Peça teatral: A fuga
Renato Arlem
Maria
Lúcia (lugar-tenente)
Helena
(chefe)
Jorge
(chefe)
Gabi
(medrosa)
Lúcia
(medrosa)
Joana
(quieta)
Mariana
(brigona)
Renata
Juliana
Paulo
(Uma
casa vazia só com um telefone. O bando chega, menos Paulo e Juliana.)
Helena: É aqui?
Gabi: De quem é essa casa?
Jorge: É do meu pai. Está
desalugada.
Joana: E se descobrem?
Helena: Como vão descobrir?
Gabi: E se chamam a polícia?
Jorge: Claro que vão chamar
a polícia, mas nunca vão pensar que viemos para uma casa vazia.
Renata: E quando é que a
gente vai viajar?
Maria Lúcia: Calma, Renata.
Primeiro a gente se instala aqui.
Joana: Minha mãe vai ficar
muito nervosa.
Helena: E não é isso que a
gente quer? Quando eles ficarem bem velhos a gente telefona e exige respeito.
Joana: Vou telefonar agora.
Jorge: Vai coisa nenhuma.
Primeiro o susto. Depois a gente apresenta nossas reivindicações.
Gabi: Não quero, não.
Renata: Nem eu. Quero a
minha mãe.
Helena: Olha aqui, menina
covarde, se você pegar neste telefone vai se ver comigo.
Joana: Cadê Juliana e o
Paulo?
Helena: Devem estar
chegando. Olha na janela, anda Gabi.
(Gabi volta.)
Gabi: Lá vêm eles.
(Entram Juliana e Paulo
cheios de compras de supermercado.)
Juliana: Legal esta casa.
Paulo: Compramos tudo.
Mariana: Trouxe o meu Toddy?
Paulo: Não. Nescau.
Mariana: Mas eu pedi Toddy.
Paulo: E daí?
Mariana: Você é um chato.
Paulo: Leite, Nescau, pão,
chocolate.
Mariana: Me dá um.
Helena: Agora não. Temos que
economizar.
Gabi (Gorda.) Quando é o
almoço?
Helena: Calma, Gabi.
Primeiro vamos nos instalar. Vamos ver a casa.
Gabi: Tô com uma fome!
(Saem Helena, Jorge, Maria
Lúcia, Mariana, Juliana e Paulo.)
Lúcia: Não sei o que estou
fazendo aqui.
Gabi: Nem eu.
Renata: Vamos fugir?
Lúcia: Helena me mata.
Gabi: Será que isto vai dar
certo?
Lúcia: Se os pais da gente
caírem, dá.
Renata: Meu pai não vai cair
e ainda vai me dar uma surra.
Gabi: O que é que vocês vão
pedir?
Lúcia: Vou exigir que papai
se case de novo com mamãe.
Renata: Mas isto não vale,
nós combinamos. Isto é assunto deles. A gente não pode se meter.
Gabi: Eu vou exigir da minha
mãe que ela fique mais em casa.
Renata: Mas por que é que
ela tanto sai?
Gabi: Cabelo, unha, jogo,
amigas.
Renata: Mas ela não está
separada do teu pai, está?
Gabi: Não, isto não. Mas é
pior. Está separada da gente. Vive na rua.
Lúcia: À minha, vou exigir
que pare de me pôr de castigo quando não estudo. Afinal, não sou mais uma
criancinha.
Renata: Ao meu pai, que pare
de tanto viajar e depois pare também de fingir que é um pai bom.
Lúcia: O que ele faz?
Renata: Quando chega de
viagem começa a beber, a ler jornal e ainda diz que ama a família acima de
tudo.
Lúcia: E vocês, que fazem?
Renata: A gente vê logo que
é bafo porque ele só pensa em ganhar dinheiro. Bebe, bebe, bebe e dorme. Mamãe
diz que ele está cansado e assim ele nunca conversou com a gente. Ignora nossa
existência. E compra a gente com dinheiro. Por isso é que pude dar mais para o
bolo.
Lúcia: Valeu!... O meu, para
dizer a verdade, prefere ler jornal a conversar com a gente.
(Voltam os outros.)
Helena: A casa está toda
depredada.
Jorge: O único lugar bom é
este aqui.
Maria Lúcia: Acho melhor a
gente se arrumar aqui mesmo.
Mariana: Cadê o rádio,
Jorge?
Jorge: Tá aqui na mochila.
Será que dizem alguma coisa?
Mariana: Liga. Tá na hora
das notícias.
(Ouve-se música, depois a
voz do repórter.)
Repórter: (Alto-falante.) E
de novo o caso do desaparecimento de 10 crianças de um dos bairros mais
elegantes da cidade. Depois dos comerciais. “Se você se sente presa,
incomodada, use Sempre Livre.” E agora ouviremos o apelo de Dona Lúcia, mãe de
uma das crianças.
Mariana: É mamãe!
Voz: Estou desesperada.
Minha filhinha querida sumiu de casa desde ontem. Não aguento mais. Minha
filhinha adorada foi raptada, garanto!
Mariana: Agora sou filhinha
adorada! Nunca deu a menor bola para mim. Vivia na rua. Seus clientes eram
muito mais importantes.
Todos: Psiu!!!
Repórter: Vai falar o Dr. Souza
Aguiar, pai da menina Helena.
Pai: Se é dinheiro que
querem estes raptores, pago o que quiserem. Quero minha filhinha de volta.
Helena: Ué, hoje não é dia
de jogo? O que é que ele está fazendo no rádio?
Jorge: Desliga isto.
(Desligam.)
Juliana: E agora, gente?
Paulo: Deixa eles sofrerem
um pouco.
Joana: Minha mãe, garanto
que ainda nem reparou. Está ocupada demais com o novo namorado.
Mariana: Os meus vão ter que
ver comigo. Me prendem tanto em casa que não vou a uma festa!
Juliana: A minha mãe vai
largar meu pai, não é? Pois então vou largar ele também.
Maria Lúcia: Tô com fome.
Helena: Vamos comer.
(Aparece um aluno com uma
tabuleta ou o alto-falante anuncia: três dias depois, todos estão caídos pelos cantos,
meio desgrenhados.)
Maria Lúcia: Tô com fome.
Renata: Eu também.
Helena: Para de ter fome,
Maria Lúcia.
Gabi: Quero ir para casa!
Renata: Quero minha mãe.
Helena: Covardes!
Jorge: É preciso aguentar
mais um pouco.
Mariana: E você vai arrumar
mais comida, vai?
Jorge: Claro que vou.
Mariana: Com que dinheiro?
Helena: Acabou tudo. Também,
vocês comem demais.
Juliana: E você, não?
Gabi: Não quero mais fugir
não. Quero meu pai!
Joana: Estou me sentindo
mal. Tô com dor de barriga.
Paulo: Essa casa é uma
droga. Não sei quem teve essa ideia!
Joana: Quero voltar para
minha casa. Quero meu pai, quero minha mãe.
Helena: Mas sua mãe não é
uma chata?
Joana: É chata, sim, mas eu
quero ela!
Gabi: Estou toda torta. Não
aguento mais dormir neste chão. Quero minha cama.
Maria Lúcia: Tô com fome.
Joana: Droga! Droga! Droga!
Jorge: Então vamos telefonar
para nossos pais e fazer as reivindicações.
Juliana: Não quero
reivindicação nada, quero minha mãe!
Helena: Vou ligar o rádio.
(Toca alguma música da moda.)
Jorge: Vamos dançar. (Os
dois tentam dançar.)
Mariana: Dançar coisa
nenhuma! Quero minha mãe.
(Todos gritam em cima da
música.)
Todos: Quero minha mãe!!
Quero meu pai! Quero minha casa!
Machado, Maria Clara. Exercícios de palco. 2.
ed. Rio de Janeiro: Agir, 1996.
Fonte: Livro – Tecendo Linguagens – Língua Portuguesa – 7º
ano – Ensino Fundamental – IBEP 4ª edição São Paulo 2015 p. 98-102.
Entendendo a peça teatral:
01 – Por que as crianças
fugiram de casa? O que reivindicavam?
Reivindicavam
mais atenção dos pais, possibilidade de convivência com eles e mais liberdade.
02 – É possível supor a
idade das personagens? Como você chegou a essa conclusão?
As personagens
devem ter uma idade aproximada de 9 a 11 anos. A rádio anuncia o
desaparecimento de crianças. O teor da conversa durante a peça auxilia na formação
de uma ideia a respeito disso.
03 – É possível afirmar que
todas as personagens que falam no texto encontram-se no mesmo espaço físico?
Explique sua resposta.
Não, as crianças
estão em uma casa vazia, desalugada, mas, no texto, ainda aparecem falas do
repórter e dos pais das crianças desaparecidas, que estão em outro lugar, no
estúdio de uma estação de rádio.
04 – Em determinado momento
da narrativa, há uma mudança de direção na história. Que mudança é essa?
Localize no texto a frase que introduz esse momento.
Com o tempo, as
crianças começam a se cansar da situação e sentem fome e saudade da família. A
frase que inicia essa mudança é: “(Aparece um aluno com uma tabuleta ou o alto-falante
anuncia: três dias depois, todos estão caídos pelos cantos, meio
desgrenhados.)”
05 – Depois dos
acontecimentos descritos na história, a que conclusão as crianças chegaram a
respeito da vida que levavam com os pais?
Chegaram à
conclusão de que, apesar de tudo, era melhor a vida em casa com os pais do que
a aventura.
06 – Em sua opinião, a saída
das crianças de casa poderia provocar uma mudança de atitude dos pais e dos
filhos? Por quê?
Resposta pessoal
do aluno.
07 – Se você vivesse
problemas parecidos com os das personagens, o que faria para tentar
resolvê-los?
Resposta pessoal
do aluno.
08 – Em sua opinião, a que
público se dirige essa peça? Por quê?
A peça se dirige
ao público em geral, inclusive aos jovens. Ela tanto interessa aos filhos como
aos pais, pois enfoca problemas comuns nas famílias.
09 – Em quanto tempo se
passa a história? Que recurso a autora utilizou para indicar esse tempo?
Três dias. Um
aluno entraria no palco com uma tabuleta para anunciar esse tempo ou ele seria
informado por um alto-falante.
10 – Nesse texto, é possível
identificar claramente algum narrador?
Não, no texto não
há o registro claro de alguém que conta a história.
11 – No texto dramático,
para que servem as expressões entre parênteses?
Elas servem para indicar características,
gestos ou ações das personagens, além de detalhes sobre cenário, sonoplastia,
etc.
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