sexta-feira, 24 de julho de 2020

POEMA: VIDA MENOR - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM GABARITO

Poema: Vida menor

          Carlos Drummond de Andrade

A fuga do real,

ainda mais longe a fuga do feérico,

mais longe de tudo, a fuga de si mesmo,

a fuga da fuga, o exílio

sem água e palavra, a perda

voluntária de amor e memória,

o eco

já não correspondendo ao apelo, e este fundindo-se,

a mão tornando-se enorme e desaparecendo

desfigurada, todos os gestos afinal impossíveis,

senão inúteis, a desnecessidade do canto, a limpeza

da cor, nem braço a mover-se nem unha crescendo.

Não a morte, contudo.

 

Mas a vida: captada em sua forma irredutível,

já sem ornato ou comentário melódico,

vida a que aspiramos como paz no cansaço

(não a morte)

vida mínima, essencial; um início; um sono;

menos que terra, sem calor; sem ciência nem ironia;

o que se possa desejar de menos cruel: vida

em que o ar, não respirando, mais envolva;

nenhum gasto de tecidos; ausência deles;

confusão entre manhã e tarde, já sem dor,

porque o tempo não mais se divide em sessões; o tempo

elidido, domado.

Não o morto nem o eterno ou o divino,

apenas o vivo, o pequenino, calado, indiferente

e solitário vivo.

Isso eu procuro.

                                   ANDRADE, Carlos Drummond de. In: Antologia poética. Rio de Janeiro: Record, 1993, p. 234-5.

Entendendo o poema:

01 – De acordo com o ideal de vida do sujeito poético, a existência humana:

(V) Deve ser simples e desapegada de valores materiais.

(F) Constitui-se um breve espaço da vida humana marcada pela vulgaridade.

(F) Tem seu verdadeiro sentido quando associada à realidade sobrenatural e divina.

(V) Deve estar isenta da preocupação com a passagem do tempo, eliminando, assim, as angústias do homem.

(V) Deve ser desvinculada de envolvimentos com a realidade social.

02 – O poema apresenta:

(V) Enumeração e reiteração de ideias, visando à expressividade.

(V) Funções emotiva e poética da linguagem.

(V) Liberdade formal.

(F) Temática de caráter social, representando bem uma arte engajada.

(F) Uma linguagem referencial, daí a objetividade no enfoque do tema.

03 – O título do poema pode ser usado como uma categoria antropológica, para quê?

      Para pensar as condições da subjetividade, em um ambiente de elevada representação histórica.


Nenhum comentário:

Postar um comentário