domingo, 16 de maio de 2021

POEMA: A IDEIA - AUGUSTO DOS ANJOS - COM GABARITO

 POEMA: A IDEIA

  Augusto dos Anjos


De onde ela vem?! De que matéria bruta
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites duma gruta?!

 

Vem da psicogenética e alta luta

Do feixe de moléculas nervosas,
Que, em desintegrações maravilhosas,
Delibera, e depois, quer e executa!

 

Vem do encéfalo absconso que a constringe,
Chega em seguida às cordas do laringe,
Tísica, tênue, mínima, raquítica ...

 

Quebra a força centrípeta que a amarra,
Mas, de repente, e quase morta, esbarra
No mulambo da língua paralítica.

Fonte: Livro- Português: Linguagem, 3/ William Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães, 11.ed – São Paulo: Saraiva, 2016.p.27.

Glossário

centrípeta: que busca o centro.

constringir: apertar.

cripta: caverna, gruta.

encéfalo: cérebro.

molécula: a menor partícula em que uma substância pode ser dividida sem que ocorra perda de suas propriedades químicas.

mulambo: molambo; farrapo, indivíduo fraco.

nebulosa: nuvem de poeira e gás em suspensão no espaço sideral.

psicogenética: qualidade do que é a origem dos processos mentais ou psicológicos da mente e da personalidade individuais.

tísico: tuberculoso, fraco.

 

Entendendo o texto

 

1. A linguagem do poema surpreende e modifica uma tradição poética brasileira, em grande parte construída com base em sentimentalismo, delicadezas, sonhos e fantasias.

a) Destaque do texto vocábulos empregados poeticamente por Augusto dos Anjos e tradicionalmente considerados antipoéticos.

As palavras são: psicogenéticas, moléculas, encéfalo, laringe, tísica, centrípeta, paralítica

b) De que área do conhecimento humano provêm esses vocábulos?

Provêm da ciência, particularmente da Biologia e da Química.

 

2. O poema pode ser dividido em duas partes: na primeira, o eu lírico pergunta sobre a origem da Ideia; na segunda, apresenta uma resposta.

a) Na 1» estrofe, são empregadas uma metáfora e uma comparação para referir-se à Ideia. Quais são?

Metáfora: essa luz que sobre as nebulosas cai de incógnitas criptas misteriosas;

Comparação: como as estalactites duma gruta.

 

b) Como são a origem e o percurso da Ideia, conforme a descrição feita pelo eu lírico nas estrofes 2 e 3?

A Ideia origina-se da luta do feixe de moléculas nervosas, passa pelo encéfalo e chega à laringe.

c) Nesse percurso, a Ideia mantém-se como na origem ou sofre perdas?

Sofre perdas, pois o encéfalo a constringe e, ao chegar à laringe, encontra-se reduzida.

 

3. No último terceto, o eu lírico apresenta o momento em que a Ideia adquire forma.

a) Qual é o instrumento responsável por dar forma à Ideia?

A língua (órgão), responsável pela fala.

b) Nesse estágio, a Ideia é reproduzida em sua plenitude?

Não, pois a língua, órgão responsável pela fala (e pelo código), é frágil e inábil.

 

4. Segundo a concepção do eu lírico:

a) A Ideia tem uma origem material ou imaterial? Explique.

Material. Sua origem é bioquímica, nasce “do feixe de moléculas nervosas”

 

b) O vocabulário empregado pelo eu lírico está de acordo com essa concepção?

Sim. O eu lírico emprega o vocabulário da ciência.

c) Essa concepção retoma uma visão romântica do mundo interior do ser humano ou rompe com ela?

Rompe com a visão romântica de que o ser humano pode ser dotado de genialidade e de grande riqueza interior; a Ideia é vista como resultado da química do corpo humano.

 

5. Identifique no texto ao menos uma característica simbolista e outra naturalista.

A característica simbolista do texto está no emprego do termo Ideia com maiúscula, elevando-a a um conceito universal; além disso, há o desespero do eu lírico diante da impotência da língua para dar sentido a conceitos não prosaicos. A característica naturalista do poema encontra-se no cientificismo e na base bioquímica dos processos mentais.

 

 

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