quinta-feira, 19 de outubro de 2023

ARTIGO DE OPINIÃO: MUNDO SEM POESIA É IMUNDO - ULISSES TAVARES - COM GABARITO

 Artigo de opinião: Mundo sem poesia é imundo

                            Ulisses Tavares

        A realidade da vida, em si mesma, não se sustenta.

        O ser humano é mais que um organismo que precisa de comida, roupa, sono e ar.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi44BhnoRud0OICg45T8qlnCzuILOwcYnq6NQ1iqJVSt3PmLvYQviTxWawgqgj5CtVkfGvtojV7vm4ydEi7IWGFh57ol7lYcSk47F_vsbBXP_jLJlb505u9nUlv20ePSC7uQFQBsrJcN1C7_tIkR38AXNLKrrBkShBXk4DE4gzTC7DuZyroINXNrTXLrwk/s320/POESIA.jpg


        As pessoas são famintas de carinho, ficam frias sem o cobertor da esperança, não dormem direito apenas com os braços de travesseiros, e querem, sempre, voar nos pensamentos. Respirar não basta, não preenche. Queremos inspiração para criar, amar, repartir. Aspiramos ser um outro ser, o que não somos podemos imaginar.

        Nem o macaco no zoológico aguenta as limitações, por mais bem tratado que seja. Claro que ele trocaria de bom grado a sua jaula pela liberdade da floresta.

        Deixamos para amanhã a luz que poderíamos ter ainda hoje. Nos assusta a poesia que iluminaria o túnel escuro em que nos arrastamos.

        Nós, os macacos evoluídos, temos a dor e o prazer de querer romper limites. E procuramos desesperadamente achar a chave da gaiola da civilização.

        A chave está dentro da gente. Sabemos disso. Mas dá trabalho procurar com afinco. Dói nos conhecermos.

        Daí desistimos com facilidade.

        E preferimos ficar macaqueando a farsa que a realidade externa nos mostra como felicidade.

        Triste espelho distorcido esse do dia-a-dia em que nos miramos para ajeitar o sorriso no rosto enquanto a alma chora.

        E vamos dançar, vamos para a balada. A música é alta para atordoar, a bebida forte para alterar rápido, e os corpos se juntam hoje para se desjuntarem amanhã cedinho como copinhos descartáveis de café.

        Queremos amor, claro. Só queremos e não temos porque, como todos, não desenvolvemos a delicadeza da entrega, da generosidade, do gosto pelas diferenças, pelas descobertas lentas, cautelosas e profundas.

        Os poemas escancarados de amor, de paixão, de entrega, de renúncia ao seu próprio umbigo, vão rareando, encolhendo, sumindo.

        Poema de amor não enche barriga, dizemos. Nem ajuda a conquistar beltrana, a impressionar fulano.

        E seguimos assombrados e sozinhos e surpresos porque contas bancárias, academias de ginástica e carro novo, também não conseguem nos tirar de nossa solidão.

        Nos contentamos com prazer sexual sem nunca chegar ao orgasmo espiritual, cósmico, que um simples e poderoso verso proporciona.

        E assistimos o noticiário para que este nos confirme que a poesia é inútil.

        Claro que nenhum bandido gosta de poesia. O poema é o território do humano, do sensível, do compartilhar. Nada a ver com o território sangrento de sua violência.

        Poderosos também não são chegados. Poesias insistem, frequentemente, em lembrar que existe todo um povo em redor deles, com seus apelos e urgências. Então, a política fica sendo a chatice, o tédio, o exercício vazio da crueldade. Falta o sonho.

        Política sem sonho é apenas um discurso.

        Demoramos milênios para adquirir o dom da fala. Séculos para dominarmos a escrita.

        Aprendemos a registrar em letras aquilo que estava engasgado na garganta imaterial de nosso íntimo.

        Frase após frase, passamos pela vida a procurar uma resposta.

        E todas as respostas estão ali, na nossa frente. São muitas porque muitas são nossas perguntas.

        Mas uma dessas respostas foi feita para nós por um de nossos semelhantes. A mesma coisa que nos inquieta também afligiu algum poeta, em algum momento.

        Teremos a coragem de ouvir?

        Poesia não se destina a fracos. Antenados percebem que da fraqueza vem sua força.

        Onde quer que se vá, um poeta já se atreveu a passar por lá. Pelos céus e pelos infernos de todos nós.

        A tecnologia muda, os costumes mudam, mas o ser humano é o que sempre foi e será, nem muito melhor, nem muito pior que isso que está aí.

        Dia a dia rima com poesia sim. Você decide. Abra um livro de poesia já. Antes que seja tarde.

        Ulisses Tavares é, claro, poeta, mas não otário, mano.

        Coloque o farol na popa e vá em frente!

        Você é uma jangada. Frágil, qualquer onda mais forte balança e quase o afoga. Você é o condutor e o passageiro ao mesmo tempo, candidato ao naufrágio, lutando e rezando para voltar à praia.

        Um país é um barco. Grande, mas nem sempre bem construído. E muito menos bem conduzido. O povo é apenas marinheiro cumprindo ordens.

        A Terra é um navio. Imenso, farto, mas com os passageiros de primeira classe capazes de festejar e dançar enquanto ele afunda como um Titanic.

        Jangada, barco e navio navegam pelas mesmas águas turbulentas da História, numa viagem que começou bem antes e não se sabe onde irá parar.

        O futuro é uma incógnita, mas o passado é a bússola que pode nos indicar se estamos fora da melhor rota. Se pegamos o caminho errado.

        E isso faz toda diferença.

        Sua jangada, precária de corpo e alma, a qualquer momento será engolfada pela tormenta dos azares, do imprevisível. A felicidade é apenas um momento de calmaria entre horas de ventos cortantes.

        As milhas já navegadas, porém, ensinam a prevenir desastres anunciados.

        Olhe os que foram engolidos pelo Triângulo das Bermudas da existência humana: drogas, egoísmo, alienação.

        Sem cuidar do corpo, você será uma casca de noz boiando no mar. Sendo egoísta, virará um homem solitário mesmo se rodeado de gente. Comprará tudo, menos o incomparável: amor, admiração, amizade. E, se alienando, será plateia perpétua, nunca ator no palco da vida. Vota, mas não apita nada.

        Nosso barco País de vez em quando acerta o rumo do porto seguro. Mas, no mais das vezes, parece uma canoa furada onde impera o salve-se quem puder.

        Novamente colocar o farol na popa, a parte de trás, em vez da popa, a parte da frente, nos ajuda a iluminar o hoje e clarear o possível amanhã.

        O barco já começou a navegar errado, com uma elite ociosa e corrupta e sem nenhum apreço pela educação. São séculos de tirar riquezas e colocar pobrezas. Primeiro pelos portugueses, depois por nossa própria conta e escolha.

        Nosso navio Terra, por sua vez, recebe insultos e devolve flores há milênios.

        Mas está com seu casco avariado, sem combustível e superlotado. Sua única saída é sacudir-se e livrar-se da tripulação toda para continuar como no início dos tempos.

        A esperança é que jangada, barco e navio encontrem uma corrente marítima segura para continuarem navegando.

        Não temos como resolver com facilidade tão grave problema. Não dá para enfrentar a fúria de Netuno, o senhor dos mares, esquecendo de Juno, o deus do tempo.

        Juno, aquele de duas faces da mitologia, uma olhando para a frente, outra voltada para o que passou.

        A História, portanto o passado, é nosso manual prático de cabotagem.

        O ser humano tem sido guerreiro, escravagista, fanático religioso e prepotente em todos os quadrantes e latitudes.

        E sempre afundou sua jangada nas procelas da ambição.

        Os governantes tem sido ora populistas, ora mentirosos, ora oportunistas.

        E sempre afundaram o barco do povo em nome de seus mesquinhos interesses pessoais.

        A Terra foi loteada em fronteiras bem delimitadas e guardadas. E essas fronteiras tem sido a justificativa para extrair o máximo de cada metro quadrado sem pensar no vizinho.

        E, como a Terra é redonda, o navio de todos nós é o mesmo e afunda por inteiro.

        Portanto, o axioma está formado, a Esfinge pronta a nos devorar se não dermos a resposta correta.

        Sem conhecer o que já passamos, como iremos decidir onde será melhor passar?

        A História não é algo estático, parado no tempo.

        É um tsunami indo e vindo, se repetindo, como uma lição que ainda não aprendemos.

        Comecemos pela jangada, passemos para o barco e chegaremos ao navio.

        Sem ler História, de nossa vida, de nosso País, de nosso Planeta, estaremos perdidos.

        E iremos ao fundo, sem a mínima ideia de porque fomos parar lá.

        Ulisses Tavares é uma jangada com medo de ir à pique. Por isso se mira na História e tenta mudar o rumo do barco e do navio. Mas se sente um pouco sozinho nessa tarefa. Alguém aí disposto a ajudar? Cartas para a redação.

Entendendo o artigo de opinião:

01 – Qual é o título do artigo de opinião?

      O título do artigo é "Mundo sem poesia é imundo."

02 – Quem é o autor do artigo?

      O autor do artigo é Ulisses Tavares.

03 – Segundo o autor, o que as pessoas desejam além das necessidades básicas, como comida e sono?

      As pessoas desejam carinho, esperança, inspiração e a capacidade de criar, amar e compartilhar.

04 – O autor menciona a busca pela chave da gaiola da civilização. O que ele quer dizer com isso?

      O autor está se referindo à busca por uma maneira de escapar das limitações e restrições da vida moderna e da sociedade.

05 – Por que o autor acredita que a poesia é importante?

      O autor acredita que a poesia é importante porque ela é uma fonte de inspiração, expressão de sentimentos profundos e uma maneira de compartilhar o humano e o sensível.

06 – Como o autor descreve a política em relação à poesia?

      O autor descreve a política como "chatice" e "exercício vazio da crueldade" quando falta o sonho, destacando a importância do idealismo na política.

07 – O que o autor afirma sobre a tecnologia e os costumes em relação à natureza humana?

      O autor afirma que a tecnologia e os costumes podem mudar, mas a natureza humana permanece relativamente constante ao longo do tempo.

08 – Qual é a importância que o autor atribui ao conhecimento histórico?

      O autor enfatiza a importância de conhecer a história como um manual prático de navegação para evitar erros do passado.

09 – Quais são as três metáforas náuticas que o autor usa para descrever a humanidade e a sociedade?

      O autor utiliza as metáforas de jangada, barco e navio para representar diferentes níveis de organização social e desafios enfrentados pela humanidade.

10 – Qual é o apelo final do autor aos leitores?

      O autor faz um apelo para que os leitores se envolvam na busca por conhecimento histórico e participem ativamente na mudança do curso da sociedade e da humanidade.

 

 

ARTIGO DE OPINIÃO: COMO LER MUITO E CONTINUAR NA MESMA - ULISSES TAVARES - COM GABARITO

 Artigo de opinião: Como ler muito e continuar na mesma

               Ulisses Tavares

        Dizem que o peixe morre pela boca, principalmente quando abocanha o anzol crente que era uma deliciosa minhoca.

        No sentido figurado, o poeta aqui deu uma de peixe.

 Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIBwXmWONJjqn5pJJ4d96xwtU3RNdZXooRYuwhrqSZBvE26DVTmvwJQytQvmHJe9vtWtY-dEnHbUP8fm0s_zAkav1cDuAXEjRWIRRlxyi8G50j-juDl9Uc4qO-uSA77Af_qwlwnDH4iPUwRzbHPOnnqV0EL5LCmdsAlz2PUs39U0hufM64oshYy4K_7M8/s320/LER.jpg


        Durante os últimos anos, tenho defendido que as pessoas devem ler, e muito, e sempre, e o que quiserem ou gostarem. Com unhas e dentes, advoguei em palestras que é melhor ler pouco do que nada. E já saí espalhando por aí que mais vale uma leitura tola e fútil que servirá como treinamento para leituras de mais fôlego, no futuro.

        Fui um dos primeiros a louvar a Internet como ferramenta que forçasse os jovens a, no mínimo, praticarem a linguagem escrita e despertasse a geração adormecida (como a Pátria, no Hino Nacional) em berço esplêndido para novos conhecimentos.

        Pois é: Eu, em grande medida, estava errado. Mordi a isca e entalei com o ferrão do anzol da realidade.

        Minhas “verdades” não resistem as mais recentes pesquisas sobre hábitos de leitura e vou esclarecer tudo neste artigo, porque persistir no erro, mesmo que bem intencionado, é pura burrice.

        Primeiro, arriemos do mastro a bandeira de que, de porcaria em porcaria literária, de livros em livros água-com-açúcar, aos poucos o leitor ingressaria no mundo vasto mundo da literatura clássica ou no instigante e complexo universo da literatura contemporânea.

        Sei que não apenas eu como muitos professores esperançosos, apostamos nessa possibilidade.

        Infelizmente, os fatos nos desmentem.

        Levantamento de entidades ligados ao livro, como a CBL, constataram o óbvio: as tiragens dos romances cor-de-rosa, no Brasil, são de fato gigantescas e avidamente consumidas as centenas dos milhares nas bancas de jornais.

        Maravilha, em princípio.

        Só que um dado surpreendente e assustador emerge da pesquisa: quem lê esse tipo de literatura, continua lendo imutáveis historinhas de amor pelo resto da vida.

        Trocando em miúdos, as jovens e maduras leitoras sonhadoras desse segmento (uma versão atualizada dos antigos folhetins) leem muito. E trocando em graúdos, não leem nem se interessam por nenhum outro gênero ou tipo de livros.

        Certamente, não é esse leitor que vai compor o País de Leitores que nosso romantismo canta nestes tempos escuros.

        Agora, a Internet.

        É inegável que os jovens, em especial, estão trocando o hábito de leitura de jornais, revistas e livros, pela consulta na telinha digital.

        O mercado de livros vendidos nas livrarias já encolheu pela metade.

        E o tempo dedicado à mídia tradicional (a mídia impressa e televisiva) também caiu 40%.

        Um fenômeno com consequências imprevisíveis mas não assustador, pois quando Gutemberg inventou os tipos móveis também se achava o fim dos tempos, afinal livros eram copiados à mão.

        O que dá o que pensar, e preocupar, é que os neo-leitores, a geração web, está lendo mais… porém sem nenhum critério.

        Os trabalhos escolares estão recheados de textos catados na internet e… sem contexto!

        Parágrafos inteiros de grandes pensadores são copiados sem citar a fonte.

        Os poemas, então, são massacrados diariamente.

        Aquele famoso de Gabriel Garcia Marques, La Marioneta, que supostamente celebra a vida de um Gabriel a beira da morte, nunca foi do grande Gabo.

        Seu autor é um ventríloquo mexicano, Johnny Welch, que escreveu o poema para seu boneco!

        Em suma, os webeiros estão lendo qualquer droga e passando pra frente como obras definitivas.

        Isso não é conhecimento. É preguiça pura.

        E leitor preguiçoso nunca vai virar um bom leitor. Como apenas ouvir música estilo sertanejo e quebra-barraco não é um bom primeiro degrau para se transformar em requintado ouvinte de Bach.

        Por incrível que pareça, apenas os contumazes e fiéis leitores e fazedores de quebra-cabeças (essa categoria também composta de revistinhas e livrinhos best-sellers), estão no bom caminho da habilitação a carta de motorista leitor-premium.

        Enriquecem seu vocabulário. Lembremos que sem amplo vocabulário não se chegará a ler e entender nem bulas de remédio ou anúncios de imóveis.

        E, de lambuja, exercitam o cérebro evitando o mal de Alzheimer.

        Acaba meu espaço mas continuam as coisas aí pedindo para refletirmos juntos. Cartas para a redação. Ler, pensar e coçar é só começar.

Ulisses Tavares, poeta, escritor, professor, dramaturgo e filósofo multiuso.

Entendendo o artigo de opinião:

01 – Qual é a principal crítica que o autor faz em relação aos hábitos de leitura das pessoas?

      O autor critica a ideia de que a leitura de qualquer tipo de material, mesmo que seja considerado frívolo, eventualmente levará os leitores a explorar a literatura clássica ou contemporânea.

02 – Segundo o autor, qual é o problema das leitoras de romances cor-de-rosa no Brasil?

      O problema apontado pelo autor é que as leitoras desses romances tendem a continuar lendo apenas histórias de amor e não se interessam por outros gêneros literários.

03 – Como a Internet está afetando os hábitos de leitura, de acordo com o autor?

      A Internet está levando os jovens a abandonar a leitura de jornais, revistas e livros em favor de conteúdo digital, e isso está diminuindo o mercado de livros vendidos nas livrarias.

04 – O que preocupa o autor em relação à leitura na era digital?

      O autor expressa preocupação com o fato de que os leitores na era digital estão consumindo conteúdo sem critério, copiando textos da Internet sem contexto e sem citar fontes, o que ele considera preguiça intelectual.

05 – Qual é a crítica do autor em relação à leitura na Internet em relação a textos escolares?

      O autor argumenta que os trabalhos escolares estão sendo preenchidos com textos retirados da Internet sem contexto, e isso é prejudicial para a educação.

06 – De acordo com o autor, o que é necessário para se tornar um leitor premium?

      O autor sugere que para se tornar um leitor premium, é necessário ser um leitor assíduo, fazer quebra-cabeças, enriquecer o vocabulário e exercitar o cérebro.

07 – Quais são as consequências negativas que o autor associa à leitura sem critério na Internet?

      O autor acredita que a leitura sem critério na Internet não resulta em conhecimento genuíno, mas sim em preguiça intelectual e na disseminação de informações incorretas.

08 – O que o autor sugere ser o caminho certo para desenvolver bons hábitos de leitura?

      O autor sugere que desenvolver hábitos de leitura sólida envolve a escolha de leituras significativas, a ampliação do vocabulário e a prática constante da leitura.

09 – O que o autor quer destacar sobre o papel dos leitores na formação de um "País de Leitores"?

      O autor quer enfatizar que apenas ler qualquer coisa, sem critério, não contribuirá para a formação de uma nação de leitores, e é necessário escolher leituras mais substanciais.

10 – Qual é a mensagem final do autor para os leitores?

      A mensagem final do autor é incentivar os leitores a refletirem sobre seus hábitos de leitura, a escolherem leituras mais significativas e a evitarem a leitura sem critério.

 

ARTIGO DE OPINIÃO: A PROPAGANDA DOS POETAS. E OS POETAS DA PROPAGANDA - ULISSES TAVARES - COM GABARITO

 Artigo de opinião: A propaganda dos poetas. E os poetas da propaganda.

                Ulisses Tavares

        Em setembro, tive a alegria de ser um dos coordenadores da Primeira Semana de Poesia da Escola Superior de Propaganda e Marketing-ESPM- de São Paulo. Muitas e variadas atrações, com pesos pesados da crítica literária e da poesia brasileira.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEirG4Z-kE2LK6vxQ5Gy77af763TTW8BDXUSe0UtsMZsaoiKpdxdFOz1Q6KBz2lZlKT7BjrUxyr1MxDg-8I2fJONre1BITgn7053otCSh9Z1OiOgxyhHxtTLMO0uvdeiEmbhZ-iWuGs0AfoR1vk7YWVGDsDzDbaX9r6xGdzm62gMlJ_BuOZXHT8mnt8IZY8/s1600/PROPAGANDA.jpg


        E tive a tristeza de constatar o óbvio: os universitários, com as poucas exceções de sempre, não parecem se entusiasmar pelo tema literatura, mesmo sendo de graça e de alta qualidade como neste evento da Espm.

        Perderam, assim, a chance de compartilhar a sabedoria atualizada de um Cláudio Willer, de um Carrascoza, de um Franceschi, de um Mauro Salles e, até, a performance do ator Pascoal da Conceição que tirou as calças e, de bunda de fora, deu um show sobre Mário de Andrade e o modernismo.

        Meu lado poeta ficou revoltado, mas meu lado publicitário, mais cínico, me consolou: esses jovens que não se ligam em leitura irão se ferrar em breve. Como é que alguém pode pretender trabalhar em marketing e propaganda se não gosta de ler? Em mais de 30 anos de profissão, nunca conheci um publicitário de sucesso que não gostasse de ler! Simplesmente porque é impossível viver o dia-a-dia da propaganda sem uma boa bagagem cultural. Na minha área, por exemplo, a Criação, as ideias surgem e se concretizam das mais diversas fontes: da moda, da informação factual, do vocabulário, da filosofia, da psicologia, da história, da geografia, enfim, de todos os ramos do conhecimento humano. Sem ser curioso e ser muito lido, o próprio mercado rejeita o sem-leitura na primeira entrevista de seleção.

        É mais fácil alguém que não gosta de ler virar presidente da república que publicitário de sucesso.

        Por isso, no próximo evento da Espm, pois muitos outros virão, já que sua diretoria é de apaixonados pela literatura, meu conselho de puta-velha é: compareçam e aproveitem, meninos, antes que seja tarde demais.

        O estudante que não compareceu às palestras, mesas-redondas e recitais, achando que poesia não tem nada a ver com propaganda, se passou um diploma de burraldo com louvor.

        Grande parte dos nossos maiores escritores e poetas foi (e assim ainda é) dependente da propaganda para sobreviver.
           O que também não é nenhuma novidade: o primeiro poeta que colocou seu talento a serviço do processo de venda de produtos, serviços e ideias (sim, o nome disso hoje é o tal de marketing, aluno alienado!) foi o maior poeta latino, Virgílio. Há mais de 2 mil anos atrás, ele ficou 8 anos escrevendo os 4 volumes do imenso poema Geórgicas. E não porque quisesse. Era para ganhar a vida mesmo. O hiper poema foi encomendado pelo imperador de Roma para convencer as pessoas a voltarem a trabalhar com prazer no campo, já que não cabia mais ninguém na cidade. Leiam e irão ver que o poema é quase um tratado de agricultura.

        Resumindo, propaganda pura e simples.

        A seguir, divirtam-se com uma seleção de exemplos da língua portuguesa:

        Fernando Pessoa, que dispensa apresentações, em 1928 meteu-se na propaganda e criou o slogan da Coca-Cola, produto recém-chegado ao seu Portugal: “Primeiro, estranha-se! Depois, entranha-se!” O slogan chegou a ter sua utilização proibida, pois as autoridades consideraram que ele insinuava que a Coca-Cola continha substâncias tóxicas. No que o autor deste artigo concorda, pois é viciado nela.

        Casimiro de Abreu, outro clássico, criou a propaganda do Café Fama: “Ah! Venham fregueses! / E venham depressa! Que aqui não se prega / Nem logro, nem peça.”

        Olavo Bilac, aquele do ouvir estrelas ensinado nas escolas do antigo primário, hoje fundamental, fez a propaganda do Fósforos Brilhante com estes versos: “Aviso a quem é fumante / Tanto o Príncipe de Gales / Como o Dr. Campos Salles / Usam Fósforos Brilhante.”

        Ernesto de Souza, em 1918, criou um hit poético-publicitário que todo mundo lembra geração após geração, para o remédio Rhum Creosotado: “Veja ilustre passageiro / o belo tipo faceiro / que o senhor tem a seu lado. / E, no entanto, acredite, / quase morreu de bronquite, / salvou-o Rhum Creosotado.”

        Augusto dos Anjos, aquele poeta da morte e dos vermes corroendo nossas putrefatas carnes, fez inúmeras propagandas em versinhos, com muita repercussão. Uma delas foi esta, para uma loja de roupas importadas: “Nesta cidade onde o atraso / Lembra uma cara morfética / Fez monopólio da estética / A Loja do Rattacaso.”

        Bastos Tigre e Ary Barroso, em 1934, lançaram a cerveja Brahma em garrafa, grande novidade da época já que, até então, só existia cerveja em barril: “O Brahma Chopp em garrafa, / Querido em todo o Brasil, / Corre longe, a banca abafa, / Igualzinho o de barril.”

        A lista é infindável, mas meu espaço não, por isso paro aqui. Mas aproveito para reiterar (é a mesma coisa, em propaganda, que a gente chama de stressar) que estudante de comunicações que não curte ler, nem ama a literatura, vai ter um problema prático logo de cara quando tentar virar profissional: seus futuros patrões são leitores compulsivos. E, também por causa disso, muito espertos e sabidos.

        Aliás, vários deles estavam lá, na Semana de Poesia da Espm. E outros tantos estarão nas próximas. Jovem que não for, dançou, marcou bobeira. Amém.

Ulisses Tavares, poeta nas horas plenas, publicitário nas horas vagas.

Entendendo o artigo de opinião:

01 – Qual foi o evento mencionado no artigo que o autor coordenou em setembro?

      O autor coordenou a Primeira Semana de Poesia da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) de São Paulo.

02 – Por que o autor ficou revoltado durante o evento?

      O autor ficou revoltado porque percebeu que a maioria dos universitários não demonstrou entusiasmo pela literatura, mesmo com a presença de figuras importantes da crítica literária e poesia brasileira.

03 – Qual é o conselho do autor para os estudantes que não compareceram ao evento da ESPM?

      O autor aconselha os estudantes a comparecerem e aproveitarem os eventos de literatura, pois acredita que é essencial para o sucesso na área de marketing e propaganda.

04 – Quem é considerado o primeiro poeta a se envolver em propaganda?

      O primeiro poeta a se envolver em propaganda foi Virgílio, um poeta latino que escreveu as "Geórgicas" a pedido do imperador romano para promover a agricultura.

05 – Quais são alguns exemplos de poetas famosos que também participaram na criação de slogans publicitários?

      Fernando Pessoa, Casimiro de Abreu, Olavo Bilac, Ernesto de Souza, Augusto dos Anjos, Bastos Tigre e Ary Barroso são alguns dos poetas mencionados no artigo que contribuíram com slogans publicitários.

06 – Qual é o ponto que o autor enfatiza sobre a importância da leitura na área de marketing e propaganda?

      O autor enfatiza que a leitura é essencial na área de marketing e propaganda porque as ideias e inspirações surgem de diversas fontes culturais e literárias.

07 – Como o autor descreve a relação entre a literatura e a propaganda?

      O autor sugere que muitos poetas e escritores tiveram que se envolver em propaganda para sobreviver, indicando uma ligação histórica entre as duas áreas.

08 – Qual é a importância do evento da ESPM mencionado no artigo?

      O evento da ESPM é importante porque oferece a oportunidade de os estudantes se envolverem com a literatura e, assim, adquirirem uma bagagem cultural fundamental para futuras carreiras em marketing e propaganda.

09 – O que o autor diz sobre o perfil dos futuros patrões na área de comunicações?

      O autor afirma que a maioria dos futuros patrões na área de comunicações são leitores compulsivos, inteligentes e bem-informados, o que pode ser um desafio para estudantes que não gostam de ler.

10 – Como o autor encerra o artigo em relação à participação dos jovens nos eventos da ESPM?

      O autor encerra o artigo enfatizando que os jovens que não participam dos eventos da ESPM perderão a oportunidade de se envolver com profissionais experientes e apaixonados pela literatura na área de comunicações.

 

 

CRÔNICA: HORÓSCOPO - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM GABARITO

 CRÔNICA: HORÓSCOPO

              Carlos Drummond de Andrade

        -- Telefonaram do escritório, bem. Seu chefe mandou perguntar por que você não foi trabalhar?

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh0qCL7boqlhXy1ixf5pXOouxCrCoCc60qm_Udn0OG370jzTRdAj5Xqa7_jbeG56J4j-7ffBZcVEp26bI3z8UvhV2p0D4uAJdt1HD537vGGdYTCL8EWPssK3tNYJP4p-R53F7TCS0vrTQ5UlH4YAsDocDJ_Fa3yrLO2nciKWaSIINsCjX9cT0ChbVVeeT0/s1600/HOROSCOPO.jpg


        -- E você deu o motivo?

        -- Não.

        -- Ora, Alfredinho, isso é motivo que se dê?

        -- Por que não? Se há motivo, está justificado. Sem motivo é que não cola.

        -- Então eu ia dizer ao seu chefe que você não trabalha hoje porque o seu horóscopo aconselha: “Fique em casa descansando?”

        -- E daí amor? Se meu signo é Touro, e se Touro acha conveniente que eu não faça nada, como é que eu vou desobedecer a ele?

        -- É, mas com certeza seu chefe não é Touro, e não vai achar graça nisso.

        -- Ele é Áries, está ouvindo? E o dia não está para relações entre Áries e Touro. Pega aí o jornal. Faz favor de ler com esses belos olhos cor de pervinca: “Áries – evite rigorosamente discussões com subordinados”.

        -- Mas se ele evitar, não tem perigo para você.

        -- Ele pode evitar, sim, deve evitar. E para colaborar com ele, eu fico em casa.

        -- Mas se você não comparecer, ele pode vir ao telefone e pegar uma discussão danada com você, dessas de sair fogo.

        -- Não atendo telefone durante o dia. Não posso atender. Não vê que estou descansando, que o horóscopo me mandou descansar? É favor não fazer rebuliço nesta casa. Amor e paz, para o descanso do guerreiro.

        -- Para mim você está com preguiça e das bravas.

        -- Posso estar com preguiça, e daí? Preguiça é relaxante, restaura as energias, predispõe para o trabalho no dia seguinte. Mas uma coisa não tem nada a ver com a outra. Se eu não faço nada hoje, não é porque estou com preguiça. É em atenção a um mandamento superior, à mensagem que vem dos astros, você não percebe?

        -- Percebo, sim, mas não concordo.

        -- Pode-se saber por que a excelentíssima não concorda com aquilo que percebe e que está devidamente explicado?

        -- Pode.

        -- Então explica, vamos.

        -- Gozado, Alfredinho, até parece que para você só existem dois signos no zodíaco: Touro e Áries, você e o patrão.

        -- Espera lá, você queria que eu prestasse atenção em Touro? Áries eu li hoje por acaso, porque está ao lado de Touro, em coluna paralela.

        -- Coincidência: você saber que seu chefe é Áries, e...

        -- É, sim.

        -- E por que você guardou na cabeça que ele é Áries?

        -- Ora por que! Ele fez anos no mês passado, amorzinho. Até contei a você que oferecemos a ele uma batedeira. Soubemos que a mulher dele precisava de batedeira, fizemos uma vaquinha, pronto. Mas por que você diz que para mim só existem dois signos?

        -- Pelo menos Sagitário você ignora.

        -- Como eu iria ignorar Sagitário, se é o signo de você, minha orquídea de novembro 25?

        -- É, mas esqueceu de ler que o dia é propício para reuniões sociais de Sagitário, e saiba que esta sua orquídea de novembro 25 vai reunir hoje as amigas aqui em casa. Trate de se mandar, querido.

        -- Sem essa! Touro me manda descansar em casa, e você me enche a casa com mulheres?

        -- É Sagitário que recomenda, monange.

        -- Sagitário não ia fazer isso comigo! Eu tinha harmonizado Touro com Áries!

        -- Pode continuar harmonizando, se for descansar em casa do Tostes, que é Virgem, eu sei, ele é nosso padrinho de casamento.

        Assim, Touro, Virgem, Áries e Sagitário ficam inteiramente harmonizados, cada um na sua, um por todos, todos por um. Ande, vá se vestir rapidinho, rapidinho, e rua, seu vagabundo!

Carlos Drummond de Andrade.

Entendendo o texto:

01 – Por que Alfredo não foi trabalhar, de acordo com o texto?

      Alfredo não foi trabalhar porque seu horóscopo, como signo de Touro, aconselhou que ele ficasse em casa descansando.

02 – Qual é o signo do chefe de Alfredo?

      O chefe de Alfredo é do signo Áries.

03 – Por que Alfredo acredita que não deve ir trabalhar quando seu chefe é de Áries?

      Alfredo acredita que não deve ir trabalhar porque o horóscopo recomendou que ele evitasse discussões com subordinados, e ele quer colaborar com o chefe evitando conflitos.

04 – Qual é o signo da esposa de Alfredo?

      A esposa de Alfredo é de Sagitário.

05 – Por que a esposa de Alfredo está reunindo suas amigas em casa?

      Ela está reunindo suas amigas em casa porque o horóscopo de Sagitário recomenda reuniões sociais, e ela deseja seguir essa recomendação.

06 – Qual é o argumento de Alfredo para justificar sua recusa em ir para casa quando sua esposa está reunindo amigas?

      Alfredo argumenta que seu horóscopo de Touro recomenda que ele descanse em casa, o que entra em conflito com a recomendação do horóscopo de Sagitário de sua esposa.

07 – Qual é a relação de Virgem com o texto?

      Virgem é mencionado no final do texto como o signo de Tostes, o padrinho de casamento de Alfredo e sua esposa, o que contribui para a harmonia dos signos no contexto da história.

 

 

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

CRÔNICA: AULA DE INGLÊS - RUBEM BRAGA - COM GABARITO

 Crônica: Aula de Inglês

               Rubem Braga

        -- Is this an elephant?

        Minha tendência imediata foi responder que não; mas a gente
não deve se deixar levar pelo primeiro impulso. Um rápido olhar que lancei à professora bastou para ver que ela falava com seriedade, e tinha o ar de quem propõe um grave problema.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg9rQfFyoY3ddIXXXBTFOz09NBQJBXrjo_Ukiklkib2OXq4zutB_CkD1a76WTlDZR6tZtdbZDsmXhLFWKZMKw1K6HsGKuq51XxgpDGU0Rq3ryWalzb2MlKe9TnEoOoZSH4T61s3CwpLLo9xr8qqgPbwMzdWzjgf8DWBfrdAcfILXPKqFZbz1Czbp_jSXgQ/s320/INGLES%20CAPA.jpg


        Em vista disso, examinei com a maior atenção o objeto que ela me apresentava.

        Não tinha nenhuma tromba visível, de onde uma pessoa leviana
poderia concluir às pressas que não se tratava de um elefante. Mas se tirarmos a tromba a um elefante, nem por isso deixa ele de ser um elefante; mesmo que morra em consequência da brutal operação, continua a ser um elefante; continua, pois um elefante morto é, em princípio, tão elefante como qualquer outro. Refletindo nisso, lembrei-me de averiguar se aquilo tinha quatro patas, quatro grossas patas, como costumam ter os elefantes. Não tinha. Tampouco consegui descobrir o pequeno rabo que caracteriza o grande animal e que, às vezes, como já notei em um circo, ele costuma abanar com uma graça infantil.

        Terminadas as minhas observações, voltei-me para a professora e disse convincentemente:

        -- No, it's not!

        Ela soltou um pequeno suspiro, satisfeita: a demora de minha resposta a havia deixado apreensiva. Imediatamente perguntou:

        -- Is it a book?

        Sorri da pergunta: tenho vivido uma parte de minha vida no
meio de livros, conheço livros, lido com livros, sou capaz de distinguir um livro à primeira vista no meio de quaisquer outros objetos, sejam eles garrafas, tijolos ou cerejas maduras – sejam quais forem. Aquilo não era um livro, e mesmo supondo que houvesse livros encadernados em louça, aquilo não seria um deles: não parecia de modo algum um livro. Minha resposta demorou no máximo dois segundos.

        -- No, it's not!

        Tive o prazer de vê-la novamente satisfeita -- mas só por alguns segundos. Aquela mulher era um desses espíritos insaciáveis que estão sempre a se propor questões, e se debruçam com uma curiosidade aflita sobre a natureza das coisas.

        -- Is it a handkerchief?

        Fiquei muito perturbado com essa pergunta. Para dizer a verdade, não sabia o que poderia ser um handkerchief; talvez fosse hipoteca... Não, hipoteca não. Por que haveria de ser hipoteca? Handkerchief! Era uma palavra sem a menor sombra de dúvida antipática; talvez fosse chefe de serviço ou relógio de pulso ou ainda, e muito provavelmente, enxaqueca. Fosse como fosse, respondi impávido:

        -- No, it's not!

        Minhas palavras soaram alto, com certa violência, pois me repugnava admitir que aquilo ou qualquer outra coisa nos meus arredores pudesse ser um handkerchief.

        Ela então voltou a fazer uma pergunta. Desta vez, porém, a pergunta foi precedida de um certo olhar em que havia uma luz de malícia, uma espécie de insinuação, um longínquo toque de desafio. Sua voz era mais lenta que das outras vezes; não sou completamente ignorante em psicologia feminina, e antes dela abrir a boca eu já tinha a certeza de que se tratava de uma palavra decisiva.

        -- Is it an ash-tray?

        Uma grande alegria me inundou a alma. Em primeiro lugar porque eu sei o que é um ash-tray: um ash-tray é um cinzeiro. Em segundo lugar porque, fitando o objeto que ela me apresentava, notei uma extraordinária semelhança entre ele e um ash-tray. Era um objeto de louça de forma oval, com cerca de 13 centímetros de comprimento.

        As bordas eram da altura aproximada de um centímetro, e nelas havia reentrâncias curvas -- duas ou três -- na parte superior. Na depressão central, uma espécie de bacia delimitada por essas bordas, havia um pequeno pedaço de cigarro fumado (uma bagana) e, aqui e ali, cinzas esparsas, além de um palito de fósforos já riscado. Respondi:

        -- Yes!

        O que sucedeu então foi indescritível. A boa senhora teve o rosto completamente iluminado por onda de alegria; os olhos brilhavam -- vitória! vitória! -- e um largo sorriso desabrochou rapidamente nos lábios havia pouco franzidos pela meditação triste e inquieta. Ergueu-se um pouco da cadeira e não se pôde impedir de estender o braço e me bater no ombro, ao mesmo tempo que exclamava, muito excitada:

        -- Very well! Very well!

        Sou um homem de natural tímido, e ainda mais no lidar com
mulheres. A efusão com que ela festejava minha vitória me perturbou; tive um susto, senti vergonha e muito orgulho.

        Retirei-me imensamente satisfeito daquela primeira aula; andei na rua com passo firme e ao ver, na vitrine de uma loja, alguns belos cachimbos inglêses, tive mesmo a tentação de comprar um. Certamente teria entabulado uma longa conversação com o embaixador britânico, se o encontrasse naquele momento. Eu tiraria o cachimbo da boca e lhe diria:

        -- It's not an ash-tray!

        E ele na certa ficaria muito satisfeito por ver que eu sabia falar inglês, pois deve ser sempre agradável a um embaixador ver que sua língua natal começa a ser versada pelas pessoas de boa-fé do país junto a cujo governo é acreditado.

A crônica acima foi extraída do livro "Um pé de milho",
         Editora do Autor – Rio de Janeiro, 1964.

Entendendo a crônica:

01 – Como o narrador inicialmente reage à pergunta da professora sobre o objeto em questão?

      O narrador inicialmente considera responder que não, mas decide não se deixar levar pelo primeiro impulso.

02 – Por que o narrador examina cuidadosamente o objeto que a professora lhe apresenta?

      Ele examina o objeto porque percebe que a professora fala com seriedade e parece estar propondo um problema sério.

03 – O que o narrador considera ao avaliar se o objeto é um elefante?

      Ele considera a falta de uma tromba visível, mas pondera que mesmo sem a tromba, um elefante continua a ser um elefante.

04 – Qual é a primeira pergunta da professora após a pergunta sobre o objeto ser um elefante?

      A primeira pergunta da professora é se o objeto é um livro.

05 – Como o narrador responde à pergunta sobre o objeto ser um livro?

      O narrador responde que não, definitivamente não é um livro.

06 – Como a professora reage à resposta do narrador sobre o objeto não ser um livro?

      A professora fica momentaneamente satisfeita com a resposta do narrador.

07 – O que o narrador sente em relação à palavra "handkerchief" (lenço) quando a professora a menciona?

      O narrador sente-se perturbado pela palavra "handkerchief" e acha-a antipática.

08 – Qual é a resposta do narrador quando a professora pergunta se o objeto é um "ash-tray" (cinzeiro)?

      O narrador responde "Yes!" (Sim) quando a professora pergunta se o objeto é um cinzeiro.

09 – Como a professora reage quando o narrador responde que o objeto é um cinzeiro?

      A professora fica muito alegre e expressa sua satisfação pela resposta correta.

10 – Qual é o sentimento do narrador após a aula de inglês?

      O narrador sente-se imensamente satisfeito após a aula de inglês e fica tentado a comprar um cachimbo inglês.

 

CRÔNICA(Fragmento): ZÉ CABALA E O TORCEDOR - JOSÉ ROBERTO TORERO - COM GABARITO

 Crônica(Fragmento): Zé Cabala e o torcedor

             JOSÉ ROBERTO TORERO

        Desta vez, o telefonista dos espíritos recebe alguém que não é atacante, zagueiro, meio-campista ou goleiro

        QUANDO CHEGUEI ao escritório de Zé Cabala, o grande mensageiro das almas, o supremo webmail dos espíritos, ele já me esperava em sua sala. Usava um turbante negro, e negra também era sua túnica.^

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh_TCiY4NGh9qIrSLJF9q1E-AjNKeKO69AzzhuDomZUqh-qJqwM-ydP_tZLHkMP8VQRTViIYJ9YWOIRmc6G84w7RhUf9wrNts05uZorWMxaUjbqh3YK6xswtO9Dflf8_azaZkLMIhSKDl5wBS6Ck24_CwTPswFlCvY9ulFsK_ZRIMJae5v5_eYEHdeyzs4/s320/psicografia.jpg


        Como nunca o tinha vista tão elegante, perguntei: "Está de luto, mestre?". "Não, é que preto emagrece", ele me respondeu. "Mas vamos ao que interessa. Quem o nobre foliculário (ou devo dizer folhiculário?) quer entrevistar hoje? Um grande meia, um inesquecível atacante, um invencível zagueiro ou um premiado técnico?" "Estava pensando em algo mais simples: um torcedor."
Então o divino psicófono ergueu-se, pegou a toalha da mesa e começou a agitá-la como se fosse uma bandeira, correndo pela sala e cantando uns hinos que eu não entendi. Depois, já ofegante, finalmente sentou-se. "O senhor é um torcedor?", perguntei. "Ô! E dos bons." "Pois eu queria saber o que leva alguém a amar um time."

        "Ah, meu filho, são vários motivos e um motivo só. Você pode gostar de um time porque é o time da sua cidade, porque algum grande amigo torce por ele ou porque seu pai lhe ensinou assim. Mas o certo é que, se torce para um time, é porque se quer fazer parte de alguma coisa maior. Um homem é só um homem, mas, se ele torce para um time, passa a fazer parte de uma torcida, de um clube, de uma história, uma história cheia de vitórias e derrotas, cheia de batalhas heroicas e grandes inimigos.”

        "E esses inimigos são importantes?" "Ô! Diga-me com quem não andas e te direi quem não és. O inimigo é tão importante quanto o amigo. Talvez mais. E torcer contra eles é uma delícia. Pode perguntar para qualquer um. O torcedor do Sport vibra com a derrota do Santa Cruz, o do Inter bebe vinho quando o Grêmio perde, e o do Galo canta quando o Cruzeiro tropeça. O inferno dos outros é o nosso céu."

        "Não é meio triste pensar assim?" "É, mas fazer o quê? O ser humano não é grande coisa." "Essa história de inimigo não é o que provoca as brigas nos estádios?"

        "Não mesmo! Torcedor comum não briga. Isso é coisa de torcedor organizado. O torcedor comum segue o trilho das coisas certas. Na verdade, ele até gosta de ir ao campo com um amigo que torce para o inimigo, só para ficar tirando sarro do coitado. Tirar sarro dos torcedores adversários é das melhores coisas que existe. Por isso é que eu adorava as segundas-feiras, porque tirava sarro de metade do pessoal lá no serviço."

        "E o senhor acha certo que o futebol seja tão importante na vida das pessoas?" "Meu filho, as coisas mais importantes são as coisas sem importância. O futebolzinho, conversar com os amigos no bar, beber uma cerveja gelada, comer uma linguicinha bem apimentada, olhar uma mulher bonita, tomar um bom pingado na padaria, pregar peça nos amigos... Felicidade é um negócio simples, a gente é que complica."

        "E quando o senhor era vivo torcia para quem?" "Como assim, você não está me reconhecendo?" "Bem..., para falar a verdade..."

        "Te chamei de "meu filho", e você não adivinhou quem sou eu?"

        "Pai?"

        "Quem mais? E você sabe que eu torço pelo Santos e contra o Corinthians. Aliás, esperei até o último jogo entre os dois para ir para o lado de lá. Ah, aquele 2 a 1 foi uma bela despedida. E, falando em despedida, já está na minha hora. Adeus. De novo."

        Estranhamente, desta vez Zé Cabala não cobrou a consulta.

torero@uol.com.br

Entendendo a crônica:

01 – Qual é o nome do protagonista da crônica, também conhecido como o "telefonista dos espíritos"?

      O protagonista se chama Zé Cabala.

02 – Por que Zé Cabala estava vestindo um turbante e uma túnica negra no início da crônica?

      Zé Cabala estava vestindo um turbante e uma túnica negra porque achava que a cor preta o fazia parecer mais magro.

03 – Quem Zé Cabala decide entrevistar desta vez, em vez de um jogador de futebol?

      Zé Cabala decide entrevistar um torcedor.

04 – Quais são alguns dos motivos mencionados pelo torcedor para explicar por que as pessoas amam seus times de futebol?

      Os motivos incluem ser o time da cidade, influência de amigos ou familiares e o desejo de fazer parte de algo maior.

05 – Por que o torcedor considera os inimigos do time tão importantes quanto os amigos?

      O torcedor considera os inimigos importantes porque torcer contra eles é uma fonte de alegria e satisfação.

06 – Qual é a opinião do torcedor sobre as brigas nos estádios de futebol?

      O torcedor comum não se envolve em brigas nos estádios; ele prefere tirar sarro dos torcedores adversários. As brigas são associadas a torcedores organizados.

07 – Qual é a visão do torcedor sobre a importância do futebol na vida das pessoas?

      O torcedor acredita que o futebol e outras coisas simples da vida, como conversar com amigos, comer, beber e se divertir, são as coisas mais importantes, e a felicidade reside na simplicidade.