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quarta-feira, 25 de junho de 2025

ARTIGO DE OPINIÃO: DORAS E CARMOSINAS - FERNANDA MONTENEGRO - COM GABARITO

 Artigo de opinião: Doras e Carmosinas

               Fernanda Montenegro

        Há momentos em que os anos vividos nos obrigam olhar em volta e fazer uma revisão das nossas perdas e dos nossos danos. Se hoje estou sendo agraciada com a mais alta condecoração de nosso país, é porque sou resultado de muitas influências e convivências. Centenas de companheiros e personagens me formaram, me educaram e estão comigo sempre. Não me refiro só a minha família de sangue, mas principalmente à minha família de opção…

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhldsP4kRtfBszIgeSCoGLyh0kBxPIJA2SVMjJSGWcfTU_XlicvaIoLSUAiuGbBA-8PljXjIRL1B84hLcT_r2EEvXWBr1Hv5P7mi0PXkjI2yhqJJ8yjIbqnzMVWH3P_b9irtWqzG_pzcmYA5-UY8ilo5qb3__YcyXVO2DT2jqIbKh5LhvmyW00bLA9wjeU/s320/1955-professoras-anos-50-a.jpg


        Mas existe o antes. A infância. E – por que não? – o período da minha educação primária. Acho que é aí que tudo começa. Ao trabalhar o mundo da professora Dora de Central do Brasil, lá na infância é que fui buscar, na minha memória, as primeiras professoras que me alfabetizaram. Credenciadas, respeitadas, prestigiadas professoras primárias da minha infância. Professoras de escolas públicas que eu frequentei, no subúrbio do Rio.

        Eu me lembro especialmente com muito carinho de Dona Carmosina Campos de Meneses, que me alfabetizou. E, mais do que isso, que me ensinou a ler, o que é um degrau acima da alfabetização. Naquele tempo, as professoras ainda se chamavam Carmosinas, Afonsinas, Ondinas. Busquei na memória a figura de Dona Carmosina para me aproximar da professora Dora (para mim, personagem não é ficção). E vi como seria trágico se a minha tão prestigiada e amada Dona Carmosina viesse a se transformar, por carências existenciais e sociais, numa endurecida e miserável Dora. Foi essa visão de tantas perdas que me deu o emocional da cena final do filme quando Dora escreve “tenho saudade de tudo”.

        Saudade é uma palavra forte e uma forma profunda de chamamento, de invocação. Entre Carmosina e Dora lá se vão sessenta anos. Penso que minha vocação de atriz foi sensibilizada a partir das leituras em voz alta, leituras muito exigidas, cuidadas, orgânicas, que nós alunos fazíamos usando os livros de português do antigo curso primário. As primeiras coisas que decorei na vida foram dois poemas que Dona Carmosina mandou (é essa a palavra: mandou) que decorássemos nas férias de dezembro: “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu e “Canção do exílio” de Gonçalves Dias. Na volta das férias naquele ano de 1937, eu, mesmo tímida, envergonhada e encantada declamei: “Oh! Que saudades que eu tenho da aurora da minha vida, da minha infância querida que os anos não trazem mais. Que amor, que sonhos, que flores, naquelas tardes fagueiras, à sombra das bananeiras, debaixo dos laranjais”. Essas bananeiras e esses laranjais não eram licença poética. Os subúrbios de nossas cidades ainda não tinham sofrido essa degradação ambiental que infelizmente se fez presente com o passar dos anos. Vi muitos Brasis entre esses meus oito anos, os oito anos do poeta e essas duas mulheres: Carmosina e Dora. Vejo essa passagem de tempo, claro, com alegrias e ganhos, mas também com muitas perdas e dor. Sou atriz e confesso a minha deformação profissional: esse sentimento de perdas, essa nostalgia me ajudaram a resgatar o emocional dessa desprotegida e amarga Dora ao intuir que dentro dessas Doras desiludidas existe sempre uma Carmosina à espera de um ombro e de um socorro.

        Senhor presidente, nesta nossa confraternização de artistas e autoridades como não lembrar o milagre que a educação e a cultura produzem em todo ser humano. É este, me parece, o espírito que nos une aqui, neste espaço, e por estarmos diante da mais alta autoridade do nosso país, que é Vossa Excelência, a herança cultural da reivindicação artística e social se apresenta… Mas, Vossa Excelência é um democrata e um professor, por isso peço a Vossa Excelência me dar o direito de não resistir, mesmo porque acredito que estamos numa concordância de vontades. Senhor presidente, precisamos urgentemente de muitas, muitas Carmosinas e, se possível, nenhuma Dora. Vossa Excelência tem poder para transformar as Doras em Carmosinas. O país lhe deu esse poder. Eu tenho um sonho que certamente é também um sonho de Vossa Excelência e de muitos, muitos, muitos brasileiros. Eu tenho um sonho (parodiando o notável reverendo americano) que um dia, realmente, todas as desesperadas Doras serão resgatadas desses ônibus perdidos que atravessam esse nosso sertão de miséria e que a elas será dado nem que seja uma parcela daquele reconhecimento e respeito social das professoras Carmosinas da minha infância. Doras com visão de futuro, com autoestima, economicamente ajustadas. Professoras Doras inventivas, confiantes, confiantes no seu magistério, para que possam ser amadas como seres humanos e (por que não?) como personagens também. Muito amadas e lembradas por todos os Vinícius e todos os Josués de nosso país. Mesmo assim prefiro as Carmosinas… Que Dora compreenda e me perdoe. Vale a troca. Para o fortalecimento da nossa educação, da nossa cultura, vale a pena, senhor presidente, se a nossa alma, isto é, se a realização do sonho de todos nós, se essa realização não for pequena. Faço de Dora e Carmosina minhas companheiras neste meu agradecimento. Ignorá-las seria desprezar a minha infância e a realidade da minha, não digo velhice, mas da minha madureza.

Transcrição do discurso feito pela atriz ao ser homenageada por sua indicação ao Oscar de melhor atriz estrangeira pelo desempenho no filme Central do Brasil.

Entendendo o artigo:

01 – Por que Fernanda Montenegro afirma que, ao ser agraciada com uma condecoração, ela é "resultado de muitas influências e convivências"?

      Ela afirma isso porque se sente formada e educada por centenas de companheiros e personagens, não apenas pela sua família de sangue, mas principalmente pela sua "família de opção" (colegas de profissão e os papéis que interpretou).

02 – Qual a importância da infância e da educação primária na formação da autora, segundo o texto?

      Fernanda Montenegro acredita que tudo começa na infância e na educação primária. Ela buscou suas primeiras professoras para construir a personagem Dora, percebendo a influência desses anos iniciais em sua formação.

03 – Quem foi Dona Carmosina Campos de Meneses e qual o seu significado para Fernanda Montenegro?

      Dona Carmosina foi a professora que alfabetizou Fernanda Montenegro e, mais do que isso, a ensinou a ler. Ela é uma figura de muito carinho e representou o prestígio e o respeito das professoras primárias da época.

04 – Como a figura de Dona Carmosina se relaciona com a personagem Dora, do filme "Central do Brasil"?

      Fernanda Montenegro buscou na memória a figura de Dona Carmosina para se aproximar da professora Dora. Ela imaginou o quão trágico seria se uma professora tão prestigiada como Carmosina se transformasse, por carências existenciais e sociais, na endurecida e miserável Dora.

05 – Que dois poemas Dona Carmosina "mandou" que os alunos decorassem nas férias de dezembro de 1937, e qual o impacto disso na autora?

      Os poemas foram "Meus oito anos" de Casimiro de Abreu e "Canção do exílio" de Gonçalves Dias. A autora destaca que a leitura em voz alta e a memorização desses poemas sensibilizaram sua vocação de atriz e a ajudaram a resgatar o emocional da personagem Dora.

06 – Qual o principal contraste que a autora estabelece entre as "Carmosinas" e as "Doras"?

      As Carmosinas representam as professoras prestigiadas, respeitadas, com autoestima e que inspiram a educação. As Doras, por sua vez, simbolizam as professoras desiludidas, amargas, que sofreram com a degradação social e a falta de reconhecimento, muitas vezes "perdidas" em um "sertão de miséria".

07 – Qual o apelo final de Fernanda Montenegro ao presidente, utilizando as figuras de Dora e Carmosina?

      Ela apela por "muitas, muitas Carmosinas e, se possível, nenhuma Dora". Pede ao presidente que utilize seu poder para transformar as Doras em Carmosinas, resgatando-as da miséria e oferecendo-lhes reconhecimento e respeito social para que sejam inventivas, confiantes e amadas.

 

POEMA: COMO UM RIO - THIAGO DE MELLO - COM GABARITO

 Poema: Como um rio

                     Thiago de Mello

Ser capaz, como um rio
que leva sozinho
a canoa que se cansa,
de servir de caminho
para a esperança.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEguX4q4vf6YoSFtLL958z93VR4yrE4xnervl7fLHxLPt8LykFjJsChxZy-K7l4fRL_nx1mFffo0QvKpPY9KVrd-FOSfLd6ivdJ1i-jDEswXd3LSuPGBn8r60sqmZuojlT1gS6TPNhGisYh3Y3fRor2guOYDhdiqaR13BnMUZ3shwmQDMmxfibSg6TOiFho/s320/1200px-Rio_Pardo_Aguas_de_Santa_Barbara.jpg


E de levar do límpido
a mágoa da mancha,
como o rio que leva
e lava.

Crescer para entregar
na distância calada
um poder de canção,
como o rio decifra
o segredo do chão.

Se tempo é de descer,
reter o dom da força
sem deixar de seguir.
E até mesmo sumir
para, subterrâneo,
aprender a voltar
e cumprir, no seu curso,
o ofício de amar.

Como um rio, aceitar
essas súbitas ondas
feitas de águas impuras
que afloram a escondida
verdade das funduras.

Como um rio, que nasce
de outros, sabe seguir
junto com outros sendo
e noutros se prolongando
e construir o encontro
com as águas grandes
do oceano sem fim.

Mudar em movimento,
mas sem deixar de ser
o mesmo ser que muda.
Como um rio.

Mormaço na floresta. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1983.

Entendendo o poema:

01 – Qual é a principal comparação que o poema faz ao longo de seus versos?

      O poema compara a existência e as ações humanas com as características e o fluxo de um rio, utilizando-o como uma metáfora para a vida.

02 – De que forma o rio, segundo o poema, serve como um "caminho para a esperança"?

      O rio serve como um caminho para a esperança ao ser capaz de levar e carregar o que está cansado ou pesado, assim como leva uma canoa, sugerindo a ideia de auxílio e continuidade.

03 – No poema, como o rio lida com as "águas impuras" e as "mágoas da mancha"?

      O rio "leva e lava" as mágoas da mancha e aceita as "súbitas ondas feitas de águas impuras", que revelam a "verdade das funduras". Isso sugere a capacidade de purificação, aceitação e superação das adversidades e impurezas da vida.

04 – O que significa a ideia de o rio "sumir para, subterrâneo, aprender a voltar"?

      Essa imagem sugere a capacidade de resiliência e renovação. Mesmo diante de momentos de recuo ou desaparecimento aparente (como um rio que se torna subterrâneo), ele se prepara para retornar e continuar seu propósito, que é "cumprir, no seu curso, o ofício de amar".

05 – Qual a mensagem final do poema sobre a identidade e a mudança, refletida na metáfora do rio?

      A mensagem final é que, assim como um rio, devemos ser capazes de "mudar em movimento, mas sem deixar de ser o mesmo ser que muda". Isso enfatiza a importância de se adaptar e evoluir com a vida, sem perder a própria essência ou propósito.

 

 

CONTO: FARINHA DE MANDIOCA - NINA HORTA - COM GABARITO

 Conto: Farinha de mandioca

           Nina Horta

        Que comida eu mais gosto… Que comida eu mais gosto?

        Fiquei com a pergunta na cabeça por uns dois meses. Qual a preferida, qual a mais digna de merecer a palavra saudade.

        Profunda, lúgubre, a toda hora me vinha à mente a feijoada, trançando o feijão, a linguiça, o paio, quiçá, o rabo, talvez, a orelhinha, ah, feijão-preto, o óbvio ululante.

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEislmfgRaTrfvma8uOPPVWr5Qf3X4hR_seQk5FPZbEgsemOZyBh8FLU2PJU4N7NB9D-hcbVkHKeuVGFTbqLvlunXX4vG5i_R_eQ06aMsvB4W9VPfKmjlYAcCGPpV1NZr9hsHegEKTAUIoiEnqxtEKmYGy34Z101AuuNcWzhRzGGzEQemjrEO9MNHI3YHxs/s1600/images.jpg

        É, a feijoada resolveria. Só pode ser ela. Boa demais, brasileira com origens nobres de cassoulets, ela própria nascida no restaurante G. Lobo, carioca a mais não poder.

        Conheço uma autora de livros de comida que só escreve receitas que gostaria de comer todos os dias, se possível. Nada de excessos, novidades, exotismos. Só o que perdura e se repete. Concordo com ela. Neste caso a feijoada perderia pontos, barroca, exagerada.

        E o palmito? Só nosso. Quase só nosso, fruto da palmeira que anuncia nossa brasilidade, flor, folha, fruto, fresco, branco, macio, desmanchando na boca. Todo dia? Também não.

        O jeito é percorrer as raízes portuguesas, africanas e indígenas. Doces de ovos, o bacalhau ao azeite, as sardinhas fritas. Tudo delicioso, da pontinha, muito bom, pois, pois.

        Dos africanos, as papas, os mingaus, o dendê translúcido e dourado, comida baiana, vatapás, moquecas, carurus, acarajés. Comida de festa, comida de santo. Sai do rol das costumeiras.

        Dos índios, a farinha. Assim, curto e grosso. A mandioca ralada, espremida, trabalhada, transformada. Há para todo gosto.

        Na Amazônia pode quebrar a ponta do dente, desce o país em nuances de beijus, crocantes, etéreas, aéreas, embebem o feijão sem empapar, empapam-se de feijão.

        É de uma modéstia de coisa centrada, que sabe o seu lugar.

        Na Bahia conheço uma, macia como veludo e que escorre dos dedos como pó, massa saborosa que solta o sabor quando apertada contra o céu da boca com a língua. Tem um gosto decidido de mandioca.

        Em Paraty a granulada já se faz mais evidente, é comprada em casas de farinha pelos caboclos e trazida para casa em lombo de burro ou nas costas, mesmo, em sacos de aniagem alvejados, brancos, limpíssimos. Fazem isso uma vez por mês, num ritual, escolhem o produto, provam, comparam com o anterior, sentem pequenas diferenças de sabor, de ponto, de cor. Discutem sobre ela, conversam sobre ela com os amigos, eles que falam tão pouco. É que não há como comer nem feijão nem peixe frito sem ela, a companheira.

        É isso. Companheira. Acompanha sempre. Segura o melado, delimita o caldo grosso da galinha, corrige os exageros líquidos do feijão.

        Gosto dela em farofa e em pirão. Farofa mineira pura, sem ovo, sem bacon. Só a manteiga na frigideira ou o óleo. Passa-se rapidamente na gordura quente sem deixar queimar o fundo, o que seria um desastre. Vai se mexendo, mexendo, até que se tenha amalgamado na perfeição. E está pronta, quente, dando o crocante a tudo que é mole. Tem gente que gosta fria, gosto tão quente que faça tzzz na língua na hora de experimentar.

        Pirão em caldos de legume, pirão no peixe, farofa com lombo, com pernil e o vinagrete. Eu conheço e você conhece quem come arroz e macarrão com farofa, a companheira.

        Farofa, farinha, efes fricativos, tem que fechar os lábios senão pula fora, farofa, farinha, frigideira, frisada, frita, fritada, frugal, fúlvida, fundamental, fundadora.

Revista Ícaro Brasil, outubro de 1999. Nina Horta é jornalista, escritora, dona do bufê Ginger, autora do livro Não é sopa (Companhia das Letras) e colaboradora das páginas de gastronomia do jornal Folha de São Paulo.

Entendendo o conto:

01 – Qual foi a pergunta que a autora Nina Horta levou em mente por cerca de dois meses?

      A pergunta era: "Que comida eu mais gosto?", buscando a preferida, a mais digna de merecer a palavra saudade.

02 – Quais comidas brasileiras a autora considera e por que as descarta como sua preferida?

      Ela considera a feijoada, mas a descarta por ser "barroca, exagerada" para ser consumida todos os dias. Ela também pensa no palmito, mas decide que não é algo para comer diariamente. Por fim, menciona comidas africanas como vatapás e moquecas, classificando-as como "comida de festa", não "costumeira".

03 – De qual herança culinária a farinha de mandioca é destacada como vinda?

      A farinha de mandioca é destacada como vinda da herança indígena.

04 – Que qualidades a autora atribui à farinha de mandioca que a fazem ser a comida mais amada?

      Ela a descreve como "modesta", "centrada", que "sabe o seu lugar". É uma "companheira" que "acompanha sempre", segura o melado, delimita o caldo grosso e corrige os exageros líquidos do feijão.

05 – Como a autora descreve a farinha de mandioca encontrada na Bahia?

      Na Bahia, ela conhece uma farinha "macia como veludo" que "escorre dos dedos como pó", com uma "massa saborosa que solta o sabor quando apertada contra o céu da boca com a língua" e um "gosto decidido de mandioca".

06 – Qual o ritual de compra e importância da farinha para os caboclos de Paraty, segundo o texto?

      Em Paraty, a farinha granulada é comprada em casas de farinha uma vez por mês. Os caboclos a levam em lombo de burro ou nas costas, em sacos alvejados. Eles provam, comparam com a anterior, notam pequenas diferenças de sabor, ponto e cor, e discutem sobre ela, pois não conseguem comer feijão nem peixe frito sem ela.

07 – De que duas formas principais a autora gosta de consumir a farinha de mandioca e como descreve uma delas?

      A autora gosta da farinha em farofa e em pirão. Ela descreve a farofa mineira pura, sem ovo ou bacon, feita rapidamente na gordura quente, mexendo até "amalgamado na perfeição", resultando em algo "quente, dando o crocante a tudo que é mole".

 

POEMA: ISTO - FERNANDO PESSOA - COM GABARITO

 Poema: Isto

             Fernando Pessoa           

Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.

 

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjxRqo2J646eo5jVRAaxPTXU3QQsXxOQmz3ktNcgzRuMXsHTi7p8JOeGh0DR3XM0WBvw3LqRLBfvNiFnMDyXOfW75hOdILMDnRGv2ZXEgs6Q9Kj7gfcVNtbWIRPZo7NV6maGlLZrY76KP5P5awsJcFEn0bIL1ISqkgPSNgQ8KqZnG9s-YQhF7jJL2x-Wxg/s320/15801185-ilustracao-em-tematica-de-imaginacao-consciente-mental-ideia-e-sonho-isolada-em-fundo-cinza-liso-quadrado-desenho-animado-simples-e-colorido-com-estilo-de-arte-com-flores-arco-iris-e-decoracao-de-coracao-grat.jpg

Tudo o que sonho ou passo,
O que me falha ou finda,
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa é que é linda.

 

Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é.
Sentir? Sinta quem lê!

Extraído de: Emilia Amaral, Mauro Ferreira, Ricardo Leite e Severino Antônio. Novas palavras. Literatura, gramática, redação e leitura, vol. 3. São Paulo, FTD, 1997.

Entendendo o poema:

01 – Qual é a principal negação feita pelo eu lírico no início do poema?

      A principal negação feita pelo eu lírico é a de que ele "finja ou minta" no que escreve. Ele afirma que sua escrita não é baseada na falsidade, mas sim em uma forma diferente de sentir.

02 – De que forma o eu lírico afirma "sentir" o que escreve?

      O eu lírico afirma sentir o que escreve "com a imaginação" e explicitamente declara "Não uso o coração". Isso sugere que sua criação poética não provém de emoções viscerais ou experiências pessoais diretas, mas de uma elaboração mental e imaginativa.

03 – Como o poema descreve a relação entre o que o eu lírico "sonha ou passa" e a "coisa linda"?

      O poema descreve o que o eu lírico "sonha ou passa" (suas experiências e divagações) como "um terraço / Sobre outra coisa ainda". Essa "outra coisa ainda" é o que ele considera "linda". Isso implica que suas vivências servem como um ponto de observação ou uma ponte para algo mais profundo e esteticamente valioso, que reside além da realidade imediata.

04 – Por que o eu lírico escreve "em meio / Do que não está ao pé"?

      O eu lírico escreve "em meio / Do que não está ao pé" porque ele se liberta do "enleio" (ligações ou amarras da realidade concreta) e aborda o que "não é" com seriedade. Isso reforça a ideia de que sua escrita transcende o mundo físico e o tangível, explorando dimensões imaginárias e conceituais.

05 – A quem o eu lírico atribui a responsabilidade de "sentir" o poema?

      No último verso, o eu lírico atribui a responsabilidade de "sentir" o poema ao leitor: "Sentir? Sinta quem lê!". Isso é uma característica marcante da heteronímia e da poética de Pessoa, onde o poeta se distancia da emoção direta, deixando para o público a tarefa de vivenciar e interpretar os sentimentos que a obra pode evocar.

 

POESIA: UMA MULHER QUE SE ABRE - MARIZE CASTRO - COM GABARITO

 Poesia: Uma mulher que se abre

           Marize Castro

        Quando uma mulher se abre o que há de mais solitário se alarga. Espantalhos de dor se mostram e se decompõem. Flocos de agonia se aproximam. Crescem perdas. Voam conchas.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjmpwpTeWxv-x6ZTm-28YXbP4Qof1_7PDT-VHmmSGyVAItjH4SRROXrsL8Pqmke0d6R0yqHESQka05ul5H9hO262Rp684SYNCk-xXrRSU8J6o644qt9s61OFzT62ah6Qi6-y0EXFGmyV6sGUAXk7DHZ2FRiVUqboFjs-2iqKltza5DEosqBDzVRO9z19i8/s1600/images.jpg


        Uma mulher que se abre é uma mulher mergulhada em anáguas e sendas. Saltando sobre a luz. Deram-lhe lanças e um falso espelho para enganar as feridas.

        Quebrada, ela conduz corações ao túmulo. Esperando, que uma nova morte, traga-lhe nova grinalda e novo véu.

        Em surdina, uma mulher que se abre deseja o esquecimento e a maternidade. Quer parir, dormir, trepar. Morte à memória!

        – O mundo não corrompe quem habita os subterrâneos.

        Disse-lhe um livro com o sol no ventre.

        O extravio de uma mulher que se abre é um deslumbre. Uma significação doce e mórbida. Possui a beleza e está carregado de hóstias e sepulturas.

        Moças e rapazes, caindo em abismos, sustentam essa mulher aberta. Beijam-lhe o útero exposto.

        Afogado em seus cabelos, ela se arqueia na esperança que o amor, quando novamente acontecer, não traga algemas.

        Uma mulher que se abre é pedra, cratera, rio, relíquia.

        Traz na língua o perdão e suas chamas.

Publicado no Diário de Natal, em 18 de julho de 1999.

Entendendo a poesia:

01 – Que sentimentos e imagens são associados à abertura da mulher no início do poema?

      No início do poema, a abertura da mulher está associada a sentimentos de solidão que se alarga, ao aparecimento e decomposição de "espantalhos de dor", à aproximação de "flocos de agonia", ao crescimento de perdas e ao voo de conchas. Essas imagens sugerem um processo de exposição vulnerável e dolorosa.

02 – O que o poema sugere sobre os "presentes" dados a uma mulher que se abre?

      O poema sugere que a uma mulher que se abre "deram-lhe lanças e um falso espelho para enganar as feridas". Isso pode indicar que as ferramentas oferecidas a ela para lidar com sua vulnerabilidade são inadequadas, ou até mesmo prejudiciais, pois as lanças podem simbolizar defesa ou ataque, e o espelho falso, uma ilusão ou negação da dor real.

03 – Quais são os desejos contraditórios expressos por uma mulher que se abre no quarto verso?

      No quarto verso, os desejos expressos são contraditórios: ela "deseja o esquecimento e a maternidade". Essa dualidade entre querer apagar o passado ("Morte à memória!") e o desejo de criar vida ("Quer parir, dormir, trepar") revela uma busca por renovação e libertação das marcas do passado.

04 – O que significa a afirmação "O mundo não corrompe quem habita os subterrâneos" no contexto do poema?

      Essa afirmação, dita por um "livro com o sol no ventre", sugere que a vulnerabilidade e a exploração das profundezas do ser (os "subterrâneos") podem oferecer uma forma de proteção contra a corrupção do mundo exterior. Implica que a verdadeira força e pureza podem ser encontradas na imersão e na aceitação das próprias complexidades e dores.

05 – Que elementos simbólicos o poema utiliza para descrever a mulher que se abre no final?

      No final, a mulher que se abre é descrita com elementos simbólicos poderosos: ela é "pedra, cratera, rio, relíquia". Esses símbolos representam, respectivamente, solidez e resistência (pedra), profundidade e força vulcânica (cratera), fluidez e persistência (rio), e valor e história (relíquia). Juntos, eles ilustram a complexidade, a resiliência e a sacralidade da mulher em seu processo de abertura.

 

CRÔNICA: EI! TEM ALGUÉM AÍ? - FRAGMENTO - JOSTEIN GAARDER - COM GABARITO

 Crônica: Ei! Tem alguém aí? – Fragmento

             Jostein Gaarder

        Ele se inclinou bem para frente, fazendo uma reverência. […] Perguntei:

        “Por que você está se inclinando?”

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjhTmUVyKXzn1yT1V-N88BCQgfxICDUPw-vkdsSLm1PQeXFw40NCtxDsOJ5rfYrAhL0RIyKRJyNAwhvuayoDws7BrRlX3__Ig7czURnhMxJQ53h6M2zeQhJ_kFtFR52B9Oacq9arw7WdgDyn08LEwU0tYgRjmZJMupQu7AQPr-SFf6u9QSUWl6mINIf-iE/s1600/716DPF2mk+L._AC_UC200,200_CACC,200,200_QL85_.jpg


        “Lá de onde eu venho”, explicou ele, “nós sempre fazemos alguma reverência, quando alguém faz uma pergunta fascinante. E quanto mais profunda for a pergunta, mais profundamente a gente se inclina.”

        […] a resposta me impressionou tanto que fiz uma profunda reverência, me inclinando ao máximo.

        “Por que você me fez uma reverência?”, perguntou ele, num tom quase ofendido.

        “Porque você deu uma resposta superinteligente para minha pergunta”, respondi.

        Daí, numa voz bem alta e clara, ele disse algo que eu haveria de lembrar para o resto da vida:

        “Uma resposta nunca merece uma reverência. Mesmo que for inteligente e correta, nem assim você deve se curvar para ela. […] Quando você se inclina, dá passagem. […] E a gente nunca deve dar passagem para uma resposta. […] A resposta é sempre um trecho do caminho que está atrás de você. Só a pergunta pode apontar o caminho para frente”.

        Achei que havia tanta sabedoria nas suas palavras, que precisei segurar bem firme meu queixo para não fazer outra reverência.

Extraído de: Ei! Tem alguém aí? São Paulo, Companhia das Letrinhas, 1997, p. 27-29.

Entendendo a crônica:

01 – Qual é a primeira ação que o personagem misterioso realiza ao se apresentar?

      A primeira ação que o personagem misterioso realiza é inclinar-se bem para frente, fazendo uma reverência.

02 – Por que o personagem misterioso se inclina quando alguém faz uma pergunta?

      Ele se inclina porque, de onde ele vem, é um costume fazer uma reverência quando alguém faz uma pergunta fascinante. Quanto mais profunda a pergunta, mais profunda a reverência.

03 – Como o narrador reage à explicação do personagem sobre as reverências?

      O narrador fica tão impressionado com a resposta que faz uma profunda reverência, inclinando-se ao máximo.

04 – Por que o personagem misterioso fica "quase ofendido" quando o narrador faz uma reverência?

      Ele fica "quase ofendido" porque, em sua perspectiva, uma resposta nunca merece uma reverência, mesmo que seja inteligente e correta.

05 – O que significa "dar passagem" no contexto da explicação do personagem misterioso?

      No contexto da explicação, "dar passagem" significa ceder ou curvar-se diante de algo. Ele argumenta que nunca se deve "dar passagem" para uma resposta.

06 – Qual é a principal diferença que o personagem misterioso estabelece entre uma pergunta e uma resposta?

      O personagem estabelece que a resposta é sempre um trecho do caminho que está atrás de você, ou seja, ela é algo já dado ou conhecido. Já a pergunta é o que pode apontar o caminho para frente, indicando a busca por algo novo e desconhecido.

07 – O que o narrador precisa fazer no final para não fazer outra reverência?

      No final, o narrador precisa segurar bem firme o queixo para não fazer outra reverência, pois achou que havia muita sabedoria nas palavras do personagem misterioso.

 

CONTO: MARCELO, MARMELO, MARTELO - FRAGMENTO - RUTH ROCHA - COM GABARITO

 Conto: Marcelo, marmelo, martelo – Fragmento

           Ruth Rocha

        [...]

        Uma vez, Marcelo cismou com o nome das coisas:

        — Mamãe, por que é que eu me chamo Marcelo?

        — Ora, Marcelo foi o nome que eu e seu pai escolhemos.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi2oUgoLwixBNCjwmILswhOuDRB0jqoLFVSdFQPPsVihwpddMIuO6og2QsKNRZ0XN7NWkdtmeKGc6_3Jr6JaYBT8A-pWQixz5eOoK24RZNYucyKIYQG6SrV0AMMBht2hyd4S7nyDps9mRuA3siGkI1DUdS07Plgo39aI9r4TOPhtQ4b5vpiE0l4yrF6ayw/s320/Marcelo_Marmelo_Martelo.jpg


        — E por que é que não escolheram martelo?

        — Ah, meu filho, martelo não é nome de gente! É nome de ferramenta...

        — Por que é que não escolheram marmelo?

        — Porque marmelo é nome de fruta, menino!

        — E a fruta não podia chamar Marcelo, e eu chamar marmelo?

        No dia seguinte, lá vinha ele outra vez:

        — Papai, por que é que mesa chama mesa?

        — Ah, Marcelo, vem do latim.

        — Puxa, papai, do latim? E latim é língua de cachorro?

        — Não, Marcelo, latim é uma língua muito antiga.

        — E por que é que esse tal de latim não botou na mesa nome de cadeira, na cadeira nome de parede, e na parede nome de bacalhau?

        — Ai, meu Deus, este menino me deixa louco!

        Daí a alguns dias, Marcelo estava jogando futebol com o pai:

        — Sabe, papai, eu acho que o tal de latim botou nome errado nas coisas. Por exemplo: por que é que bola chama bola?

        — Não sei, Marcelo, acho que bola lembra uma coisa redonda, não lembra?

        — Lembra, sim, mas... e bolo?

        — Bolo também é redondo, não é?

        — Ah, essa não! Mamãe vive fazendo bolo quadrado...

        O pai de Marcelo ficou atrapalhado.

        E Marcelo continuou pensando:

        "Pois é, está tudo errado! Bola é bola, porque é redonda. Mas bolo nem sempre é redondo. E por que será que a bola não é a mulher do bolo? E bule? E belo? E bala? Eu acho que as coisas deviam ter nome mais apropriado. Cadeira, por exemplo. Devia chamar sentador, não cadeira, que não quer dizer nada. E travesseiro? Devia chamar cabeceiro, lógico! Também, agora, eu só vou falar assim".

        [...]

ROCHA, Ruth. Marcelo, marmelo, martelo e outras histórias. 27. ed. São Paulo: Salamandra, s.d. p. 9-13. (Fragmento).

Fonte: Língua Portuguesa: Singular & Plural. Laura de Figueiredo; Marisa Balthasar e Shirley Goulart – 6º ano – Moderna. 2ª edição, São Paulo, 2015. p. 202-203.

Entendendo o conto:

01 – Qual é a principal "cisma" de Marcelo que inicia o conto?

      A principal cismada de Marcelo é com o nome das coisas. Ele questiona por que cada objeto e pessoa tem um nome específico e não outro.

02 – Que exemplos Marcelo usa para questionar o nome dele próprio e de outras coisas?

      Marcelo questiona por que se chama Marcelo e não "martelo" ou "marmelo". Depois, ele pergunta por que mesa se chama mesa, e não "cadeira", "parede" ou "bacalhau". Por fim, ele indaga sobre o nome de bola e bolo.

03 – Como a mãe de Marcelo tenta explicar o nome dele?

      A mãe de Marcelo tenta explicar que "Marcelo" foi o nome que ela e o pai escolheram. Para justificar a não escolha de "martelo" ou "marmelo", ela diz que "martelo não é nome de gente" e "marmelo é nome de fruta".

04 – Qual é a explicação do pai de Marcelo para o nome "mesa" e como Marcelo reage a ela?

      O pai de Marcelo explica que a palavra "mesa" vem do latim. Marcelo reage de forma curiosa, perguntando se "latim é língua de cachorro", e depois questiona por que o latim não "botou na mesa nome de cadeira, na cadeira nome de parede, e na parede nome de bacalhau".

05 – Por que o pai de Marcelo fica "atrapalhado" ao discutir o nome "bola" e "bolo" com o filho?

      O pai de Marcelo fica atrapalhado porque, ao tentar explicar que "bola" lembra uma coisa redonda, Marcelo contrapõe que "bolo nem sempre é redondo", já que a mãe faz bolo quadrado. Isso desestabiliza a lógica simples que o pai tentava apresentar.

06 – Quais são as propostas de Marcelo para novos nomes para "cadeira" e "travesseiro"?

      Marcelo propõe que "cadeira" devia chamar "sentador" e "travesseiro" devia chamar "cabeceiro", argumentando que esses nomes seriam mais "apropriados" e lógicos em relação à função dos objetos.

07 – O que a insistência de Marcelo em questionar os nomes das coisas revela sobre sua forma de pensar?

      A insistência de Marcelo em questionar os nomes das coisas revela que ele tem um pensamento crítico e uma lógica própria e criativa. Ele não aceita as convenções sem questionamento, buscando uma coerência e um sentido mais direto na linguagem. Isso demonstra uma mente curiosa e original, característica da fase infantil de descoberta do mundo.

 

 

PIADA: NA LOJA DE TECIDOS - ZYLBERSZTAJN - COM GABARITO

 Piada: Na loja de tecidos

          ZYLBERSZTAJN.

        — Quanto custa o metro deste algodão? — pergunta Jacó.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhdbxABra6_PZLjsJpK1icM9EfbXht_ZpUChjf6-ANu0qrteoP0EVtowISQyzIdhN5kjevCyFmcuPzkOfD6EIRYY-9EYWn2aPY2NzmnVz2OjgvsBn_-KzyGKcTEJqN_4T8tHe6zn84Zk8rRuWhoGB8X_LbgmERTkfuo-hDFgEOglZ7lvrWdeI2YsCJD3DA/s1600/download.jpg


        — Estamos em promoção — diz o vendedor, pegando a bobina do tecido —, quanto mais o senhor levar, mais barato fica.

        — Então, vai desenrolando até ficar de graça.

ZYLBERSZTAJN. Abram. As melhores piadas do humor judaico.
Rio de Janeiro: Garamond, 2003. p. 16. v. 2.

Fonte: Língua Portuguesa: Singular & Plural. Laura de Figueiredo; Marisa Balthasar e Shirley Goulart – 6º ano – Moderna. 2ª edição, São Paulo, 2015. p. 209.

Entendendo a piada:

01 – Qual é o nome do cliente que pergunta o preço do algodão?

      O cliente se chama Jacó.

02 – Qual é a condição especial que o vendedor oferece sobre o preço do tecido?

      O vendedor informa que estão em promoção e que "quanto mais o senhor levar, mais barato fica".

03 – Como o vendedor demonstra a condição especial para o cliente?

      O vendedor pega a bobina do tecido para ilustrar a promoção.

04 – O que Jacó pede ao vendedor, com base na promoção?

      Jacó pede para o vendedor "desenrolar" o tecido até que ele fique "de graça".

05 – Qual é o humor da piada?

      O humor da piada reside no fato de Jacó levar a lógica da promoção ("quanto mais leva, mais barato fica") ao extremo, imaginando que se ele levar uma quantidade infinita de tecido, o preço chegaria a zero.

 

MÚSICA(ATIVIDADES): AÍ! SE SÊSSE! - ZÉ DA LUZ - COM GABARITO

 Música (Atividade): Ai! Se sêsse!

            Zé da Luz

Se um dia nois se gostasse
Se um dia nois se queresse
Se nois dois se empareasse
Se juntim nois dois vivesse
Se juntim nois dois morasse
Se juntim nois dois drumisse
Se juntim nois dois morresse
Se pro céu nois assubisse

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgNgUjFziglWpU0ue0HnpSsuA0Fc40B0ihBDqSKzASafI_ZPBOvJeaZ4o9Ht4ehkvxy8Gh0hSSsnxDw0Ow4-9ZWZYlSKpimMvA4xxk4iUcKMCxjeChkHUAts2yOTXSbrPqzQQWxykdDGFGmIyzp7ygO_II2yLcFwqk45Xu9hIt6YuEn_pCiY7FnqMcH3_w/s320/maxresdefault.jpg


Mas porém acontecesse de São Pedro não abrisse
A porta do céu e fosse te dizer qualquer tulice
E se eu me arriminasse
E tu cum eu insistisse pra que eu me arresolvesse
E a minha faca puxasse
E o bucho do céu furasse
Tarvês que nois dois ficasse
Tarvês que nois dois caísse
E o céu furado arriasse e as virgi toda fugisse.

Composição: Zé Da Luz. Disponível em: http://letras.terra.com.br/cordel-do-fogo-encantado/78514/. Acesso em: 4 nov. 2014.

Fonte: Língua Portuguesa: Singular & Plural. Laura de Figueiredo; Marisa Balthasar e Shirley Goulart – 6º ano – Moderna. 2ª edição, São Paulo, 2015. p. 215.

Entendendo a música:

01 – Qual é o sentimento principal que o eu-lírico expressa no início da canção?

      O sentimento principal expresso no início da canção é o de um desejo profundo e condicional de união com a pessoa amada. O eu-lírico usa a repetição de "se" para imaginar uma vida inteira de cumplicidade e proximidade.

02 – O que o eu-lírico imagina que aconteceria se ele e a pessoa amada morressem e tentassem entrar no céu?

      Ele imagina que, ao chegarem no céu, São Pedro não abriria a porta e diria "qualquer tulice" (besteira, tolice), impedindo a entrada dos dois.

03 – Diante da recusa de São Pedro, qual é a reação extrema e bem-humorada que o eu-lírico pensa em ter?

      O eu-lírico pensa em "se arriminar" (se armar) e, com a insistência da amada, puxar sua faca e "furar o bucho do céu".

04 – Quais seriam as consequências da ação radical do eu-lírico, caso ele "furasse o bucho do céu"?

      As consequências seriam: "Tarvês que nois dois ficasse / Tarvês que nois dois caísse / E o céu furado arriasse e as virgi toda fugisse." Ou seja, talvez eles permanecessem, talvez caíssem, o céu se desmoronaria e todas as virgens (anjos) fugiriam.

05 – Qual é o efeito do uso repetitivo da conjunção "se" ao longo da letra?

      O uso repetitivo da conjunção "se" cria uma atmosfera de hipótese e imaginação, construindo um cenário de possibilidades e fantasias. Ele enfatiza o caráter condicional de todos os eventos narrados, do amor à rebelião celestial.

 

 

ENTREVISTA: ROSINALVA DIAS, TRABALHO PEDAGÓGICO DE ALFABETIZAÇÃO - COM GABARITO

 Entrevista:  Rosinalva Dias, Trabalho Pedagógico de Alfabetização

        Rosinalva Dias, professora da escola pública, no ensino fundamental há 24 anos, vinte dos quais na 1ª série, fala sobre seu trabalho na sala de aula e nos conta um pouco de sua história profissional, na busca de uma prática educativa de qualidade e de uma rotina adequada para o trabalho pedagógico de alfabetização.

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj67OEVUoVRSnIQe4NymlKPNoSpO7ZnqvUP7ve6kxxSvhkn1DSthcttcS9PBeMXP1PwQ8Wf29Upga1LEoCoGqeZfPsAjOlVJg254l3yZqHlrZCJ_Sh8gRrNrBMsLVbJ4V933qDhBjyKkK7liA3vZiGQ9kKDlBfsNp_XVGVercUX-CvMEmvWqPlJB8xQCEI/s320/2%C2%BA_Sem-6_CAPA-e1597335853807.png

        PROFA: Como você planeja o trabalho nas primeiras semanas de aula?

        Rosinalva: Todo início de ano, nós, professores, ficamos ansiosos não só para conhecer os novos alunos, como também para organizar a rotina do trabalho pedagógico nas primeiras semanas de aula. Alguns anos atrás, isso não era muito tranquilo para mim e nem para os meus colegas, não só porque não tínhamos claro que atividades desenvolver, mas porque os objetivos de alcance do ano não eram discutidos pela equipe escolar. Antes de contar o que faço hoje, nas primeiras semanas de aula, gostaria de destacar que é importante que o professor tenha claros os objetivos didáticos colocados para a série com a qual vai trabalhar.

        PROFA: E quais são seus objetivos, em Língua Portuguesa, para a sua classe de 1ª série?

        Rosinalva: O que espero é que meus alunos cheguem alfabetizados ao final do 1o ano, isto é, que saibam ler e escrever com autonomia, mesmo que cometam ainda muitos erros. Há alguns anos, venho utilizando em meu plano de trabalho os objetivos apresentados nos Parâmetros Curriculares Nacionais. E tenho contado com a parceria da coordenadora pedagógica da minha escola, que tem me ajudado a compreender o real significado desses objetivos e a expressá-los de fato no meu planejamento. Com a implementação dos ciclos em nosso município, aumentou a minha preocupação em definir os objetivos para o ano letivo, pois o fato de não haver retenção, entre a 1ª e a 2ª série, para os alunos que não se alfabetizam, não significa que a grande maioria não possa aprender a ler e escrever em um ano. Essa possibilidade depende, em grande parte, das metas que a gente traçar.

        PROFA: Alfabetizar todos os alunos em um ano não é a meta de todo professor alfabetizador?

        Rosinalva: Sim. Todos querem que seus alunos se alfabetizem no 1º ano, mas a proposta de organização da escolaridade em ciclos provocou algumas distorções sérias, em alguns casos, por falta de clareza dos professores sobre os seus fundamentos. Eu mesma cheguei a dizer que, agora, com os ciclos, os alunos teriam dois anos para aprender a ler e escrever – o que não é a finalidade de um sistema de ciclos –, e isso se refletiu diretamente em minha prática. O que acontecia comigo, e acontece com muitos colegas ainda, é o seguinte: acham que se os alunos não aprendem no 1º ano, devem começar tudo de novo no 2º e, com esse raciocínio, repetem-se as mesmas atividades propostas no ano anterior e eles continuam sem saber ler e escrever.

        PROFA: Conte como você organiza seu trabalho no início do ano?

        Rosinalva: Na década de 80, eu já tinha como objetivo alfabetizar todos os alunos em um ano, mas meus primeiros dias de aula eram muito diferentes dos de hoje em dia. Nas duas escolas públicas em que trabalhava, sempre tive de três a cinco dias de reuniões de planejamento no início do ano, sendo que um dos dias era reservado para organizar o trabalho na primeira semana de aula. Eu sentava com as minhas colegas e definíamos uma série de atividades. A rotina do trabalho proposta para a semana era mais ou menos assim:

• Segunda-feira: apresentação dos alunos, visita à escola para conhecer suas dependências e funcionários, desenho da escola, leitura de história, apresentação do nome de cada criança no crachá e cópia do cabeçalho. Apresentação da vogal A, treinando uma página do seu traçado, levantamento de palavras que começam com A e pintura do desenho de objetos com nomes iniciados por A.

• Terça-feira: apresentação da vogal E, da mesma forma que foi feita a apresentação do A. Cópia do próprio nome, construção de maquete da sala (1ª parte), desenho livre e brincadeira no pátio.

• Quarta-feira: Trabalho com a vogal I, tal como foi feito com o A e o E. Cópia do nome, construção de maquete da sala (2ª parte) e leitura de história.

• Quinta-feira: trabalho com a vogal O, tal como com as anteriores. Colagem do nome com papel crepom, jogos, criação de uma história, oralmente, a partir de sequências de gravuras e canto de músicas infantis.

• Sexta-feira: trabalho com a vogal U, da mesma forma que foi feito com as anteriores. Recorte, colagem e apresentação de uma história em vídeo.

Como se pode ver, essas atividades pouco contribuem para que se possa conhecer quais são os saberes que os alunos possuem quando chegam à escola e não favorecem o alcance dos objetivos de ensino e aprendizagem em Língua Portuguesa.

        PROFA: Você diz que hoje faz um trabalho diferente. O que provocou essa mudança?

        Rosinalva: Sem dúvida o conhecimento teórico que fui construindo ao longo do tempo. Eu sempre fiz os cursos que a Secretaria de Educação oferecia; aliás, tudo que sei é fruto das oportunidades que tive e nunca deixei de aproveitar. Uma das primeiras coisas que aprendi nos cursos de formação em serviço é que os alunos, mesmo os não-alfabetizados, têm conhecimentos sobre a escrita. Lembro-me de alunos que não usavam letras para escrever, mas que sabiam que se escreve da esquerda para a direita e faziam garatujas imitando escritas de adultos – conhecimentos que para mim não tinham o menor valor. Na verdade, o que fui aprendendo sobre o que pensam os alunos a respeito da escrita foi mudando o meu olhar e o meu jeito de trabalhar: aprendi a enxergar não mais o que eles não sabiam, mas quais saberes já possuíam. Quando temos clareza disso, muda a nossa relação com os alunos e o respeito intelectual por eles passa a ser muito maior. Considerar um aluno “fraquinho”, ou considerar que ele tem pouco conhecimento sobre a escrita, pode parecer a mesma coisa, mas não é. Essa compreensão faz toda a diferença.

        PROFA: Saber como os alunos aprendem é suficiente para organizar uma prática pedagógica de qualidade?

        Rosinalva: Acreditei nisso durante alguns anos. Com o tempo e muito estudo aprendi que não é assim. É necessário ter domínio dos conteúdos que ensinamos aos alunos. Todo professor que trabalha com a área de Língua Portuguesa precisa ter certos conhecimentos básicos, como, por exemplo: o que é ler, o que caracteriza e o que diferencia a linguagem oral e a escrita, para que serve a gramática, o que é prioritário ensinar aos alunos… entre muitos outros.

        PROFA: Há outro tipo de conhecimento que o professor precisa dispor para ensinar os alunos a ler e escrever?

        Rosinalva: Há sim. É o conhecimento didático, isto é, de como se ensina. Saber como os alunos aprendem e dominar os conteúdos do ensino não basta: é necessário saber como ensinar considerando os processos de aprendizagem e a natureza dos conteúdos a serem aprendidos.

        PROFA: Mas como ensinar não foi sempre a preocupação central dos professores?

        Rosinalva: É verdade. Só que nos preocupávamos com o ensino sem considerar as formas de aprender dos alunos. Hoje sabemos que o conhecimento didático que nos pode ser útil se apóia nos conhecimentos sobre o sujeito da aprendizagem (o aluno) e sobre o que é objeto de seu conhecimento (no caso da alfabetização, a Língua Portuguesa).

        PROFA: Como esses conhecimentos a ajudaram a rever seu trabalho no início do ano?

        Rosinalva: Eu continuo sentando com os meus colegas e planejando com eles o que faremos na sala de aula. Temos um plano anual que é sempre revisto antes de começar o ano letivo, desde a linguagem até as propostas. Ele sofre alterações, porque durante o ano anterior sempre aprendemos muitas coisas novas, principalmente nas reuniões coletivas da equipe escolar. E quanto mais nosso conhecimento avança, mais nosso olhar se renova e mais o nosso plano é aprimorado. Ele também é modificado em função das turmas de alunos, que são sempre diferentes.

        PROFA: Então, ter um plano já definido é fundamental para planejar os primeiros dias de aula?

        Rosinalva: Sem dúvida, mas o planejamento não é fechado, ele sofre alterações. É fundamental que se tenha claro o que se pretende ensinar para que se possa fazer um diagnóstico sobre o que os alunos já sabem a respeito. Isto serve não só para Língua Portuguesa, mas para qualquer área do conhecimento.

        PROFA: Conte-nos: o que você e seus colegas fazem nas primeiras semanas do ano letivo?

        Rosinalva: A partir do plano que envolve as diferentes áreas do conhecimento, nós priorizamos algumas para trabalhar. Na verdade, só não damos ênfase inicial a História, Geografia e Ciências, pois organizamos as atividades dessas áreas por meio de projetos, e estes só começam a ser desenvolvidos em meados de março. Listamos todas as atividades que julgamos importantes para os alunos realizarem e que podem nos dar informações sobre quais são os seus saberes em cada área a ser trabalhada.

        PROFA: E que atividades são essas que vocês listam?

        Rosinalva: Em Língua Portuguesa, as atividades envolvem principalmente:

• leitura e escrita dos nomes dos alunos;

• escrita de diferentes tipos de texto curto;

• apresentação do alfabeto com letra de fôrma maiúscula e minúscula;

• leitura diária de diferentes tipos de textos e principalmente de boas histórias (priorizamos os contos infantis tradicionais);

• manuseio de diferentes portadores de texto: gibis, revistas, jornais, livros etc.

• leitura feita pelos alunos que ainda não leem convencionalmente (para isso é necessário ir apresentando as atividades, para que eles possam se familiarizar com as propostas);

• roda de conversa para conhecer músicas, poemas, parlendas, quadrinhas e histórias que fazem parte do repertório dos alunos (caso eles tenham um repertório restrito, é o momento de ampliá-lo);

• roda de conversa informal, de notícia, de novidades etc.

        PROFA: Nas primeiras semanas os alunos usam algum caderno?

        Rosinalva: Sim, nele os alunos registram as atividades do dia e também copiam nomes significativos para eles: o nome da escola, seu próprio nome, os nomes dos colegas e de outras coisas que lhes façam sentido etc. Além disso, são coladas no caderno todas as atividades mimeografadas propostas na sala de aula. Essa é uma forma de os pais acompanharem o trabalho que é desenvolvido na classe e os alunos começarem a aprender os procedimentos de utilização do caderno.

        PROFA: Quais são os materiais que vocês consultam para preparar as atividades de alfabetização?

        Rosinalva: Hoje está mais fácil a pesquisa de material para organizar as atividades didáticas. Além de podermos contar com os PCNs, em nossa escola, por exemplo, a coordenadora pedagógica fez um trabalho de formação, com todos os professores, utilizando o Módulo de Alfabetização do Programa Parâmetros em Ação, o que deu maior fundamentação para nossa prática. A coordenadora também nos apresentou vários exemplos de atividades, por escrito e em programas de vídeo, discutindo conosco as melhores formas de desenvolvê-las com os alunos. Também, compramos alguns livros que foram indicados na bibliografia do Módulo de Alfabetização: cada professor comprou um e fomos trocando entre nós.

        PROFA: Você afirmou que as primeiras semanas de aula são para conhecer os alunos? E se eles não souberem fazer as atividades?

        Rosinalva: O objetivo é oferecer uma diversidade de situações que permitam conhecer o que os alunos sabem e, caso não saibam o que se imaginava que soubessem, apresentar a eles propostas que contribuam para que comecem a se familiarizar com o que desconhecem. Os primeiros dias de aula são para o professor diagnosticar os saberes dos alunos, mas são também para eles aprenderem muitas coisas.

        PROFA: Você não faz as atividades do chamado período preparatório?

        Rosinalva: Não faço e, para ser sincera, nunca fiz. Sempre tive uma intuição de que o período preparatório não servia para nada. Meus alunos sempre aprenderam a ler e escrever sem ter passado pelas atividades do período preparatório, mesmo quando eu alfabetizava pelo método analítico-sintético. É escrevendo, copiando textos significativos, fazendo desenhos que os alunos exercitam a coordenação motora. É realizando as diferentes atividades de leitura e escrita propostas na sala de aula que eles põem em uso a capacidade de discriminação visual e auditiva e as demais capacidades que se pretende desenvolver nesse período. O período preparatório não é condição para aprender a ler e escrever.

        PROFA: Você e os seus colegas fazem um planejamento com atividades iguais para todas as turmas, desenvolvidas nos mesmos horários do dia?

        Rosinalva: Não. Como eu disse anteriormente, nós listamos todas as atividades das áreas a serem trabalhadas, o que, nesse período inicial, inclui jogos de mesa e conhecimento do espaço da escola e das pessoas que nela trabalham. Depois, cada professor faz a organização da sua rotina semanal, considerando o que discutimos e as necessidades específicas do seu agrupamento. Portanto, não existe mais aquela coisa estranha de todo mundo, no mesmo horário, realizar as mesmas atividades.

        PROFA: De onde vêm os recursos para vocês comprarem os materiais de que precisam?

        Rosinalva: Alguns vêm da verba do Fundef: foi com esse dinheiro que compramos o mimeógrafo, o vídeo, a tevê e outros materiais para os alunos: jogos, brinquedos e alguns materiais escolares. Os livros, recebemos do Ministério da Educação. As revistas e gibis foram doados, inclusive por familiares dos professores. Dificilmente podemos contar com a ajuda financeira dos pais, mas quando fazemos festas que revertem em fundos para a escola eles comparecem e colaboram de uma forma ou de outra. O pouco que arrecadamos, investimos em livros e outros materiais para os alunos. Não é nada fácil, mas os resultados são sempre gratificantes. Com o tempo a gente vai aprendendo que quando se quer verdadeiramente algo nada nos impede de conseguir. O material que temos ainda é pouco, mas já provocou grandes avanços em nosso trabalho.

        PROFA: Há uma pergunta que ainda gostaríamos de fazer. Como você faz quando encontra na sua classe alunos já alfabetizados, no início do ano? Existe uma rotina semanal diferente para eles? Não seria melhor remanejá-los?

        Rosinalva: Não é fácil responder essas questões em poucas palavras… Mas vamos lá. Em todas as classes, há alunos que iniciam o ano alfabetizados: nesse caso, não há necessidade de se fazer uma rotina diferenciada e sim propostas que atendam a suas necessidades de aprendizagem. Por exemplo, quando os alunos com escrita não-alfabética realizam uma atividade de leitura de um texto com algum tipo de apoio que permita tornar o desafio de ler possível para eles, os alunos já alfabetizados podem ler esse mesmo texto sem nenhum tipo de apoio, ou escrever o texto, ditado pelo professor. Quando a proposta é de escrita, os alunos que já estão alfabetizados escreverão de forma mais próxima da convencional e os que ainda não estão alfabetizados escreverão conforme suas próprias hipóteses de escrita. Durante todo o ano em minha sala de aula, há situações em que todos realizam a mesma atividade, cada qual de acordo com a sua competência; há situações em que o texto é o mesmo e a proposta é que varia, conforme as possibilidades de realização dos alunos; e há situações em que as propostas são mesmo diferenciadas. Mas isso não significa uma rotina de trabalho diferente para alunos que já sabem ler e que ainda não sabem… E a possibilidade de remanejamento nem passa pela nossa cabeça, por vários motivos. Em primeiro lugar, porque é horrível para um aluno ficar mudando de professora em função do que sabe ou não. E, depois, porque os alunos com um nível de conhecimento superior à média da classe são informantes importantes, que em muito contribuem com o trabalho de todos. O cuidado necessário, entretanto, é para não colocá-los na condição de ajudantes do professor, pois eles são alunos que precisam ter atendidas as suas próprias necessidades de aprendizagem.

        PROFA: Mas, de qualquer forma, esses alunos com mais conhecimento não ficam prejudicados?

        Rosinalva: Eu também pensava assim. Mas se eles têm suas próprias necessidades de aprendizagem atendidas esse risco não existe. Além do que, quando esses alunos experimentam situações em que precisam ensinar o que sabem aos colegas que ainda não sabem, acabam aprendendo muito também. Hoje sabemos que diante da tarefa de ensinar o outro, todo indivíduo aprende mais sobre o que ensina, pois precisa organizar os conhecimentos disponíveis para dar explicações e elaborar argumentações convincentes. Isto parece fácil, mas não é. Por fim, quero dizer uma coisa que me parece necessária: ter uma classe heterogênea é muito bom para os alunos, mas ainda um grande desafio para o professor.

Entendendo a entrevista:

01 – Qual a experiência profissional de Rosinalva Dias no ensino fundamental, e especificamente na 1ª série?

      Rosinalva Dias tem 24 anos de experiência no ensino fundamental em escola pública, sendo 20 desses anos dedicados à 1ª série.

02 – Qual a principal preocupação de Rosinalva Dias ao planejar as primeiras semanas de aula?

      Sua principal preocupação é organizar a rotina do trabalho pedagógico e ter claros os objetivos didáticos para a série, além de conhecer os novos alunos.

03 – Qual o objetivo de Rosinalva para seus alunos de 1ª série em Língua Portuguesa ao final do ano?

      O objetivo é que seus alunos cheguem alfabetizados ao final do 1º ano, ou seja, que saibam ler e escrever com autonomia, mesmo que ainda cometam erros.

04 – Como a implementação dos ciclos no município de Rosinalva influenciou sua prática e a de seus colegas, e o que ela aprendeu sobre isso?

      A implementação dos ciclos gerou, inicialmente, a distorção de que os alunos teriam dois anos para se alfabetizar, o que Rosinalva percebeu não ser o objetivo. Ela aprendeu que essa mentalidade levava à repetição das mesmas atividades no 2º ano, sem avanços, e que a definição clara de metas anuais é crucial.

05 – Qual a principal mudança no planejamento inicial de aula de Rosinalva, em comparação com sua prática na década de 80?

      Antes, o planejamento era focado em uma rotina rígida de apresentação de vogais e cópias, que pouco contribuía para conhecer os saberes dos alunos. Atualmente, o foco é em diagnosticar os conhecimentos prévios dos alunos sobre a escrita, reconhecendo seus saberes e não apenas suas deficiências.

06 – Qual a importância do conhecimento teórico na mudança da prática pedagógica de Rosinalva?

      O conhecimento teórico a ajudou a mudar seu olhar sobre os alunos, aprendendo que mesmo os não-alfabetizados possuem conhecimentos sobre a escrita. Isso a fez enxergar o que os alunos já sabiam, aumentando o respeito intelectual por eles.

07 – Além de saber como os alunos aprendem, que outros dois tipos de conhecimento Rosinalva considera essenciais para uma prática pedagógica de qualidade?

      Ela menciona o domínio dos conteúdos (saber o que ensinar, como ler, o que é gramática, etc.) e o conhecimento didático (saber como ensinar, considerando os processos de aprendizagem e a natureza dos conteúdos).

08 – Que tipo de atividades são priorizadas por Rosinalva e seus colegas em Língua Portuguesa nas primeiras semanas do ano letivo?

      As atividades incluem leitura e escrita de nomes, escrita de textos curtos, apresentação do alfabeto, leitura diária de diferentes tipos de textos e histórias, manuseio de portadores de texto (gibis, revistas), rodas de conversa sobre repertório dos alunos (músicas, poemas), e rodas de conversa informais.

09 – Como Rosinalva lida com a presença de alunos já alfabetizados em sua classe no início do ano?

      Ela não faz uma rotina semanal diferenciada, mas oferece propostas que atendam às necessidades de aprendizagem de cada um. Os alunos já alfabetizados podem ler sem apoio, escrever textos ditados ou aprofundar-se, enquanto os demais realizam atividades adaptadas ao seu nível.

10 – Por que Rosinalva considera uma classe heterogênea (com diferentes níveis de conhecimento) benéfica?

      Ela acredita que é "muito bom para os alunos" porque os que têm maior conhecimento podem atuar como informantes importantes, contribuindo com o trabalho de todos. Além disso, ao precisarem ensinar o que sabem aos colegas, eles próprios aprendem mais, organizando seus conhecimentos e elaborando explicações.