segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

CRÔNICA: FOFOCA, UMA OBRA SEM AUTOR - MARTHA MEDEIROS - COM GABARITO

CRÔNICA: FOFOCA, uma obra sem autor
                      Martha Medeiros

   O próprio som da palavra dá a ela um certo ar de frivolidade. Fofoca, mexerico, coisa sem importância. Difamação é crime, mas fofoca é só uma brincadeira.

           O que seria da vida sem um bom diz-que-me-diz-que, não?
        Não. Dispenso fofocas e fofoqueiros. Quando alguém se aproxima de mim, segura no meu braço e olha para o lado antes de começar a falar, já sei que vem aí uma lama que não me diz respeito. Se não tiver como fugir, deixo que a indiscrição entre por um ouvido e saia pelo outro, dando assim o pior castigo para o meu interlocutor: não passarei adiante nem uma palavra.
        Não recuso uma olhada na revista Caras, especialista em entregar quem come quem, quem traiu quem faliu, quem casou, quem separou. É a única publicação do gênero que passa alguma credibilidade, porque sei que os envolvidos foram escutados, deram declarações por vontade própria, deixaram-se fotografar. São fofocas profissionais, consentidas e quase sempre assinadas. Fofoca anônima é que é golpe baixo.
        A fofoca nasce da boca de quem? Ninguém sabe. Ouviu-se falar. É uma afirmação sem fonte, uma suspeita sem indício, uma leviandade órfã de pai e mãe. Quem fabrica uma fofoca quer ter a sensação de poder. Poder o quê? Poder divulgar algo seu, ver seu “trabalho” passado adiante, provocando reações, mobilizando pessoas. Quem dera o criador da fofoca pudesse contribuir para a sociedade com um quadro, um projeto de arquitetura, um plano educacional, mas sem talento para tanto, ele gera boatos.
        Quem faz intrigas sobre a vida alheia quer ter algo de sua autoria, uma obra que se alastre e cresça, que se torne pública e que seja muito comentada. Algo que lhe dê continuidade. É por isso que fofocar é uma tentação. Porque nos dá, por poucos minutos, a sensação de ser portador de uma informação valiosa que está sendo gentilmente dividida com os outros. Na verdade, está-se exercitando uma pequena maldade, não prevista no Código Penal. Fofocas podem provocar lesões emocionais. Por mais inocente ou absurda, sempre deixa um rastro de desconfiança. Onde há fumaça há fogo, acreditam todos, o que transforma toda fofoca numa verdade em potencial. Não há fofoca que compense. Se for mesmo verdade, é uma bala perdida. Se for mentira, é um tiro pelas costas.

                          Medeiros, Martha. Almas gêmeas, 20 set. 1999. Disponível em:
                                                                    http://almas.terra.com.br/martha/martha_2D_09.htm/
                                                                                                 Acesse em: 7 dez. 2005. 
Interpretação do texto:
01 – Para tratar da fofoca, a autora do texto cria uma metáfora. Qual é ela?
      Martha Medeiros diz que a fofoca é uma “obra sem autor.”

a)   Que argumentos são utilizados, no texto, para justificar essa metáfora?
Para justificar a ausência de autoria de uma fofoca, o argumento utilizado é o fato de não ser possível identificar a fonte da fofoca. A fofoca seria gerada pelo desejo de quem a criou de ter uma “obra” sua comentada por todos, de ter seu “trabalho” divulgado, “provocando reações, mobilizando pessoas”, assim como ocorre com as obras de arte.

b)   Por que, segundo o texto, a fofoca é tentadora?
Porque daria ao seu autor a sensação de poder, de “ser portador de uma informação valiosa que está sendo gentilmente dividida com os outros.”

c)   No final do terceiro parágrafo, a autora do texto deixa clara a sua opinião sobre aqueles que produzem fofocas. Qual é ela?
A autora considera os fofoqueiros pessoas sem talento que, incapazes de contribuir para a sociedade com obras realmente significativas, acabam produzindo boatos.

02 – Releia:
        “Não há fofoca que compense. Se for mesmo verdade, é uma bala perdida. Se for mentira, é um tiro pelas costas.”
a)   Nesse trecho, há outras duas metáforas para a fofoca. Quais são elas?
“Bala perdida” e “Tiro pelas costas”.

b)   O que significa cada uma delas, considerando o contexto?
No primeiro caso, a metáfora faz referência à inutilidade da fofoca caso o que se conte seja verdade, já que não será uma afirmação fundamentada, mas sim uma exposição “maldosa” de algo ocorrido com outra pessoa.
A segunda metáfora sugere a relação de semelhança entre a fofoca e uma traição, um ato covarde, que impossibilita a defesa da vítima.

c)   Explique de que maneira as metáforas destacadas contribuem para fortalecer a crítica da autora sobre o assunto tratado.
Ao tratar a fofoca como uma “obra sem autor”, uma “bala perdida” e “um tiro pelas costas”, Martha Medeiros enfatiza o caráter inútil, covarde e traiçoeiro de criar ou reproduzir fofocas.




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