domingo, 15 de maio de 2022

CONTO: CANTIGA DE ESPONSAIS - MACHADO DE ASSIS - COM GABARITO

 Conto: CANTIGA DE ESPONSAIS

          Machado de Assis                      

        Imagine a leitora que está em 1813, na igreja do Carmo, ouvindo uma daquelas boas festas antigas, que eram todo o recreio público e toda a arte musical. Sabem o que é uma missa cantada; podem imaginar o que seria uma missa cantada daqueles anos remotos. Não lhe chamo a atenção para os padres e os sacristães, nem para o sermão, nem para os olhos das moças cariocas, que já eram bonitos nesse tempo, nem para as mantilhas das senhoras graves, os calções, as cabeleiras, as sanefas, as luzes, os incensos, nada. Não falo sequer da orquestra, que é excelente; limito-me a mostrar-lhes uma cabeça branca, a cabeça desse velho que rege a orquestra, com alma e devoção.

        Chama-se Romão Pires; terá sessenta anos, não menos, nasceu no Valongo, ou por esses lados. É bom músico e bom homem; todos os músicos gostam dele. Mestre Romão é o nome familiar; e dizer familiar e público era a mesma coisa em tal matéria e naquele tempo. "Quem rege a missa é mestre Romão" — equivalia a esta outra forma de anúncio, anos depois: "Entra em cena o ator João Caetano"; — ou então: "O ator Martinho cantará uma de suas melhores árias." Era o tempero certo, o chamariz delicado e popular. Mestre Romão rege a festa! Quem não conhecia mestre Romão, com o seu ar circunspecto, olhos no chão, riso triste, e passo demorado? Tudo isso desaparecia à frente da orquestra; então a vida derramava-se por todo o corpo e todos os gestos do mestre; o olhar acendia-se, o riso iluminava-se: era outro. Não que a missa fosse dele; esta, por exemplo, que ele rege agora no Carmo é de José Maurício; mas ele rege-a com o mesmo amor que empregaria, se a missa fosse sua.

        Acabou a festa; é como se acabasse um clarão intenso, e deixasse o rosto apenas alumiado da luz ordinária. Ei-lo que desce do coro, apoiado na bengala; vai à sacristia beijar a mão aos padres e aceita um lugar à mesa do jantar. Tudo isso indiferente e calado. Jantou, saiu, caminhou para a rua da Mãe dos Homens, onde reside, com um preto velho, pai José, que é a sua verdadeira mãe, e que neste momento conversa com uma vizinha.

        — Mestre Romão lá vem, pai José, disse a vizinha.

        — Eh! eh! adeus, sinhá, até logo.

        Pai José deu um salto, entrou em casa, e esperou o senhor, que daí a pouco entrava com o mesmo ar do costume. A casa não era rica naturalmente; nem alegre. Não tinha o menor vestígio de mulher, velha ou moça, nem passarinhos que cantassem, nem flores, nem cores vivas ou jucundas. Casa sombria e nua. O mais alegre era um cravo, onde o mestre Romão tocava algumas vezes, estudando. Sobre uma cadeira, ao pé, alguns papéis de música; nenhuma dele...

        Ah! se mestre Romão pudesse seria um grande compositor. Parece que há duas sortes de vocação, as que têm língua e as que a não têm. As primeiras realizam-se; as últimas representam uma luta constante e estéril entre o impulso interior e a ausência de um modo de comunicação com os homens. Romão era destas. Tinha a vocação íntima da música; trazia dentro de si muitas óperas e missas, um mundo de harmonias novas e originais, que não alcançava exprimir e pôr no papel. Esta era a causa única da tristeza de mestre Romão. Naturalmente o vulgo não atinava com ela; uns diziam isto, outros aquilo: doença, falta de dinheiro, algum desgosto antigo; mas a verdade é esta: — a causa da melancolia de mestre Romão era não poder compor, não possuir o meio de traduzir o que sentia. Não é que não rabiscasse muito papel e não interrogasse o cravo, durante horas; mas tudo lhe saía informe, sem ideia nem harmonia. Nos últimos tempos tinha até vergonha da vizinhança, e não tentava mais nada.

        E, entretanto, se pudesse, acabaria ao menos uma certa peça, um canto esponsalício, começado três dias depois de casado, em 1779. A mulher, que tinha então vinte e um anos, e morreu com vinte e três, não era muito bonita, nem pouco, mas extremamente simpática, e amava-o tanto como ele a ela. Três dias depois de casado, mestre Romão sentiu em si alguma coisa parecida com inspiração. Ideou então o canto esponsalício, e quis compô-lo; mas a inspiração não pôde sair. Como um pássaro que acaba de ser preso, e forceja por transpor as paredes da gaiola, abaixo, acima, impaciente, aterrado, assim batia a inspiração do nosso músico, encerrada nele sem poder sair, sem achar uma porta, nada. Algumas notas chegaram a ligar-se; ele escreveu-as; obra de uma folha de papel, não mais. Teimou no dia seguinte, dez dias depois, vinte vezes durante o tempo de casado. Quando a mulher morreu, ele releu essas primeiras notas conjugais, e ficou ainda mais triste, por não ter podido fixar no papel a sensação de felicidade extinta.

        — Pai José, disse ele ao entrar, sinto-me hoje adoentado.

        — Sinhô comeu alguma coisa que fez mal...

        — Não; já de manhã não estava bom. Vai à botica...

        O boticário mandou alguma coisa, que ele tomou à noite; no dia seguinte mestre Romão não se sentia melhor. É preciso dizer que ele padecia do coração: — moléstia grave e crônica. Pai José ficou aterrado, quando viu que o incômodo não cedera ao remédio, nem ao repouso, e quis chamar o médico.

        — Para quê? disse o mestre. Isto passa.

        O dia não acabou pior; e a noite suportou-a ele bem, não assim o preto, que mal pôde dormir duas horas. A vizinhança, apenas soube do incômodo, não quis outro motivo de palestra; os que entretinham relações com o mestre foram visitá-lo. E diziam-lhe que não era nada, que eram macacoas do tempo; um acrescentava graciosamente que era manhã, para fugir aos capotes que o boticário lhe dava no gamão, — outro que eram amores. Mestre Romão sorria, mas consigo mesmo dizia que era o final.

        — Está acabado, pensava ele.

        Um dia de manhã, cinco depois da festa, o médico achou-o realmente mal; e foi isso o que ele lhe viu na fisionomia por trás das palavras enganadoras:

        — Isto não é nada; é preciso não pensar em músicas...

        Em músicas! justamente esta palavra do médico deu ao mestre um pensamento. Logo que ficou só, com o escravo, abriu a gaveta onde guardava desde 1779 o canto esponsalício começado. Releu essas notas arrancadas a custo e não concluídas. E então teve uma ideia singular: — rematar a obra agora, fosse como fosse; qualquer coisa servia, uma vez que deixasse um pouco de alma na terra.

        — Quem sabe? Em 1880, talvez se toque isto, e se conte que um mestre Romão...

        O princípio do canto rematava em um certo lá; este lá, que lhe caía bem no lugar, era a nota derradeiramente escrita. Mestre Romão ordenou que lhe levassem o cravo para a sala do fundo, que dava para o quintal: era-lhe preciso ar. Pela janela viu na janela dos fundos de outra casa dois casadinhos de oito dias, debruçados, com os braços por cima dos ombros, e duas mãos presas. Mestre Romão sorriu com tristeza.

        — Aqueles chegam – disse ele –, eu saio. Comporei ao menos este canto que eles poderão tocar...

        Sentou-se ao cravo; reproduziu as notas e chegou ao lá....

        — Lá, lá, lá...

        Nada, não passava adiante. E contudo, ele sabia música como gente.

        — Lá, dó... lá, mi... lá, si, dó, ré... ré... ré...

        Impossível! nenhuma inspiração. Não exigia uma peça profundamente original, mas enfim alguma coisa, que não fosse de outro e se ligasse ao pensamento começado. Voltava ao princípio, repetia as notas, buscava reaver um retalho da sensação extinta, lembrava-se da mulher, dos primeiros tempos. Para completar a ilusão, deitava os olhos pela janela para o lado dos casadinhos. Estes continuavam ali, com as mãos presas e os braços passados nos ombros um do outro; a diferença é que se miravam agora, em vez de olhar para baixo. Mestre Romão, ofegante da moléstia e de impaciência, tornava ao cravo; mas a vista do casal não lhe suprira a inspiração, e as notas seguintes não soavam.

        — Lá... lá... lá...

        Desesperado, deixou o cravo, pegou do papel escrito e rasgou-o. Nesse momento, a moça embebida no olhar do marido, começou a cantarolar à toa, inconscientemente, uma coisa nunca antes cantada nem sabida, na qual coisa um certo lá trazia após si uma linda frase musical, justamente a que mestre Romão procurara durante anos sem achar nunca. O mestre ouviu-a com tristeza, abanou a cabeça, e à noite expirou.

ASSIS, Machado de. O alienista e outros contos. São Paulo: Moderna, 1997.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 137-141.

Entendendo o conto:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Botica: farmácia.

·        Capote: vitória em um jogo, em geral pelo dobro dos pontos alcançados pelo adversário.

·        Circunspecto: sério, reservado.

·        Cravo: instrumento de cordas.

·        Esponsais: noivado.

·        Esponsalício: relativo a noivado.

·        Idear: idealizar.

·        Jucundo: jovial, alegre.

·        Macacoa: doença sem importância, indisposição.

·        Mantilha: tipo de manta grossa com que as mulheres cobrem a cabeça e parte do corpo.

·        Missa: peça musical composta para ser executada em missa cantada.

·        Sanefa: cortina.

·        Suprir: fazer as vezes de, prover.

·        Valongo: bairro da cidade do Rio de Janeiro.

·        Vulgo: povo.

02 – Complete a frase a seguir no caderno. O narrador apresenta a personagem principal, mestre Romão, apenas no final do primeiro parágrafo, após enumerar diversos elementos da cena. Essa forma de apresenta-lo permite inferir que ..............

a)   Mestre Romão tinha menos importância que todos os elementos que compunham aquela cena.

b)   Se o narrador não chamasse a atenção para aquela personagem naquela cena, ninguém a perceberia, tal seu acanhamento.

c)   Num primeiro momento o narrador exclui todos os elementos que seriam importantes numa festa religiosa para destacar a figura realmente importante da cena.

03 – Segundo o texto, mestre Romão era uma pessoa reconhecida pela sociedade de seu tempo. Que trecho justifica essa afirmação?

      “Mestre Romão é o nome familiar; e dizer familiar e público era a mesma coisa em tal matéria e naquele tempo. [...] Era o tempero certo, o chamariz delicado e popular. Mestre Romão rege a festa! Quem não conhecia mestre Romão [...]?”

04 – Nos dois primeiros parágrafos, a situação é de equilíbrio, ou seja, não há tensões, não há problemas, trata-se apenas da apresentação de um regente de orquestra bastante popular e reconhecido. No início do terceiro parágrafo, porém, uma informação sugere que a situação descrita inicialmente não á assim tão livre de tensões:

        “Acabou a festa; é como se acabasse um clarão intenso, e deixasse o rosto apenas alumiado da luz ordinária. Ei-lo que desce do coro, apoiado na bengala; vai à sacristia beijar a mão aos padres e aceita um lugar à mesa do jantar. Tudo isso indiferente e calado.”

a)   Qual é essa informação? Explique.

Acabada a festa (a missa cantada que o mestre regia), é como se Romão Pires ficasse apagado: não há mais clarão intenso, e ele se torna indiferente e calado.

b)   Retire do conto um trecho que evidencia o problema vivido por mestre Romão Pires e que já é insinuado no começo do terceiro parágrafo.

“Ah! se mestre Romão pudesse seria um grande compositor. [...] Tinha a vocação íntima da música; trazia dentro de si muitas óperas e missas, um mundo de harmonias novas e originais, que não alcançava exprimir e pôr no papel. Esta era a causa única da tristeza de mestre Romão.”

05 – O narrador desse conto, além de onisciente, é parcial. Com uma ou outra expressão aparentemente sem muita importância, ele deixa transparecer sua opinião sobre certos comportamentos, certos acontecimentos. Reconhecer a forma como o narrador conduz a construção de sua narrativa também pode colaborar para a compreensão do conto. Releia o trecho que vai de “Quem não conhecia” até “se a missa fosse sua”. (Linhas 24 a 30). Segundo o narrador, em que situação teria mais sentido o comportamento iluminado, vivo, amoroso e efusivo de mestre Romão ao reger uma missa? Que frase desse trecho justifica sua resposta?

      Para o narrador, o comportamento efusivo de mestre Romão teria mais sentido se a missa fosse dele. Trechos que justificam a resposta: “não que a missa fosse dele” ou “mas ele rege-a com o mesmo amor que empregaria, se a missa fosse sua”.

06 – “A casa não era rica naturalmente; nem alegre”. Por que não se poderia esperar que a casa de mestre Romão fosse rica ou alegre?

      O narrador possivelmente sugere que a profissão de regente não era bem remunerada, além disso a casa parece retratar a própria insatisfação de Mestre Romão. Em síntese, trata-se de um recurso estilística para aproximar as características do espaço (pobre e triste) ás características psicológicas da personagem.

07 – No trecho “Naturalmente o vulgo não atinava com ela; uns diziam isto, outros aquilo: doença, falta de dinheiro, algum desgosto antigo [...]”, o que o narrador revela pensar das pessoas comuns ao afirmar ser natural que o vulgo não identificasse a real causa da tristeza de mestre Romão?

      Que as pessoas comuns veem razão para tristeza apenas nos fatos concretos.

08 – Releia:

        “Parece que há duas sortes de vocação, as que têm língua e as que a não têm. As primeiras realizam-se; as últimas representam uma luta constante e estéril entre o impulso interior e a ausência de um modo de comunicação com os homens. Romão era destas.”

        A ideia principal do conto está resumida nesse trecho. Mas, procurando traduzir a dificuldade de criação de mestre Ramão, o narrador não se restringe a enunciar o problema, ele busca também exemplifica-lo. Há duas situações na história em que está clara a “luta constante e estéril entre o impulso interior e a ausência de um modo de comunicação com os homens”. Quais são essas situações?

      Romão Pires, recém-casado, tentou escrever um conto esponsalício que traduzisse sua felicidade conjugal, mas não conseguiu. Pouco antes de morrer, tentou mais uma vez e de novo fracassou.

09 – Todas as informações relacionadas às características da narrativa podem ajudar o leitor a compreender um conto como “Cantiga de esponsais”.

a)   Em que ponto da narrativa se dá o clímax do conto?

No último parágrafo, o trecho que vai de “Nesse momento, a moça [...]” até “[...] sem achar nunca”.

b)   E em que ponto se dá o desfecho?

Na última frase: “O mestre ouviu-a com tristeza, abanou a cabeça, e à noite expirou”.

c)   Explique por que o desfecho, em certa medida, é irônico.

Mestre Romão morre após ouvir a moça cantarolar intuitivamente a melodia que ele buscara por tanto tempo.

 

sábado, 14 de maio de 2022

POEMA: MINHA TERRA! GONÇALVES DIAS- COM GABARITO

 Poema: Minha terra!

             Gonçalves Dias

Quanto é grato em terra estranha

Sob um céu menos querido,

Entre feições estrangeiras,

Ver um rosto conhecido;

 

Ouvir a pátria linguagem

Do berço balbuciada,

Recordar sabidos casos

Saudosos — da terra amada!

 

E em tristes serões d'inverno,

Tendo a face contra o lar,

Lembrar o sol que já vimos,

E o nosso ameno luar!

 

Certo é grato; mais sentido

Se nos bate o coração,

Que para a pátria nos voa,

P’ra onde os nossos estão!

 

Depois de girar no mundo

Como barco em crespo mar,

Amiga praia nos chama

Lá no horizonte a brilhar.

 

E vendo os vales e os montes

E a pátria que Deus nos deu,

Possamos dizer contentes:

Tudo isto que vejo é meu!

 

Meu este sol que me aclara,

Minha esta brisa, estes céus:

Estas praias, bosques, fontes,

Eu os conheço — são meus!

 

Mais os amo quando volte,

Pois do que por fora vi,

A mais querer minha terra,

E minha gente aprendi.

DIAS, Gonçalves. Poemas. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, s/d. Paris, 1964.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 86-88.

Entendendo o poema:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavra abaixo:

·        Grato: agradável, bom, doce.

·        Lar: a parte da cozinha onde se acende o fogo, lareira.

·        Pátrio: relativo ou pertencente à pátria.

02 – De acordo com o texto, em relação tanto ao conteúdo como à forma. Quantos versos têm as estrofes? E quantas sílabas poéticas têm os versos?

      Todas as estrofes têm quatro versos; os versos têm sete sílabas poéticas.

03 – O tema da composição poética é comum, mas há diferença na forma de representa-lo.

a)   Qual é esse tema, encontrado no poema?

A saudade da terra natal.

b)   O que motiva o desfiar de lembranças do eu lírico em “Minha terra!”?

O encontro do eu lírico, em terras estrangeiras, com um conterrâneo (um brasileiro).

c)   No poema, a pátria é valorizada pelo contraste com o que falta ou não é tão bom no lugar onde se encontra o eu lírico. Copie uma estrofe do poema que mostre uma diferença entre o lugar onde o eu lírico está e a pátria, de que ele tem saudade.

A terceira estrofe.

04 – Releia a primeira estrofe do poema. Nessa estrofe, por meio da caracterização da terra onde se encontra o eu lírico, antecipa-se a caracterização da pátria.

a)   Copie no caderno as expressões que se referem à terra onde se encontra o eu lírico e ao povo desse lugar.

Terra estranha, um céu menos querido, feições estrangeiras.

b)   Sabendo o que o eu lírico sente em relação à terra estrangeira, conclua, por oposição, o que ele sente em relação à terra natal.

A terra natal é, para ele, a terra conhecida e querida, o lugar onde estão as pessoas com as quais se identifica, inclusive fisicamente.

c)   A ideia de pátria pode estar relacionada a segurança, identidade ou importância da família. A que essa primeira estrofe permite pensar que a ideia de pátria está relacionada para o eu lírico?

Identidade.

05 – Faça um levantamento da referência à pátria no poema, depois responda:

a)   O que o eu lírico mais valoriza em seu país?

O eu lírico valoriza mais a natureza, as belezas naturais.

b)   Que relação pode haver entre a valorização desse aspecto específico e o fato de Gonçalves Dias ter passado muitos anos na Europa, em Portugal e na França?

A Europa tem clima mais frio e sua natureza, ainda que bela, não tem a diversidade tropical, daí o destaque dado ao sol, às praias, etc., elementos que se opõem claramente aos da paisagem europeia.

06 – Complete a frase no caderno: O poema “Minha terra!” sugere que ...........

·        O amor à pátria é algo absoluto, sentido por qualquer pessoa que valorize seu país.

·        Só pode amar a pátria quem vive longe dela.

·        A distância e a saudade levam a valorizar as pessoas e as belezas da pátria.

POEMA: O FRIO PODE SER QUENTE? JANDIRA MASUR - COM GABARITO

 Poema: O frio pode ser quente?

                Jandira Masur.


As coisas têm muitos jeitos de ser,

depende do jeito que a gente vê.

O comprido pode ser curto

e o pouco pode ser muito.

O manso pode ser bravo

e o escuro pode ser claro.

O fino pode ser redondo

e o doce pode ser amargo.

O quente pode ser frio

e o que parece um mar também pode ser um rio.

(...)

O amanhã de ontem é hoje,

o hoje é o ontem de amanhã;

Dentro dessa complicação

quem tem uma explicação?

(...)

Parece mesmo que no fim

o bom pode ser ruim,

E neste caso por que não

o ruim também pode ser bom?

(...)

Jandira Masur, O frio pode ser quente. São Paulo: Editora Ática.

Fonte:  Livro – Coleção ALET – Língua Portuguesa – Kátia P. G. Sanches & Sebastião Andreu – 6ª Série – 1ª edição – São Paulo. Ediouro, 2002 – p. 160.

Entendendo o poema:

01 – As palavras: comprido, pouco, manso, escuro, fino, doce, quente, bom e ruim são, no texto, substantivos, mas fora dele são adjetivos. O mesmo ocorre com as palavras pouco, amanhã, ontem e hoje, que expressam circunstâncias de tempo ou quantidade. O que as transformou em substantivos, neste texto?

      A transformação se deu, pelo uso do artigo.

02 – Os artigos indefinidos referem-se a quais palavras?

      Os artigos indefinidos referem-se às palavras: mar, rio e explicação. Não foram usados artigos definidos para não especificar de qual mar, rio ou explicação a autora está falando.

POEMA: AI, DONA FEA! FOSTE-VOS QUEIXAR - JOAN GARCIA DE GUILHADE - COM GABARITO

 Poema: Ai, dona fea! Foste-vos queixar

           Joan Garcia de Guilhade 

Ai, dona fea! Foste-vos queixar

porque vos nunca louv’ en meu trobar;

mais ora quero fazer um cantar

en que vos loarei toda via;

e vedes como vos quero loar:

dona fea, velha e sandia!

 

Dona fea! se Deus mi perdon!

pois avedes tan gran coraçon

que vos eu loe, en esta razon,

vos quero ja loar toda via;

e vedes qual será a loaçon:

dona fea, velha e sandia!

 

Dona fea, nunca vos eu loei

en meu trobar, pero muito trobei;

mais ora ja un bon cantar farei,

en que vos loarei toda via;

e direi-vos como vos loarei:

dona fea, velha e sandia!

      GUILHADE, Joan Garcia de. In: SPINA, Segismundo. Presença da literatura portuguesa, op. cit.

Fonte: Livro – Viva Português 1° – Ensino médio – Língua portuguesa – 2ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2014. p. 70-1.

Entendendo o poema:

01 – Como o eu lírico se refere à mulher para quem ele canta?

      Ela é tratada por “dona fea”.

02 – A cantiga parece ser resposta a uma queixa feita pela mulher. Qual pode ter sido essa queixa?

      Ela provavelmente reclamou do fato de o eu lírico nunca ter feito uma cantiga para louvá-la, para declarar-lhe sua admiração.

03 – Como o eu lírico responde à queixa?

      Em vez de destacar-lhe as qualidades, ele a chama de feia, velha e louca.

04 – Podemos saber quem é a mulher a quem o eu lírico se refere? Por quê?

      Não, porque o nome dela não é mencionado.

05 – No caderno, complete a frase com a proposição correta: O eu lírico do poema coloca-se diante da mulher...

     De maneira altiva e desrespeitosa, como se fosse muito melhor que ela.

·        De maneira humilde, submissa, como se estivesse nas mãos dela.

 

 

CONTO: OLHANDO PARA O HORIZONTE DA VIDA - MARINA COLASANTI - COM GABARITO

 Conto: Olhando para o horizonte da vida

             Marina Colasanti

        Subitamente tocado pela mutabilidade da vida, parou e perguntou-se: "Meu Deus, onde estarei no ano que vem a esta hora?" E do futuro respondeu-lhe o tédio: "Aqui, quando então te perguntarás, onde estarei no ano que vem, e a resposta será aqui. Quando então te perguntarás, onde estarei..."

Marina Colasanti. Contos de amor rasgados. Rio de Janeiro: Rocco, 1986.

Fonte: Livro – Viva Português 1° – Ensino médio – Língua portuguesa – 2ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2014. p. 28-9.

Entendendo o conto:

01 – Desse pequeno conto pode-se extrair um tema, mas, para isso, é necessário compreender o sentido por trás da organização do texto – e perceba que esse sentido não é tão claro, tão óbvio. O que pode significar ser “Subitamente tocado pela mutabilidade da vida”?

      Essa expressão pode significar um momento em que a personagem do miniconto sente, de forma repentina, que a vida é feita de mudanças.

02 – Ao pergunta-se "[...] onde estarei no ano que vem a esta hora?", a personagem revela um desejo que vai além de simplesmente saber em que lugar estará no próximo ano. Que desejo é esse? Escreva a alternativa certa no caderno.

a)   O desejo de que algo em sua vida se modifique.

b)   O desejo de prever o futuro.

c)   O desejo de planejar os próximos anos.

03 – Quem responde à pergunta é o tédio, exatamente do lugar onde a personagem estará dali a um ano.

a)   Por que a resposta dada pelo tédio se opõe ao desejo da personagem?

Porque evidencia para a personagem que nada em sua vida vai mudar.

b)   Que ideia é reforçada pela repetição da pergunta ("Onde estarei no ano que vem a esta hora?") e da resposta ("Aqui")?

É reforçada a ideia de repetição, tédio, de que nada mudará na vida da personagem.

04 – Releia as respostas dada às questões anteriores e responda:

a)   O tema do miniconto de Marina Colasanti coincide com o tema do texto de Filosofia "Crise existencial". Que tema é esse?

O tema é a insatisfação com a própria existência ou a busca de um sentido para a vida.

b)   Quanto à forma de apresentar o tema, em que o texto se diferencia?

No miniconto, a autora narra uma história assim compartilha uma mensagem, mas não de modo direto: os dados são trabalhados artisticamente para tornar mais expressivo um fato e alcançar o leitor pelas emoções; isto é conseguido pelas combinações de palavras e frases, pelo uso da repetição como recurso expressivo.

 

CONTO: NATAL NA BARCA - LYGIA FAGUNDES TELLES - COM GABARITO

 Conto: Natal na Barca

            Lygia Fagundes Telles

        Não quero nem devo lembrar aqui por que me encontrava naquela barca. Só sei que em redor tudo era silêncio e treva. E que me sentia bem naquela solidão. Na embarcação desconfortável, tosca, apenas quatro passageiros. Uma lanterna nos iluminava com sua luz vacilante: um velho, uma mulher com uma criança e eu.

        O velho, um bêbado esfarrapado, deitara-se de comprido no banco, dirigira palavras amenas a um vizinho invisível e agora dormia. A mulher estava sentada entre nós, apertando nos braços a criança enrolada em panos. Era uma mulher jovem e pálida. O longo manto escuro que lhe cobria a cabeça dava-lhe o aspecto de uma figura antiga.

        Pensei em falar-lhe assim que entrei na barca. Mas já devíamos estar quase no fim da viagem e até aquele instante não me ocorrera dizer-lhe qualquer palavra. Nem combinava mesmo com uma barca tão despojada, tão sem artifícios, a ociosidade de um diálogo. Estávamos sós. E o melhor ainda era não fazer nada, não dizer nada, apenas olhar o sulco negro que a embarcação ia fazendo no rio.

        Debrucei-me na grade de madeira carcomida. Acendi um cigarro. Ali estávamos os quatro, silenciosos como mortos num antigo barco de mortos deslizando na escuridão. Contudo, estávamos vivos. E era Natal.

        A caixa de fósforos escapou-me das mãos e quase resvalou para o. rio. Agachei-me para apanhá-la. Sentindo então alguns respingos no rosto, inclinei-me mais até mergulhar as pontas dos dedos na água.

        — Tão gelada — estranhei, enxugando a mão.

        — Mas de manhã é quente.

        Voltei-me para a mulher que embalava a criança e me observava com um meio sorriso. Sentei-me no banco ao seu lado. Tinha belos olhos claros, extraordinariamente brilhantes. Reparei que suas roupas (pobres roupas puídas) tinham muito caráter, revestidas de uma certa dignidade.

        — De manhã esse rio é quente — insistiu ela, me encarando.

        — Quente?

        — Quente e verde, tão verde que a primeira vez que lavei nele uma peça de roupa pensei que a roupa fosse sair esverdeada. É a primeira vez que vem por estas bandas?

        Desviei o olhar para o chão de largas tábuas gastas. E respondi com uma outra pergunta:

        — Mas a senhora mora aqui perto?

        — Em Lucena. Já tomei esta barca não sei quantas vezes, mas não esperava que justamente hoje…

        A criança agitou-se, choramingando. A mulher apertou-a mais contra o peito. Cobriu-lhe a cabeça com o xale e pôs-se a niná-la com um brando movimento de cadeira de balanço. Suas mãos destacavam-se exaltadas sobre o xale preto, mas o rosto era sereno.

        — Seu filho?

        — É. Está doente, vou ao especialista, o farmacêutico de Lucena achou que eu devia ver um médico hoje mesmo. Ainda ontem ele estava bem mas piorou de repente. Uma febre, só febre… Mas Deus não vai me abandonar.

        — É o caçula?

        Levantou a cabeça com energia. O queixo agudo era altivo mas o olhar tinha a expressão doce.

        — É o único. O meu primeiro morreu o ano passado. Subiu no muro, estava brincando de mágico quando de repente avisou, vou voar! E atirou-se. A queda não foi grande, o muro não era alto, mas caiu de tal jeito…

        Tinha pouco mais de quatro anos.

        Joguei o cigarro na direção do rio e o toco bateu na grade, voltou e veio rolando aceso pelo chão. Alcancei-o com a ponta do sapato e fiquei a esfregá-lo devagar. Era preciso desviar o assunto para aquele filho que estava ali, doente, embora. Mas vivo.

        — E esse? Que idade tem?

        — Vai completar um ano. — E, noutro tom, inclinando a cabeça para o ombro: — Era um menino tão alegre. Tinha verdadeira mania com mágicas. Claro que não saía nada, mas era muito engraçado… A última mágica que fez foi perfeita, vou voar! disse abrindo os braços. E voou.

        Levantei-me. Eu queria ficar só naquela noite, sem lembranças, sem piedade. Mas os laços (os tais laços humanos) já ameaçavam me envolver. Conseguira evitá-los até aquele instante. E agora não tinha forças para rompê-los.

        — Seu marido está à sua espera?

        — Meu marido me abandonou.

        Sentei-me e tive vontade de rir. Incrível. Fora uma loucura fazer a primeira pergunta porque agora não podia mais parar, ah! aquele sistema dos vasos comunicantes.

        — Há muito tempo? Que seu marido…

        — Faz uns seis meses. Vivíamos tão bem, mas tão bem. Foi quando ele encontrou por acaso essa antiga namorada, me falou nela fazendo uma brincadeira, a Bila enfeiou, sabe que de nós dois fui eu que acabei ficando mais bonito? Não tocou mais no assunto. Uma manhã ele se levantou como todas as manhãs, tomou café, leu o jornal, brincou com o menino e foi trabalhar. Antes de sair ainda fez assim com a mão, eu estava na cozinha lavando a louça e ele me deu um adeus através da tela de arame da porta, me lembro até que eu quis abrir a porta, não gosto de ver ninguém falar comigo com aquela tela no meio… Mas eu estava com a mão molhada. Recebi a carta de tardinha, ele mandou uma carta. Fui morar com minha mãe numa casa que alugamos perto da minha escolinha. Sou professora.

        Olhei as nuvens tumultuadas que corriam na mesma direção do rio. Incrível. Ia contando as sucessivas desgraças com tamanha calma, num tom de quem relata fatos sem ter realmente participado deles. Como se não bastasse a pobreza que espiava pelos remendos da sua roupa, perdera o filhinho, o marido, via pairar uma sombra sobre o segundo filho que ninava nos braços. E ali estava sem a menor revolta, confiante. Apatia? Não, não podiam ser de uma apática aqueles olhos vivíssimos, aquelas mãos enérgicas. Inconsciência? Uma certa irritação me fez andar.

        — A senhora é conformada.

        — Tenho fé, dona. Deus nunca me abandonou.

        — Deus — repeti vagamente.

        — A senhora não acredita em Deus?

        — Acredito — murmurei. E ao ouvir o som débil da minha afirmativa, sem saber por quê, perturbei-me. Agora entendia. Aí estava o segredo daquela segurança, daquela calma. Era a tal fé que removia montanhas…

        Ela mudou a posição da criança, passando-a do ombro direito para o esquerdo. E começou com voz quente de paixão:

        — Foi logo depois da morte do meu menino. Acordei uma noite tão desesperada que saí pela rua afora, enfiei um casaco e saí descalça e chorando feito louca, chamando por ele! Sentei num banco do jardim onde toda tarde ele ia brincar. E fiquei pedindo, pedindo com tamanha força, que ele, que gostava tanto de mágica, fizesse essa mágica de me aparecer só mais uma vez, não precisava ficar, se mostrasse só um instante, ao menos mais uma vez, só mais uma! Quando fiquei sem lágrimas, encostei a cabeça no banco e não sei como dormi. Então sonhei e no sonho Deus me apareceu, quer dizer, senti que ele pegava na minha mão com sua mão de luz. E vi o meu menino brincando com o Menino Jesus no jardim do Paraíso. Assim que ele me viu, parou de brincar e veio rindo ao meu encontro e me beijou tanto, tanto… Era tamanha sua alegria que acordei rindo também, com o sol batendo em mim.

        Fiquei sem saber o que dizer. Esbocei um gesto e em seguida, apenas para fazer alguma coisa, levantei a ponta do xale que cobria a cabeça da criança. Deixei cair o xale novamente e voltei-me para o rio. O menino estava morto. Entrelacei as mãos para dominar o tremor que me sacudiu. Estava morto. A mãe continuava a niná-lo, apertando-o contra o peito. Mas ele estava morto.

        Debrucei-me na grade da barca e respirei penosamente: era como se estivesse mergulhada até o pescoço naquela água. Senti que a mulher se agitou atrás de mim

        — Estamos chegando — anunciou.

        Apanhei depressa minha pasta. O importante agora era sair, fugir antes que ela descobrisse, correr para longe daquele horror. Diminuindo a marcha, a barca fazia uma larga curva antes de atracar. O bilheteiro apareceu e pôs-se a sacudir o velho que dormia:

        – Chegamos!… Ei! chegamos!

        Aproximei-me evitando encará-la.

        — Acho melhor nos despedirmos aqui — disse atropeladamente, estendendo a mão.

        Ela pareceu não notar meu gesto. Levantou-se e fez um movimento como se fosse apanhar a sacola. Ajudei-a, mas ao invés de apanhar a sacola que lhe estendi, antes mesmo que eu pudesse impedi-lo, afastou o xale que cobria a cabeça do filho.

        — Acordou o dorminhoco! E olha aí, deve estar agora sem nenhuma febre.

        — Acordou?!

        Ela sorriu:

        — Veja…

        Inclinei-me. A criança abrira os olhos — aqueles olhos que eu vira cerrados tão definitivamente. E bocejava, esfregando a mãozinha na face corada. Fiquei olhando sem conseguir falar.

        — Então, bom Natal! — disse ela, enfiando a sacola no braço.

        Sob o manto preto, de pontas cruzadas e atiradas para trás, seu rosto resplandecia. Apertei-lhe a mão vigorosa e acompanhei-a com o olhar até que ela desapareceu na noite.

        Conduzido pelo bilheteiro, o velho passou por mim retomando seu afetuoso diálogo com o vizinho invisível. Saí por último da barca. Duas vezes voltei-me ainda para ver o rio. E pude imaginá-lo como seria de manhã cedo: verde e quente. Verde e quente.

TELLES, Lygia Fagundes. Contos brasileiros 2. São Paulo: Ática, 2002.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 113-7.

Entendendo o conto:

01 – Releia os quatro primeiros parágrafos do conto. Em que estado se encontra a narradora-personagem no início da história?

      Ela está só e sente-se bem nessa solidão.

02 – A narradora parece disposta a estabelecer algum tipo de contato com a outra passageira? Copie trechos do conto que justifiquem sua resposta.

      Não, ela não parece disposta a estabelecer contato. “Pensei em falar-lhe assim que entrei na barca. Mas já devíamos estar quase no fim da viagem e até aquele instante não me ocorrera dizer-lhe qualquer palavra. Nem combinava mesmo com uma barca tão despojada, tão sem artifícios, a ociosidade de um diálogo. Estávamos sós. E o melhor ainda era não fazer nada, não dizer nada, [...]”.

03 – Releia:

        “Levantei-me. Eu queria ficar só naquela noite, sem lembranças, sem piedade. Mas os laços (os tais laços humanos) já ameaçavam me envolver. Conseguira evitá-los até aquele instante. E agora não tinha forças para rompê-los.”

a)   Quais são “os tais laços humanos” a que a narradora se refere?

São os vínculos afetivos que se estabelecem entre as pessoas levando-as a compartilhar sentimentos e, também, a preocuparem-se umas com as outras, a sentirem piedade, etc.

b)   Que motivos poderiam levar a narradora a querer evitar os laços humanos?

Pode-se pensar que a narradora tenha passado por algo que a tenha desgastado emocionalmente, deixando-a esvaziada dos recursos internos que permitem a uma pessoa ter piedade e solidarizar-se com outra sem sucumbir ao sofrimento alheio.

04 – A narradora se surpreende com a reação da mulher às desgraças que vivera.

a)   O que a narradora acha mais surpreendente na forma como a mulher encara seus sofrimentos?

Ela surpreende-se com a calma, a ausência de revolta, a confiança, a fé na religião.

b)   O que essa surpresa revela sobre o modo como a própria narradora enxerga os eventos da vida?

Provavelmente ela mesma não é uma pessoa que aceita com calma e confiança os sofrimentos e as dificuldades da vida.

c)   Em relação à forma de encarar as dificuldades da vida, as duas personagens são opostas. Explique essa oposição.

A mulher com a criança enxerga a vida positivamente, tem esperanças, acredita em Deus. A narradora é mais negativa, mais cética, menos confiante.

05 – Outras oposições marcam a construção desse conto, algumas evidenciadas nos acontecimentos, outras simbólicas. Releia:

        “[...] Ali estávamos os quatro, silenciosos como mortos num antigo barco de mortos deslizando na escuridão. Contudo, estávamos vivos. E era Natal.”

a)   Esse trecho fala da mesma oposição que a autora apresenta no título do conto. Que posição é essa?

A oposição entre vida (“estávamos vivos. E era Natal”) e morte (“como mortos num antigo barco de mortos”).

b)   Essa oposição é recuperada por um extremamente significado no conto e que tem início quando a narradora levanta o xale que cobre o bebê. Que evento é esse?

A narradora acredita que o menino está morto, fica aflita e deseja se afastar. Chegando ao destino, porém, a moça mostra o filho vivo, acordado e corado.

06 – Antes da conversa com a mulher, a paisagem que a narradora descreve é escura e fria. Veja:

        “[...] Ali estávamos os quatro, silenciosos como mortos num antigo barco de mortos deslizando na escuridão. [...]”.

        “[...] Sentindo então alguns respingos no rosto, inclinei-me mais até mergulhar as pontas dos dedos na água.

        — Tão gelada — estranhei, enxugando a mão.”

Compare com o final do conto:

        “[...] Duas vezes voltei-me ainda para ver o rio. E pude imaginá-lo como seria de manhã cedo: verde e quente. Verde e quente.”.

Se o escuro e o frio podem ser associados à morte (ausência de luz e de calor) e se no final do conto a narradora já consegue imaginar o rio verde e quente, por qual transformação podemos dizer que ela passou?

      Podemos interpretar a transformação da personagem como uma espécie de renascimento para a vida ou para a esperança, ideia reforçada por outros elementos do conto.

 

 

 

 

ARTIGO DE OPINIÃO: EM 2004, GERUNDISMO ZERO! RICARDO FREIRE - COM GABARITO

 Artigo de opinião: Em 2004, gerundismo zero!

                            Ricardo Freire

        As reformas passaram. Os juros começaram a cair. A indústria voltou a contratar. As vendas melhoraram um pouquinho. Já dá para comemorar? Não. Existe um grande perigo por trás de tudo isso. O quê? Não, não é a volta da inflação. Refiro-me à bolha do gerundismo.

        Pense bem: quanto maior é a atividade econômica, mais negócios são fechados. Mais telefonemas são dados. Como consequência, mais gente tem a oportunidade de dizer coisas como: “Nós vamos estar analisando os seus dados e vamos estar dando um retorno assim que possível”. Ou: “Pra sua encomenda tá podendo tá sendo entregue, o senhor precisa tá deixando o nome de uma pessoa pra tá recebendo pelo senhor”.

        Para! Para tudo! Não é para isso que a gente se sacrificou este ano inteiro. Crescimento, sim. Gerundismo, não! Mais do que nunca, precisamos nos mobilizar. Cada um de nós deve ser um agente sanitário eternamente a postos para exterminar essa terrível praga que se propaga pelo ar, pelas ondas de TV e pelas redes telefônicas.

        E só existe uma forma de descontaminar um gerundista crônico: corrigindo o coitado. Na chincha. Com educação, claro. Por incrível que pareça, ninguém usa o gerundismo para irritar. Quando a teleatendente diz “O senhor pode estar aguardando na linha, que eu vou estar transferindo a sua ligação”, ela pensa que está falando bonito. Por sinal, ela não entende por que “eu vou estar transferindo” é errado e “ela está falando bonito” é certo. O que só aumenta a nossa responsabilidade como vigilantes e educadores.

        [...].

Revista Época, edição 293, dez. 2003. Disponível em: http://www.freires.com.br/materiais.asp?qual=4&materia_id=24&qp=3. Acesso em: 28 fev. 2010.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 170.

Entendendo o artigo de opinião:

01 – Qual a relação que o autor procura estabelecer entre os temas tratados no 1° e no 2° parágrafo?

      O autor afirma que, com o aquecimento da economia, as empresas e bancos tiveram maior possibilidade de vender seus produtos. Assim, houve contratação de mais pessoas para o serviço de telemarketing, função que exige cordialidade e impessoalidade no trato com o cliente, e, na opinião do autor, por essa razão teria ocorrido a disseminação do gerundismo.

02 – É evidente que o excesso de ocorrências de verbos no gerúndio em textos pequenos deixa o autor irritado.

a)   Entre as locuções verbais que o autor levanta como exemplo, nas linhas 9 a 12, há alguma que apresenta a estrutura ir + estar + gerúndio durativo? Copie a(s) locução(ões) no caderno.

A locução “vamos estar analisando”.

b)   Na(s) frase(s) em que essa estrutura aparece é possível identificar qual o momento futuro e duradouro em que acontece a ação referida?

Não.

c)   Reescreva o trecho das linhas 9 a 12 em que aparece o uso abusivo de gerúndio, evitando essa ocorrência verbal quando necessário. Faça correções também em relação aos demais termos do trecho, de acordo com a variedade-padrão da língua.

“Nós vamos estar analisando os seus dados e vamos estar dando um retorno assim que possível”. Ou: “Pra sua encomenda tá podendo tá sendo entregue, o senhor precisa tá deixando o nome de uma pessoa pra tá recebendo pelo senhor”.