
paulista, por sinal. Um carioca preferiria "sacada", eu acho) é na
área das relações sociais. Cariocas são falantes e simpáticos. Você conhecerá
gatas, gatos, hipopótamos e baleias comprimidas em biquínis do tamanho de um
lenço de nariz. Ao final da conversa, sempre vem a frase:
— Quando é que você vem em casa?
Não cometa a bobagem de sair atrás de uma
caneta, papelzinho para anotar o endereço, ou qualquer atitude igualmente
constrangedora. O carioca não pretende dizer onde mora. É apenas uma forma
cordial de comentar que, apesar de paulista, você é um ser humano.
O horário de uma festa sempre é falso. Chegue
no mínimo duas horas depois. Vista-se e veja um bom programa de televisão. Ao
final, tome mais um banho e troque de roupa outra vez. Será o primeiro a
chegar.
A cidade é movida a ar condicionado. O seu
corpo precisa se habituar a deixar um escritório a 10 graus e enfrentar um
calor de 40 em exatos três segundos. É lastimável que a Nasa não tenha estudado
os cariocas. Seria ótimo para destrinchar as condições de vida em planetas selvagens.
Ah! Leve tapa-ouvidos. Em boa parte dos hotéis e apartamentos, o velho e
trabalhador aparelho resfolega a cada golfada de ar. Parece que o apartamento
está aquecendo as turbinas para decolar. No táxi, tire os óculos. Não verá o
taxímetro, mas que fazer? Ao sair do carro fresquinho parado asfalto
flamejante, seus óculos vão embaçar. Paulistanos podem ser atropelados
simplesmente porque os óculos nublaram.
Séria é a questão do traje. Um amigo meu
encontrou famosa escritora da pauliceia correndo no calçadão de Ipanema de
tênis e collant preto. Parecia um ninja. A desditosa imaginou que o traje a
emagreceria. Isso não vale para um lugar onde se usa o mínimo de roupa. Um
paulista se veste para ir à praia. Bota horrendas meias com tênis, bermuda,
camiseta. O carioca se despe. Tira a camisa, as calças, usa no máximo uma
havaiana. Moças pegam ônibus de biquíni com o dinheiro dobradinho na barriga.
(E naturalmente molham quem está do lado, ao voltar.) Talvez você fique sem
jeito, ao expor o tom de pele branco-esverdeado, fruto da exposição a luzes fluorescentes.
Não há alternativa. Praia com meia é o suprassumo da cafonice. Também pode ser
da inocência. Tente sorrir para a barraca do lado:
— Dá pra você tomar conta enquanto dou uma
nadadinha?
Tudo que você encontrará na volta serão
expressões angelicais, enquanto você grita atrás do seu tênis de palmilha
especial para pé chato.
E... atenção! Muitas praias no Rio são
especializadas. Existe a praia de surfistas na Barra; a dos praticantes de
asa-delta, em São Conrado; a de quem quer ver e ser visto, em frente ao
Country. E as gays, em Ipanema e Copacabana. Há um acordo tácito, pelo qual
ninguém interfere na onda dos outros. Escolha a praia que preferir. Mas depois
não reclame, se for convidado a brincar de casinha.
Seguindo essas fáceis regras de etiqueta, você poderá desfrutar uma das mais belas cidades do mundo. Será um passeio "maneiro". Ah, eu não disse ainda? Esqueça palavras como bonito, formoso, excelso. Tudo que é bom no Rio é "maneiro". Se alguém lhe fizer esse elogio... puxa, aos olhos do carioca você não é um paulistano tão detestável assim!
Entendendo o texto
01. Qual é a recomendação do autor em relação ao
convite para ir à casa de um carioca?
a) Anotar o endereço
imediatamente.
b) Sair em busca de uma
caneta e papel.
c) Não se
preocupar em anotar, pois é apenas uma forma cordial.
d) Perguntar o
endereço várias vezes para não esquecer.
02. O que o autor sugere sobre o horário
de uma festa no Rio de Janeiro?
a) Chegar no horário marcado.
b) Chegar duas horas antes do horário
marcado.
c) Chegar duas horas depois do
horário marcado.
d) Ignorar o horário, pois as festas
nunca começam.
03. Como o autor descreve a relação do
carioca com o ar condicionado?
a) O carioca evita o uso do ar
condicionado.
b) O carioca adora o ar condicionado.
c) O carioca sofre com as mudanças de
temperatura.
d) A cidade é movida a ar
condicionado.
04. O que é recomendado ao usar táxi no Rio
de Janeiro, segundo o autor?
a) Ignorar o taxímetro.
b) Sempre pedir ao taxista para ligar
o ar condicionado.
c) Tirar os óculos para não
embaçarem.
d) Usar um mapa para monitorar o
trajeto.
05. Como o autor descreve a questão do traje
na praia?
a) Os cariocas se vestem para ir à
praia.
b) Os paulistas usam o mínimo de
roupa na praia.
c) É comum ver pessoas de tênis e
meias na praia.
d) As moças usam biquíni no ônibus.
06. O que o autor destaca sobre as
expressões "maneiro" no Rio de Janeiro?
a) São palavras paulistas.
b) São usadas para descrever coisas
feias.
c) Substituem elogios como
"bonito" e "formoso".
d) São pouco utilizadas pelos cariocas.
07. O que o autor menciona sobre as
diferentes praias no Rio de Janeiro?
a) Todas as praias são iguais.
b) Cada praia tem sua
especialização.
c) Não vale a pena visitar as
praias.
d) Os cariocas evitam a praia.
08. O que o autor diz sobre a reação ao
elogio "maneiro"?
a) É um sinal de detestabilidade.
b) Indica que o carioca gostou de
você.
c) Significa que você é considerado
um paulistano simpático.
d) Deve ser ignorado, pois não tem
importância.
09. Qual é a recomendação do autor ao ser
convidado para brincar de casinha?
a) Aceitar de imediato.
b) Recusar educadamente.
c) Escolher a praia certa.
d) Não reclamar após aceitar o
convite.
10. Como o autor descreve o corpo dos
cariocas em relação ao ar condicionado?
a) O corpo dos cariocas não se adapta ao ar
condicionado.
b) É lamentável que a Nasa não tenha estudado
os cariocas.
c) Os cariocas adoram a mudança
brusca de temperatura.
d) A cidade deveria ter temperaturas
mais amenas.
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