Reportagem: A planta da felicidade
Na
Índia, uma arte popular para todas as estações
Na Índia as artes populares
tradicionais inspiram-se frequentemente nas crenças religiosas. No estado de Rajasthan,
a sudoeste de Délhi, nas férteis planícies pontilhadas pelos célebres palácios
e fortalezas rajput, a arte do mehndi – pintura de mãos para mulheres –
integra-se no ciclo de festas e cerimônias.
Durante séculos as mulheres da Índia e
do Oriente Médio usaram mehndi (ou henê) para decoração, mas as mulheres da
comunidade Vaixía, do Rajasthan, destacam-se por usá-lo para cobrir de desenhos
artísticos as palmas das mãos, os dedos dos pés e até os pés. Esses enfeites
variam conforme a ocasião – casamentos, nascimentos ou festas como o Holi e o
Gangur.
O henê é uma planta muito cultivada na
África e no sudoeste da Ásia para ornamento e para tintura. É empregado para
tingir os cabelos, para pintar animais e tingir peles. Também serve como
adstringente nas doenças da pele, em queimaduras e contusões.
Desde os tempos bíblicos s mulheres do
Egito e da Índia usam o creme de henê para pintar de vermelho-alaranjado as
unhas e diversas partes das mãos e dos pés, a fim de realçar sua beleza. A cor
se mantém por três ou quatro semanas.
[...]
Acredita-se que a pintura de mehndi
tivesse chegado à Índia com os muçulmanos, mas na verdade começou muito antes,
antes mesmo do período Gupta (350 a.D.). As antigas pinturas murais de Ajanta-Ellora
mostram cenas de decoração com mehndi; numa cena vê-se uma princesa de
Pataliputra repousando semi-adormecida sob uma árvore, enquanto uma amiga lhe
decora os pés e as mãos com desenhos feitos com mehndi.
[...] Hoje essa ornamentação corporal
tornou-se um complexo de desenhos geográficos e florais que continua a ser
indispensável em algumas regiões, mas que em outras já desapareceu.
O mehndi, sob a forma de folhas, é
amassado, reduzindo a pó e misturado com caldo de limão, água açucarada e
algumas gotas de óleo de parafina. O resultado é uma pasta escura, cuja cor
persiste muito tempo. As mãos e os pés são muito bel lavados com besan (farinha
de grão-de-bico) ou sabão.
Os belos desenhos são feitos com
palito, com arame fino ou mesmo com o dedo indicador. A pasta é aplicada em
riscos delgados, e a pessoa que a aplica não de tocar a pele que está pintando.
Quando o desenho está pronto, espera-se que seque e penetre na pele.
Aplicando-se pasta de calcário sobre
henê vermelho obtêm-se desenhos brancos em fundo vermelho: é o método batik.
Para manter a intensidade da cor vermelha, as mãos são esfregadas com óleo de
sésamo ou de mostarda e depois lavados. Os desenhos mantêm-se por duas ou três
semanas. Há também desenhos já prontos, que podem ser aplicados com rapidez,
mas desaparecem mais depressa. É preciso tempo e dedicação para fazer pintura
com mehndi; o trabalho leva de quatro a oito horas no caso de uma noiva.
O
mehndi dá sorte no casamento. Quanto mais escuro o vermelho na palma da mão de
uma mulher, mais ela é amada pelo marido. Como a arte do mehndi simboliza a
durabilidade do amor entre marido e mulher, só pode ser praticada por mulheres
casadas, para as quais é símbolo do estado matrimonial. Solteiras e viúvas não
podem ostentar esses desenhos, mas as mulheres mortas são ornadas com mehndi
como se fossem noivas. Moças e rapazes solteiros não podem untar os pés com
mehndi porque dá azar. Mulher grávida não pode usar o mehndi.
Acredita-se que Lakshimi, deusa da
sorte e da felicidade, esteja presente nos desenhos feitos com mehndi. Um sinal
feito com mehdi na fronte de uma pessoa atrai boa sorte, como também dá sorte
oferecer mehndi aos deuses e deusas para aplica-los, pedir-lhes favores ou
afastar maus espíritos. As decorações com mehndi são indispensáveis nas mãos e
nos pés das noivas durante a cerimônia do casamento.
[...]
Os desenhos de mehndi dividem-se em
várias categorias: estações, festas, cerimônias e miscelânea. Esta última
categoria serve para enriquecer os desenhos específicos e limitados que se
fazem para as festas e cerimônias. Neles são representados muitos costumes e
crenças populares.
Bicchu (escorpião) é um símbolo do amor
e um desenho muito popular, especialmente no verão. O papagaio também é um
símbolo importante nas canções populares de Rajasthan; representa o mensageiro
das heroínas. O pavão, notável por suas muitas cores, é o companheiro querido
das mulheres sepradas dos maridos. Também são representados objetos da vida
cotidiana: gulodices, roupas, flores e objetos usados em jogos, como chakaris
(brinquedos que giram como piões). Os keris (mangas verdes), as
castanhas-d’água e o lótus são motivos frequentes.
Desenhos onde aparecem o sol, a lua,
estrelas e keri representam o casamento perfeito que dura a vida inteira. As
flores simbolizam a felicidade; as mangas verdes são a virgindade e a chegada
do verão. O pavão, o papagaio e o escorpião são símbolos do amor.
As estações do ano na Índia são o
verão, as chuvas e o inverno. O verão e a estação das chuvas duram das festas
Holi às festas Deepavali, ou seja, de março a outubro. O mehndi é apropriado ao
verão porque refresca e amacia as mãos. Tem também propriedades medicinais
apreciadas durante a estação chuvosa. Os bijanis (leques), em centenas de
variedade, são motivo popular próprio para o verão, por simbolizarem o ar
fresco e um alívio para o calor.
Na estação das chuvas os desenhos são
mais numerosos, mais trabalhados e até mais exuberantes do que no verão e no
inverso. É a época em que a decoração com mehndi atinge sua maior beleza.
Desenham-se keri e chopar (jogo parecido com o gamão). Laharia – onda do mar ou
de rio – reflete os sentimentos de alegria e excitação próprios da época e do
espírito da estação. É também a estação do mela, das feiras, dos festivais;
muitas mulheres passam tempo no jardim, brincando em balanços. Os sentimentos
próprios dessa estação se exprimem nas vestimentas vibrantes, onde se misturam
as cores do arco-íris, e nas formas do laharia e dos keni. Tudo isso se
encontra nos desenhos feitos com mehndi. Vários desenhos são inspirados no
ghevar, espécie de guloseima que os irmãos oferecem às irmãs nos dias de festa.
Como o mehndi tem características
refrescantes, o inverno é a estação que lhe é menos favorável. Nessa época há
menos desenhos. [...]
A arte do mehndi está profunda e
intimamente ligada à vida popular e até originou provérbios. “Mão pintada com
mehndi” refere-se a uma pessoa que procura fugir do trabalho. Também se diz que
“o mehndi só produz cor quando é amassado sobre uma pedra”. Isso quer dizer que
só com sofrimento se adquire experiência da vida.
O mehndi fornece um quadro verdadeiro
da vida do povo e esclarece aspectos de sua mentalidade. A beleza, o encanto e
a riqueza dessa tradição estão muito bem resumidos nestes versos de um poeta
urdu: “Resolvi agora escrever os desejos do meu coração sobre as folhas do
mehndi. Quando ela vier colher estas folhas, colocará a mão sobre elas, lerá
minha mensagem e saberá meu segredo”.
O Correio. Rio de Janeiro,
ano 5, n. 4, 1977.
Fonte: Livro – Ler, entender, criar – Português – 6ª Série – Ed. Ática, 2007 – p. 233-6.
Entendendo a reportagem:
01 – Para que você possa
compreender bem a origem da pintura corporal de que fala o texto lido, faça as
seguintes atividades:
a) Em um atlas geográfico mundial, localize a Índia e Délhi, uma importante cidade desse país.
Resposta pessoal do aluno.
b) Em um mapa da Índia, localize o estado de Rajasthan, que fica a sudoeste de Délhi.
Resposta pessoal do aluno.
c) Compare os resultados de sua pesquisa com os encontrados por um colega.
Resposta pessoal do aluno.
02 – Dividimos a seguir o
texto em seis partes. Escreva em seu caderno quais parágrafos podem constar de
cada parte:
· Localização no espaço e no tempo da arte do mehndi – pintura de mãos para mulheres;
Do 1° ao 6° parágrafos.
· A técnica do mehndi;
Do 7° ao 9° parágrafos.
· As crenças associadas ao mehndi;
10° e 11° parágrafos.
· As categorias e os símbolos do mehndi;
Do 12° ao 14° parágrafos.
· Mehndi e as estações do ano;
Do 15° ao 17° parágrafos.
· Mehndi e a cultura popular.
18° e 19° parágrafos.
03 – Pesquise em um
dicionário as palavras do texto cujo significado você desconhece. Lembre que
você poderá encontrar mais de um significado para cada palavra procurada. Anote
apenas o significado mais adequado, considerando a frase em que ela está.
Resposta pessoal
do aluno.
04 – O título e a chamada de
reportagem estão adequados à reportagem? Comente um pouco sua resposta.
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: O
título e a chamada são uma síntese das ideias expressas na reportagem.
05 – Vamos fazer uma nova
divisão do texto, desta vez em três partes:
·
Apresentação do assunto (do 1° ao 66°
parágrafo);
·
Desenvolvimento (do 7° ao 17° parágrafo);
·
Conclusão (18° e 19° parágrafos).
Crie um intertítulo para a segunda e
outro para a terceira parte. Compare seus intertítulos com os criados por seus
colegas.
Resposta pessoal
do aluno.