quarta-feira, 31 de outubro de 2018

CRÔNICA: O LEÃO - DALTON TREVISAN - COM QUESTÕES GABARITADAS

CRÔNICA: O leão
                                 Dalton Trevisan

        A menina conduz-me diante do leão, esquecido por um circo de passagem. Não está preso, velho e doente, em gradil de ferro. Fui solto no gramado e a tela fina de arame é escarmento ao rei dos animais. Não mais que um caco de leão: as pernas reumáticas, a juba emaranhada e sem brilho. Os olhos globulosos fecham-se cansados, sobre o focinho contei nove ou dez moscas, que ele não tinha ânimo de espantar. Das grandes narinas   escorriam gotas e pensei, por um momento, que fossem lágrimas.
        Observei em volta: somos todos adultos, sem contar a menina. Apenas para nós o leão conserva o seu antigo prestígio – as crianças estão em redor dos macaquinhos. Um dos presentes explica que o leão tem as pernas entrevadas, a vida inteira na minúscula jaula.  Derreado, não pode sustentar-se em pé. Chega-se um piá e, desafiando com olhar selvagem o leão, atira-lhe um punhado de cascas de amendoim. O rei sopra pelas narinas, ainda é um leão: faz estremecer as gramas a seus pés. Um de nós protesta que deviam servir-lhe a carne em pedacinhos.
        -- Ele não tem dente?
        -- Tem sim, não vê? Não tem é força para morder.
        Continua o moleque a jogar amendoim na cara devastada do leão. Ele nos olha e um brilho de compreensão nos faz baixar a cabeça: é conhecida a amarga derrota. Está velho, artrítico, não se aguenta das pernas, mas é um leão. De repente, sacudindo a juba, põe-se a mastigar capim. Ora, leão come verde! Lança-lhe o guri uma pedra: acertou no olho lacrimoso e doeu.  O leão abriu a bocarra de dentes amarelos, não era um bocejo.
        Entre caretas de dor, elevou-se aos poucos nas pernas tortas. Sem sair do lugar, ficou de pé. Escancarou penosamente os beiços moles e negros, ouviu-se a rouca buzina do “Ford antigo.”  Por um instante o rugido manteve suspensos os macaquinhos e fez bater mais depressa o coração da menina. O leão soltou seis ou sete urros. Exausto, deixou-se cair de lado e fechou os olhos para sempre.
                                                                   Dalton Trevisan
Entendendo o texto:

01 – ITA:      
I. Embora não seja um texto predominantemente descritivo, ocorre descrição, visto que o autor representa a personagem principal através de aspectos que a individualizam.
II. Por ressaltar unicamente as condições físicas da personagem, predomina a descrição objetiva no texto, com linguagem denotativa.
III. Por ser um texto predominantemente narrativo, as demais formas - descrição e dissertação -inexistem.
Inferimos que, de acordo com o texto, pode(m) estar correta(s):
a) Todas
b) Apenas a I
c) Apenas a II
d) Apenas a III
e) Nenhuma das afirmações.

02 – ITA.
I. Fato principal: a morte do leão. Causas principais: o circo, que o abandonou, e a criança, que o acertou com uma pedra.
II. A decadência física do leão, assunto predominante do texto, denota animalização do ser humano.
III. A velhice do leão, assunto predominante do texto, conota marginalização, maus tratos e decadência física dos animais.
Inferimos que, de acordo com o texto, pode(m) estar correta(s):
a) Todas
b) Apenas a I
c) Apenas a II
d) Apenas a III
e) Nenhuma das afirmações.

03 – (ITA)            
I. Conotativamente, o leão chora; denotativamente, o menino agride.
II. A decadência do leão é tanta, que nada faz lembrar a sua antiga reputação. Nem mesmo os adultos o reconhecem mais.
III. Metaforicamente, o leão, que não mais produz e não mais trabalha, pode representar a marginalização, abandono e agressão a que são submetidos os idosos.
Inferimos que, de acordo com o texto, pode(m) estar correta(s):
a) Todas
b) Apenas a I
c) Apenas a II
d) Apenas a III
e) Nenhuma das afirmações.

04 – (ITA)       
I. Evidencia-se explicitamente no texto uma comparação: a decadência do leão é similar à do ser humano em geral.
II. Incapaz de reagir fisicamente às provocações, o leão, sentindo-se inconformado, morre.
III. O fato de o leão "não estar preso em gradil de ferro constitui, por parte de seus antigos donos, uma prova de gratidão.
Inferimos que, de acordo com o texto, pode(m) estar correta(s):
a) Todas
b) Apenas a I
c) Apenas a II
d) Apenas a III
e) Nenhuma das afirmações.






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