Crônica: Olhai os lírios do campo
Érico Veríssimo
Estive pensando muito na fúria com que
os homens se atiram à caça do dinheiro. É essa a causa principal dos
dramas, das injustiças, da incompreensão da nossa época. Eles esquecem o
que têm de mais humano e sacrificam o que a vida lhes oferece de melhor: as
relações de criatura para criatura. De que serve construir arranha-céus
se não há mais almas humanas para morar neles?
Quero que abras os olhos, Eugênio, que
acordes enquanto é tempo. Peço-te que pegues a minha Bíblia que está na
estante de livros, perto do rádio, leias apenas o Sermão da Montanha. Não
te será difícil achar, pois a página está marcada com urna tira de papel.
Os homens deviam ler e meditar esse trecho, principalmente no ponto em
que Jesus nos fala dos lírios do campo, que não trabalham nem fiam, e no
entanto nem Salomão em toda a sua glória jamais se vestiu como um deles.
Está claro que não devemos tomar as
parábolas de Cristo ao pé da letra e ficar deitados à espera de que tudo nos
caia do céu. É indispensável trabalhar, pois um mundo de criaturas
passivas seria também triste e sem beleza. Precisamos, entretanto, dar um
sentido humano às nossas construções. E quando o amor ao dinheiro, ao sucesso,
nos estiver deixando cegos, saibamos fazer pausas para olhar os lírios do campo
e as aves do céu.
Não penses que estou fazendo o elogio
do puro espírito contemplativo e da renúncia, ou de que o povo deva viver
narcotizado pela esperança da felicidade na "outra vida". Há na terra
um grande trabalho a realizar. É tarefa para seres fortes, para corações
corajosos. Não podemos cruzar os braços enquanto os aproveitadores sem
escrúpulos engendram os monopólios ambiciosos, as guerras e as intrigas cruéis.
Temos que fazer-lhes frente. É indispensável que conquistemos este mundo, não
com as armas do ódio e da violência e sim com as armas do amor e da persuasão.
Considere a vida de Jesus. Ele foi antes de tudo um homem de ação e não um puro
contemplativo.
Quando falo em conquista, quero dizer a
conquista de uma situação decente para todas as criaturas humanas, a conquista
da paz digna, através do espírito de cooperação.
E quando falo em aceitar a vida não me
refiro à aceitação resignada e passiva de todas as desigualdades, malvadezas,
absurdos e misérias do mundo. Refiro-me, sim a aceitação da luta necessária, do
sofrimento que essa luta nos trará, das horas amargas a que ela forçosamente
nos há de levar.
Olhai os lírios do campo.
Érico Veríssimo.
Fonte: Livro – Encontro
e Reencontro em Língua Portuguesa – 8ª Série – Marilda Prates – Ed. Moderna,
2005 – p. 108/9.
Entendendo a crônica:
01 – Na sua opinião qual é o
principal motivo de tantas injustiças entre os homens?
Resposta pessoal
do aluno.
02 – O que Érico Veríssimo
quis afirmar com a frase: “É indispensável trabalhar, pois um mundo de
criaturas passivas seria também triste e sem beleza?
Que o trabalho é básico na vida do homem.
03 – Humanizar o mundo e os
homens é um trabalho para quem?
Para os fortes e
corajosos.
04 – Explique o pensamento
da personagem em relação ao mundo e a sua conquista.
Todos devem ter
um modo de vida decente, sem preconceitos e injustiça.
05 – A expressão “disposição
para a luta” é usada no texto com que palavra?
Com a palavra
aceitação.
06 – Você concorda com a
ideia de que o homem deve aceitar todos os sofrimentos aqui na Terra, por que a
felicidade o espera no “céu”?
Não. Jamais o
homem deve ser passivo. Assim ele fará o jogo do sistema. É preciso lutar
contra a maré.
07 – O que deveria ser mais
importante para o homem: ter
mais ou ser mais? Por quê?
Ser mais. Os bens
materiais são passageiros.
08 – Qual seria a maior
fonte de felicidade pessoal?
Gostar-se e
gostar espontaneamente das pessoas.
Muito obrigado 😊
ResponderExcluir